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Publicação errada em lista telefônica acarreta reparação por dano moral

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DECISÃO:  TJ-RS  –  Listel Listas Telefônicas Ltda. deverá pagar indenização por ter publicado, nas páginas gratuitas, nome de cliente associado a endereço e telefone de outra empresa concorrente. Por unanimidade, a 9ª Câmara Cível do TJRS confirmou a sentença que determinou a reparação de R$ 5 mil a João Veit & Cia. Ltda., autor da ação. Segundo o Colegiado, a má-consecução de contrato de publicidade impõe à ré o dever de indenizar em danos morais.

Os magistrados aplicaram o Código de Defesa do Consumidor, segundo o qual os fornecedores respondem, independentemente de culpa, pela reparação dos danos causados a consumidores por defeitos relativos aos serviços prestados, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

A Listel apelou, sustentando que o alegado erro ocorreu na lista gratuita, onde as partes não possuem relação contratual. Assinalou somente se responsabilizar pelos dados contratados, sendo o de figuração gratuita fornecidos pela Brasil Telecom. Ressaltou a impossibilidade de se indenizar pessoa jurídica por danos morais.

O relator do recurso, Desembargador Odone Sanguiné, salientou que a demandada comprovou que no anúncio publicitário contratado houve publicação correta dos dados de João Veit & Cia. Ltda. Entretanto, a Listel cometeu o equívoco ao publicar o nome da empresa na lista de figuração gratuita, frisou o magistrado.

Reconheceu os danos decorrentes da falha na prestação dos serviços disponibilizados pela ré. Destacou que a Listel veiculou informações diversas da contratada e acabou por beneficiar diretamente empresa que compete com o apelado na atividade de comercialização de piscinas.

“A demandada é fornecedora de um serviço e, se o prestou de maneira defeituosa, está obrigada a ressarcir eventuais prejuízos suportados pelo usuário, à luz do Código de Defesa do Consumidor”, asseverou o Desembargador Odone Sanguiné.

Votaram de acordo com o relator, a Desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira e o Desembargador Tasso Caubi Soares Delabary.  Proc. 70020084505


FONTE: TJ-RS, 01 de outubro de 2007.

Pais de servente que morreu do coração após passar por exame admissional recebem indenização

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DECISÃO:  TRT-MG  – Embora, na prática, não se dê a devida importância ao exame médico realizado nos candidatos a emprego a fim de verificar se estão aptos para o trabalho, ele não é apenas uma medida pro forma, mas um importante instrumento de garantia da integridade física do trabalhador, que não pode ser forçado a tarefas mais pesadas do que sua condição física e psíquica lhe permite. Foi esse o alerta dado pelo juiz convocado Paulo Maurício Ribeiro Pires, ao relatar caso julgado pela 8ª Turma do TRT de Minas, que deu ganho de causa a um casal que perdeu o filho em função de parada cardio-respiratória, edema agudo de pulmão, arritmia cardíaca e valvulopatia mitral, após ter sido admitido por uma construtora para trabalhar como servente de pedreiro. Apesar de ser portador de doença cardíaca grave, o rapaz, de apenas 21 anos, foi considerado apto para o trabalho pelo exame médico admissional realizado pelo médico da empresa. “O caso demonstra à evidência e à saciedade o desacerto de encarar questões de saúde do trabalho, como essa, como formalismos inúteis ou desnecessários” – ressalta o relator.

Em sua defesa, a ré trouxe aos autos depoimento de um parente do empregado falecido, revelando que ele havia se submetido a uma cirurgia para implante de prótese mitral biológica, mas que teimava em não prosseguir com o tratamento e não revelava a ninguém sua condição, não deixando de fumar e beber, só para aparentar um estado de saúde normal. Mas, para o relator, isso não exime a empresa de sua responsabilidade: “A questão é que as sérias circunstâncias do empregado passaram despercebidas pela reclamada, que o admitiu mesmo assim. Sabe a empresa, ou deveria saber, a clientela que lhe bate à porta, em busca de emprego. São trabalhadores de baixa qualificação, com pouco ou nenhum acesso às condições mínimas de saúde, eventualmente com vícios como os alegados. Daí mesmo decorre a necessidade de cuidados redobrados na admissão, exames bem feitos, inclusive com entrevista de vida atual, pregressa, histórico familiar, dentre outros. Se não o fez, foi por atropelo, de notória sabença a grande rotatividade desses trabalhadores, ante ao imenso contigente à disposição no mercado”.

A prova pericial constatou que o reclamante tinha saúde muito debilitada, era portador de prótese de válvula e veio a falecer após uma jornada mais longa e pesada. Portanto, a causa primeira da morte foi o fato de o servente não ter sido corretamente avaliado quanto à sua capacidade de trabalho. Assim, houve culpa da empresa, mas não exclusiva, uma vez que o servente, sabedor de sua condição, aceitou trabalhar em atividades que o colocaram em risco de morte. “Impossível olvidar, nesse sentido, que a falha não é atribuível unicamente à empresa, pois o zelo pela segurança e pela saúde não é iniciativa que deva ser atribuída apenas ao empregador. Ao contrário, é evidente que para tanto devem concorrer também os empregados, principais interessados, aliás, na proteção contra o sinistro”- frisa o juiz.

Dessa forma, a decisão da Turma foi pela caracterização da culpa concorrente, ou seja, de ambas as partes, empregador e empregado, ficando a empresa condenada a pagar aos pais do servente falecido uma indenização por danos morais no valor de R$30.000,00 e outra de mesmo valor, a título de danos materiais. Não houve condenação a pagamento de pensão, pois o reclamante não tinha dependentes diretos. (RO nº 00332-2006-064-03-00-0)


FONTE:

  TRT-MG, 02 de outubro de 2007.

Em Santa Catarina, Desembargador entende que prisão por dívida está abolida

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DECISÃO:  TJSC –   A 1ª Câmara de Direito Comercial do TJ, em matéria sob relatoria do desembargador Salim Schead dos Santos, concedeu habeas corpus em benefício de um cidadão que corria o risco de ser preso na condição de depositário infiel.

Ele se insurgiu contra decisão da Comarca da Capital que lhe concedia prazo de 24 horas para entregar bem sob sua guarda ou seu equivalente em dinheiro, sob pena de prisão de até um ano.

O relator entendeu que o Brasil, na condição de signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, também conhecida como “Pacto de São José da Costa Rica”, aboliu a possibilidade de prisão por dívida – exceção aos casos de inadimplemento de pensão alimentícia.

Esse entendimento, todavia, nunca foi pacífico, conforme reconhece o próprio magistrado. É que logo após a incorporação do tratado ao ordenamento jurídico nacional, ocorrido em 1992, abriu-se uma discussão sobre seu grau de equivalência e hierarquia – seria ele constitucional, infraconstitucional ou supraconstitucional?.

O STF, num primeiro momento, posicionou-se pela equivalência do acordo internacional com a legislação ordinária, razão pela qual admitia a prisão civil do depositário infiel. Ao longo dos tempos, contudo, esta posição sofreu alterações. O desembargador Salim acompanhou essa evolução e, em seu acórdão, inclusive, colacionou voto prolatado pelo ministro Gilmar Mendes: “O meu entendimento é o de que, desde a ratificação dos referidos tratados, inexiste uma base legal para a prisão civil do depositário infiel, pois o caráter especial desses diplomas internacionais sobre direitos humanos lhes reserva lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna”.

A decisão de conceder o habeas foi unânime na 1ª Câmara Comercial do TJ, com votos ainda dos desembargadores Anselmo Cerello e Ricardo Fontes. (Habeas Corpus nº 2007.032576-9)


 FONTE:  TJ-SC, 28 de setembro de 2007.

Reconhecimento da paternidade após adoção por viúva, gera obrigação alimentar ao pai biológico

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DECISÃO:  STJ – Íntegra da decisão inédita do STJ que reconheceu o direito de uma jovem receber alimentos do pai biológico, depois de adotada por uma mulher.


RECURSO ESPECIAL Nº 813.604 – SC (2006⁄0011178-7)
RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE: L C DOS S – MENOR PÚBERE
REPR.POR: A C DE O DOS S
ADVOGADO: PEDRO ANTONIO PEREIRA
RECORRIDO: S M
ADVOGADO: RODRIGO PEREIRA MAUS E OUTRO(S)

EMENTA

Direito civil. Família. Investigação de paternidade. Pedido de alimentos. Assento de nascimento apenas com o nome da mãe biológica. Adoção efetivada unicamente por uma mulher.

– O art. 27 do ECA qualifica o reconhecimento do estado de filiação como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, o qual pode ser exercitado por qualquer pessoa, em face dos pais ou seus herdeiros, sem restrição.

– Nesses termos, não se deve impedir uma pessoa, qualquer que seja sua história de vida, tenha sido adotada ou não, de ter reconhecido o seu estado de filiação, porque subjaz a necessidade psicológica do conhecimento da verdade biológica, que deve ser respeitada.

– Ao estabelecer o art. 41 do ECA que a adoção desliga o adotado de qualquer vínculo com pais ou parentes, por certo que não tem a pretensão de extinguir os laços naturais, de sangue, que perduram por expressa previsão legal no que concerne aos impedimentos matrimoniais, demonstrando, assim, que algum interesse jurídico subjaz.

