Home Blog Page 272

Itajaí: sentença libera FGTS de mulher que vive com portadora do HIV

0

DECISÃO:  TRF-JF-SC – A Justiça Federal autorizou a liberação de parte do saldo do FGTS para pagamento de prestações de arrendamento residencial em atraso, em favor de uma mulher que vive em união com outra mulher que é portadora do vírus da Aids. A sentença é do juiz Marcelo Adriano Michelotti, do Juizado Especial Federal Cível de Itajaí, e foi proferida na última segunda-feira (27/8/2007). Segundo o magistrado, a lei permite o saque do FGTS quando o titular da conta ou seus dependentes têm o HIV e os tribunais já reconheceram os relacionamentos homoafetivos.

“Caracterizada a relação sociofativa, sendo a dependência presumida e provada a condição de portadora do HIV [da companheira], possível o saque do FGTS”, concluiu Michelotti. De acordo com o processo, ambas mantêm a união há cerca de quatro anos e nos últimos dois estão morando juntas, num apartamento objeto de arrendamento. Com três prestações em atraso, a titular da conta moveu ação contra a Caixa Econômica Federal (CEF) para poder usar o dinheiro, obtendo decisão favorável.

A sentença determina a CEF que empregue a quantia necessária da conta da titular para quitar as parcelas e também permite o saque de R$ 300 para pagamento do condomínio. Se a decisão for mantida em instâncias superiores, a titular poderá levantar o restante do valor. A CEF pode recorrer da sentença.

FONTE:  TRF-4ª Região (SC),  04 de setembro de 2007.


 

As Astreintes no direito do consumidor: limites e possibilidades de aplicação e liquidação

0

* Rizzatto Nunes

No presente artigo, examinaremos o importante instituto das astreintes, que a cada dia têm sido mais utilizada pelo Poder Judiciário para fazer valer suas decisões nas obrigações de fazer e não fazer, especialmente nas questões envolvendo consumidores e fornecedores. O tema não é novo, mas ainda assim não está bem esclarecido entre os juristas e aplicadores do direito. Por isso, tentaremos solver alguns dos problemas que têm aparecido como pendentes nas disputas forenses.

1. O vocábulo

Antes de fazer as observações necessárias a respeito das astreintes, é importante consignar que parte da doutrina equivoca-se não só ao defini-la, como ao tratar de suas conseqüências e suas funções.

O termo astreintes, mantido entre nós no vocábulo estrangeiro, tem origem na jurisprudência francesa. Apesar da hostilidade da doutrina, que via na sua fixação uma violação ao principio da nulla pena sine lege, firmou-se lá como criação pretoriana.

O vocábulo, ao que parece, é utilizado entre nós como o original francês por mera dificuldade de tradução (aproximadamente, seria compulsão, constrição), mas não há dúvida de que se trata de multa, cuja única finalidade é cominatória, vale dizer, sua existência tem como objetivo o cumprimento de uma obrigação de fazer ou não fazer.

2. Função

Em nosso sistema que, diga-se, é o único que importa, as astreintes são previstas em mais de um texto legal (como se verá adiante). Cabe ao magistrado fixá-las no caso concreto para estimular – forçar, na verdade – o devedor a cumprir sua obrigação.

No entanto, infelizmente, há casos de abusos na sua fixação e, especialmente, na sua liquidação em pecúnia quando não cumprida a obrigação, em parte influenciada pela equivocada doutrina.

E, para citarmos, por todos, a posição jurídica acertada a respeito do tema, transcreve-se o pensamento de Calmon de Passos. Diz ele que o valor das astreintes deve ser proporcional à obrigação inadimplida e que seja capaz de desempenhar a função de coercibilidade sobre o devedor: "Suficiente para induzir o devedor a adimplir, pelo que variará em função da capacidade econômica do devedor, mais do que em função da natureza da obrigação, mas essa correção não pode alcançar excesso, devendo cingir-se ao compatível".

3. Natureza

Realce-se, também, um aspecto que, às vezes, passa despercebido, o de que, a rigor, o resultado da liquidação da multa não deveria reverter a favor do credor da obrigação.

A natureza das astreintes é de pena para exercer pressão psicológica, imposta pelo magistrado para garantir sua própria decisão, e não o crédito ou o direito da outra parte. Tanto isso é verdade que, de fato, as astreintes substituem o delito de desobediência.

A liquidação da multa, portanto, não tem relação com o direito da parte contrária, exatamente como o cumprimento da pena do crime de desobediência não a prejudica nem a beneficia.

Desse modo, o produto da liquidação das astreintes, evidentemente, deveria pertencer ao Estado e não à parte. Nesse sentido é a doutrina de Luiz Guilherme Marinone: "a multa (…) serve apenas para pressionar o réu a adimplir a ordem do juiz, motivo pelo qual não parece racional a idéia de que ela deva reverter para o patrimônio do autor, como se tivesse algum fim indenizatório ou algo parecido com isso; seu único objetivo é garantir a efetividade da tutela jurisdicional."

E também de Marcelo Lima Guerra: "o credor não tem, em princípio, direito de receber nenhuma quantia em dinheiro, em razão direta do inadimplemento do devedor, que não seja àquela correspondente a perdas e danos. Na relação entre credor e devedor, o primeiro só tem direito à prestação contratada ou ao equivalente pecuniário dessa mesma prestação (o ressarcimento em dinheiro pelos prejuízos resultantes da não realização da prestação)".a

4. O caráter objetivo: confusão a ser evitada

Outrossim, há de se deixar claro o caráter objetivo da fixação da multa inibitória. Ela não pode ter a natureza de vingança ou castigo pelo descumprimento da ordem judicial.

O que se percebe, algumas vezes, nos pronunciamentos dos magistrados, é uma espécie de ira pelo descumprimento de sua ordem, como se a negativa fosse subjetiva e especificamente dirigida ao prolator da ordem. Verifica-se, nesses casos, que o juiz, usando o bastão das astreintes, aplica sua revanche pessoal ao infrator e até, por vezes, exatamente por agir como pessoa e não como representante do Estado, abusa do direito que tem.

Ora, não há nada de pessoal, quer no cumprimento quer no descumprimento de uma ordem judicial. Esta é resultado de uma ação dita jurisdicional, feita não por uma pessoa na condição de indivíduo ou cidadão, mas por alguém investido do papel social público e essencial, no qual está investido, vale dizer, na função pública de magistrado. Uma vez dada a ordem, ela se dirige ao devedor não pela pessoa física do juiz, mas por seu papel, na investidura do cargo como representante do Estado.

Além disso, exponha-se desde já, a Justiça não fica diminuída em sua dignidade, porque em certo momento alguém não cumpre uma determinação do juiz, como também não fica diminuída se esse mesmo juiz (ou pela via de recurso o juízo ad quem) modifique a decisão, revogando a obrigação. É algo juridicamente possível, justo e plenamente de acordo com o sistema processual vigente no país.

Desse modo, é de se excluir as considerações doutrinárias e jurisprudenciais de fundo psicológico, eis que isso vicia a objetiva incidência do instituto das astreintes nos estritos limites do eqüitativo e justo no caso concreto.

5. O limite do "quantum"

Na questão do valor, há de se convir que nenhuma multa, seja de que natureza for e independente do modo lingüístico utilizado (lembre-se que a linguagem retórico-jurídica pode gerar alguma ilusão), deverá reduzir o infrator à insolvência nem enriquecer ilicitamente o credor e, muito menos, ser fixada de tal maneira que a torne mais importante que o objeto da ação principal em jogo.

Aliás, anote-se que não há como sustentar lógica e juridicamente a hipótese de liquidação de astreintes cuja somatória seja maior, mais relevante ou mais importante que o objeto perseguido na ação principal; é uma contradição em termos: Condenar o devedor por não ter cumprido uma ordem judicial a pagar mais que o valor do pleito feito pelo credor na própria ação principal é tão estranho que mais justo seria julgar procedente a ação sem ouvir o réu.

É o que aconteceria, por exemplo, numa ação por danos morais fundada em negativação indevida de nome nos cadastros de inadimplentes em que, como regra, os tribunais fixam o quantum indenizatório em cinco, dez, vinte ou, em casos muitos especiais, em trinta mil reais. Numa ação desse tipo, o descumprimento da ordem de retirada da anotação no órgão de proteção ao crédito (geralmente conferida liminarmente) com fixação de astreintes, não pode, evidentemente, gerar um valor dezenas de vezes superior ao da condenação na ação principal (e esse raciocínio é válido, mesmo que no momento da execução das astreintes não tenha ainda o juiz ou o Tribunal fixado definitivamente o valor da indenização da ação principal).

Realmente, não tem sentido nenhum, repita-se, que o não cumprimento de uma ordem incidental no feito, possa ser mais importante que o próprio feito tomado em seu conjunto. Não poderia, pois, o quantum das astreintes fixado no incidente superar o valor pleiteado na principal. A jurisprudência no mesmo sentido é farta:

"IMPOSSIBILIDADE, CONDENAÇÃO, DEVEDOR, PAGAMENTO, ‘ASTREINTE’, VALOR SUPERIOR, VALOR CONTRATO / HIPÓTESE, DEVEDOR INADIMPLEMENTO, OBRIGAÇÃO PRINCIPAL; CREDOR, FIXAÇÃO, MULTA POR ATO UNILATERAL; DEVEDOR NÃO IMPUGNAÇÃO, VALOR, MULTA / DECORRENCIA, MULTA, MESMA NATUREZA JURÍDICA, CLAUSULA PENAL; OBSERVANCIA, CÓDIGO CIVIL, 1916.

CABIMENTO, RESCISÃO, ACÓRDÃO, TRIBUNA AQUO / HIPÓTESE, DECISÃO JUDICIAL, VIOLAÇÃO, LITERAL DISPOSIÇÃO DE LEI, CODIGO CIVIL, 1916, PREVISÃO, LIMITE MÁXIMO, CLÁUSULA PENAL, EQUIVALÊNCIA, VALOR, OBRIGAÇÃO PRINCIPAL / APLICAÇÃO, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.
(…) RECURSO ESPECIAL. AÇÃO RESCISÓRIA. CLÁUSULA PENAL. LIMITAÇÃO AO VALOR DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL.

_ Ofende o art. 920 do Código Beviláqua a estipulação de cláusula penal que supere o valor da obrigação principal
(…) Com essas considerações, dou provimento ao recurso especial para julgar procedente o pedido e rescindir o acórdão atacado. Em novo julgamento da causa, limito a multa a ser cobrada pela recorrida ao valor dos contratos firmados pelas partes"

"Execução de obrigação de fazer – ‘astreintes’ – Possibilidade de alteração, se verificada a insuficiência ou o excesso da multa – Redução para o valor equivalente ao da obrigação principal – decisão alinhada com a melhor doutrina e com a jurisprudência tradicional – recurso desprovido
(…) Mas, a multa diária atingiu valor expressivo (R$378.000,00) e por isso, o magistrado, por aplicação analógica do artigo 920, do Código Civil, reduziu-a para o valor da obrigação principal".

6. Previsão legal

Com a redação dada ao parágrafo único do art. 645 do CPC, pela lei 8953/94, qualquer dúvida que eventualmente existisse a respeito deste assunto, foi elucidada, pois a lei permite expressamente a modificação para cima ou para baixo do valor das astreintes. Leia-se:

"Art. 645. Na execução de fazer ou não fazer, fundada em título extrajudicial, o juiz, ao despachar a inicial, fixará multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação a data a partir da qual será devida.
Parágrafo único. Se o valor da multa estiver previsto no título, o juiz poderá reduzi-lo, se excessivo".

O legislador, inclusive, inspirou-se na tradicional jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Veja-se, por exemplo, que no Resp 13.416-0-RJ, da relatoria do Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, o tema é estudado e aplicado com base na interpretação dos arts. 287, 644 e 645 do CPC:

"Ação cominatória. Execução. Pena pecuniária. CPC, arts. 287, 644 e 645. Enriquecimento indevido. Limitação. CC, arts. 920 e 924. Hermenêutica. Recurso inacolhido. I – O objetivo buscado pelo legislador, ao prover a pena pecuniária no art. 644 do CPC, foi coagir o devedor a cumprir a obrigação específica. Tal coação, no entanto, sem embargo de equiparar-se a ‘astreintes’ do direito francês, não pode servir de justificativa para o enriquecimento sem causa, que ao direito repugna. II – É da índole do sistema processual que, inviabilizada a execução específica, esta se converterá em execução por quantia certa, respondendo o devedor por perdas e danos, razão pela qual aplicáveis os princípios que norteiam os arts. 920 e 924 do CC. III – A lei, que deve ser entendida em termos hábeis e inteligentes, deve igualmente merecer do julgador interpretação sistemática e fundada na lógica do razoável, pena de prestigiar-se, em alguns casos, o absurdo jurídico".

