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STF ratifica lei que libera desapropriação de terra que não cumprir função social

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Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal validou os dispositivos da Lei da Reforma Agrária que permitem a desapropriação de terras produtivas que não cumprirem sua função social.

Apresentada pela Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a ação que questionava a norma foi julgada na semana passada, no plenário virtual da Corte.

Em seu voto, o ministro Edson Fachin (foto), do STF, relator do caso, afirmou que a Constituição “exige, de forma inequívoca, o cumprimento da função social da propriedade produtiva como requisito simultâneo para a sua inexpropriabilidade”.

Ainda segundo o magistrado, caso seja comprovado o descumprimento da função social, o terreno deve ser desapropriado e o proprietário indenizado pela perda.

Na ação, a CNA afirmava que, ao permitir a desapropriação de imóvel produtivo que não cumpra função social, o texto dá “tratamento idêntico” ao dispensado a propriedades improdutivas.

Segundo a Constituição, a função social é cumprida quando a propriedade realiza aproveitamento racional e adequado, utilização adequada dos recursos naturais, cumprimento da legislação trabalhista e exploração que favoreça o bem-estar de proprietários e trabalhadores.

FONTE:  STF, 05 de setembro de 2023.

Especialista responde às principais controvérsias sobre a Lei da Alienação Parental

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Em meio a controvérsias, debates polarizados e tentativas de revogação, a Lei da Alienação Parental (12.318/2010) completou treze anos nessa semana. Em atenção ao aniversário da norma, em 26 de agosto, a advogada Renata Nepomuceno e Cysne, coordenadora do Grupo de Estudo e Trabalho sobre Alienação Parental do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, responde aos principais argumentos de quem busca a revogação da Lei e desmembra as ramificações do tema no Direito das Famílias.

A LAP considera como ato de alienação parental “a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”.

Confira, a seguir, a entrevista exclusiva da especialista:

Uma grande controvérsia sobre o tema da alienação parental é que o termo foi cunhado na década de 1980 pelo psicanalista estadunidense Richard Gardner, sem respaldo da ciência ou mesmo da psicologia. Além disso, autor e obra também são criticados por “prestar serviço em defesa do abuso sexual de crianças”. Como a senhora responde a essa questão?

Os estudos sobre as consequências do divórcio hostil para crianças e adolescentes iniciaram-se de forma quase concomitante com a possibilidade do divórcio em diversos países, isto é, entre as décadas de 1950 a 1970. A percepção dos profissionais da alteração de comportamento das crianças e adolescentes, envolvidos em cenários de conflito, gerou uma série de estudos e investigações da temática.

Sobre a temática da alienação parental, provavelmente Richard Gardner é o autor estrangeiro mais conhecido no Brasil. E o conceito “alienação parental” passou a ser difundido no Brasil a partir das obras dele. Isto se deu pela necessidade de nomear uma disfuncionalidade recorrente nas dissoluções conjugais litigiosas e que precisavam de uma intervenção para a proteção de crianças e adolescentes.

A barreira da língua e a insuficiência de tradução de outras obras fez com que o conceito de “alienação parental” fosse vinculado fortemente à figura controversa de Richard Gardner.  De fato, Richard Gardner criou a teoria da “Síndrome da Alienação Parental”, segundo ele, crianças e adolescentes desenvolviam um conjunto de sintomas psicológicos, quando sujeitos à programação e manipulação no cenário de divórcio hostil.

A “Síndrome de Alienação Parental” não foi reconhecida pelos órgãos de Saúde Mental, assim como não possui inscrição na Classificação Internacional de Doenças – CID. Nesse ponto, é importante observarmos que muitas doenças levam anos até o reconhecimento pela OMS, a exemplo da depressão.

No entanto, o comportamento de interferência psicológica, os danos causados pelo envolvimento/utilização dos filhos no conflito e a disputa por guarda no divórcio hostil vêm sendo alvo de estudo e enfrentamento há muitos anos.

Segundo levantamento feito pela Professora Bruna Barbieri, membro do Grupo de Estudo e Trabalho sobre Alienação Parental do IBDFAM, diversos outros estudiosos trataram do fenômeno da “Alienação Parental”, sob outra nomenclatura, e cita a título de exemplo:

– Lealdades Invisíveis (Boszormenyi-Nagy, 1973); Recusa de Visitas (Wallerstein, 1976); Alinhamento Patológico (Wallerstein e Kelly, 1976); Forte Aliança (Janet Johnston, Linda Campbell e Sharon Mayes, 1985), entre outros.