– O art. 27 do ECA não deve alcançar apenas aqueles que não foram adotados, porque jamais a interpretação da lei pode dar ensanchas a decisões discriminatórias, excludentes de direitos, de cunho marcadamente indisponível e de caráter personalíssimo, sobre cujo exercício não pode recair nenhuma restrição, como ocorre com o Direito ao reconhecimento do estado de filiação.

– Sob tal perspectiva, tampouco poder-se-á tolher ou eliminar o direito do filho de pleitear alimentos do pai assim reconhecido na investigatória, não obstante a letra do art. 41 do ECA.

– Na hipótese, ressalte-se que não há vínculo anterior, com o pai biológico, para ser rompido, simplesmente porque jamais existiu tal ligação, notadamente, em momento anterior à adoção, porquanto a investigante teve anotado no assento de nascimento apenas o nome da mãe biológica e foi, posteriormente, adotada unicamente por uma mulher, razão pela qual não constou do seu registro de nascimento o nome do pai.

Recurso especial conhecido pela alínea "a" e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Castro Filho, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, nesta assentada, a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros.

Brasília (DF), 16 de agosto de 2007.(data do julgamento).

MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

RELATÓRIO

Recurso especial interposto por L. C. dos S. com fundamento nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional.

Ação: de alimentos, proposta pela recorrente em face de S. M., ora recorrido, em razão do resultado de exame pericial pelo método DNA, realizado nos autos de ação de investigação de paternidade, cuja conclusão atestou a probabilidade de 99,99% da paternidade.

Decisão interlocutória: recebeu a ação de alimentos como medida cautelar incidental à investigatória de paternidade, e arbitrou os alimentos provisionais no equivalente a 12,5% dos rendimentos do recorrido, que exerce função de Delegado de Polícia.

Acórdão: conferiu provimento ao recurso de agravo de instrumento interposto pelo recorrido, nos termos da seguinte ementa:

(fl. 271) – AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DE ALIMENTOS – ADOÇÃO – INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE – ART. 27 DO ECA – RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE – DEVER DE PRESTAR ALIMENTOS DO ADOTANTE E NÃO DO PAI BIOLÓGICO – ROMPIMENTO DOS VÍNCULOS COM A FAMÍLIA NATURAL – ART. 41 DO ECA – DECISÃO INTERLOCUTÓRIA REFORMADA – RECURSO PROVIDO.

A partir da adoção, as ligações com a família natural desaparecem, nada mais ligará a criança ou o adolescente aos pais sangüíneos, sendo o adotado equiparado, nos direitos e obrigações, ao filho sangüíneo.

Cessa o dever do pai biológico de prestar alimentos à filha, ante o rompimento dos vínculos de filiação ocorrido com a adoção.

Embargos de declaração: rejeitados.

Recurso especial: interposto sob alegação de ofensa ao art. 27 do ECA e conseqüente interpretação equivocada do art. 48 da mesma Lei, por entender a recorrente que a regra contida nesse dispositivo (art. 48 do ECA) "não pode atingir o pai biológico que não participou da adoção autorizada pela mãe biológica" (fl. 303), sem descurar que deve sempre militar em favor da criança e do adolescente a interpretação dada ao ECA.

Traz ainda à colação diversos julgados desta Corte para ilustrar o dissídio jurisprudencial.

O recurso especial foi inadmitido na origem e subiu por meio de agravo de instrumento (fl. 321).

Não houve contra-razões, conforme atesta certidão à fl. 329.

Parecer do MPF (fls. 341⁄346): o i. Subprocurador-Geral da República, Henrique Fagundes Filho, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso especial tão-somente pela alínea "a".

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relatora):

A peculiar questão trazida a debate consiste em definir se o pai reconhecido como tal em exame pericial pelo método DNA, nos autos de ação de investigação de paternidade, deve prestar alimentos à filha que foi anteriormente adotada por uma viúva, com quem reside.

Por ocasião de seu nascimento, em 22⁄4⁄1982, a recorrente teve registrado em seu assento apenas o nome da mãe biológica. Posteriormente, foi adotada por uma viúva que trabalhava no abrigo de crianças da cidade onde residia. Transitou em julgado a sentença de procedência do pedido de adoção em 15⁄8⁄1996, contando a recorrente com 14 anos de idade.

Ajuizada ação de investigação de paternidade em face do recorrido, foi confirmada a paternidade pelo exame de DNA, o que redundou no deferimento de alimentos provisionais, postulados pela recorrente. Ressalte-se que à época da decisão deferindo alimentos, a recorrente contava com 20 anos de idade e cursava faculdade de enfermagem, o que foi considerado pelo Juízo.

O Tribunal Estadual reformou a decisão interlocutória, ao entendimento de que, embora a recorrente tenha o direito de ver reconhecida sua paternidade, por causa do rompimento do vínculo de filiação natural produzido pela adoção, cessa o dever do pai biológico de prestar alimentos à filha.

Todavia, tal interpretação não se mostra adequada, a uma, porque não há vínculo anterior com o pai para ser rompido, o que é decorrência lógica da investigatória de paternidade; a duas, porque a matéria controvertida, em processos alusivos aos interesses de crianças e adolescentes, deve ser invariavelmente visualizada sob os contornos da fundamental proteção aos menores definidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (art. 6º).

Anote-se que, no processo em julgamento, a recorrente propôs a investigatória de paternidade em 29⁄3⁄1999, quando tinha 16 anos de idade, o que lhe conferiu o direito de postular sob o manto de proteção do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Necessário, portanto, para a solução do embate jurídico, pautar a controvérsia sob a perspectiva dada pelo art. 27 do ECA, que qualifica o reconhecimento do estado de filiação como direito personalíssimo, indisponível e imprescritível, o qual pode ser exercitado em face dos pais ou seus herdeiros, sem restrição. Tal dispositivo, portanto, assenta a respeito do amplo e irrestrito direito de toda pessoa ao reconhecimento do respectivo estado de filiação.

De outra sorte, o art. 41 do ECA impõe, como efeito imanente à adoção, o rompimento de qualquer vínculo do adotado com pais ou parentes biológicos, salvo quanto aos impedimentos matrimoniais.

A respeito do tema, conquanto sob base empírica diversa, releva destacar que a Terceira Turma deste Tribunal já decidiu questão semelhante, em precedente da lavra do i. Min. Eduardo Ribeiro, DJ de 28⁄8⁄2000, nos termos da seguinte ementa:

"Adoção. Investigação de paternidade. Possibilidade.

Admitir-se o reconhecimento do vínculo biológico de paternidade não envolve qualquer desconsideração ao disposto no artigo 48 da Lei 8.069⁄90. A adoção subsiste inalterada.

A lei determina o desaparecimento dos vínculos jurídicos com pais e parentes, mas, evidentemente, persistem os naturais, daí a ressalva quanto aos impedimentos matrimoniais. Possibilidade de existir, ainda, respeitável necessidade psicológica de se conhecer os verdadeiros pais.

Inexistência, em nosso direito, de norma proibitiva, prevalecendo o disposto no artigo 27 do ECA."

No aludido julgado, a adoção consumou-se sob o regime do Código Civil de 1916, na vigência do antigo Código de Menores (Lei n.º 6.697⁄79), denominada adoção simples, instituto abolido pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, no intuito de extirpar eventual discriminação entre filhos naturais e adotivos.

Assim, embora afastada a identidade empírica entre o precedente mencionado e o processo ora em julgamento, as teses jurídicas se entrelaçam, porque cuidam igualmente da existência ou não de efeitos do reconhecimento da paternidade em relação à adoção.

Por tudo isso, a adoção persiste inalterada, porque o reconhecimento da paternidade não tem o condão, muito menos a pretensão de revogar o vínculo adotivo. Não fere, tampouco, a intenção do legislador, ao impor a irrevogabilidade do instituto de adoção, vedando qualquer discriminação em relação à sua condição peculiar de adotado.

Distinção estar-se-ia fazendo, isto sim, na hipótese de não permitir ao adotado a busca da sua verdade biológica, o que, repita-se, de forma alguma interage no relacionamento estabelecido entre adotante e adotado.

Ademais, ao estabelecer o art. 41 do ECA que a adoção desliga o adotado de qualquer vínculo com pais ou parentes, por certo que não tem a pretensão de extinguir os laços naturais, de sangue, que perduram por expressa previsão legal no que concerne aos impedimentos matrimoniais, demonstrando, assim, que algum interesse jurídico subjaz.

Por outro lado, há de se respeitar a necessidade psicológica do conhecimento da verdade biológica, amplamente albergada pelo ECA, conforme já exposto, de acordo com os lindes do art. 27.

Não se deve concluir que o referido dispositivo alcança apenas aqueles investigantes que não foram adotados, porque jamais a interpretação da lei pode dar ensanchas a decisões discriminatórias, excludentes de direitos de cunho marcadamente indisponível e de caráter personalíssimo, sobre cujo exercício não pode recair nenhuma restrição, como ocorre com o Direito ao reconhecimento do estado de filiação.

Sob tal perspectiva, tampouco poder-se-á restringir ou até mesmo eliminar, como o fez o Tribunal de origem, o direito do filho de pleitear alimentos do pai assim reconhecido na investigatória, não obstante a letra do art. 41 do ECA.

Em complemento, retira-se do § 1º do art. 41 do ECA que, ao regular hipótese diversa, ressalva a subsistência do vínculo entre o adotado e o cônjuge ou concubino do adotante, quando este adota filho do companheiro. Em raciocínio não muito diverso enquadra-se o dilema da recorrente que, tendo apenas o nome da mãe biológica em seu registro, vem a ser adotada unicamente por uma mulher.