E, a partir da edição da lei, o judiciário vem corretamente aplicando o preceito:

"Ora, malgrado o inconformismo do agravante, é de se ponderar que, com o advento da lei 8.953/94, que introduziu o parágrafo (único) ao artigo 645, do CPC, está o juiz autorizado a alterar multa imposta, quando verificar que se tornou ela insuficiente ou excessiva"
.
"EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER – Fazenda Pública – Multa cominatória – O art. 644 não excepcionou o Estado de sua incidência – Prerrogativas funcionais devem ser expressamente previstas, diante do princípio da igualdade das partes no processo – O valor da ‘astreinte’, no entanto deve guardar proporcionalidade com a finalidade da pena – Multa reduzida – Agravo parcialmente provido para esse fim".

"AGRAVO DE INSTRUMENTO – Medida cautelar de busca e apreensão de documentos – Execução de Sentença – Cumprimento de decisão judicial já transitada em julgado – Mero efeito secundário e imediato da sentença que prescinde de ajuizamento de nova ação – Razoabilidade das ‘astreintes’, que não devem ultrapassar o valor da obrigação principal – Multa de natureza inibitória – Art. 461, § 4º, do CPC e art. 920 do CC de a 1916 – Art. 412 do novo CC – Inexistência de atos que reportem litigância de má-fé – Alegação afastada – Recurso improvido".

"ADMINISTRATIVO – PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – FGTS – OBRIGAÇÃO DE FAZER – MORA NO CUMPRIMENTO DA DECISÃO – ASTREINTE – POSTERIOR AFASTAMENTO DA MULTA DIÁRIA – REDUÇÃO DO VALOR DA MULTA – ART. 461 §§ 5º, 6º, CPC.
I – Cabível a cominação de ´astreinte’ pela mora injustificável da obrigação que deriva de decisão judicial com fulcro no arts. 461, 461-A e 644, do CPC, e obedece o princípio da proporcionalidade.
II – O valor da multa diária deve ser compatível com a obrigação, sob pena de redução, a teor do art. 461, § 4º, do CPC, e obedece ao princípio da proporcionalidade.
III – A multa diária, instrumento para assegurar a efetividade das decisões do magistrado, se cominada pelo juiz ‘a quo’, deve ser confirmada para a credibilidade deste instituto.
IV – Agravo de Instrumento parcialmente provido".

7. Ação principal sem valor econômico

Anote-se que, mesmo que a ação principal não tenha conteúdo econômico, ainda assim não há motivo para que seja fixada uma multa que possa gerar valores astronômicos. Nesses casos, deverá o magistrado avaliar as circunstâncias concretas do feito e arbitrar o montante que seria razoável que o autor obtivesse se tivesse que ser indenizado. Esse valor arbitrado servirá, então, de parâmetro para a determinação do quantum total do resultado da liquidação das astreintes. Isso decorre, naturalmente, de todos os fundamentos antecedentes e também dos demais que se expõe abaixo.

8. Medida direta do juiz

Além disso, é importante lembrar que, se o juiz puder tomar medida ou determinar ação direta ou indireta que possa substituir a parte-devedora relutante na obrigação de fazer ou não fazer, basta que ele emita a ordem que a questão será eficazmente resolvida. Não há sequer necessidade de fixação de astreintes. É o caso de determinação de retirada de nome dos chamados serviços de proteção ao crédito. Basta a emissão de ofício ao órgão anotador para a obtenção do resultado querido. Assim tem decidido, por exemplo, a 23ª. Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

"Diante do exposto, concedo a liminar pleiteada, para determinar o sobrestamento da execução e a exclusão do nome dos executados recorrentes dos cadastros da Serasa e demais Serviços de Proteção ao Crédito relativos ao feito sub-judice. Para a efetivação desta medida deverá a parte indicar especificamente o órgão anotador com respectivo endereço para que o MM. Juízo "a quo" emita os ofícios correspondentes".

Aliás, a própria lei assim o determina. Com efeito, dispõe o art. 84, §§ 4º e 5º do Código de Defesa do Consumidor:

"Art. 84. Na ação que tenha por objeto obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação e determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao adimplemento.

§ 4º O juiz poderá, na hipótese do § 3º ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito."
§ 5º Para a tutela específica ou para a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz determinar as medidas necessárias, tais como busca e apreensão, remoção de coisas e pessoas, impedimento de atividade nociva, além de requisição de força policial."

Note-se, pois, que a lei 8078/90 autoriza expressamente que o magistrado substitua a parte, sempre que possível, para tornar mais célere e eficaz o decisum (§5º do art. 84 acima). As hipóteses legais não são exaustivas, mas meros exemplos das medidas que o juiz pode tomar. Ele decidirá o caso "tomando as medidas necessárias", vale dizer, encontrando os meios pelos quais a determinação judicial tornar-se-á eficaz.

O art. 461 do Código de Processo Civil, seguindo o Código de Defesa do Consumidor, teve a redação modificada para dar o mesmo sentido à norma:

"Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado pratico equivalente ao do adimplemento.

§ 4º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito.
§ 5º Para efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício, ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas ou coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial".

Assim, repita-se, podendo a obrigação de fazer ou não fazer ser satisfeita sem a participação da parte devedora e omissa, deve o juiz executá-la diretamente. Não há que fixar astreintes.

A rigor, a fixação da multa cominatória só tem sentido quando o magistrado não pode tomar a medida diretamente e/ou quando o próprio credor também não (com ou sem o auxílio ou autorização do juiz) ou, ainda, quando um terceiro não possa fazê-lo. Numa ação para busca e apreensão de menor, por exemplo, não tem cabimento que o juiz fixe multa para sua não entrega. Ele simplesmente determinará que o Oficial de Justiça (com o auxílio de força policial, se necessário) recolha a criança e entregue a quem de direito. O mesmo se dá quando, por exemplo, o juiz determina a reintegração de posse num imóvel que foi bloqueado por um cadeado. Ora, basta mandar quebrar o cadeado e permitir a entrada no imóvel. Fixar astreintes em casos que tais não atende aos objetivos das normas vigentes.

A questão é, portanto, de básica lógica jurídica: se o juiz pode substituir a parte recalcitrante, deve faze-lo.

9. Modificação das astreintes não viola a coisa julgada

Anote-se, também, que não há que se falar em coisa julgada, pois o suposto crédito advindo de astreintes não integra propriamente a lide, com o reforço de que a lei, como acima exposto, permite expressamente a modificação do quantum.

A doutrina e a jurisprudência nesse ponto, também, não têm dúvida:

"Essa modificabilidade não ofende a coisa julgada, porque a multa, na espécie, não é compensatória e, portanto, não integra a obrigação exeqüenda propriamente dita. Trata-se de medida de coação, simples ato do processo de execução, como a busca e apreensão, a penhora e outros meios coercitivos que dispõe o credor"

"…o valor executado não pode ser tido como líquido, haja vista a não fixação pelo juízo ‘a quo’ de termo inicial e/ou final para a incidência da multa pecuniária, de modo que tal se quedou ilimitada, o que se mostra abusivo, já que o valor até agora atingido ultrapassa em muito o valor pleiteado fixado a título de indenização em sentença, ou seja, o valor executado atinge a monta de R$714.000,00(Setecentos e quatorze mil reais), enquanto que o valor da indenização é de apenas R$25.000,00(vinte e cinco mil reais).

A multa pecuniária, por ter cunho eminentemente coercitivo, não pode ter valor indeterminado e ilimitado, aumentando vertiginosamente a cada dia. Ainda que não tenha o réu, ora agravado, não cumprido o quanto expressamente determinado pela decisão que deferiu a tutela antecipada pleiteada pelo autor, isso não indica que a sua punição por tal desobediência não tenha limites.

Ademais, as artigos 287 e 461, §4º, do Código de Processo Civil, combinados, prevêem que a multa fixada para o fim de garantir o cumprimento da tutela antecipada concedida deve ser suficiente e compatível com a obrigação principal. No caso em tela, contudo, o valor da multa é infinitamente superior ao valor da obrigação principal, o que não é, portanto, admitido pelo ordenamento jurídico pátrio"

"EMBARGOS À EXECUÇÃO. ‘ASTREINTES’. REVISÃO DA MULTA ORIGINÁRIA DE EXECUÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. POSSIBILIDADE. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 461, §6º, 644, 645 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. OFENSA À COISA JULGADA. NÃO CONFIGURADA. SUCUMBÊNCIA. Verificando-se que o valor a ser pago a título de multa é significativamente superior àquela resultante da condenação na lide principal, ou que o recebimento da mesma poderá implicar no enriquecimento da embargada, o juiz poderá reduzi-la. Incidência dos arts. 461, §6º, 644, 645 Do Código De Processo Civil. Ainda que o valor da multa seja reduzido pelo juízo em face de sua excessividade, o executado pode responder pela totalidade do ônus sucumbencial, vez que foi ele quem deu causa à execução. Aplicação do princípio da causalidade. Por outro lado, tal redução não implica em ofensa à coisa julgada, porquanto o crédito resultante das astreintes não integra a lide propriamente dita, não podendo ser enquadrada, destarte, como questões já decididas relativas a mesma lide, de que trata o art. 461 do CPC. RECURSO DA EMBARGADA PARCIALMENTE PROVIDO. IMPROVIDO O DA EMBARGANTE".

10. O que acontece se a ação é julgada improcedente ou extinta sem julgamento do mérito

Outro ponto relevante a ser avaliado no tema, é o do que acontece com o quantum das astreintes quando o devedor não cumpre a determinação judicial, mas sai vitorioso na demanda. Isto é, qual o fim das astreintes quando a ação é julgada contra o credor?

Parece-nos evidente que não há que esse falar em liquidação da multa cominatória, eis que a mesma é apenas uma peça acessória do feito principal. De todo modo, é importante justificarmos essa posição.

Candido Dinamarco tem esse mesmo entendimento. No caso de fixação da multa cominatória em antecipação de tutela, diz ele: "enquanto houver incertezas quanto à palavra final do Poder Judiciário sobre a obrigação principal, a própria antecipação poderá ser revogada, com ela, as ‘astreintes’". Ou, em outros termos, e corroborando com o que expõe o Professor Dinamarco, como a multa é fixada para garantir o cumprimento da liminar, enquanto não decidida definitivamente a ação principal em que se a confirme, ela não pode ser exigida.

Dinamarco sustenta com razão que, por exemplo, ao se fixar a multa cominatória na sentença, não seria legítimo cobrá-la do devedor, se ele, podendo recorrer contra sua fixação, o faz, no que tem a possibilidade de vencer a demanda. Por isso que, "o valor das multas periódicas acumuladas ao longo do tempo só é exigível a partir do trânsito em julgado do preceito mandamental".

E, realmente, aqueles que defendem a execução das astreintes, independentemente do resultado da demanda, ingressam na seara psicológica que acima demonstramos ser injustificável. Com efeito, não há fundamento para tanto. A função da multa cominatória, como exposto, é a de forçar o devedor a cumprir obrigação de fazer ou não fazer. Todavia, até certo momento (o do trânsito em julgado da sentença na ação principal) não se poderá afirmar que havia mesmo essa obrigação. Digamos que se trate, pode exemplo, de determinação para que um comerciante faça a retirada do nome do autor da ação de um cadastro de inadimplentes, sob pena de pagamento de multa diária, fundada no argumento de que esse autor quitara a dívida. Suponha-se que o comerciante não cumpra a determinação e, depois de alguns meses, a ação principal seja julgada improcedente porque o Juiz verificou que ele continuava devendo. Como é que o autor poderia executar a multa? Qual o sentido?

Se ele não tinha nenhum direito desde o início, não há que se falar em qualquer execução de astreintes pelo descumprimento de obrigação inexistente. Aliás, poderia se dar de se reconhecer que, inclusive, o autor da demanda estivesse da má fé. Ele, então, sairia vencido na demanda, seria condenado como litigante de má fé, mas receberia polpuda importância advinda da multa cominatória gerada pela obrigação não cumprida? É um non sense: seria como o Juiz condenar e, simultaneamente, absolver um réu. Ou, num outro exemplo: suponha-se que um cidadão é acusado de ter cometido um crime e, indiciado e feito o pedido de prisão provisória, o mesmo é deferido pelo Juiz. Mas, o réu se oculta e permanece foragido. Suponha-se que, posteriormente, é descoberto que o verdadeiro criminoso é outro indivíduo, sendo arquivado o processo em relação ao foragido. Teria sentido puni-lo porque durante o trâmite do feito ele esteve foragido? Como, se ele nada devia? Ora, ele fugiu exatamente porque, nada devendo, não quis passar as agruras da prisão. Os exemplos podem se multiplicar, mas o relevante mesmo é o fato de que não se pode falar em condenar judicialmente alguém pelo descumprimento de uma obrigação que ele jamais teve.