No entanto, é importante ressaltar que a Lei de Alienação Parental não trata da Síndrome da Alienação Parental, mas apresenta atos que, quando praticados em conjunto e/ou de forma reiterada, merecem a intervenção do Estado para a proteção de crianças e adolescentes. Isto é, segundo a normativa não é necessário que haja o dano à criança e ao adolescente, muito menos o adoecimento destes, para que o Estado interfira na proteção, basta que se tenha indícios do comportamento prejudicial à criança e ao adolescente que as ferramentas de proteção sejam aplicadas.

Portanto, a Lei de Alienação Parental em muito se afasta do conceito da Síndrome de Alienação Parental, pois sequer há necessidade da configuração de qualquer dano à criança e ao adolescente, para que haja a sua proteção, o que vai ao encontro do Princípio da Intervenção Precoce presente no Estatuto da Criança e do Adolescente, mas é a resposta legislativa à necessidade social de proteção de crianças e adolescentes em cenários de conflitos familiares específicos.

Fale-nos sobre a importância da Lei da Alienação Parental (12.318/2010).

É uma realidade que crianças e adolescentes têm sido utilizados como objeto em processos conflituosos de dissolução familiar e que esse envolvimento os coloca em situação de risco, o que atrai a necessidade de atuação do Judiciário. A Lei de Alienação Parental, além de nomear esse comportamento, fornece ferramentas de intervenção para a proteção de crianças e adolescentes.

A exemplificação de atos de alienação parental, contida no artigo 2º da referida Lei, tem efeitos pedagógicos na sociedade e joga luz sobre comportamentos que não são aceitáveis, o que acompanha o movimento social de reconfiguração do exercício da parentalidade e dos papéis de gênero.

Em seu artigo 4º, a Lei prevê a tramitação prioritária e dispõe sobre a atuação interdisciplinar, artigos 5º e 8º-A, o que constitui avanço para a efetivação dos princípios da proteção integral e do melhor interesse da criança e do adolescente. O artigo 6º norteia a intervenção judiciária, a fim de assegurar o direito à convivência familiar e a igualdade no exercício do poder familiar.

Portanto, a Lei da Alienação Parental integra o sistema legal de proteção a vulneráveis, reconhecidos constitucionalmente, e é um instrumento para assegurar o equilíbrio das relações entre os pais e mães que não convivem entre si, no melhor interesse afetivo dos filhos e da absoluta necessidade da manutenção dos vínculos de convivência saudável para o bom desenvolvimento psicossocial de crianças e adolescentes.

Por que a Lei precisa de manutenção e não revogação?

Importante observarmos que, em 18 de maio de 2022, há pouco mais de um ano, foi publicada a Lei 14.340/2002, que alterou a Lei da Alienação Parental (12.318/2010), e o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (8.069/1990). A norma aprovada passou por amplo debate público, envolveu diversos atores sociais e políticos que puderam se expressar, opinar e construíram uma norma que aprimora e reforça o sistema legal protetivo das pessoas, crianças e adolescentes.

Após o advento da referida Lei, Tribunais começaram a capacitar suas equipes de atendimento multidisciplinar, assim como o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, por meio da Portaria 359/2002, assinada pela presidente do Supremo Tribunal Federal – STF e do CNJ, Ministra Rosa Weber, instituiu um grupo de trabalho para debater e propor protocolo para a escuta especializada e depoimento especial de crianças e adolescentes nas ações de família em que se discuta alienação parental.

A título de exemplo, o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná – TJPR, com fundamento na Lei 14.340/2022, inaugurou espaço de convivência de laços e afetos, que proporciona local adequado para a convivência familiar assistida, em casos nos quais é necessária uma atuação mais próxima do Judiciário.

A Lei 14.340/2022 é resultado de diversos projetos que tratavam sobre a Lei de Alienação Parental e trouxe mudanças que ainda estão em fase de implementação. Revogar as normas referentes à temática da Alienação Parental significa enfraquecer a rede de proteção infantil, da qual a Lei de Alienação Parental é um elo importante na proteção às crianças e adolescentes, atualmente vigente, tornando-a deficiente, o que é verdadeiro retrocesso social.