Aqui reside a peculiaridade do processo em julgamento e norteadora da tese jurídica abraçada: não há vínculo anterior, com o pai biológico, para ser rompido, simplesmente porque jamais existiu tal ligação, notadamente, em momento anterior à adoção. Ressalte-se que tal raciocínio é imanente à natureza da investigatória de paternidade, porquanto busca tal ação declarar a existência de vínculo ocultado do investigante e, portanto, inexistente em qualquer momento da vida deste, em especial, anterior à formulação do pleito.

Acresça-se à premissa anterior, que não se deve impedir uma pessoa, qualquer que seja sua história de vida, tenha sido adotada ou não, de ter reconhecido o seu estado de filiação, nos termos em que dispõe o art. 27 do ECA.

Extrai-se, por fim, do Parecer exarado pelo i. Subprocurador-Geral da República, Henrique Fagundes Filho, percuciente consideração:

(fl. 345) – "(…) Imagine-se a satisfação do genitor imoral e insensível ao ser obsequiado com a adoção de seu rebento renegado, não lhe restando, assim, nenhuma responsabilidade sobre aquele, quer moral, quer patrimonial. Melhor solução não haveria a pessoas dessa índole.

A irrevogabilidade da adoção e a extinção dos vínculos com a família biológica, não foram concebidas, por evidente, para premiar o progenitor irresponsável, ausente, imoral, que pretende escapar das conseqüências advindas de seus atos de instinto fisiológico, tão somente. A intenção da norma é prestigiar as situações familiares consolidadas.

Ora, no caso vertente, a insubsistência dos laços de parentesco consangüíneos apenas beneficia o genitor desidioso, não protege a recorrente, muito menos a adotanda, tomando a norma contornos para os quais não foi concebida, não atingindo os fins sociais para os quais se destina.

Desta feita, ainda que se entenda dever subsistir a adoção da recorrente, não é possível obstar que conheça quem é seu pai biológico, exigindo dele o cumprimento dos deveres concernentes a esse estado."

Consideradas as peculiaridades do processo, notadamente aquela atinente à inexistência de anterior vínculo com o pai, deve prevalecer, portanto, o disposto no art. 27 do ECA, no sentido de se admitir amplamente o reconhecimento do estado de filiação e suas conseqüências jurídicas, inclusive patrimoniais, sempre em benefício da criança ou do adolescente, dispositivo esse que foi vulnerado pelo acórdão recorrido.

Ressalte-se, quanto ao dissídio jurisprudencial, que não há similitude fática entre os acórdão alçados a paradigma e o julgado ora impugnado, o que impõe o conhecimento do recurso especial tão-somente pela alínea "a".

Forte em tais razões, CONHEÇO do recurso especial, pela alínea "a" do permissivo constitucional e, DOU-LHE PROVIMENTO para cassar o acórdão recorrido e restabelecer a decisão interlocutória que deferiu os alimentos provisionais à recorrente.

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO FILHO: Trata-se de pedido de vista formulado em processo de relatoria da eminente Ministra Nancy Andrighi, cujo ponto nodal da controvérsia está em definir se o pai reconhecido como tal em exame pericial pelo método DNA, nos autos de ação de investigação de paternidade, deve prestar alimentos à filha que foi anteriormente adotada por uma viúva, com a qual reside atualmente.

Após relatar o feito, a ilustre Ministra proferiu seu voto no sentido de conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, para cassar o acórdão recorrido e restabelecer a decisão interlocutória que deferiu os alimentos provisionais à recorrente.

Estou de acordo, pois compartilho do mesmo entendimento exarado pela douta relatora, no sentido de que deverão ser preservados os interesses do menor, que sobrelevam a qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado, na linha, inclusive, da jurisprudência desta Corte, citada no seu voto.

Cabe, ainda, considerar as doutas ponderações emitidas pelo parquet federal, que bem elucidou a questão, assim arrematando:

"Desta feita, ainda que se entenda dever subsistir a adoção da recorrente, não é possível obstar que conheça quem é seu pai biológico, exigindo dele o cumprimento dos deveres concernentes a esse estado." (fls. 344⁄345)

Destarte, acompanho, integralmente, a conclusão da eminente relatora, dando provimento ao recurso.

É o voto.


FONTE:  STJ, julgado em 16 de agosto de 2007.

Estelionato educacional

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EDITORIAL:  JFSP  –  O editorial "Estelionato educacional" foi publicado hoje (28) no jornal Folha de S.Paulo:

"O Ministério da Educação (MEC) ameaça punir 89 (17,5%) dos 510 cursos de direito avaliados pela instituição. Estão com a corda no pescoço as faculdades que obtiveram notas 1 e 2 (numa escala que vai até 5) no Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), que avalia o conhecimento de universitários, e no IDD, que indica quanto conhecimento as escolas conseguiram transmitir.

Os cursos que foram para o índex terão de passar por um processo de supervisão. Têm prazo de dez dias para traçar um diagnóstico de seus problemas e propor providências. Se o MEC as considerar insuficientes, poderá dar início a um processo administrativo com previsão de sanções que vão da redução das vagas até o fechamento da escola.

Já não era sem tempo de o ministério tomar uma atitude mais incisiva. Há anos proliferam no mercado educacional brasileiro verdadeiras arapucas, incapazes de fazer seus alunos aprenderem, mas muito eficientes na hora de cobrar mensalidades.

No passado, o MEC já tentou -sem muito sucesso- enquadrar as escolas com renitente história de fracasso. Espera-se que, desta feita, tenha êxito.

Cursos perigosamente ruins devem ser extintos por duas razões. Representam violação aos direitos do consumidor de seus alunos, que estão comprando gato por lebre, e constituem, em princípio, uma ameaça à ordem pública, ao despejar no mercado profissionais incompetentes.

No caso específico do direito, tal efeito até que é mitigado pela exigência de exame de habilitação imposto pela Ordem dos Advogados do Brasil. Se não forem aprovados no teste da OAB, os bacharéis não poderão advogar.

Só que o mesmo filtro não existe para outras carreiras, como medicina -próximo alvo do MEC-, nas quais as conseqüências do despreparo podem ser ainda mais devastadoras."

 


FONTE:  OAB-DF, 28 de setembro de 2007

STJ nega homologação de sentença que previa apenas juízo estrangeiro em caso de litígios

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DECISÃO:  STJ   – A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o recurso de G.L., cidadão canadense, contra a decisão do Tribunal que rejeitou pedido de homologação de sentença estrangeira. A homologação foi negada pelo STJ porque previa a renúncia das partes à jurisdição brasileira em caso de ações futuras sobre a guarda dos filhos do casal que se separou. O processo foi relatado pelo presidente do STJ, ministro Raphael de Barros Monteiro Filho, e a decisão da Corte foi unânime.

No recurso, G.L. reiterou seus argumentos favoráveis à homologação da sentença porque seria resultado de acordo firmado entre as partes – ele e a ex-esposa R.M., cidadã brasileira. O acordo, segundo G.L., estaria definindo o regime de guarda compartilhada dos filhos do casal e a visitação aos menores. A sentença estrangeira também teria considerado o domicílio dos menores à época, que, como os pais, residem no Canadá.

Para o ministro Barros Monteiro, relator do processo, ao contrário do alegado pelo recorrente (G.L.) – no sentido de que a decisão estrangeira sujeita à homologação se refere, basicamente, à cláusula que definiu a guarda compartilhada dos menores –, “o acordo homologado pela Corte Canadense elegeu o Tribunal Superior de Quebec, Comarca Judiciária de Montreal, como foro competente para decidir as questões que, por acaso, surjam a respeito da guarda dos filhos”.

Segundo o ministro, “a própria sentença faz referência ao ‘Acordo sobre a jurisdição do Tribunal’”. Diante disso, para o relator, “a renúncia à jurisdição brasileira para apreciar litígios futuros relativos à guarda mostra-se, portanto, inequívoca; bem como flagrante a ofensa à soberania nacional e à ordem pública”. O voto do relator foi acompanhado por todos os membros da Corte.

O presidente do STJ citou trechos da decisão contestada por G.L. com destaque ao parecer do Ministério Público, desfavorável ao pedido de homologação da sentença por entender inadmissível a renúncia à competência da Justiça brasileira. “Como bem ressaltou o representante do Parquet (MP), ‘o caso é de competência concorrente e não absoluta, o que não impede, se for o caso, de a justiça brasileira, se provocada, manifestar-se sobre a questão, principalmente quando envolve menor”, salientou o Ministério Público.


FONTE:  STJ, 28 de setembro de 2007.

A Participação Popular na Gestão Pública como razão constituinte do Estado Democrático de Direito

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*Bruno José Ricci Boaventura

I.  Introdução

O Poder é uno e indivisível, e o exercício de todas as suas funções, inclusive as precípuas, devidamente distribuídas, obedecem ao interesse público, pois é esta a norma fundamental da Administração Pública como reflexo da norma constitucional fundamental da sistematicidade jurídica: todo poder emana do povo[1].