Poder-se-ia, argumentar, é verdade que se o quantum devido pelo descumprimento da obrigação pertencesse ao estado, então, nesse caso, seu valor seria sempre devido. Pensamos, que nem assim. É importante realçar um aspecto já tratado: a Justiça não fica diminuída em sua dignidade, porque em certo momento alguém não cumpre uma determinação do juiz, como também não fica diminuída se esse mesmo juiz (ou pela via de recurso o juízo ad quem) modifique a decisão, revogando a obrigação. É algo juridicamente possível, justo e plenamente de acordo com o sistema processual vigente no país. Pronunciamentos provisórios são, como o próprio nome indica, provisórios e não perdem o caráter de justeza apenas porque foram modificados. O que existe no momento da mudança é apenas um outro tempo processual: o tempo em que, após a colheita de provas e ouvida dos envolvidos ou reexame por outro juízo, se chega à conclusão diversa da anterior. Aliás, algo absolutamente possível em praticamente todo o sistema processual ocidental.

Resta, por fim, analisar o que acontece na hipótese da ação principal ser extinta sem julgamento do mérito. E, naturalmente, nesse caso, o destino será o mesmo daquela ação julgada improcedente. Não há que se falar em pagamento de multa pelo descumprimento da obrigação porque esta não existe mais. Desapareceu junto da ação principal.

 


 

 REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Rizzatto Nunes:  Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela PUC/SP, Livre-Docente em Direito do Consumidor pela PUC/SP; Titular de Direito do Consumidor da Unimes/Santos; Coordenador dos Programas de Mestrado e Doutorado em Direito da Unimes/Santos; Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.

 

Você está com o nome “sujo” na praça? Foi protestado? Negativado? Passou cheque sem fundo? Saiba como limpar seu nome.

0

ORIENTAÇÃO:  * Rizzatto Nunes – Os chamados serviços de proteção ao crédito foram transformados em entidades de caráter público, por disposição do Código de Defesa do Consumidor. O CDC, assim, passou a regular as anotações feitas nesses cadastros, quer seja advinda de relação jurídica de consumo, como a simples compra e venda de um produto numa loja, quer nasça de uma relação privada, como a decorrente de transação feita entre comerciantes.

As anotações, pois, de um lado, tornaram-se legítimas por força de lei, mas de outro devem seguir à risca os limites e requisitos impostos. Veja abaixo como funcionam os registros e como cancelar anotações.

A negativação nos SPCs e na Serasa

Os chamados serviços de proteção ao crédito (por exemplo, os SPCs e a Serasa) são, como o nome diz, serviços oferecidos no mercado para informarem quem são os pessoas inadimplentes, isto é os devedores. Eles funcionam como banco de dados negativos: a pessoa que tem lá lançado seu nome fica “negativada”, ou seja, a anotação aponta que alguma dívida não foi paga. São registrados os nomes de pessoas físicas e jurídicas (empresas).

Cartório de Protestos

A pessoa também fica negativada quando é protestada pelo não pagamento de um título de crédito (nota promissória, duplicata, cheque etc), ficando seu nome anotado no Cartório de Protestos.

CCF-Cadastro de Cheques sem fundos

Acontece o mesmo quando a pessoa tem um cheque devolvido duas vezes por falta de fundos, ficando anotada no CCF-Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundo.

Pessoa marcada negativamente

Essas anotações deixam a pessoa “suja no mercado”, como vulgarmente se diz. Por isso, é importante evitar a todo custo que seu nome seja anotado em algum desses cadastros, pois quando isso ocorre fica bastante difícil obter crédito, impedindo que você compre para pagamento à prazo. Veja, na seqüência, o que fazer para limpar seu nome.

Veja o que fazer para limpar seu nome em cada caso

• Cadastro de Cheques sem Fundo – CCF

– Para ter sido incluído o cheque deve ter sido devolvido sem fundos por duas vezes;

– Você deve, normalmente, saber qual é esse cheque, pois tem os dados de quem o recebeu (atenção: sempre que passar um cheque anote o nome e telefone da pessoa que o recebeu, além, claro, do valor e da data de emissão);

– Caso você não tenha anotado os dados, dirija-se ao Banco que fez a inclusão no CCF e peça o número, o valor e data de emissão e da apresentação pelas duas vezes, além dos dados do portador que o apresentou ao banco;

– Procure o portador para quitar o débito, exigindo o cheque original de volta;

– Se o portador destruiu ou perdeu o cheque, peça que ele emita uma declaração, com assinatura (firma) reconhecida em cartório de que o cheque foi pago e que ele nada mais tem a reclamar;

– De posse do cheque ou da declaração, prepare uma carta com os dados indicados pelo gerente de sua conta (ou preencha o formulário que ele entregar);

– Tire cópia do cheque que irá devolver ao banco ou da declaração e guarde;

– Junte o original à carta ou ao formulário e entregue ao Banco, pagando a taxa de devolução do cheque e peça cópia protocolada da carta ou formulário (o próprio banco se encarregará de enviar o pedido com o cheque para liberação ao Banco do Brasil, que é o encarregado de atualizar os dados do CCF);

– Peça protocolo (recibo de entrega) da carta ou formulário ao gerente.

 Título protestado

– Obtenha, no Cartório em que foi protestado, uma certidão com os dados do título e da pessoa que o levou a protesto;

– Entre em contato com essa pessoa, quite a dívida e exija dela uma carta indicando que a dívida foi paga. Nessa carta devem constar todos os dados do título e do protesto, conforme consta da certidão. Por exemplo, tipo de título (nota promissória, duplicata, cheque etc.), data da emissão, valor, data do protesto, n.º do Cartório de Protesto (quando na cidade existir mais de um), nome do apresentante etc.

– Essa carta deve ter firma reconhecida da pessoa que a assinou;

– Tire cópia da carta já com firma reconhecida e guarde;

– Volte ao Cartório de Protestos, apresente a carta e peça o cancelamento da anotação;

– Peça nova certidão que aponte que seu nome está limpo e guarde.



·    SPCs e Serasa

Esses prestadores de serviços, que são públicos por força de Lei como dito, arquivam informações negativas fornecidas por comerciantes e instituições financeiras.

Como eu disse acima, são feitos registros de dívidas vencidas, mesmo que você não tenha sido protestado ou cobrado judicialmente.

Tecnicamente, sempre que você quitar uma dívida, os credores que anteriormente tinham indicado seu nome, devem informar tais serviços para que seu nome seja retirado do cadastro. Se isso não for feito, procure imediatamente um órgão de proteção ao consumidor ou um advogado de confiança.

Todavia, para evitar maiores dissabores, sempre que você quitar uma dívida, exija a retirada de seu nome e, no caso de cancelamento do protesto de título, para garantir que seu nome seja limpo, tire cópia autenticada da certidão negativa do respectivo Cartório de Protesto e protocole pedido junto ao serviço de proteção ao crédito, exigindo o cancelamento da anotação. Caso não consiga o resultado adequado, procure um órgão de defesa do consumidor ou um advogado de confiança.



– Os acordos

Saiba que, quem estiver negativado e renegociar a dívida com o credor, pode exigir a retirada da anotação, pois passa à condição de pagador pontual.
Assim, sempre que você fizer um acordo para composição de dívida, exija a retirada de seu nome dos cadastros.

Após firmar o termo de composição amigável ou novo contrato, aguarde dez dias e, após, certifique-se que seu nome esteja livre daquela anotação. Se não estiver, procure um órgão de defesa do consumidor ou advogado de confiança.

 

Rizzatto Nunes:  Mestre e Doutor em Filosofia do Direito pela PUC/SP, Livre-Docente em Direito do Consumidor pela PUC/SP; Titular de Direito do Consumidor da Unimes/Santos; Coordenador dos Programas de Mestrado e Doutorado em Direito da Unimes/Santos; Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Jovem poderá acrescentar sobrenome de seus pais de criação

0

DECISÃO:  * STJ – Por ter atingido a maioridade civil – 18 anos, a jovem N.B.F. poderá acrescentar ao seu os sobrenomes de seus pais de criação. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que, por unanimidade, acompanhou o voto do relator no recurso especial, ministro Castro Filho, por entender que a inclusão não prejudica os sobrenomes da família que constam em seu registro civil.

A jovem, por ter vivido desde a infância em companhia do casal L.V.L.G. e D.M.C.G., considera-os seus verdadeiros pais. Por isso, ela desejava prestar-lhes essa homenagem, passando a assinar N.B.F.C.G.

Em primeira instância, teve seu pedido julgado improcedente. Ela então apelou ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ/RJ), que negou provimento ao recurso por considerar que o acréscimo dos sobrenomes prejudicaria os de família, ainda que estes não fossem suprimidos.

Inconformada, a jovem interpôs recurso especial com fundamento na alínea “a” do permissivo constitucional, alegando violação do artigo 56 da Lei n. 6.015/73, que impõe uma única condição para a alteração do nome: que não sejam prejudicados os apelidos de família. O recurso foi inadmitido na origem, porém os autos subiram ao STJ por força do provimento dado ao agravo de instrumento.

No entendimento unânime da Terceira Turma do STJ, a simples incorporação do sobrenome não altera o nome da família. Portanto, ao incluir e não suprimir, não é causado prejuízo aos apelidos da família, o que atende aos requisitos expostos no artigo 56 da lei que dispõe sobre os registros públicos.

 

FONTE:  STJ, 03 de setembro de 2007.

 


União estável não depende da convivência sob mesmo teto

0

 

DECISÃO: * TJ-MT – A comprovação de união estável não depende da convivência do casal sob o mesmo teto, nem é preciso ter mais de cinco anos de convívio para caracterizar o fato. Esse é o entendimento do juiz Irênio Lima Fernandes, titular da 5ª Vara Especializada da Família e Sucessões, que analisa diariamente pedidos de reconhecimento de união estável em seu gabinete.  

“O fato de viver em casas separadas, por si só, não descaracteriza a união estável. Eu mesmo já deferi um caso em que os conviventes moravam na mesma cidade, mas em casas diferentes. A jurisprudência admite a união stável mesmo nessa condição”, assinala.  

 O juiz esclarece ainda outra dúvida comum entre casais que convivem em união estável: a lei não impõe tempo para essa questão. Segundo o magistrado, a primeira lei que tratou da união estável, a nº. 8.791/1994, exigia o tempo mínimo de cinco anos. “Posteriormente, a Lei nº. 9.278/1996 acabou com esse tempo mínimo de convivência para que a união estável pudesse ser caracterizada”, observa o juiz Irênio Fernandes. 

De acordo com ele, o que configura união estável é a convivência pública, contínua e duradoura, com objetivo de constituir família. Ou seja, a notoriedade e a publicidade do relacionamento, somadas aos fatos de os companheiros não terem outro relacionamento e de se assistirem financeiramente mutuamente, já são indicativos suficientes para que um dos dois tenha direito à herança dos bens deixados pelo companheiro ou companheira. Em síntese, independente de residir sob o mesmo teto, “se você vive como se fosse casado, declara a outra pessoa como dependente no Imposto de Renda e no trabalho, por exemplo, já fica caracteriza a união estável”, exemplifica o juiz.   

A união estável foi reconhecida pela Constituição Federal de 1988, artigo 226, parágrafo 3º, que dispõe que para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento’. Ou seja, reconhecida essa nova forma de entidade familiar, os conviventes têm direito à pensão alimentícia, à herança e à partilha de bens adquiridos durante o relacionamento.  

O juiz Irênio Fernandes diz ainda que o novo Código Civil, em vigor desde janeiro de 2003, veio disciplinar a união estável nos artigos 1.723 a 1.727. Para ele, no caso da sucessão, o novo código civil representa um retrocesso em relação às duas leis anteriores, no que diz respeito aos direitos do companheiro ou companheira. Conforme a nova lei, o companheiro ou companheira é herdeiro dos bens adquiridos a título oneroso na vigência da união. “Ou seja, se o companheiro (a) concorrer com filhos comuns, terá uma cota equivalente à atribuída ao filho. Se concorrer com descentes só do autor da herança, terá metade do que couber a cada um deles. Se concorrer com outros parentes sucessíveis, como irmãos e pais, terá direito a um terço da herança. Somente se não houver outros parentes sucessíveis, ele (a) terá a totalidade da herança”, explica o magistrado.  