O mandamento constitucional, alvo a ser perseguido, é a proteção integral, qualquer mudança que possa acarretar redução de proteção precisa ser avaliada e amplamente debatida com a sociedade.

É primordial identificar as omissões que a eventual revogação da Lei deixará. A análise aprofundada sobre a questão pelos cidadãos, órgãos e entidades públicas e civis, que deve ocorrer sobretudo sob a ótica do melhor interesse de crianças e adolescentes, mostra-se urgente.

Tendo se dedicado ao estudo da Lei de Alienação Parental – LAP por tanto tempo, qual é a sua análise das alegações de que essa norma está sendo usada por agressores como forma de vingança contra mulheres e/ou para perpetuar a violência sexual contra crianças e adolescentes?

No Anuário da Segurança Pública, desse ano, foi identificado o maior número de estupros da história. Foram 74.930 vítimas. Sendo 56.820 estupros de pessoas vulneráveis. Os estupros aconteceram em sua maioria na residência das vítimas, com mais de 50.000 pessoas sendo violentadas sexualmente em sua própria casa.

As vítimas, em sua maioria, são mulheres e possuem de 0 a 13 anos de idade, sendo mais de 10% delas crianças com menos de 4 anos de idade. Na grande maioria dos casos de estupros cometidos contra as crianças, o agressor é conhecido da vítima, e em 64,4% das vezes é alguém da família.

Os dados revelam a violência sexual em uma escala crescente e, ainda sim, acredita-se que a realidade seja muito pior do que a refletida nos números, isso porque os dados são subnotificados e, muitas vezes, a violência passa despercebida pela família, pela sociedade e pelo Estado.

Há um grande número de crianças e adolescentes sendo violentadas dentro de suas casas por familiares. O Anuário nos mostra também o crescente número de violência doméstica praticada contra mulheres e crianças e adolescentes e do aumento do feminicídio.

Então, resta óbvio a ineficiência das políticas de enfrentamento à violência intrafamiliar, assim como que o conjunto normativo tem sido insuficiente para gerar a necessária proteção.

No entanto, atribuir a causa da violência intrafamiliar à Lei de Alienação Parental é deixar de fazer a análise e o enfrentamento das questões que envolvem esse cenário assombroso de violência doméstica e sexual no Brasil. Manter a discussão dessa questão sob a lupa da Lei de Alienação Parental é permanecer envolto por uma cortina de fumaça, sem focar nas pautas centrais e de maior impacto do combate à violência intrafamiliar.

Por exemplo, é possível identificar a falta de comunicação efetiva entre a rede de proteção e no próprio Judiciário, entre as varas de violência doméstica, família e infância e juventude. Também é possível identificar a revitimização que ocorre em diversos momentos de perícia, estudo psicossocial e depoimentos quando há processos nessas varas que tramitam concomitantemente. Falhas essas que são passíveis de correção e que, uma vez corrigidas, gerariam maior proteção às vítimas.

Quando se trata de um cenário em que há alegação de violência doméstica – física, psíquica, patrimonial e/ou sexual – praticada contra a mulher e contra os filhos, e há, também, de forma paralela, a alegação de alienação parental – violência psíquica – praticada contra os filhos, ambas alegações devem ser investigadas, pois do contrário estaríamos hierarquizando as violências.

Ressalto ainda que, na minha opinião, a violência dirigida à mãe é violência praticada também contra o filho e, nesses casos, não há que se falar em alienação parental.

A senhora teve acesso à reportagem publicada pelo Intercept neste ano que reuniu algumas dessas denúncias? Qual a sua opinião sobre as questões abordadas na matéria?

Eventuais deficiências e a má aplicação da Lei de Alienação Parental devem ser identificadas e corrigidas com o concurso permanente e crítico de todos os interessados e estudiosos, a partir da apuração de dados, para que os fins sociais da norma legal sejam devidamente alcançados.

Preocupa-me que processos que tramitam em segredo de justiça sejam compartilhados na mídia, com a exposição de casos concretos e de crianças e adolescentes, que terão a sua história exposta.