A clareza da linguagem do Poder é quando podemos com clareza afirmar aquilo que está do que não está de acordo com o direito, como bem elucidou Luhmann[2]

Conjugando a detenção do poder do povo com a necessidade de clareza do poder, temos, indubitavelmente, a base da formação do Estado Democrático de Direito, que conforme Lênio Luiz Streck, será concretizada com a participação popular:

“Já a forma/modelo de Estado Democrático de Direito está assentado nos dispositivos que estabelecem os mecanismos de realização da democracia – nas suas diversas formas – e dos direitos fundamentais. Não esquecemos que o Estado Democrático de Direito constitui uma terceira forma de Estado de Direito exatamente porque agrega um plus às formas anteriores (Liberal e Social), representado por esses dois pilares: democracia e direitos fundamentais. Assim, o art. 1º estabelece que o Brasil é uma República que se constitui em Estado Democrático de Direito. A soberania popular, prevista no parágrafo único do art. 1º, é o sustentáculo do Estado Democrático, podendo ser exercida sob diversas formas, inclusive diretamente, tudo ancorado no pressuposto do pluralismo político garantido pela Lei Fundamental.”[3](Grifo nosso)

A previsão de participação popular em todos os atos decisivos no exercício do poder é justamente a diferença entre o mero Estado de Direito, e um concreto Estado Democrático de Direito, conforme leciona Carlos Ari Sunfeld[4].

Assim o fluxo de diretrizes do Estado, deixou de ser meramente burocrática, para atingir o nível democrático, no qual as ordens partem de baixo para cima e não de cima para baixo, como bem já descreveu José de Albuquerque Rocha[5].

Assim ao estabelecer os critérios para caracterização de todo e qualquer processo democrático Robert Dahl coloca como indispensável a possibilidade do controle do programa de planejamento governamental pela comunidade: “Os membros devem ter a oportunidade exclusiva para decidir como e, se preferirem, quais as questões que devem ser colocadas no planejamento.”[6]

A evolução atual do Estado, com a inserção do modo democrático organizativo, aprimorou os mecanismos de fiscalização pela sociedade, caracterizando como de importância fundamental. Para a concretização do controle social, como sucedâneo da participação popular, é imperioso que exista a transparência dos atos governamentais. É inadmissível no Estado Democrático de Direito que o governo fique enclausurado, hermético, sem dar satisfação de seus atos, estes são os ensinamentos de Hélio Saul Mileski[7].

O controle social emerge como imperativo de estatura constitucional, mas não pode receber contornos apenas teóricos, mas sim uma expansiva vinculação ético-jurídica entre a atuação do controlador social e a daqueles que exercem poderes-deveres no seio do aparato estatal, como já bem ressaltou Juarez Freitas[8].

A cidade como a nação vive o descalabro da miséria em algumas localidades, e a riqueza em outras poucas, portanto para que possamos melhor distribuir a riqueza com o equacionamento da divisão do bolo arrecadado necessitamos basearmos em indicadores objetivos, como o próprio Índice de Desenvolvimento Humano – IDH.

Assim o Estado Democrático de Direito Social, última versão filosófica da tentativa do homem dar ao homem aquilo que minimamente o homem precisa (princípio da dignidade humana), incluiu em seu bojo mecanismos de transparência, participação popular e controle social. 

II. A Participação popular na gestão pública

A participação popular deve estar inserida na gestão da cidade, somente com esta inclusão de forma efetiva dos cidadãos nas tomadas das decisões poderemos ter um comprometimento social com o próprio desenvolvimento, conforme coloca Janaína Rigo Santin.[9]

O princípio da participação popular, com o advento da Constituição Federal de 1.998, norteia toda a organização da Administração Pública, tem como características ser implícito, derivado e estruturante, como bem leciona Evandro Martins Guerra e Manuella Lemos Ribeiro[10]. 

Gilmar Ferreira Mendes destaca, de muitos, dois efeitos positivos da participação popular quanto a elaboração dos instrumentos de responsabilidade fiscal: o primeiro deles é a maior legitimidade que adquirirão tais instrumentos, uma vez que sua confecção foi feita com respaldo da sociedade; o segundo tem a ver com o fato de que os esboços de tais instrumentos podem ser maximizados em sua qualidade com a interação entre sociedade e Poder Público, tanto porque, diversas vezes, este não possui a devida acuidade para perceber as carências sociais, tanto porque, tecnicamente, eles podem ser aprimorados com a colaboração dos diversos entes sociais.[11] 

A Constituição Estadual de Mato Grosso, por exemplo, evidencia-a no inciso VI do artigo 3º, e no inciso V e do artigo 5º como objetivo prioritário do Estado, acredito que entendido como de uma forma a integrar o próprio Município, a participação social nas decisões como forma efetiva de aperfeiçoamento democrático das instituições[12]. 

A Lei Federal no 10.257, de 10 de julho de 2001, que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal estabelece diretrizes gerais da política urbana e dá outras providências, estabelece, para efeitos de analogia, na alínea f) do inciso III do artigo 4º a gestão orçamentária participativa. Já nos incisos II e IV do artigo 43 que a gestão democrática da cidade realiza-se através de debates e consultas públicas, inclusive com a iniciativa popular de planos de desenvolvimento[13].

A participação efetiva das comunidades na elaboração dos planos já é realidade em muitas cidades do Brasil, e principalmente nos países ditos desenvolvidos, mas como ressalta a obra coordenada por Flávio da Cruz, para que se torne prática seria necessário incentivar, e uma Lei específica é um importante meio para tal fim[14].

Ruy Samuel Espíndola esclarece a existência do princípio da legitimidade da despesa pública como um dos setoriais da administração pública:

“O Princípio da Legitimidade está previsto no artigo 70, caput, da Constituição Federal. Por ele, nosso Direito positivou, de forma mais peremptória, um olhar mais substancialista, material, não meramente formal por sobre os atos administrativos e sua fiscalização. Nele se fundamenta a necessidade de o Administrador consultar a aspiração geral, a vontade dos cidadãos, auscultar suas carências e desejos vertidos em interesse público. Atos, despesas e receitas legítimas são aquelas que atendem aos anseios populares, anseios estes, em uma federação, medidos em cada unidade federativa, em cada povo nela existente. (…) Também esse princípio é paramétrico no controle de constitucionalidade, servindo de invalidação às leis que lhe contrariem o significado.”[15] (grifo nosso).

Assim a participação popular na definição da priorização dos investimentos estará legitimando diretamente a despesa pública como gasto de interesse público.

III. O Controle social como efeito da participação popular

A razão de existir do controle social é bem explicada por José de Ribamar Caldas Furtado como uma questão de direito natural, pois todo aquele que administra coisa alheia fica naturalmente obrigado a prestar contas ao verdadeiro proprietário[16].

A res sendo pública é natural que todos aqueles que a administram prestem contas ao restante da sociedade. È direito de todos os administrados por deterem a legitimidade de escolha dos administradores controlarem a administração, exigindo que o bem público seja finalisticamente usado somente para atendimento do interesse público.

O controle social está inserido no texto magno, entre outros, no inciso XXXIII, do artigo 5º[17]. A Lei Orgânica do Município de Cuiabá traz em seu bojo as diretrizes básicas para a orientação do planejamento municipal, e no inciso I do artigo 94 está a necessidade de democracia e transparência na elaboração, já no inciso II o interesse social como questão a ser considerada[18]. A Constituição Estadual também prevê que a sociedade terá função corregedora sobre o exercício das funções públicas[19].

Um dado que exemplifica a tomada desta consciência é a Carta dos Procuradores Municipais Brasileiros que em 2001 na cidade de Foz do Iguaçu declararam que o controle social do orçamento público é indispensável para dar cumprimento à Constituição e à Lei de Responsabilidade Fiscal, devendo ser assegurado pelos agentes públicos, adotando-se uma gestão plenamente democrática e participativa.

IV. A transparência fiscal como objetivo da participação popular

A transparência fiscal como aprofundamento evolutivo setorial do princípio da publicidade é própria do regime democrático. Em uma democracia a disponibilização da informação para a livre discussão é um componente jurídico prévio necessário para tomada da decisão que afeta a coletividade e é imprescindível para sua legitimação, como pondera Têmis Limberger[20]. O sigilo torna-se uma exceção de caráter estrito, somente possível quando o próprio interesse público, diante da divulgação da informação corre um grave risco, como nos casos de segurança nacional.

A transparência fiscal como efeito especifico no orçamento do princípio constitucional da publicidade, pode ser detalhadamente consubstanciada no parágrafo 2º do artigo 16 da Constituição Estadual[21]. A Lei Orgânica Municipal também descreve com especificidade que o Município organizará toda a sua contabilidade de forma transparente[22].

A Lei Complementar n.º 101/2000, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, no parágrafo único do artigo 48 estabelece que a transparência será assegurada mediante incentivo à participação popular durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos[23].

O artigo 74 da Constituição Federal traz os conceitos de eficiência e eficácia inseridos no sistema de controle interno, mas não determina especificadamente tal abrangência[24]. Os princípios basilares do presente projeto, da efetividade, eficiência e eficácia, são conceitos já difundidos pelo Tribunal de Contas da União no auxílio da ação fiscalizadora junto ao Poder Executivo.

Os fins pretendidos com a transparência fiscal são exatamente a efetividade da gestão pública, a eficiência administrativa e a eficácia dos gastos públicos. Estes conceitos apesar de não serem determinados em outras normas, estão implicitamente ou explicitamente previstos, como no inciso II do artigo 94 da Lei Orgânica Municipal de Cuiabá[25].