Ele esclarece que a nova lei representa retrocesso porque a lei nº. 8.791/1994 excluía os parentes colaterais (irmãos) em relação aos bens adquiridos na constância do casamento a título oneroso. Na lei anterior, ela não era herdeira, mas tinha 50% dos bens, mesmo os adquiridos antes da união. Se não tivesse ascendentes e descendentes, ficava com toda a herança”, explica o magistrado.  

Na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, o regime de comunhão parcial de bens se aplicará às relação patrimoniais. Ou seja, será dividido entre as partes tudo que for adquirido durante a convivência em nome de um ou de outro a título oneroso, como, por exemplo, um carro comprado durante o relacionamento.   

Contrato de Namoro – Para evitar que uma eventual ruptura no namoro se transforme numa disputa judicial por dinheiro, o juiz orienta o casal, caso julgue necessário, a firmar um contrato escrito que regule a relação patrimonial existente. “O casal deve procurar um cartório de registro civil e pode levar testemunhas. A lei não estabelece uma forma para fazer isso, mas o casal deve estabelecer o regime que quer e a forma da relação patrimonial”, explica. Conforme o juiz Irênio Fernandes, o artigo 1725 do Código Civil permite esse tipo de contrato, popularmente conhecido como “contrato de namoro” ou “contrato de convivência”. 

Na separação, o juiz Irênio Fernandes explica que o casal pode procurar um cartório e estabelecer as condições da separação, caso não tenham filhos. Se tiverem filhos menores de idade, devem procurar um advogado especialista em direito de família para mover ação de reconhecimento e dissolução instável. “Isso é muito comum”, relata o magistrado.


 

FONTE:  TJ-MT, 31 de agosto de 2007.

Prescrição Acidentária. Indenização reparatória não pode ser entendida como crédito trabalhista (versão atualizada e ampliada)

0

* Luiz Salvador

A doutrina e a jurisprudência têm entendimentos divergentes a respeito de qual seja a prescrição aplicável às ações de reparação por danos materiais e morais acidentários, agora de competência para julgar pela Justiça do Trabalho, por força da EC 45.

Para os defensores da primeira corrente, a prescrição aplicável é a dos créditos trabalhistas previstas no art. 7º, inciso XXIX, que dispõe: “ação, quanto a créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho”.

Para os da segunda corrente, na qual nos incluímos, a prescrição não pode ser a trabalhista, posto que de crédito trabalhista stricto sensu não se trata.

A Indenização reparatória por danos morais e materiais não pode ser entendida como crédito trabalhista, ainda que julgada pela Justiça do Trabalho, por força da ampliação de competência trazida pela EC 45.

Créditos trabalhistas são assegurados ao trabalhador que vende sua força de trabalho, segundo contrato laboral estabelecido entre as partes, dentro de uma jornada máxima de trabalho não superior a oito horas diárias, 44 mensais (CF, art. 7º, inciso, XIII da CF), podendo ser inferior, prevista em lei, a exemplo dos bancários (art. 226 da CLT) e ou pactuada diretamente com o empregador e ou estabelecida em negociação coletiva.

Os créditos trabalhistas stricto sensu são, pois, os que remuneram a prestação laboral contratada, não sendo admissível o entendimento de também tratar-se de crédito trabalhista os oriundos de uma reparação decorrente de um direito ao ressarcimento de um dever de indenizar o prejudicado e à extensão do dano, tais como o previsto no art. 186 do Código Civil, em que o infortúnio tenha ocorrido por culpa do empregador que não investiu em prevenção, descumprindo-se a legislação infortunística vigente.

Todos os cidadãos têm direito à busca de melhores condições de vida, de trabalho, de salário e no caso de ser ceifados dessa expectativa de ascensão social têm direito à reparação e à extensão do dano, indenização reparatória esta que não pode ser confundida como crédito trabalhista.

Em assim sendo, estamos com a conclusão sintética do brilhante procurador de Campinas, Dr. Raimundo Simão de Mello, que com propriedade sintetiza: nem de crédito se trata, quanto mais de crédito trabalhista” (Prescrição do dano moral no Direito do Trabalho: um novo enfoque, site Jus Navegandi, link: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=6867).
André Araújo Molina, juiz do Trabalho em Mato Grosso (23ª Região), também integrante da segunda corrente, disponibiliza aos operadores e aplicadores do direito e à sociedade de modo geral excelente e aprofundado artigo publicado no site Jus Navegandi “A Prescrição das Ações de Responsabilidade Civil na Justiça do Trabalho” com conclusões ponderáveis, claras, objetivas, elucidadoras no sentido de estarem com a razão os seguidores da segunda corrente, não sendo a prescrição trabalhista a aplicável, posto que de crédito trabalhista stricto sensu não se trata.
Link: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9698

A doutrina de Raimundo Simão de Mello orienta-se no sentido do entendimento de se tratar de direitos fundamentais imprescritíveis e ou quando não de se aplicar a prescrição do direito comum regulada pelo art. 205 do CC, já que não se trata de simples reparação de danos, mas de violação de um direito fundamental inerente à pessoa humana e aos direitos de personalidade, com assento constitucional, acima das categorias de direitos civis e ou trabalhistas, “Prescrição nas ações trabalhistas”LTR070, n.10, pg.1171.

A doutrina de JORGE LUIZ SOUTO MAIOR pondera que não se trata de “crédito trabalhista”, já que a própria Constituição especifica o instituto em questão como indenização:

"Sob o ponto de vista de nossa investigação, ademais, relevante notar que a própria Constituição especifica o instituto em questão como indenização e, por óbvio, indenização não é crédito que decorra da relação de trabalho, não se lhe podendo, também por esse motivo, fizer incidir a regra da prescrição trabalhista, prevista na mesma Constituição." (A Prescrição do Direito de Ação para Pleitear Indenização por Dano Moral e Material decorrente de Acidente do Trabalho, publicado no site da Associação dos Magistrados do Trabalho da 10ª Região, fev. de 2006).

Não se tratando de crédito, muito menos o trabalhista, acaso se entenda ser prescritível o direito, não tem este assento nem no disposto no art. 7º, inciso XXIX da CF, nem no art.206, § 3º, inciso V do Código Civil, mas sim no regramento disposto no art.205 do mesmo código civil: “A prescrição ocorre em 10 anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”.

Neste sentido, estamos com a doutrina de RAIMUNDO SIMÃO DE MELLO.

Ao julgar a questão deve ainda o magistrado ater-se ao regramento especial trazido pela legislação previdenciária (Lei de benefícios), 8.213 que em seu art.104 prescreve aplicação da prescrição quinquenária às ações referentes à prestação por acidentes do trabalho, contados do momento em que for reconhecida a incapacidade pela Previdência:

“Art. 104. As ações referentes à prestação por acidente do trabalho prescrevem em 5 (cinco) anos, observado o disposto no art. 103 desta Lei, contados da data: I – do acidente, quando dele resultar a morte ou a incapacidade temporária, verificada esta em perícia médica a cargo da Previdência Social; ou II – em que for reconhecida pela Previdência Social, a incapacidade permanente ou o agravamento das seqüelas do acidente”.

O Superior Tribunal de Justiça de há muito que aplica este entendimento, Súmula nº 278: “O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral”.

A jurisprudência mais progressista têm se posicionado de que a prescrição aplicável à hipótese não é a trabalhista:

“Indenização por Danos Morais – Prescrição – Observada a natureza civil do pedido de reparação por danos morais, pode-se concluir que a indenização deferida a tal título em lide cujo trâmite se deu na Justiça do Trabalho, não constitui crédito trabalhista, mas crédito de natureza civil resultante de ato praticado no curso da relação de trabalho. Assim, ainda que justificada a competência desta Especializada para processar a lide não resulta daí, automaticamente, a incidência da prescrição trabalhista. A circunstância de o fato gerador do crédito de natureza civil ter ocorrido na vigência do contrato de trabalho, e decorrer da prática de ato calunioso ou desonroso praticado por empregador contra trabalhador não transmuda a natureza do direito, uma vez que o dano moral se caracteriza pela projeção de um gravame na esfera da honra e da imagem do indivíduo, transcendendo os limites da condição de trabalhador do ofendido. Dessa forma, aplica-se, na hipótese, o prazo prescricional de 20 anos previsto no artigo 177 do Código Civil, em observância ao art. 2.028 do novo Código Civil Brasileiro, e não o previsto no ordenamento jurídico-trabalhista, consagrado no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal. Embargos conhecidos e providos. (TST – SDI I – ERR 08871/2002-900-02-00.4 – Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa – DJ 5.3.2004).

"PRESCRIÇÃO – DANO MORAL E MATERIAL TRABALHISTA – 1. O prazo de prescrição do direito de ação de reparação por dano moral e material trabalhista é o previsto no Código Civil. 2. À Justiça do Trabalho não se antepõe qualquer obstáculo para que aplique prazos prescricionais diversos dos previstos nas Leis trabalhistas, podendo valer-se das normas do Código Civil e da legislação esparsa. 3. De outro lado, embora o dano moral trabalhista encontre matizes específicos no Direito do Trabalho, a indenização propriamente dita resulta de normas de Direito Civil, ostentando, portanto, natureza de crédito não-trabalhista. 4. Por fim, a prescrição é um instituto de direito material e, portanto, não há como olvidar a inarredável vinculação entre a sede normativa da pretensão de direito material e as normas que regem o respectivo prazo prescricional. 5. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento." (TST – RR 1162/2002-014-03-00.1 – 1ª T. – Red. p/o Ac. Min. João Oreste Dalazen – DJU 11.11.2005).

O Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região analisando esta mesma questão decidiu que a prescrição aplicável em pleito de natureza civil é a do direito comum:

ACIDENTE DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. Pleito de reparação de natureza civil. Aplicação do disposto no art. 206, § 3º, V, e da parte final do art. 2.028, ambos do Novo Código Civil, com permissivo no parágrafo único do art. 8º da CLT. Direito de ação que não se encontra fulminado pela prescrição. Recurso provido” TRT- 4ª Região, RO 00396-2005-831-04-00-0, Relatora Cleusa Regina Halfen, decisão publicada no DJ/RS em 12/02/2007).

CONCLUSÃO.

Também em nosso entender o posicionamento correto quanto à prescrição aplicável nas ações de reparação por dano material e moral decorrente de uma relação trabalhista é a do direito comum e não é a trabalhista, a teor do permissivo autorizado pelo disposto no art. 205 do Novo Código Civil, de importação permitida com base no parágrafo único do art. 8º da CLT.

Não se trata de crédito trabalhista stricto sensu o direito buscado na ação de reparação por danos materiais e morais perante a Justiça do Trabalho, mas, sim, de indenização por violação a direitos fundamentais asseguradores da dignidade da pessoa humana,

Trata-se da garantia de mantença da vida com higidez física e moral. O empregador é devedor de saúde, sendo de sua responsabilidade assegurar ao trabalhador meio ambiente de trabalho equilibrado, livre de riscos ocupacionais e ou acidentários.

A indenização por dano material e moral não se confunde com o direito previdenciário do empregado ao benefício acidentário de encargo da Previdência. A par da obrigação patronal da contribuição obrigatória à constituição do fundo do seguro acidentário (SAT), mantêm-se o dever do empregador aos investimentos suficientes e necessários à prevenção a que os infortúnios laborais previsíveis deixem de acontecer, sendo o texto constitucional claro no sentido de que em caso de culpa pelo infortúnio é devida a reparação por dano material e moral, sem exclusão do direito pelo infortunado ao benefício auxílio-doença acidentário (B-91), de responsabilidade do INSS.

 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Luiz Salvador: Advogado trabalhista em Curitiba, Secretário Geral da ALAL, Representante Brasileiro no Depto. De Saúde do Trabalhador da Jutra, Diretor da ABRAT, da AAT-PR e do Sindicato dos Advogados de SP e membro integrante do corpo técnico do Diap.  Site: www.defesadotrabalhador.com.br.


Inconstitucionalidade do afastamento do Juizado Especial Criminal nas infrações de menor potencial ofensivo nos crimes de Violência Domestica

0

* Flavio Ribeiro da Costa

A Lei 11340/06, conhecida como Maria da Penha, excluiu qualquer chance de aplicabilidade da Lei 9099/95 aos crimes praticados com violência domestica e familiar contra a mulher, independentemente de qualquer pena, conforme se verifica do art. 41 deste diploma.

Assim, visando agravar o rigor dos crimes praticados violentamente contra a mulher, seja a violência física, psicológica, sexual ou moral e matrimonial (art. 7º, I a V da Lei 11340/06), a mens legis foi a de proibir toda e qualquer aplicação da Lei 9099/95 para os crimes praticados contra a mulher, desde que possuam como âmbito normativo e de espaço físico a unidade domestica, o âmbito da família, incluindo aquela decorrente de laços de afinidade e as relações intimas, acentuado a aplicação teoria do Direito Penal Simbólico, sustentada por Günther Jakobs.