As reportagens publicadas apontam diretamente profissionais e é importante a consciência de que o tribunal midiático não comporta contraditório e ampla defesa e tem sido cruel em diversos casos, muitas vezes com consequências irreversíveis aos indivíduos. Temos que ter senso crítico e não tomar como verdadeiros casos que são apontados pela mídia e que ainda não sofreram o crivo do Judiciário.

Qual seria a solução para a controvérsia?

Inicialmente, precisamos obter dados, números concretos para compreendermos de que forma a Lei vem sendo aplicada, as lacunas que precisam ser preenchidas e os artigos que precisam ser revistos.

Há também a questão da implementação da Lei de 14.340/2022. Como dito, há um Grupo de Trabalho no CNJ comprometido com o aprimoramento da escuta de crianças e adolescentes nos processos de família, o que tende a trazer avanços. Os espaços de convivência assistida também estão em fase de implementação, a exemplo do que foi realizado no TJPR.

No âmbito do Executivo e do Legislativo, mostra-se essencial a realização de audiências públicas, que são um importante espaço de consolidação da cidadania, com a participação de cidadãos, órgãos e entidades públicas e civis para análise e propostas de políticas públicas e projetos de lei.

Acima de tudo, a discussão deve ser pautada com foco na criança e no adolescente.

O que aconteceria se a LAP fosse revogada hoje?

Teríamos uma lacuna considerável com relação à efetivação da convivência familiar, um retrocesso com relação à proteção de crianças e adolescentes. O olhar interdisciplinar, que tem sido importante nos casos de família, seria enfraquecido.

Outras normas também seriam comprometidas, pois se relacionam diretamente com a Lei de Alienação Parental. Enfim, uma série de consequências que precisam ser melhor compreendidas e debatidas por diversos agentes do sistema de proteção.

Recentemente, o IBDFAM enviou ao CNJ pedido de providências que solicita a coleta de dados sobre processos envolvendo o tema da Alienação Parental e seus resultados em Varas das cinco regiões do Brasil. Qual é o objetivo desse pedido?

Diante da insuficiência de dados confiáveis que pautem o debate sobre os desdobramentos da Lei de Alienação Parental no Judiciário, apresentamos ao CNJ um Pedido de Providências para a realização de pesquisa. Apresentamos 29 quesitos para nortear a coleta de informações junto aos Tribunais de Justiça das cinco regiões do Brasil.

O pedido de providências ainda está em análise. O Setor de Pesquisa do CNJ sinalizou de forma negativa, mas ainda está pendente de apreciação pelo Ministro Luis Felipe Salomão.

Se há um debate sobre a possibilidade de alterar um elo da proteção integral de crianças e adolescentes, é preciso fazer isso com base em dados, e não em experiências pessoais. A partir da obtenção de dados podemos traçar estratégias de atuação, sempre com o objetivo de gerar maior proteção às crianças e adolescentes.

Em 2022, a Organização das Nações Unidas – ONU direcionou um comunicado ao Brasil para que o país proíba de forma expressa o uso da Síndrome de Alienação Parental em processos judiciais. Qual a opinião da senhora sobre esta solicitação e quais são seus desdobramentos no meio jurídico?

O relatório apresentado pelo Conselho de Direitos Humanos não foi submetido à votação na Assembleia Geral da ONU em 13 de julho, na 53º Assembleia Geral, ou seja, ainda está pendente de análise mais apurada.

Por sua vez, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos reconhece a Alienação Parental.

Há projetos de lei nas Casas Legislativas que merecem atenção especial? Quais merecem aprovação e quais devem ser barrados?

A Lei de Alienação Parental foi, recentemente, amplamente debatida nas Casas Legislativas, aproximadamente 15 projetos de lei foram reunidos para análise e resultaram na Lei 14.340/2022. Retornar a esse debate pouco mais de um ano da aprovação da Lei, sem que tenha dado tempo suficiente para a implementação das alterações e com encaminhamentos concretos ocorrendo, é uma atitude precipitada.

No entanto, acredito que o debate sempre seja um caminho de amadurecimento e uma possibilidade de aprimoramento.

FONTE:   IBDFAM, 31 de agosto de 2023.