A avaliação da efetividade refere-se ao exame da relação entre a implementação de um determinado programa e seus impactos e/ou resultados, isto é, seu sucesso ou fracasso em termos de uma efetiva mudança nas condições sociais prévias da vida das populações atingidas pelo programa sob avaliação, como bem ensina Ieda Frasson[26], trazendo este conceito para a elaboração do orçamento temos a efetividade da gestão pública como a capacidade de atendimento das reais prioridades sociais.

A eficiência administrativa seria a capacidade de promover os resultados pretendidos com o dispêndio mínimo de recursos, por isso, determina-se que um projeto torna-se mais eficiente quanto menor for a relação custo/benefício para o atingimento dos objetivos estabelecidos no projeto, como coloca Frasson.

Já na avaliação de eficácia, analisa-se até quais pontos estão sendo alcançados os resultados, representando assim a “medida do grau em que o programa atinge os seus objetivos e metas”, e por esta razão que o presente projeto tem a  eficácia dos gastos públicos como a capacidade de promover os resultados pretendidos com o alcance máximo da meta traçada.

V. O Combate a corrupção como causa da Participação Popular

A Associação Amigos de Ribeirão Bonito – AMARRIBO, entidade destacada nacionalmente pela difusão do combate a corrupção, ao elaborar uma Cartilha colocou que um dos sinais de acontecimento de corrupção na Administração Municipal é o alheamento da comunidade quanto ao processo orçamentário[27]. Ao inversamente considerarmos tal assertiva temos que quanto mais o processo de elaboração do orçamento for transparente, com a participação e sucessivo controle social teremos um maior combate a corrupção.

Este modo preventivo de combate a corrupção pelo controle social já é defendido pela Organização das Nações Unidas – ONU, através da Convenção contra a corrupção, assinada em 11 de dezembro de 2.003 na cidade mexicana de Mérida[28].

No artigo 5º da convenção, sobre políticas e práticas de prevenção da corrupção, há a obrigação dos Estados signatários de formular políticas que promovam a participação da sociedade na gestão dos assuntos e bens públicos.

Já no artigo que trata sobre a informação pública, o artigo 10º, temos que o Estado Parte adotará medidas que sejam necessárias para aumentar a transparência em sua administração pública, inclusive no relativo a organização e funcionamento dos processos de decisões. Neste dispositivo existem algumas medidas que poderiam ser tomadas como: a instauração de procedimentos ou regulamentações que permitam ao público em geral obter, quando proceder, informação sobre a organização, o funcionamento e os processos de adoção de decisões de sua administração pública, com o devido respeito à proteção da intimidade e dos documentos pessoais, sobre as decisões e atos jurídicos que incumbam ao público.

VI. Apontamentos Conclusivos

O alcance prático da participação popular deve estar inserido em todos os meandros do poder público, salvo aquele em que o próprio interesse público corre risco como nos caso de segurança nacional. Seria de todo modo ilógico em um Estado Democrático de Direito faz qualquer tipo de indiferença a participação popular na gestão da coisa pública. 

Além das possibilidades jurídicas concretas de participação popular temos que conquistar a consciência de todos gestores do poder público de que o fim último do Estado é alcançar a justiça social.

 


 

NOTAS

[1] Hely Lopes Meirelles retrata tal realidade: “Referimo-nos à função precípua de cada Poder de Estado porque, embora o ideal fosse a privatividade de cada função para cada Poder, na realidade isso não ocorre, uma vez que todos os Poderes têm necessidade de praticar atos administrativos, ainda que restritos à sua organização e ao seu funcionamento, e, em caráter excepcional admitido pela Constituição, desempenham funções e praticam atos que, a rigor, seriam de outro Poder. O que há, portanto, não é separação de poderes com divisão absoluta de funções, mas, sim, distribuição das três funções estatais precípuas entre órgãos independentes, mas harmônicos e coordenados no seu funcionamento, mesmo porque o poder estatal é uno e indivisível”. In: Direito Administrativo Brasileiro. 24.ed. São Paulo: Malheiros, 1999. p. 55-56. 

[2] “O poder é, «por natureza», difuso e flutuante. Só com o recurso à distinção entre o poder de acordo com o direito ou em oposição a ele é que se pode ter uma alternativa clara.” In: O Poder, trad. Martine Creusot Martins, Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1992. p.29.

[3] Jurisdição Constitucional e Hermenêutica. 2ª ed. RJ: Forense, 2004 . p.86.

[4] “O mero Estado de Direito decerto controla o poder, e com isso protege os direitos individuais, mas não garante a participação dos destinatários no seu exercício.” In: Fundamentos do Direito Público. 4ª ed. SP:Malheiros. 2003. p.49 

[5] “Nesse sentido vamos fazer uma corte na realidade, isto é, vamos reduzir os inúmeros tipos de organização de poder existentes na realidade, para trabalharmos com apenas dois tipos de organizar o exercício do poder: o burocrático e o democrático. Portanto, para nossos fins, as organizações, do ponto de vista do exercício do poder, ou são burocráticas ou democráticas. As burocracias se caracterizam pelo fato de o poder ser hierarquizado, significando que o exercício do poder está condicionado ao lugar que a pessoa ocupa na organização. Portanto, o poder de mando nas organizações burocráticas decorre do posto que se ocupa nela, de uma relação superior-inferior. Em síntese, a burocracia é o modo de exercício do poder em que este desce dos governantes para os governados, de cima para baixo. As organizações democráticas, ao contrário, se caracterizam pelo fato de o poder derivar da participação política dos interessados na formação dos órgãos de poder, de modo que nem governa o faz em nome de todos, ou da maioria. Em síntese, a democracia é modo de exercício do poder em que este sobe dos governados para os governantes, de baixo para cima (Bobbio)” In: Estudos sobre o Poder Judiciário. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 40.

[6] In: Sobre a Democracia. Tradução de Beatriz Sidou. Brasília: UNB. 2001. p.49.

[7] “Com a evolução do Estado, não foram traçados somente novos parâmetros no relacionamento com a sociedade, posto que, em decorrência desses inovadores fatores de ação do Estado, também foram propiciados avanços para os sistemas de controle, com aprimoramento dos mecanismos de fiscalização e surgimento de novos meios de controle, no sentido de ser dada a transparência necessária aos atos governamentais, de onde defluem o surgimento e o fortalecimento do controle social. Portanto, modernamente, no novo tipo de Estado, um Estado democrático de direito e, sobretudo, policrático, o controle social passou a ter importância fundamental para o sistema de fiscalização, que deve ser exercido sobre uma administração imbuída de caráter gerencial. Nesse contexto inovador, o controle social assume aspecto relevante, na medida em que possibilita obtenção de uma maior amplitude ao controle que deve ser exercido sobre a Administração Pública, funcionando como um aliado do Controle Oficial. (…) Transparência, participação popular e controle social estão intimamente interligados e decorrem de um mesmo fator, o Estado moderno, um Estado policrático, que resultou no Estado Democrático de Direito. (…) Nesse contexto, para que haja participação popular, imperiosamente impõe-se a existência de transparência dos atos governamentais.” In: Controle Social: um aliado do controle oficial. Revista Interesse Publico n. 36. Porto Alegre: Notadez. 2066, p. 86.

[8] “Logo, o controle social emerge como imperativo de estatura constitucional, decorrente do princípio maior da democracia, mas nem sempre daí têm decorrido as várias implicações práticas.  (…) Ora bem, o controle social, para fazer jus ao conceito esposado, não pode ser de fachada ou simples ornamentação de estruturas avessas à cidadania protagonista, sendo incompatível com meras discussões ou audiências públicas concebidas, de antemão, para a esterilidade. Essencial, pois, a conquista de autêntica verticalização inclusiva, isto é, de uma expansiva vinculação ético-jurídica entre a atuação do controlador social e a daqueles que exercem poderes-deveres no seio do aparato estatal.” In: O princípio da democracia e o controle do orçamento público brasileiro. Revista Interesse Público Especial. Porto Alegre: Notadez, 2002. p.12.

[9] “Enfim, o processo de gestão democrática na cidade somente será possível através da articulação entre Poder Público e cidadãos, através de mecanismos que devem ser implantados gradativamente e de forma organizada. É preciso possibilitar que a tomada de decisões seja feita por todos, com iguais oportunidades, o que ocasionará a racionalização de recursos e a redescoberta da cidadania em cada um, levando a um maior comprometimento com o social. Só assim ter-se-á uma gestão democrática participativa, de todos e para todos, construindo uma cidade mais humana e mais digna de se viver.” In: O estatuto da cidade e a gestão democrática municipal. Revista Interesse Público n.º 21. Porto Alegre: Notadez, 2003. p.221.

[10] “Como corolário, o nosso ordenamento jurídico, em especial a CR/88, consagrou um novo princípio de organização da Administração, a participação popular. Esse princípio pode ser caracterizado como: implícito, pois não se encontra arrolado no caput do art. 37 ou em qualquer norma constitucional de forma expressa, mas é desvendado a partir da combinação de diversas normas constitucionais (art. 37, § 3º, art. 10, art. 29, X etc.); Além disso é também derivado (subprincípio), pois conectado a outros princípios constitucionais (…), e estruturante da atividade da Administração Pública em diversos graus, pois conduz à formação de processos de decisão e de divisão de funções.” In: O orçamento participativo como instrumento de gestão democrática do município. Revista do Administrador Público: Governet. Publicado no Boletim de Orçamento e Finanças de julho de 2007. p. 612

[11] In: Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. Ives Gandra da Silva Martins, Carlos Valder do Nascimento. (orgs.). SP:Saraiva, 2001. p.339.