Ocorre que, o dispositivo legal em comento com a redação clara do art. 98, I. da CRF/88, vê-se que o legislador constitucional outorgou á lei ordinária o dever de regulamentar o conceito daquilo que resolveu chamar de infração de menor potencial ofensivo, assim dispondo: “[…]Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: 1- juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidades infrações penais de menor potencial ofensivos, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau […]”

Sendo assim, diante da necessidade de concretização do texto constitucional, o legislador ordinário, quando da promulgação da Lei 9099/95, definiu aquilo que poderia adequar-se ao conceito de menor potencial ofensivo, prevendo no seu art. 61 todas as contravenções penais e os crimes cuja pena máxima não fosse superior a um ano, executados os casos legais de previsão para adoção do procedimento especial, sem embargo da modificação posterior do conceito trazida pela redação original art. 2º Parágrafo único da Lei 10259/01, posteriormente alterado pela Lei 11313/01.

Portanto, a infração de menor potencial ofensivo foi e é uma determinação constitucional, além de constituir-se também como um direito e garantia constitucional, do cidadão em face do Estado, razão pela qual não é licito ao legislador infraconstitucional violar a norma constitucional, a qual ocupa o status superior, abolindo-se o conceito de infração de menor potencial ofensivo,quando esse vier a ocorrer nas hipóteses do art. 5º da Lei 11340/06.

Pela interpretação trazida pelo art. 41 da Lei 9099/95, a implementação do Juizado de Violência Domestica ab-rogou o tradicional conceito de infração de menor potencial. Na verdade ele apenas deveria vedar a aplicabilidade dos institutos despenalizadores trazidos pela lei dos Juizados Especiais, tais como a composição dos danos civis, transação, a suspensão, condicional do processo, o que em nada infringiria a Constituição, já que o próprio constituinte originário delegou ao legislador ordinário a prerrogativa de estabelecer quais as hipóteses de incidência ou não dos citados institutos. Vale a pena lembrar da parte final do art. 98, I, Constituição Republicana de 1988: […] infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juizes de primeiro grau […].

De fato, não sendo essa a redação da norma em comento, não há óbice á aplicação do Principio da Interpretação Conforme a Constituição,a qual visa buscar a interpretação que não contra-venha o texto constitucional.

Dissertando sobre o Principio, entendemos que o conceito dado pela lei em comento sugere a necessidade de buscar uma interpretação que não seja a que decorre da leitura mais obvia do dispositivo, mas a que tenha por finalidade excluir a interpretação ou as interpretações que contravenham a Constituição.

Em linhas gerais, é possível decompor didaticamente o processo de interpretação da norma legal que a mantenha em harmonia com a Constituição, em meio a outra ou outras possibilidades interpretativas que o preceito admitia. Tal interpretação busca encontrar um sentido possível para a norma, que não é o que mais evidente resulta da leitura de seu texto.

A eleição de uma linha de interpretação procede-se á exclusão expressa de outra ou outras interpretações possíveis, que conduziriam a resultado contrastante com a Constituição.

Logo, somente com a utilização da interpretação conforme a constituição, meio de interpretação e de decisão constitucional, será possível a salvação da norma, postulando-se a negativa de aplicação do art. 33 e a interpretação conforme do art 41 da Lei 11340/06 efetivando-se assim o controle difuso de constitucionalidade, incidente em qualquer causa e juízo, ante o evidente equivoco do legislador federal.

Bibliografia

Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Saraiva, 1989.

O Princípio da Proporcionalidade no Direito Penal, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003.

Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª. Ed.

Prado, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 2ª edição. RT: 2.000.

Valores Constitucionais e Direito Penal, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1989.

Juizados Especiais Criminais, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2ª. ed.

 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Flavio Ribeiro da Costa: Advogado Publicísta. Especialista em Direito Penal e Processual pela UNIRP. Pós-graduando em Direito Público Universidade Federal de Uberlândia. Frutal-MG.


Dano Moral pela inclusão indevida no SERASA (Indústria do Dano Moral ou Falha na Prestação dos Serviços?)

0

  * Nehemias Domingos de Melo

Sumário: I – Os bancos e o Código de Defesa do Consumidor. II – Abuso ou exercício regular de um direito. III – Dos fundamentos da reparação do dano moral. IV – A indenização por dano moral. V. – Da prova do dano moral. VI – Da inclusão enquanto se discute a dívida.  VII – Do dever de informar da abertura de cadastro. VIII – Indústria do dano moral(?).  IX – Conclusão. X – Referências bibliográficas.

 

I. – OS BANCOS E O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR

Advirta-se desde logo, que a responsabilidade dos bancos e instituições financeiras é objetiva, a teor do que dispõe o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 14, verbis: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. No mesmo artigo, em seu parágrafo primeiro, o legislador esclarece o que seja serviço defeituoso, nos seguintes termos: “§ 1º. O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I – o modo de seu fornecimento; II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III – a época em que foi fornecido”.

Muito embora ainda se discuta sobre a aplicabilidade, ou não, do Código de Defesa do Consumidor no âmbito das relações bancárias, somos daqueles que entendem que tal discussão é estéril na exata medida em que a lei consumerista consignou, de forma clara e expressa, que “serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista” (art. 3°, § 2°). Grifamos a parte que fala expressamente dos serviços de natureza bancária, financeira e de crédito para chamar a atenção para fato expresso em lei que, apesar disso, tem suscitado acalorada discussão acerca da aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações bancárias e financeiras.

Ademais, ainda que a lei não fosse expressa, os bancos são, a toda evidência, prestadores de serviços e, como tal, sujeito às normas insculpidas no Código de Defesa do Consumidor porquanto, quando da elaboração da norma, a opção legislativa revelou a preocupação de não deixar brechas que pudesse comportar uma interpretação divergente que pudesse, por vias transversas, excluir do conceito geral de prestadores de serviços, as atividades de massas, especialmente as bancárias.[1]

Em verdade o que se pode discutir é se a parte que contrata com o banco se enquadra no conceito de consumidor ou não, porquanto os bancos enquanto prestadores de serviços são fornecedores e, a teor que dispõe a lei consumerista, respondendo objetivamente pelos danos que vierem a causar aos seus clientes/consumidores por defeito na prestação dos serviços (Lei n° 8.078/90, art. 3°, § 2° c/c art. 14).

Importante tecer estas considerações iniciais porque o fato da demanda contra bancos ser enquadrada dentre aquelas que devem ser regidas pela lei consumerista cria, para o consumidor algumas vantagens. Não se olvide de que a aprovação da Lei n° 8.078/90 provocou uma verdadeira revolução nas concepções vigentes no direito pátrio, notadamente no que diz respeito à responsabilidade civil e as regras processuais, impondo alguns postulados que visam facilitar o efetivo exercício dos direitos do consumidor, e dentre estes, pela importância, destacamos os seguintes: a) o principio da boa-fé objetiva, pelo qual se exige das partes que procedam segundo um mínimo lealdade e padrão ético e em estrito respeito às leis (art. 4°, III), decorrendo deste princípios outros deveres anexos tais como: o dever de informação, de lealdade, de cooperação mútua e de assistência técnica; b) a possibilidade de cumulação do dano moral com o dano patrimonial, de forma efetiva, isto é, integral e sem tarifação, com vista a efetiva prevenção e reparação de danos individuais ou coletivos (art. 6°, VI);  c) a inversão do ônus da prova, como forma de facilitação da defesa do consumidor em juízo (art. 6°, VIII); d) a responsabilidade objetiva do fornecedor em face da prestação de serviços defeituosos, tanto com relação ao consumidor, o utende ou qualquer outra pessoa eventualmente atingida pelo evento danoso (art. 14  e art. 17 c/c art. 6°, VI); e) a responsabilidade solidária do fornecedor por seus prepostos ou representantes autônomos, em face da teoria da aparência (art. 34); f) a obrigatoriedade dos bancos de dados de cadastros de consumidores (tipo Serasa e SPC), de informar ao consumidor sobre abertura de fichas e cadastros e de suas fontes de informação (art. 43); g) a interpretação das cláusulas contratuais sempre de forma mais favorável ao consumidor (art. 47); h) a expressa previsão de nulidade no que diz respeito às cláusulas consideradas abusivas (art. 51 e incisos); i) a facilitação da defesa do consumidor com o estabelecimento de foro privilegiado, em se tratando de ação por responsabilidade civil, visto que a demanda poderá ser proposta no foro do seu domicílio (art. 101, I).[2]

II. – ABUSO OU EXERCÍCIO REGULAR DE UM DIREITO.

As situações nos dias atuais que mais se assemelham ao abuso de direito, são aquelas derivadas da relação de consumo de crédito que, por falhas as mais diversas, acabam por implicar em protestos indevidos bem como pelas inclusões irregulares dos nomes dos “maus pagadores” nos registros dos bancos de dados, especialmente a SERASA.

Evidentemente que, no exercício regular de seus direitos, as empresas credoras podem e devem negativar o nome de seus clientes inadimplentes, seja pela via do protesto de títulos, seja pela inclusão no sistema de registros de proteção ao crédito. Tanto é assim que o próprio Código de Defesa do Consumidor reconheceu como tendo caráter público as entidades de proteção ao crédito e congêneres, conforme expressamente previsto no art. 43, § 4°, da Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990.

Neste particular aspecto, analisando o referido dispositivo legal, Rui Stocco afirma “inexistir proibição a que essas empresas ou entidades procedam ao registro, ainda que negativo, de atos e fatos da vida comercial da pessoa”. Mais adiante conclui o magistrado paulista que “por se constituir atividade de caráter público, passa a ter interesse social de modo que impõe-se regramento específico e protetivo do consumidor correto e pontual”.[3]

É aí que reside o nó da questão. Efetivamente, os credores podem fazer uso dos sistemas de proteção ao crédito para ali registrarem o nome dos maus pagadores. Esse é um direito líquido e certo. Contudo, muitas vezes acontece que, por desorganização ou displicência ou ainda pela complexidade e impessoalidade das relações negociais das grandes empresas, procede-se à inscrição irregular de clientes naqueles cadastros ou, leva-se a protesto títulos que não deveriam ser protestados. Nestes casos, excede-se o limite do exercício regular de um direito para adentrar-se no campo do ilícito que autoriza pleitear indenização por dano moral.

III. – DOS FUNDAMENTOS DA REPARAÇÃO DO DANO MORAL

Como ensina o mestre Caio Mário da Silva Pereira, “o fundamento da reparabilidade pelo dano moral está em que, a par do patrimônio em sentido técnico, o indivíduo é titular de direitos integrantes de sua personalidade, não podendo conformar-se a ordem jurídica em que sejam impunemente atingidos”.[4]

Ademais, não se pode descurar do caráter penal que a condenação por dano moral deve conter. Além do caráter compensatório é certo que “quem exige uma reparação do dano moral sofrido não visa tanto a recomposição do seu equilíbrio de afeição ou sentimento, impossível de conseguir, como infligir, por um sentimento de represália inato, ao seu ofensor, uma punição, por precária que seja, que, na maior das vezes não encontra outro parâmetro senão em termos pecuniários”.[5]

Nesta linha de raciocínio, o professor e magistrado José Luiz Gavião de Almeida afirma de maneira categórica que “a reparação dos danos morais não busca reconduzir as partes à situação anterior ao dano, meta impossível. A sentença visa a deixar claro que a honra, o bom nome e a reputação da vítima restaram lesionados pela atitude inconseqüente do causador do dano. Busca resgatar o bom conceito de que se valia o ofendido no seio da sociedade. O que interessa, de fato, é que a sentença venha declarar a idoneidade do lesado; proporcionar um reconforto à vítima, e, ainda, punir aquele que agiu, negligentemente, expondo o lesado a toda sorte de dissabores”.[6]

Ainda nesse sentido defende Martinho Garcez Neto que a função penal, da condenação por dano moral, pode e deve ser encarada como algo altamente moralizador, na medida em que, atingindo o patrimônio do agressor com a sua conseqüente diminuição, estaria, frente à luz da moral e da equidade, cumprindo a mais elementar noção de justiça: estar-se-ia punindo o ofensor para que o bem moral seja respeitado e, mais importante, fazendo calar o sentimento de vingança do ofendido, sentimento este inato em qualquer pessoa, por mais moderno e civilizado que possa ser.[7]

É preciso recordar que a dignidade humana foi elevada a um dos fundamentos básicos do Estado brasileiro. Veja-se que na Constituição Federal de 1988 o legislador constituinte fez insculpir, já no artigo primeiro, dentre os fundamentos sobre os quais se assenta o Estado Democrático de Direito, a dignidade humana.[8] Desta forma, conforme preleciona Sérgio Cavalieri Filho “temos hoje o que pode ser chamado de direito subjetivo constitucional à dignidade”,[9] com reflexos inevitáveis na conceituação de dano moral, na exata medida em que, os valores que compõem à dignidade humana são exatamente aqueles que dizem respeito aos valores íntimos da pessoa, tais como o direito à intimidade, à privacidade, à honra, ao bom nome e outros inerentes à dignidade humana que, em sendo violados, hão de ser reparados pela via da indenização por danos morais.