[12]Art. 3º – São princípios fundamentais e constituem objetivos prioritários do Estado: (…)  VI – a efetivação da participação popular na elaboração das diretrizes governamentais e no funcionamento dos Poderes; (…) Art. 5º – A soberania popular será exercida: (…) V – pela participação nas decisões do Estado e no aperfeiçoamento democrático de suas instituições;

[13] “Art. 4o Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos: (…) III – planejamento municipal, em especial: f) gestão orçamentária participativa; (…) Art. 43. Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados, entre outros, os seguintes instrumentos: II – debates, audiências e consultas públicas; IV – iniciativa popular de projeto de lei e de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;”

[14] In: Lei de responsabilidade fiscal comentada. Flávio da Cruz (coord.). 2ª ed. SP: Atlas, 2001. P.142 e 144.

[15] Revista Interesse Púbico nº 21. Porto Alegre: Notadez, 2003. p.79.

[16] “Essa relação jurídica deriva do direito natural; é obrigação universal, vale para todos e em toda parte; é incumbência imutável, não se podendo nem cogitar da sua dispensa; é dever que é, pela própria natureza; decorre da racionalidade humana, da ordem regular das coisas; é preceito bom, a priori, não por vontade da lei; não por ser útil, mas por determinação da própria natureza do ato de administrar coisa alheia; é imposição da própria consciência e não da vontade do legislador. É essa força que impulsiona o síndico do condomínio de um edifício a prestar constas de sua gestão, e até mesmo uma criança a informar ao tio o preço do sorvete, justificando o valor do troco devolvido. Quem movimenta recursos alheios tem não apenas a obrigação, como também o direito de prestar contas. Não existe responsabilidade por administração de recurso alheio sem o respectivo dever de prestar contas; assim como não há o dever de prestar contas sem a correlativa responsabilidade por gerência de recurso alheio. Como são institutos jurídicos absolutamente dependentes um do outro, indissociáveis, correlatos, é fácil concluir que o agente que gerencia interesses de terceiros – o responsável – será sempre o mesmo que estará obrigado a prestar contas, ou seja, o titular da prestação de contas. São aspectos distintos, porém resultantes do mesmo fato gerador, qual seja, a gerência de bens de terceiros. De um modo geral, pode-se dizer que a prestação de contas, que deve ser instruída com os documentos justificativos, consiste na discriminação da universalidade das receitas e despesas, concernentes a uma administração de bens, valores ou interesses de outrem, em um determinado período, efetivada por força de lei ou contrato. É obrigação que emana do princípio universal de que todos aqueles que administram bens alheios, ou os têm sob a sua guarda, têm o dever de acertar o resultado de sua gestão; é decorrência natural do ato de gerir o que não é seu.” In: Os regimes de contas públicas: contas de governo e contas de gestão. Revista Interesse Público n.º 42. Porto Alegre: Notadez, 2007. p.344.

[17] “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes(…) XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado;

[18]Art. 94 O Planejamento Municipal deverá orientar-se pelos seguintes princípios básicos: I – democracia e transparência na sua elaboração e no acesso às informações disponíveis; IV – viabilidade técnica e econômica das proposições, avaliada a partir do interesse social da solução e dos benefícios públicos;

[19]Art. 5º – A soberania popular será exercida: (…) VI – pela ação corregedora sobre as funções públicas e as sociais de relevância pública.

[20] “Assim, o que distingue o poder democrático do poder autocrático é que apenas o primeiro, por meio da livre crítica, pode desenvolver em si mesmo os anticorpos e permitir formas de desocultamento. A democracia como poder visível, que permite ao cidadão o controle por parte de que quem detém o poder. A informação possui uma nota distinta no Estado Democrático de Direito se comparado ao modelo liberal. Para este último, é uma conseqüência política do exercício de certas liberdades individuais. Nos Estados democráticos, a livre discussão é um componente jurídico prévio à tomada de decisão que afeta a coletividade e é imprescindível para sua legitimação. (…) O ordenamento jurídico no Estado democrático se assenta no princípio geral da publicidade, devendo o sigilo ser excepcional e justificado. Esse preceito é extraído com base no princípio da publicidade e do direito a ser informado do cidadão.” In: Transparência administrativa e novas tecnologias:  o dever de publicidade, o direito a ser informado e o princípio democrático. Revista Interesse Público n.º 39. Porto Alegre: Notadez, 2006. p.73.

[21]Art. 16 – Todos têm direito a receber informações objetivas de interesse particular, coletivo ou geral, acerca dos atos e projetos do Estado e dos Municípios, antes de sua aprovação ou na fase de sua implementação § 2º – Os documentos que relatam as ações do Poder Público do Estado e dos Municípios serão vazados em linguagem simples e acessível à população.”

[22]Art. 107 O Município organizará a sua contabilidade de modo a evidenciar, com transparência, os fatos ligados à administração financeira, orçamentária, patrimonial e industrial.”

[23] “Art. 48. (…) Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.”

[24] “Art. 74. Os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário manterão, de forma integrada, sistema de controle interno com a finalidade de: (…) II – comprovar a legalidade e avaliar os resultados, quanto à eficácia e eficiência, da gestão orçamentária, financeira e patrimonial nos órgãos e entidades da administração federal, bem como da aplicação de recursos públicos por entidades de direito privado”

[25]Art. 94 O Planejamento Municipal deverá orientar-se pelos seguintes princípios básicos:(…) II – eficiência e eficácia na utilização dos recursos financeiros, técnicos e humanos disponíveis;”

[26] In: Critérios de eficiência, eficácia e efetividade adotados pelos avaliadores de instituições não-governamentais financiadoras de projetos sociais. Disponível em: http://teses.eps.ufsc.br/defesa/pdf/4951.pdf. Acessado em: 12 de setembro de 2.007.

[27] In: O Combate à Corrupção nas prefeituras do Brasil. Disponível em: http://www.amarribo.org.br/mambo/images/stories/organizar/ocacnpdb3ed.pdf. Acessado em 10 de setembro de 2.007.

[28] Disponível em: http://www.unodc.org/pdf/brazil/ConvONUcorrup_port.pdf. Acessado em 10 de setembro de 2.007.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Bruno José Ricci BoaventuraProfissão e qualificações; advogado militante em Cuiabá em direito público, sócio-gerente da Boaventura Advogados Associados S/C; Especialista em Direito do Estado, com ênfase em Constitucional, pela Escola Superior de Direito de Mato Grosso.

 

 

 

A multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC

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* Moacir Leopoldo Haeser

       A execução da sentença condenatória sempre gerou grandes reclamações, especialmente das partes, pessoas leigas, que não compreendiam como era possível que, tendo o Poder Judiciário reconhecido seu direito e condenado o réu ao cumprimento da obrigação, necessitassem ingressar com novo processo, com todos os seus percalços, para alcançar a efetividade de seu direito, já reconhecido.

          Parecia que a lei privilegiava o devedor recalcitrante em detrimento do direito do credor, pois permitia-lhe postergar o pagamento através da prática de atos processuais que, embora lícitos, acabavam por fazer arrastar-se a execução (nomeação de bens à penhora,embargos, impugnação da avaliação, formalidades da arrematação etc.). Além disso, o leilão acabava desmoralizado e esvaziado pela possibilidade, sempre presente, de invocação de nulidades, embargos de terceiro e remição dos bens, o que afastava possíveis interessados.

          A reforma processual, portanto, caminhou no sentido de agilizar, simplificar e dar efetividade à sentença, ou seja, transformar aquela peça processual, que reconhece um direito e condena um devedor, em efetiva entrega do bem da vida que, através do processo, buscava o prejudicado, seja dinheiro ou outro bem/direito.

          A simplificação do procedimento e as alternativas da forma de alienação dos bens penhorados, a antecipação da possibilidade de adjudicação e remição, são apenas algumas delas. Outra, fundamental, é o sincretismo de procedimento, seguindo-se ao processo de conhecimento a fase executória da sentença, estabelecendo a exigência de espontaneidade de cumprimento da sentença judicial condenatória.

          O intérprete das novas normas deve fazê-lo tendo em vista essa ótica: a simplificação e eficiência do processo, como fim instrumental de alcançar ao titular do direito, de forma efetiva, o bem da vida buscado. O autor não busca a prestação jurisdicional para emoldurar a bela sentença que reconhece seu direito, mas para obter o resultado prático e concreto que dela resulta.

          O art.475-J do Código de Processo Civil, introduzido pela Lei n° 11.232, prevê MULTA para o caso do devedor, condenado ao pagamento de valor já definido, não o efetuar no prazo de 15 dias. Trata-se de incentivo ao cumprimento espontâneo da condenação, evitando-se a sobrecarga do Poder Judiciário e a postergação do direito do credor, punição pela recalcitrância e efeito da sentença condenatória, ope legis:

          Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação

          O termo da contagem do prazo tem gerado alguma controvérsia na doutrina, porém aos poucos vai se assentando o melhor entendimento de que o prazo decorre automaticamente do trânsito em julgado.

          Alguns têm defendido que corre da sentença ou do acórdão (Apelação Cível Nº 70017661646, 17ª Câmara Cível, TJRS) – o réu pode recorrer ou cumprir o julgado – se assumiu o risco de recorrer e o recurso foi improvido, incorre na multa – solução que não me parece a mais adequada.

          Outros, que a multa exigiria o retorno dos autos ao Juízo de origem e a intimação pessoal do devedor (art. 557, CPC), não só do seu advogado (Agravo Interno Nº 70018256347, Décima Segunda Câmara Cível, TJRS), invocando-se as dificuldades práticas de emissão da guia de pagamento, a impossibilidade de impor-se ao procurador o ônus de cientificar o outorgante e a finalidade coercitiva da multa.

          Com a devida vênia aos que pensam de forma diversa, não tenho dúvidas de que o legislador deu efetividade à sentença, exigindo jurisdicionalmente o pagamento tão logo cesse a possibilidade de modificação do julgado, pelo trânsito em julgado ou estabelecido o valor a ser pago, se necessária liquidação. O cumprimento da condenação não é um interesse meramente privado do credor, mas uma exigência da jurisdição, uma decorrência da prestação jurisdicional, onde se incluem os princípios da dignidade, seriedade e efetividade da Jurisdição prestada, estas reafirmadas na possibilidade de advertência do Juiz ao devedor (arts. 599, 600 e 601, do CPC) [01].

          Assim, a multa de 10% sobre o valor do débito, estabelecida no art.475-J do Código de Processo Civil, incide automaticamente se o débito não for pago no prazo de quinze dias do trânsito em julgado da condenação, se líquida, dependente apenas de cálculo aritmético [02], ou fixada em liquidação. Tal tese foi sufragada pelo STJ no Resp n° 954859, primeira manifestação do Tribunal sobre a questão, no qual foi dito:

          "O termo inicial dos quinze dias previstos no Art. 475-J do CPC, deve ser o trânsito em julgado da sentença. Passado o prazo da lei, independente de nova intimação do advogado ou da parte para cumprir a obrigação, incide a multa de 10% sobre o valor da condenação. Se o credor precisar pedir ao juízo o cumprimento da sentença, já apresentará o cálculo, acrescido da multa. Esse o procedimento estabelecido na Lei, em coerência com o escopo de tornar as decisões judiciais mais eficazes e confiáveis. Complicá-lo com filigranas é reduzir à inutilidade a reforma processual (Resp 954859, Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS).

          A multa incide sobre o total do débito ou do saldo, quando houver pagamento parcial, e decorre do inadimplemento. Não tem cunho de direito material, mas legal. Sua incidência é ope legis e não depende de ato ou da vontade do juiz. Incide "de forma automática caso o devedor não efetue o pagamento no prazo concedido em lei", como manifesta o ex-Ministro Athos Gusmão Carneiro, em artigo na REVISTA AJURIS Nº 102, p.63, junho/2006.

          "O descumprimento da obrigação reconhecida na sentença condenatória enseja, independente de pedido da parte credora, a incidência da penalidade prevista em lei. A medida não tem sua aplicação sujeita ao arbítrio do juiz, visto que a norma é taxativa ao impor a incidência da multa no caso de não pagamento, não sendo faculdade do magistrado aplicá-la, ou mesmo deliberar acerca do percentual a ser imposto", como já afirmou o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (Agravo nº 70016938706).

          Não há que aguardar o retorno dos autos, a intimação do advogado de que os autos retornaram ou a intimação pessoal do devedor para efetuar o pagamento, pois se exige deste que, espontaneamente, cumpra a condenação imposta pela Jurisdição à qual deve submeter-se.

          A intimação do devedor, caso não tenha ocorrido o pagamento, ocorrerá, já com a multa, da penhora e avaliação, efetuada por indicação do credor, na pessoa de seu advogado, ou pessoalmente, quando poderá impugnar o valor executado, seguindo-se a alienação.

          Os problemas práticos de implantação de um novo sistema são normais e as dificuldades de pagamento devem ser solucionadas administrativamente, não devendo servir para desvirtuar a efetividade que o legislador buscou implantar.

          Nesse sentido já agiu prontamente a Corregedoria-Geral da Justiça, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que baixou o Provimento n° 20/2006 disciplinando a questão e instruindo sobre a forma de realização do depósito.

          Considerando o advento da lei federal nº 11.232/05, que acrescentou o artigo 475-J ao Código de Processo Civil, impondo multa de dez por cento àquele que, condenado ao pagamento de quantia certa ou já estabelecida em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias;

          Considerando a possibilidade de interpretação no sentido de que a fluência desse prazo se dê a partir do trânsito em julgado e quando os autos ainda se encontrem no Tribunal;

          Considerando a competência do juízo de 1º grau para os atos de cumprimento da sentença, salvo quando o processo se origine no Tribunal,

          Considerando, por fim, que a falta de regulamentação pode acarretar o direcionamento de petições ao 2º grau, gerando atos desnecessários e que possam retardar a celeridade processual pretendida a partir da alteração legislativa, artigo 475-P, incisos I e II, DO Código de Processo Civil

          Resolve prover:

          Art. 1º – a parte que pretenda promover, por sua conta e risco, depósito em conta judicial, para não responder pela multa a que alude o artigo 475-J, caput, do código de processo civil, deverá fazê-lo no juízo de 1º grau, ainda que os autos se encontrem no Tribunal, salvo nas hipóteses em que o processo seja da competência originária do Tribunal de Justiça, caso em que o depósito será feito diretamente no 2º Grau.

          Parágrafo único – a expedição de guia para depósito pela serventia judicial será feita à vista dos elementos de cálculo fornecidos pelo devedor.

          Art. 2º – A realização do depósito será imediatamente comunicada, por petição, ao juízo de 1º grau ou ao relator do processo, conforme se trate das hipóteses do caput do artigo anterior.

          Parágrafo único – Realizado o depósito e recebida a petição instruída da guia, após intimação do credor proceder-se-á à autuação destes documentos, como expediente avulso com o mesmo número do processo de conhecimento (numeradas as folhas no canto inferior direito), procedendo-se a respectiva anotação no sistema informatizado (até liberação do sistema Themis informar no campo ‘observações’ e ‘local dos autos’ que o processo de conhecimento está em 2º grau). Havendo pedido de liberação do valor depositado pelo credor, será este juntado ao expediente e submetido à apreciação judicial. Cópia do alvará expedido também deverá permanecer entranhada ao expediente até retorno do processo de conhecimento, quando serão, as peças, a este juntadas e numeradas da forma usual, descartando-se a capa.

          Art. 3º – A pretensão liberatória e a ordem de levantamento em favor do credor sujeitam-se a exclusivo critério jurisdicional, inclusive quanto à apresentação de cópias para tanto necessárias, quando feito o depósito origem e os autos do processo não estiverem na serventia."

          (Provimento Nº 20/06-CGJ DESEMBARGADOR JORGE LUÍS DALL’AGNOL CORREGEDOR-GERAL DA JUSTIÇA – publicado no dj nº 3.399, fl. 02, de 24-07-2006.

          Dessa forma, não deve servir de empeço ao pagamento espontâneo o fato de encontrarem-se os autos ainda no Tribunal, como se tem defendido alhures, nem se exige a intimação pessoal do devedor para fluência do prazo, uma vez que a efetividade jurisdicional, como efeito da sentença, impõe o cumprimento da obrigação tão-logo se torne certo o valor da condenação.

          Apesar da natural resistência ao novo, a efetividade da jurisdição exige que o intérprete olhe com novos olhos as inovações das reformas processuais, que tem permeado, em várias disposições processuais, regras de sobredireito – que aparentemente quebram o sistema, mas que, na verdade, alcançam ao juiz infinitas possibilidades de, no caso concreto, fazer justiça efetiva -, sob pena de manter-se o cartorialismo formalista que tanto tem atrapalhado a efetiva prestação jurisdicional, em detrimento da realização da verdadeira justiça buscada pelo cidadão, muitas vezes perdida em filigranas processuais que eternizam o procedimento.

          A lei é um mero instrumento com a qual o artífice do direito deve construir a obra da justiça. O processo não é um fim em si mesmo, mas mero instrumento de sua realização. Muitas vezes os mais belos processos guardam as maiores injustiças. Justiça que tarda é uma grande injustiça.


Notas

          01 Art. 599. O juiz pode, em qualquer momento do processo: I – ordenar o comparecimento das partes; II – advertir ao devedor que o seu procedimento constitui ato atentatório à dignidade da justiça.

          Art. 600. Considera-se atentatório à dignidade da Justiça o ato do executado que: I – frauda a execução; II – se opõe maliciosamente à execução, empregando ardis e meios artificiosos; III – resiste injustificadamente às ordens judiciais; IV – intimado, não indica ao juiz, em 5 (cinco) dias, quais são e onde se encontram os bens sujeitos à penhora e seus respectivos valores.

          Art. 601. Nos casos previstos no artigo anterior, o devedor incidirá em multa fixada pelo juiz, em montante não superior a 20% (vinte por cento) do valor atualizado do débito em execução, sem prejuízo de outras sanções de natureza processual ou material, multa essa que reverterá em proveito do credor, exigível na própria execução. Parágrafo único. O juiz relevará a pena, se o devedor se comprometer a não mais praticar qualquer dos atos definidos no artigo antecedente e der fiador idôneo, que responda ao credor pela dívida principal, juros, despesas e honorários advocatícios.