De nossa parte, temos certeza que se fosse dada oportunidade de escolha aos lesados, seguramente eles desejariam que não tivesse ocorrido a lesão. Contudo, como independentemente da vontade das pessoas agressões ocorrem, temos que o sentimento de justiça presente em cada cidadão faz surgir a necessidade de “uma vez verificada a existência do dano, e sendo alguém responsável pela lesão de direito ocorrida, há que se buscar uma solução para o evento danoso” de tal forma a que se procure “compor a ordem que foi quebrada, o direito que foi ofendido”.[10]

De maneira objetiva e com a clareza que lhe é peculiar, Antonio Jeová Santos preleciona que “seria escandaloso que alguém causasse mal a outrem e não sofresse nenhum tipo de sanção; não pagasse pelo dano inferido”.[11] Em outras palavras, o princípio que fundamenta o dever de indenizar se encontra centrado no fato de que a todo o dano injusto deve corresponder um dever de reparação. 

De tal sorte que se pode concluir, utilizando as sábias palavras de Artur Oscar de Oliveira Deda: “Quando a vítima reclama a reparação pecuniária de dano moral, não pede um preço para sua dor, mas, apenas, que se lhe outorgue um meio de atenuar, em parte, as conseqüências da lesão jurídica. Na reparação dos danos morais, o dinheiro não desempenha a função de equivalência, como, em regra, nos danos materiais, porém, concomitantemente, a função satisfatória e a de pena”.[12]

IV – A INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL

Ocorrente o ilícito no que diz respeito a negativação do nome do consumidor, a sua reparação in natura é praticamente impossível porquanto não se pode retroceder no tempo e apagar os efeitos deletérios do ato ilicitamente praticado. Como diz com maestria o magistrado José Luiz Gavião de Almeida, “nenhuma indenização, por mais alta que possa ser, tem força de apagar os prejuízos, a humilhação e as dificuldades enfrentadas pela vítima, que teve seu crédito abalado em virtude da conduta negligente de alguém. Dinheiro algum pode devolver o bom nome de alguém que teve sua reputação indevidamente arranhada”.[13]

“Nos últimos tempos, controverte-se a indenização pecuniária do dano moral. Averbam-se tais indenizações como uma fonte de enriquecimento sem causa e a própria constatação desta espécie de dano, em inúmeros ilícitos, como uma trava perniciosa à vida em sociedade”, é o intróito do bem articulado artigo escrito pelo Desembargador Araken da Assis que o utiliza, para, em contraponto afirmar com toda a veemência que, “com tais proposições, honestamente, não posso concordar. Em geral, elas provêm de contumazes contraventores de regras de conduta e de litigantes contumazes, interessados em minimizar os efeitos dos seus reiterados atos ilícitos. Ao contrário do que se alega, é imperioso, na sociedade de massas, inculcar respeito máximo à pessoa humana, freqüentemente negligenciada, e a indenização do dano moral, quando se verificar ilícito e dano desta natureza, constitui um instrumento valioso para alcançar tal objetivo”.[14]

Ainda no mesmo artigo, ao tratar da liquidação do dano, renomado mestre ao asseverar que o órgão judiciário deve agir com prudência e severidade na fixação do “quantum” explicita que, em alguns casos, a indenização deverá punir exemplarmente o ofensor, com o fito de impedir sua reiteração, citando como exemplo o “caso das empresas de banco que, com indiferença cruel consignam informações negativas sobre seus clientes e devedores em cadastros que vedam ou tolhem o acesso ao crédito e, posteriormente, se desculpam com o pretexto de erro operacional”.

Há situações mais graves, máxime quando se verifica que empresas inescrupulosas, utilizam-se de ameaça de inclusão do nome do possível devedor naquele sistema legal, com o único intuito de obrigar o devedor a satisfazer os supostos créditos. Este é mais um perfeito caso de flagrante abuso de direito. 

V. – DA PROVA DO DANO MORAL

Outra questão tormentosa refere-se a necessidade ou não de prova do dano moral. Autores renomados tem afirmado que o dano moral, por tratar-se de lesão ao íntimo das pessoas, dispensa a necessidade de prova, conformando-se a ordem jurídica com a demonstração do ilícito porquanto o dano moral estaria configurando desde que demonstrado o fato ofensivo, existindo in re ipsa.[15] 

No mesmo sentido tem se orientado a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, conforme se pode notar no voto do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, de cujo trecho se transcreve: “Já assentou a Corte que não há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação ao art. 334 do Código de Processo Civil”.[16] Ou como vaticinou o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, em julgamento do qual foi relator, cujo trecho da emenda assim se redigiu: “A prova do dano moral se satisfaz, na espécie, com a demonstração do fato que o ensejou e pela experiência comum”.[17] Mesmo entendimento manifesta o Ministro Cesar Asfor Rocha que, em termos da questão em análise, já teve oportunidade de se manifestar e, assim o fez: “Na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto”.[18]     

Existe uma natural lógica para assim proceder, porquanto, se o dano moral existe a partir da lesão a um daqueles direitos íntimos da pessoa humana, tal qual a honra, a intimidade, a vida privada e a imagem, somente para citar alguns, não há nenhuma lógica exigir-se a prova da repercussão no íntimo do ofendido dos efeitos de tais violações. O ordenamento jurídico há que se conformar com a presunção de que, em razão de máximas de experiências, qualquer indivíduo de mediana sensibilidade, se sentiria ofendido e agredido em seus valores anímicos, diante de determinados procedimentos ilícitos.

Em se tratando de inclusão indevida junto aos bancos de dados, a jurisprudência pátria e unânime, no que diz respeito a desnecessidade de prova da repercussão de seus efeitos. Nesta particular aspecto, basta ao ofendido provar que a inclusão se deu de forma irregular ou indevida para fazer surgir o dever indenizatório. A guisa de exemplo, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, pelo voto do Ministro Castro Filho que “em casos que tais (inscrição indevida na Serasa), faz-se desnecessária a prova do prejuízo, que é presumido, uma vez que o dano moral decorre da própria inclusão indevida do nome do autor no cadastro de inadimplentes.[19] Também o Ministro Aldir Passarinho Junior deixou assentado que “a inscrição indevida do nome do autor em cadastro negativo de crédito, a par de dispensar a prova objetiva do dano moral, que se presume, é geradora de responsabilidade civil para a instituição bancária”.[20]

Desta forma, ocorrendo a inscrição irregular do nome do usuário dos serviços bancários em banco de dados, não há falar-se em necessidade de prova da repercussão do dano moral porquanto é de se presumir que o só fato da inscrição irregular, gera dano passível de indenização.

VI. – DA INCLUSÃO ENQUANTO SE DISCUTE A DÍVIDA

Como ensina Antonio Herman de Vasconcelos Benjamin, “evidentemente (que) todo credor – mesmo usurário – quer receber de volta o que emprestou, somado à sua remuneração. Para tanto vai, muitas vezes, às últimas conseqüências: a cobrança judicial. Só que esta, face aos obstáculos inerentes ao processo, não é nunca a opção primeira do credor. Em decorrência da demora e custos envolvidos em um processo judicial, o credor, provavelmente, fará uso, a princípio, de táticas extrajudiciais de cobrança”,[21] principalmente se considerarmos que muitas instituições financeiras terceirizam seu departamento de cobrança, perdendo controle sobre os procedimentos adotados pelos terceirizados. 

Há diversos registros de situações em que, independentemente da eventual discussão, judicial ou extrajudicial, acerca do débito existente, o consumidor se depara com a ameaça de inclusão de seu nome naqueles bancos de dados, o que, inegavelmente, lhe cria constrangimentos e dissabores e, viola os objetivos principais do estatuto. Tais situações caracterizam “desvio de finalidade dos arquivos de consumo, pois a implementação prestou-se mais para cobrar dívida, do que para proteger o crédito como originariamente previsto”.[22] É o típico caso do consumidor que, não concordando com os valores que lhes são cobrados, seja com relação ao principal, seja com relação aos juros incidentes sobre a dívida, procura discutir seus débitos administrativamente. No curso das negociações depara-se com a ameaça de inclusão de seu nome nos bancos de consumo o que, a toda evidência, o coloca em posição de inferioridade na discussão dos elementos que compõem o montante da dívida.

Nesse sentido, quando a discussão da dívida se dá em juízo, nossos Tribunais tem decidido que, enquanto se discute o montante da dívida, não há falar-se em inclusão do nome do consumidor nos cadastros de maus pagadores. O ilustre Desembargador Vicente Barroco Vasconcelos, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, a esse respeito posicionou-se de maneira peremptória nos seguintes temos: “Havendo discussão acerca do direito de crédito, é pelo menos razoável não fique o suposto devedor sujeito às conseqüências danosas do lançamento de seu nome em cadastros de maus pagadores, onde sequer lhe é concedido o direito de defesa. Há que se aplicar o bom senso, e sempre haverá maior facilidade para o credor ressarcir-se de prejuízos advindos da falta de lançamento do nome do devedor do cadastro de maus pagadores, que o devedor livrar-se das conseqüências, às vezes, imprevisíveis, de tal inscrição”.[23]

Da mesma forma, o não menos ilustre Desembargador Orlando de Almeida Perri, do Egrégio Tribunal de Justiça do Mato Grosso, assim decidiu: “Não obstante a necessidade da existência de bancos de dados na sociedade moderna, que facilitam as relações de consumo, ele não pode servir de instrumento de coação ao consumidor, máxime quando se está a discutir a própria legitimidade do débito inscrito ou a extensão dele”.[24]

Também o Superior Tribunal de Justiça, pelo voto abalizado do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, já teve oportunidade de decidir a questão e assim o fez: “São por demais conhecidos os efeitos negativos do registro em bancos de dados de devedores; daí porque inadequada a utilização desse expediente enquanto pende ação consignatória, declaratória ou revisional, uma vez que, inobstante a incerteza sobre a obrigação, já estariam sendo obtidos efeitos decorrentes da mora. Isso caracteriza um meio de desencorajar a parte a discutir em juízo eventual abuso contratual”.[25]

A questão que se coloca é se o atraso, eventualmente existente, se deve por culpa exclusiva do devedor ou se o credor também tem sua parcela de culpa no inadimplemento. Neste particular aspecto, o magistrado paulista Nivaldo Balzano, em acórdão de brilhante teor, do qual se transcreve trecho, nos brinda com uma magnífica lição sobre inadimplemento e mora, para concluir que é necessário cautela antes do envio do nome de devedor aos registros de maus pagadores, veja-se: “Esse registro é antijurídico na medida em que não distingue a mora do inadimplemento, nem do retardamento. O inadimplemento é a não satisfação da obrigação no prazo. A mora decorre do inadimplemento comprovado, sem causa ou injusto, mas nem toda retardação caracteriza a mora do devedor, podendo ocorrer de fato inimputável ao obrigado e sim imputável ao pretenso credor, como exemplo, exigência de encargos excessivos pelas instituições financeiras, aplicação de índices de reajustamentos indevidos, capitalização de juros vedada, falta de demonstração inequívoca de débito, enfim, tantas outras práticas do dia-a-dia que não encontram amparo no direito”. Para ao depois arrematar que “o singelo decurso do prazo de uma obrigação, sem perquirição de outros fatores, por si só, não gera o direito de enviar os dados do retardante a um cadastro de restrições amplas ao crédito, comprometendo todas suas atividades negociais. Remetido, o autor deve responder pelos danos morais causados, sem necessidade de se comprovar o reflexo concreto porque desnecessário a partir da Constituição Federal de 1988 que contemplou o direito à reparação desse dano isoladamente”.[26]

É nosso entendimento que, ainda que a dívida esteja sendo discutida tão somente no âmbito administrativo e, enquanto não solucionada a pendência pelo titular do crédito, seria precipitada a inclusão do nome do devedor nos cadastros de proteção ao crédito. E tal se justifica porque, como diz Marcio de Mello Casado “por constituir em bem público, jamais a concessão de crédito poderia estar tão simplificada ao ponto de uma simples informação na tela do computador, fria, mormente incompleta, às vezes equivocada, servir para o fechamento absoluto das portas do sistema financeiro ao pretenso consumidor de crédito”.[27] Ademais, adverte ainda o mesmo autor que as atividades da Serasa acabaram por se converter em meio de cobrança abusiva, o que estaria a contrariar o disposto no art. 42 do estatuto consumerista.

Não é por outra razão que o magistrado Sebastião Flávio da Silva Filho, do extinto 1° Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, ainda que não acompanhado por seu pares, sentenciou: “Ninguém desconhece hoje o caráter estigmatizante decorrente da deformação da utilidade inicial desse serviço de proteção ao crédito mantido pela SERASA, o qual, se foi concebido com o bom propósito de proporcionar um cadastro geral para a segurança na concessão de créditos bancários, hoje tem mais o perfil de criar uma generalizada suspeita de insolvência ou de inadimplência contumaz, sem distinguir cada situação de ‘per si’. E não é por outra razão que se valem as instituições financeiras dessa deformação para compelir a pagamento ou a renegociação de seus créditos, sabedoras de que informação sobre pendência creditícia implica gravíssimas restrições ao prosseguimento dos negócios do atingido, em face desse apontado caráter estigmatizante, verdadeira morte civil”.[28]

Assim, em que pese o respeito das opiniões em contrário, qualquer materialização da inclusão do nome do (suposto) inadimplente naqueles cadastros restritivos de crédito, enquanto se discute o montante da dívida, a sua origem e seus adicionais, seja discussão no âmbito judicial ou extrajudicial, estaria a caracterizar abuso de direito, ensejador de reparação pela via do dano moral.

VII. – DO DEVER DE INFORMAR DA ABERTURA DE CADASTRO

A inclusão do nome do devedor nos cadastros restritivos de crédito deve, obrigatoriamente, ser precedida da devida comunicação ao consumidor para lhe permitir a oportunidade de aferição da veracidade e da correção de tal indicação. Em assim não procedendo, a empresa credora e o banco de dados, deverão ser responsabilizados, solidariamente, pelo descumprimento do dever legal de comunicação, expressamente previsto no art. 43, §§ 2° e 3°, do estatuto consumerista. 

Nesse sentido, se pode afirmar que o primeiro direito do consumidor, em se tratando de arquivos de consumo, é tomar prévio conhecimento de que alguém começou a estocar informações a seu respeito, independentemente de provocação ou aprovação sua. Esse dever de comunicação, além da expressa previsão do art. 43, é corolário dos direitos básicos e genéricos estatuído no art. 6º da Lei n° 8.078/90 e, a sua falta, configura-se em ato ilícito, gerando por via de conseqüência, a obrigação de indenizar.[29]

Esclareça-se que a comunicação deverá ser sempre por escrito e, recomenda o bom senso, deve ser entregue mediante comprovação de recebimento. Ocorre na prática diária que esta cautela não é seguida, nem pela Serasa, nem pelas empresas que apontam os nomes de seus clientes àquele banco de dados. Mais grave ainda: remetem a comunicação através de carta simples, sem sequer procurar saber se o endereço do apontado está correto e atualizado. Conseqüência óbvia: nascerá para o consumidor o direito à indenização pelo só fato de não ter sido, previamente, comunicado de que se estaria estocando informações a seu respeito. Tal se justifica porque em situações assemelhadas, o consumidor acabará por descobrir a inclusão de seu nome naquele banco de dados da pior maneira possível – quando vai utilizar seu crédito junto a algum fornecedor. 

Outro aspecto que releva comentar é que o prazo máximo de estocagem da informação negativa do nome do devedor está limitado ao prazo de cinco anos, ressalvando-se que tal prazo deve ser contado do fato que deu origem à inscrição e não a data da inserção no banco de dados.[30] De tal sorte que viola as disposições contidas no § 1º do art. 43 do Código de Defesa do Consumidor manter-se por mais de cinco anos o apontamento do nome do inadimplente naqueles cadastros.

Neste aspecto, se a permanência da inscrição pelo lapso superior a cinco anos for causa de constrangimento para o consumidor, autorizará o mesmo a ingressar com a ação para compelir a Serasa a promover a exclusão de seu nome, sem prejuízo da ação competente visando ser indenizado em face do dano moral ocorrido. Nesse sentido e, até por ilustrativo, trazemos à colação trecho de ementa de julgado em que foi relator o Desembargador Sebastião Chaves que assim sentenciou: “… o ato de manter o nome do apelado inscrito na Serasa com a informação de inadimplente por mais de cinco anos, conforme restou soberbamente comprovado nos autos, gera para o devedor o direito de obter, perante o poder judiciário, a exclusão de seu nome do cadastro negativo e a reparação dos danos decorrentes desse ato ilícito, e para o credor a obrigação de indenizar os danos sofridos pelo devedor, nos termos do art. 159 do Código Civil/1916 e dos arts. 186 e 187 do novo Código Civil”.[31]  

VIII – INDÚSTRIA DO DANO MORAL? 

Na atual realidade brasileira, algumas críticas são dirigidas ao instituto do dano moral e, dentre estas, merece especial destaque aquela atinente a questão da chamada “industria do dano moral”.

Sabemos que na vida moderna há o pressuposto da necessidade de coexistência do ser humano com os dissabores que fazem parte do dia-a-dia. Desta forma, alguns contratempos e transtornos são inerentes ao atual estágio de desenvolvimento de nossa sociedade. Concordamos que se há de ter prudência na propositura de ação a título de dano moral pois como assevera o mestre Antonio Chaves não é “todo e qualquer melindre, toda suscetibilidade exacerbada, toda exaltação do amor-próprio pretensamente ferido, a mais suave sombra, o mais ligeiro roçar das asas de uma borboleta, mimos, escrúpulos, delicadezas excessivas, ilusões, insignificantes desfeitas[32] que hão de caracterizar a existência de ilícito autorizador da propositura de ação na busca de indenização por danos morais.

Contudo, a crítica daqueles que, se baseando no grande volume de ações decorrente de dano moral, usam tal parâmetro para afirmar que tais ações visam promover a loteria do dano moral, não merece prosperar.

Há, evidentemente, casos isolados que podem até denotar tal intuito. Contudo o que precisa ser ressaltado é que, o aumento das demandas de caráter indenizatórias por danos morais decorre de duas premissas básicas: a uma, o despertar de cidadania da população brasileira que, como decorrência natural, faz com que cada dia mais, os cidadãos passem a ter consciência dos seus efetivos direitos e, mais do que isso, a exercê-los em toda sua plenitude e, a duas, a incidência, cada vez maior, de violação da intimidade das pessoas, principalmente em face da impessoalidade das relações negociais.

Não podemos concordar com aqueles que, em nome dos infratores habituais, procuram minimizar os efeitos deletérios da agressão à dignidade humana perpetrada diuturnamente pelos chamados infratores contumazes, com os argumentos que denotam desprezo pela honra, imagem, nome e intimidade das pessoas.

Em verdade, grande parte das demandas a título de dano moral, decorrem de falhas na prestação dos serviços bancários. Por mais que os computadores estejam cada vez mais sofisticados, a impessoalidade que impera em seus sistemas de controles impedem uma avaliação pessoal de cada caso de tal sorte a individualizar cada cliente. Conclusão: qualquer falha no sistema gera relatórios imprecisos e, por conseguinte, inscrições irregulares junto aos bancos de dados, não se perquirindo se a máquina foi alimentada com dados incorretos ou não.

Já se foi o tempo em que a análise do inadimplemento do cliente era feita pelo Gerente da conta. Nos dias atuais, pouca diferença faz se o inadimplente é cliente recente da instituição ou cliente antigo, daqueles que ao longo de vários anos sempre teve um proceder escorreito. Caindo nas malhas do sistema computadorizado, não importa perquiri sobre o perfil do cliente, independentemente de qualquer análise pessoal, seu nome será levado ao banco de dados de controle de crédito e, ele que prove a inexistência dos fatos que geraram sua inclusão naquele órgão.

Desta forma, não se há falar em indústria do dano moral porquanto as inúmeras demandas propostas, diuturnamente, contra as empresa bancárias a esse título decorrem, como já frisamos, de duas premissas básicas: primeiro – o despertar da cidadania para o exercício pleno de seus direito e, segundo – de falhas na prestação dos serviços, decorrentes, no mais das vezes, da impessoalidade das relações negociais.

IX – CONCLUSÃO

Em face do exposto, podemos concluir: no mundo moderno, onde a desmedida corrida em busca do lucro, sem que se respeitem a ética e a moral nas relações negociais, transformou o consumidor, de produtos e serviços, em frios e abstratos números. O melhor método de garantir o respeito à dignidade e aos direitos fundamentais da personalidade humana, somente atingirá seus desígnios, se fosse adotada uma postura sólida de reprimenda aos abusos cometidos.

O peso da indenização no “bolso” do infrator, até pelo caráter pedagógico da sanção civil é, a nosso sentir, a resposta mais adequada que o ordenamento jurídico pátrio pode oferecer ao lesado para garantir não sejam ofendidos diuturnamente os bens atinentes à personalidade do ser humano.

Em resumo:

1.      A condenação por danos morais tem que ter um caráter de atender aos reclamos e anseios de justiça, não só do cidadão, mas da sociedade como um todo.

2.      A melhor teoria que se coaduna com os anseios da sociedade moderna, no tocante à reparação por danos morais, é aquela que tem um caráter tríplice, qual seja: punitivo, compensatório e exemplar.

3.      Aos grandes conglomerados econômicos cabe exigir atitudes de vigilância quanto à qualidade dos serviços prestados, quanto à prevenção dos chamados erros operacionais, cometidos amiúde por seus funcionários e prepostos, de tal sorte a reduzir a incidência de afrontas aos direitos e a dignidade dos usuários de tais serviços.

4.    A utilização desmedida do instituto do dano moral poderá criar o descrédito e vir a banalizar tão importante instrumento, por isso que se recomenda ao judiciário critérios sólidos na aferição e na quantificação da indenização por ilícitos desta ordem e, aos operadores do direito, que utilizem de cautela e prudência na propositura de demandas a esse título.

5.      O fato de existirem desvios, não pode ter o condão de invalidar tão importante preceito legal – o dano moral. É preciso que se aperfeiçoem os instrumentos postos à disposição daqueles que manejam o direito, de tal sorte que os excessos possam ser coibidos.

X – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 

ASSIS, Araken. Indenização do dano moral. Porto Alegre: Revista Jurídica n° 236, p. 5.

BENJAMIN, Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor Comentado, 4a. edição. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1996.

CASADO, Márcio Mello. Proteção do Consumidor de Crédito Bancário e Financeiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

CASILLO, João. Dana à pessoa e sua indenização, 2a. edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1994.

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil, 3a. edição. São Paulo: Malheiros, 2002.

CHAVES, Antonio. Tratado de Direito Civil – Responsabilidade civil. São Paulo: Revista do Tribunais, v. III, 1985.

COVIZZI, Carlos Adroaldo Ramos. Práticas abusivas da Serasa e do SPC, 2a. edição. São Paulo: Edipro, 2000.

GARCEZ NETO, Martinho. Prática da responsabilidade civil, 4a. edição. São Paulo: Saraiva, 1989.

MELO, Nehemias Domingos de. Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2004.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro; Forense, edição em CDRom, não paginado.

SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável, 4a. edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.

STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil, 5a. edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

REPOSITÓRIOS DE JURISPRUDÊNCIAS:

Júris Síntese/IOB CDRom n° 50 – nov-dez. 2004

Biblioteca Digital Lex – jurisprudência consolidada Tribunais Superiores.


 

NOTAS:

[1] Cf. Arruda Alvim – Código do Consumidor Comentado, Revista dos Tribunais, 1991, p. 40 (apud: Sergio Cavalieri Filho – Programa de responsabilidade civil, p. 343).

[2] Por aplicação analógica nossos tribunais tem estendido tal regra a todos os tipos de ações em que se discuta direitos do consumidor. Veja-se, por exemplo, decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (AI 236.895-4/4 – 3ª C.DPriv. – Rel. Des. Ênio Santarelli Zuliani – J. 09.04.2002), e (AI 320.681-4/5-00 – Teodoro Sampaio – 10ª CDPriv. – Rel. Des. Quaglia Barbosa – J. 18.11.2003). Da mesma forma no Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo (1º TACSP – AI 1152182-3 – (47949) – Taubaté – 2ª C. – Rel. Juiz Ribeiro de Souza – J. 19.02.2003) e (1º TACSP – AI 1221214-9 – José Bonifácio – 3ª C. – Rel. Juiz Oswaldo Erbetta Filho – J. 07.10.2003) .