          02 Art. 475-B. Quando a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor requererá o cumprimento da sentença, na forma do art. 475-J desta Lei, instruindo o pedido com a memória discriminada e atualizada do cálculo.

 

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Moacir Leopoldo Haeser: desembargador aposentado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, advogado em Santa Cruz do Sul (RS)

 


Principais pontos do Simples Nacional

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* Irapuã Beltrão

Em dezembro de 2006 o ordenamento jurídico foi profundamente inovado com a publicação da Lei Complementar n° 123, de 14 de dezembro, autodenominado Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte. Afirmamos a profundidade da referida norma pela diversidade de matérias ali contida, sendo que a maioria dos seus efeitos sequer chegou a ser bem compreendida em todo o seu alcance. Da referida lei, muito tem sido dito sobre a inovação da parte tributária com a instituição do Simples Nacional, sendo negligenciada a visão ampla da Lei Complementar e das demais matérias ali plasmadas. Com o intuito de oferecer este olhar panorâmico e após testemunhar vários momentos de sua já inobservância, sugerirmos a atenção de todos para alguns pontos.

Em primeiro lugar, cumpre observar que trata-se de norma geral, editada, portanto, no âmbito da competência concorrente dos entes federativos, não pretendendo ou podendo esgotar todas as matérias. Ainda que tenha disciplinado inúmeros aspectos – alguns com riqueza de detalhamentos, é verdade – não está afastada a possibilidade de edição de normas estaduais suplementares, em consonância com os preceitos do art. 24 da Constituição.

Ademais, apesar de ter sido bastante celebrada quanto aos aspectos tributários, a L. C. n° 123, de 2006, cuida de três aspectos predominantes relativos à Microempresa (ME) e Empresa de Pequeno Porte (EPP):

·        regime único de arrecadação dos impostos e contribuições de todas as unidades federativas;

·        cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias;

·        ao acesso a crédito e ao mercado.

Exemplifica-se a diversidade de tratamento pela própria cláusula final de vigência. Como sabido, muitos destaques têm sido dado ao início de sua incidência em 1° de julho de 2007, sem observar que tal data aplicar-se-á apenas para o regime da tributação, enquanto as demais questões passaram a viger no momento da publicação da lei.

Desta forma, exige a mencionada lei maior atenção jurídica interdisciplinar já que estaria abordando temática não só tributária, mas também trabalhista, previdenciária, administrativa, empresarial, etc., estes já em plena vigência. Apesar da autonomia de cada matéria, transborda da lei, contudo, alguns princípios comuns, tais como a simplificação das obrigações acessórias e o tratamento diferenciado em favor das ME. e EPP.

Para atingir a tais objetivos, principia a norma definindo como microempresas o empresário ou a pessoa jurídica com receita bruta anual não superior a R$ 240.000,00 e como empresas de pequeno porte aqueles cuja receita ultrapasse a tal montante mas não exceda a R$ 2.400.000,00 também no exercício financeiro. Definidos tais patamares, estabelece ainda a norma como regramento comum a todos os campos atingidos a orientação para a unicidade do processo de registro e de legalização dos empresários perante as pessoas jurídicas nos 3 (três) âmbitos do governo, inclusive com entrada única dos dados cadastrais e de documentos procurando inaugurar um novo modelo de atuação em nosso burocrático federalismo.

Cuidou também o legislador em nacionalizar o sucesso do antigo sistema de arrecadação unificado do governo federal, transformando o antigo “Simples” numa instituição nacional. No detalhamento necessário, define os impostos e contribuições que poderão ser recolhidos mensalmente mediante documento único – com o destaque para a possibilidade quanto ao ICMS e ISS – da mesma forma que didaticamente afirma quais exações deverão permanecer através do pagamento direto.

Do ponto de vista dos particulares fixa ainda a lei as vedações de ingresso e alguns critérios para a realização da adesão dos empresários e pessoas jurídicas a tal sistema, sem deixar de delegar ao ali criado Comitê Gestor de Tributação a possibilidade estabelecer a forma da opção e a competência para tratar dos assuntos fiscais, especialmente quanto a regulamentação do recolhimento e do repasse do produto arrecadado para o INSS, Estados, Distrito Federal e Municípios.

Todavia, como afirmado, não se cuida de lei específica em matéria tributária, envolvendo outros temas relacionados às ME e EPP, tanto assim que, além do citado Comitê Gestor da Tributação com representantes dos entes políticos, é criado o Fórum Permanente das ME e EPP com participação dos órgãos federais e entidades vinculadas ao setor, para tratar dos demais aspectos.

De toda sorte, determina a Lei Complementar o privilégio de acesso ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão. Neste ponto, o procedimento de licitação passa também a ser influenciado pelas suas disposições, com regras para a habilitação jurídica, bem como com a necessária previsão, como critério de desempate, de preferência de contratação para ME e EPP.

De forma bastante detalhada, interfere a LC n° 123 na anterior disciplina legal para os certames de contratação, exigindo que os novos editais repensem seus modelos já consolidados pelo tempo e que os comentaristas do Direito Administrativo destaquem a novel estrutura prevista, o que aqui se ilustra, com conceitos de empate e novos procedimentos de habilitação, propostas, empenhos, entre outros.

Ainda no campo das inovações, trouxe para tais empresários e pessoas jurídicas significativas simplificações das relações de trabalho, com a dispensa de diversos deveres acessórios do empregador, merecendo o cuidado específico da interpretação de sua aplicação sobre o campo do direito material e processual do trabalho.

De modo a assegurar a efetividade destes três pilares da lei (questão tributária; favorecimento nas aquisições públicas; simplificação trabalhista), determina também a norma princípios para uma fiscalização orientadora, para o associativismo, para o estímulo ao crédito e à capitalização e à inovação e para o apoio e representação das ME e EPP através de políticas públicas.

E, como não poderia deixar de tangenciar, para os fins da aplicação do Código Civil quanto ao conceito de pequeno empresário, restou definido o patamar máximo de renda anual bruta de R$ 36.000,00, afastando destes as formalidades e rigores quanto a realização de reuniões e assembléias, além de definir a necessidade de utilização do adjetivo legal no nome empresarial e de regras específicas para o protesto de títulos.

Por fim, de forma a completar a gigantesca amplitude deste novo estatuto ainda consagra, processualmente, a capacidade das microempresas e empresas de pequeno porte às pessoas de ingressarem como autoras perante os Juizados Especiais, sem prejuízo do estímulo a utilização dos institutos da conciliação prévia, mediação e arbitragem para a solução dos seus conflitos.

Por tudo, parece claro não se pode diminuir a importância e alcance das disposições deste novo Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, sendo evidente que impõe-se aos estudantes, advogados, agentes públicos e interessados dissecar todos os institutos e ferramentas previstas.

 

Irapuã BeltrãoProcurador Federal, Professor Universitário, de Cursos Preparatórios e de Extensão, Especialista em Direito Econômico pela FGV; Master of Law pela University of Connecticut, Autor de Resumo de Direito Tributário pela Ed. Impetus

 


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Hospital Sarah e Pioneiras Sociais são condenados a pagar R$ 350 mil em dano moral por erro médico

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DECISÃO:  TJ-DF  –  Paciente procurou hospital porque estava ficando corcunda e, por causa de diagnóstico errado, acabou ficando paraplégica

A Associação das Pioneiras Sociais e o Hospital Sarah foram condenados a pagar indenização no valor de R$ 350 mil a uma paciente que ficou paraplégica por causa de um diagnóstico equivocado. De acordo com os Desembargadores da 2ª Turma Cível a ocorrência de erro médico é “incontroversa”. A paciente buscou o Hospital Sarah porque estava ficando corcunda. Um diagnóstico errado e duas cirurgias depois, ela estava paraplégica. O julgamento unânime ocorreu nesta 4ª feira, 28/9.

A paciente tinha apenas 11 anos de idade quando procurou o Sarah Kubitscheck pela primeira vez. Era 1978. A queixa da garota era uma diferença entre o ombro esquerdo e o direito, que a deixava com aspecto de corcunda. Os médicos diagnosticaram uma escoliose congênita e marcaram cirurgia para corrigir o problema.

Após uma revisão na bateria de exames, constatou-se que a menina estava acometida por uma tuberculose na coluna vertebral, conhecida como Mal de Pott. Diante do novo diagnóstico foi realizada uma outra intervenção cirúrgica, só que dessa vez a conseqüência foi desastrosa e irreversível. A paciente perdeu totalmente os movimentos dos membros inferiores, ficando paraplégica.

Os fatos narrados foram comprovados por meio de documentos juntados no processo. O próprio Hospital Sarah reconheceu o erro de diagnóstico, embora tenha afirmado que casos como esse são “raríssimos”. As provas e o reconhecimento expresso levaram a Turma a condenar as instituições a indenizar o dano moral sofrido pela paciente e sua família.

Na análise dos Desembargadores, o dano sofrido é considerado “gravíssimo”, em face das seqüelas resultantes. “Segundo as palavras da própria ré, em contestação, o erro de diagnóstico dos médicos ensejou um trágico resultado… O certo é que uma criança, ao procurar atendimento em um hospital de referência da medicina do aparelho locomotor no país, Hospital Sarah de Brasília, por erro médico, ficou paraplégica”, afirmaram.  Nº do processo:20030110878119


FONTE:

  TJ-DF, 26 de setembro de 2007.