[3] Tratado de Responsabilidade Civil, p. 1478.

[4] Responsabilidade Civil – edição eletrônica (CD Rom), não paginado.

[5] Antonio Chaves – Tratado de Direito Civil, v. 3, p. 634.

[6] 1° TaCivil – Ap. n°. 825.862-2, – j. 09.10.2001 – LEX-JTACSP, v. 193, p. 193.

[7] Prática de responsabilidade civil, p. 51.

[8] CF – Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

  (…)

   III – a dignidade da pessoa humana;

[9] Op.cit.,  p. 85.

[10] João Casillo – Dano à pessoa e sua indenização, p. 77.

[11] Dano moral indenizável, p.62.

[12] Citado por Antonio Chaves – Tratado de direito civil, v. III, p. 637.

[13] 1° TaCivil/SP – Ap. n° 832.057-2 – 9a. Câm. – j. 19.03.2002 – LEX-JTACSP, v. 195, p. 199.

[14] Indenização do dano moral – Revista Jurídica n° 236, p. 5.

[15] Sérgio Cavalieri Filho – Programa de responsabilidade civil, P. 92.

[16] STJ – RESP . 318099 – SP – 3ª T. – Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJU 08.04.2002.

[17] STJ – RESP 304738 – SP – 4ª T. – Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira – DJU 13.08.2001 – p. 0167.

[18] STJ – RESP – 173124 – RS – 4ª T. – Rel. Min. Cesar Asfor Rocha – DJU 19.11.2001 – p. 00277.   

[19] STJ – AGA 470538 – SC – 3ª T. – Rel. Min. Castro Filho – DJU 24.11.2003 – p. 00301.

 

[20] STJ – RESP 432177 – SC – 4ª T. – Rel. Min. Aldir Passarinho Junior – DJU 28.10.2003 – p. 00289.

[21] Código brasileiro de defesa do consumidor comentado…, p. 255.

[22] Carlos Adroaldo Ramos Covizzi – Práticas abusivas da Serasa e do SPC, p. 23.

[23] TJRS – AGO 197729155 – RS – 7ª C.Cív. – J. 18.03.1998, in Juris Sintese 164-35.

[24] TJMT – Agr.In 9.565  – 1.ª Câm. – j. 31.05.1999 – in RT 770/337.

[25] STJ – RESP n° 172.854-SC – 4a. Turma -j. 04.08.1998 – DJU 08.09.98.

[26] 1° TaCivil  – Ap. 815.072-5 – 5a. câm. – j.13.12.2000 -LEX-JTACSP , v. 188, p. 181.

[27] Proteção do consumidor de crédito bancário e financeiro, p. 181.

[28] Em voto vencido na ap. n. 826.731-6 – 9a. Câm. – j. 03.08.2000 – LEX-JTACSP, v. 186, p 170.

[29] Cf. Des. Airvaldo Stela Lalves – TJPR – AI 0153240-3–Londrina – 6ª C.Cív. – DJPR 23.08.2004.

[30] Cf. Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin – Código comentado pelos autores, p. 277.

[31] TJRO – AC 100.001.2002.004401-0 – C.Cív. – Rel. Des. Sebastião T. Chaves – J. 03.08.2004.

[32] Tratado de direito civil, vol. III, p. 637.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

NEHEMIAS DOMINGOS DE MELO: Advogado militante em São Paulo Professor de Direito Civil e Processual Civil na Universidade Paulista – UNIP/SP. Especialista em Direito Civil – Pós-Graduado pelo UniFMU/SP. Mestrando em Direitos Difusos e Coletivos na UNIMES/SP. Ex-Assessor da Comissão de Seleção e Inscrição da OAB – Seccional SP. Membro da Comissão de Defesa do Consumidor do Instituto dos Advogados de São Paulo – IASP. O autor é palestrante e conferencista, tem artigos publicados em Sites e Revistas especializadas. É autor dos seguintes livros: “Dano moral – problemática: do cabimento à fixação do quantum” (2004) e “Da culpa e do risco – como fundamentos da responsabilidade civil” (2005) – (ambos pela Editora Juarez de Oliveira); “Direito do Consumidor” (Robortella – 2006); “Dano moral trabalhista” (Ed. Atlas – 2007); e, “Dano moral nas relações de consumo” (Saraiva – prelo 2007).  e-mail: melo.advocacia@terra.com.br

Artigo elaborado em 20 de fevereiro de 2005.


Procedimento do artigo 285-A do Código de Processo Civil

0

* Thanaia Raffo       

Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada.
§ 1°. Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação.
§ 2°. Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso.

Esse trabalho tem por objetivo analisar as novas técnicas de sumarização do processo com intima relação a efetividade do mesmo, racionalizando o serviço judiciário, tornando-o mais eficiente, palavra essa que modernamente tem norteado o processo civil.

Trataremos do instituto do artigo 285-A do CPC criado pelos nossos legisladores, com o propósito de promover uma Justiça célere e realmente comprometida com o fim sócio, político e jurídico a que se destina o processo.

Ele é voltado a massificação de determinados processos dando-os atendimento especial.

Segundo esse artigo, há a possibilidade de o juiz proferir uma sentença de plano, sem citar o réu, ou seja, não formando o triângulo base de todos os processos, e fazendo coisa julgada material.

Ele lembra muito o artigo 295 tbm do CPC, que trata do indeferimento da inicial, de plano, tendo como diferença essencial a análise do mérito, ou seja, enquanto no 295 não se analisa o mérito havendo preocupação apenas com as formalidades do processo, no 285-A há tal análise. Além disso como já mencionado, o 285-A é voltado para questões massificadas enquanto o outro não.

Requisitos para o uso do 285-A:

1. a matéria controvertida deve ser unicamente de direito, ou seja, não é necessária a instrução do processo, com dilação probatória;

2. haver, no mesmo juízo, uma sentença anterior proferida, de total improcedência (não pode incidir no caso de procedência, pois o réu não pode ser prejudicado sem lhe ser dada a oportunidade de defesa);

3. haver outros casos idênticos, pelo menos em número de dois, com sentenças de improcedência, para que seja possível o julgamento prima facie, liminar.

Segundo palavras do comentariata Daniel Francisco Mitidiero,

“Tal dispositivo tem por desiderato racionalizar o serviço judiciário, tornando-o mais eficiente.
Não nos parece, contudo, que o art. 285-A, CPC, participe da " efetividade virtuosa" , a que a Constituição expressamente empresta guarida. Parece-nos, antes, que esse expediente de sumarização instrumental guarda relação justamente com a outra face da efetividade, identificada outrora por Carlos Alberto Alvaro de Oliveira como " efetividade perniciosa" , que se encontra em aberto conflito com os direitos fundamentais encartados em nosso formalismo processual.
Com efeito, a pretexto de agilizar o andamento dos feitos, pretende o legislador sufocar o caráter dialético do processo, em que o diálogo judiciário, pautado pelos direitos fundamentais, propicia ambiente de excelência para reconstrução da ordem jurídica e conseguinte obtenção de decisões justas. Aniquila-se o contraditório, subtraindo-se das partes o poder de convencer o órgão jurisdicional do acerto de seus argumentos. Substitui-se, em suma, a acertada combinação de uma legitimação material e processual das decisões judiciais por uma questionável legitimação pela eficiência do aparato judiciário, que, de seu turno, pode facilmente desembocar na supressão do caráter axiológico e ético do processo e de sua vocação para ponto de confluência de direitos fundamentais.
Afora essa flagrante inconstitucionalidade, temos que fora desacertada igualmente a escolha do parâmetro autorizador do julgamento de improcedência liminar das demandas repetitivas. Com efeito, seria menos desastroso tivesse o legislador aludido a súmulas de jurisprudência dos Tribunais Superiores, à jurisprudência desses Tribunais ou mesmo dos Tribunais de Apelação no lugar de sentenças de primeiro grau, dada a ampla revisibilidade a que essas se encontram sujeitas no direito brasileiro. Pense-se, por exemplo, no grave inconveniente de terem-se, no juízo de primeiro grau, julgamentos liminares com fulcro no artigo em comento em conflito com a jurisprudência do Tribunal a que se liga o órgão jurisdicional de primeira instância ou, a fortiori, contrários a súmulas dos Tribunais Superiores. Aí haverá, iniludivelmente, desserviço à boa administração da justiça.
Seja como for, acaso se entenda constitucional o artigo em comento, tem-se de notar que esse só autoriza julgamento de improcedência das demandas repetitivas. O julgamento de procedência encontra-se vedado pelo legislador. Tem-se de observar, ainda, que a sentença de improcedência não tem de ser idêntica à prolatada anteriormente: basta que tenha o mesmo teor. Não se veda, pois, o reforço argumentativo.
Prolatada sentença de improcedência, dispensa-se a citação do réu. Entende-se a dispensa, porque aí não há prejuízo, não havendo, princípio, risco à esfera jurídica do demandado”

Tem razão o comentarista quando fala que seria melhor que fosse mais observada a jurisprudência, assim como tem razão quando explica que se dispensa a citação do réu, por que se a sentença foi de improcedência este não tem do que se defender.

Assim entendo que não há inconstitucionalidade no dispositivo, apesar de ele ter sido publicado com uma redação não tão feliz assim.

 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Thanaia Raffo: Advogada, em Porto Alegre (RS).

 


Breves anotações sobre a arbitragem – Lei 9307/96

0

 * Thanaia Raffo  

A muito já se dizia que a arbitragem seria a solução para o século em que vivemos, e com o grande acúmulo de processos e desrespeito a celeridade, cada vez mais as pessoas buscam uma alternativa para o alcance de suas expectativas.

A arbitragem é uma forma de solução de conflitos, realizada por terceiro, que não o órgão jurisdicional. Esse terceiro pode ser qualquer pessoa privada e capaz, escolhida pelas partes, exceto juiz de direito.

Assim a arbitragem, tendo como pressupostos essências a exigência da neutralidade, a sensibilidade aos anseios geradores do clima conflitante e, por fim, o fator confiança, veículo condutor da convergência voluntária das partes a melhor e mais profícua solução, tem sido a escolha.

Ela não precisa nem mesmo ser homologada por um juiz de direito, pois ao haver convenção entre as partes, documentadamente, há a vinculação de solução de lide dessa forma, ficando as partes impedidas de recorrer ao judiciário.

Convém salientar ainda, que a arbitragem só pode ser convencionada em questões que envolvam direitos de natureza patrimonial e disponível. E que essa convenção pode se dar por cláusula compromissória, em um contrato, por exemplo, e ainda, por compromisso arbitral, firmado a partir de uma lide já existente.

O árbitro nesse caso de solução de conflitos é escolhido com liberdade, e por não ter poder estatal inspira e cativa a confiança dos interessados, que vêm a oportunidade de interação com o campo das negociações, o que facilita a mais rápida e harmoniosa conclusão.

É o consenso objetivado pelo exercício da autonomia da vontade dos interessados, vinculados, por força dela, à responsabilidade direta pela composição do impasse, evitando as longas e protelatórias discussões no poder judiciário.

O Brasil relutou em adotar a arbitragem e mesmo agora há vozes respeitáveis erguendo-se contra pretensa inconstitucionalidade da lei, por entenderem que esta estaria a conflitar com o princípio consagrado pelo artigo 5º, XXXV da C.F, segundo o qual, a lei não excluirá lesão ou ameaça a direito da apreciação do Judiciário.

Mas sabemos que isso não é verdade, porque essa lei dá a liberdade de o cidadão abrir mão do uso do poder judiciário, sendo esta renúncia à jurisdição estatal uma prerrogativa do cidadão (art. 2º do CPC), ao tempo em que a sua busca não poderá constituir-se em obrigação imposta, pois, nesta hipótese, despontaria o arbítrio, antitético do que o grande filósofo Reale denomina Estado Democrático de Direito.

Por tudo que foi dito, entendo que a edição da lei modernizou o Brasil, que, no cenário universal e como país que se prepara com otimismo para a liderança latino-americana dentro do Mercosul, jamais poderá ocupar o espaço que lhe reserva o futuro, desprovido de regras adequadas para o contexto deste mundo novo sem porteiras. È necessária a disposição de meios mais eficazes na prestação de soluções de lides.

Não bastassem todas estas vantagens, a opção pela arbitragem resulta em custos menores, especialmente em função do prazo para definição do litígio, estabelecido pela lei em, no máximo, seis meses, sendo certo que o maior ônus imposto pela justiça estatal tem sido justamente o demasiado tempo de duração das ações judiciais.

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Thanaia Raffo: Advogada, em Porto Alegre (RS).