STF mantém decisão do TST sobre adicionais a carteiros motociclistas

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Segundo entendimento da ministra Rosa Weber, confirmado pelo Plenário, a questão não envolve matéria constitucional.

O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que autoriza carteiros que utilizam motocicleta em serviço a receberem tanto o adicional de atividades externas quanto o adicional de periculosidade específico de motociclistas. Na sessão virtual encerrada em 1º/9, o Plenário, por unanimidade, negou pedido de Suspensão de Liminar (SL 1574) da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT).

Em decisão individual, a presidente do STF, ministra Rosa Weber, já havia negado liminar, por entender que a controvérsia não trata de matéria constitucional. Agora, esse entendimento foi confirmado no julgamento de mérito.

No pedido ao Supremo, a ECT questionava o pagamento cumulativo dos adicionais e alegava que a decisão do TST teria desrespeitado a autonomia negocial coletiva. Segundo a empresa, o Adicional de Atividade de Distribuição e/ou Coleta Externa (AADC), previsto em norma coletiva, deveria ser suprimido com a edição da Lei 12.997/2014, que criou o adicional de periculosidade para atividades exercidas em motocicletas.

Condições de trabalho x risco

Segundo entendimento do TST, fixado no julgamento do Tema Repetitivo nº 15, o AADC remunera o trabalho exercido nas ruas em condições mais gravosas (adicional de penosidade), envolvendo insolação e desidratação e restrições de acesso a instalações sanitárias ou locais de descanso e alimentação, entre outras.

Já o adicional de periculosidade (artigo 193, parágrafo 4º, da CLT, com redação dada pela Lei 12.997/2014) é exclusivo dos trabalhadores motociclistas, sejam eles carteiros ou não. Sua função é remunerar o risco à integridade física e à vida resultante da direção de motocicleta no trânsito.

Irretocável

Segundo a ministra Rosa Weber, é “irretocável” a conclusão do TST quanto à distinção entre a finalidade das duas parcelas. Ela apontou que a Lei 12.997/2014 se limita ao universo dos trabalhadores motociclistas. Já o AADC é adicional de atividade externa, que também pode ser feita a pé, de bicicleta ou por meio de carros ou caminhonetas.

Em seu voto, a presidente do STF explicou que o direito dos carteiros ao AADC está assegurado em normas coletivas e só pode ser suprimido mediante negociação coletiva específica ou se houver legislação para regulamentar o adicional.

Controvérsia

A ministra reiterou, ainda, que o objeto da controvérsia foi resolvido integralmente na interpretação da legislação infraconstitucional e das cláusulas convencionais, e o cabimento das ações suspensivas no STF pressupõe ofensa direta ou transgressão imediata a preceitos constitucionais.

FONTE:  STF, 04 de setembro de 2023.

Sexta Turma admite mandado de segurança para cassar decisão que arquivou inquérito sobre violência doméstica

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​De forma excepcional, ao julgar recurso em mandado de segurança, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cassou decisão que homologou o arquivamento do inquérito policial em um caso de violência doméstica e familiar contra a mulher. O colegiado determinou a remessa dos autos ao procurador-geral de Justiça de São Paulo para melhor análise quanto ao possível exercício da ação penal ou à realização de novas diligências investigativas.

No caso, a suposta vítima relatou a uma guarnição policial, em fevereiro de 2022, que havia sido agredida verbal e fisicamente pelo namorado na casa dele. Ela foi submetida a exame pericial, que confirmou múltiplas lesões no corpo. No entanto, por considerar as provas frágeis, a Promotoria de Justiça estadual requereu o encerramento do inquérito, sem determinar outras diligências para apurar a possível situação de violência contra a mulher. O pedido foi homologado pelo juízo de primeiro grau.

A possível vítima pediu a reconsideração do arquivamento, porém a promotora e o juízo se manifestaram contra. Ela requereu a revisão do arquivamento pelo procurador-geral, o que foi igualmente indeferido pelo juízo de primeiro grau. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou a reanálise do caso.

“O encerramento prematuro das investigações, aliado às manifestações processuais inconsistentes nas instâncias ordinárias, denotam que não houve a devida diligência na apuração de possíveis violações de direitos humanos praticadas contra a recorrente, em ofensa ao seu direito líquido e certo à proteção judicial, conforme os artigos 1º e 25 da Convenção Americana de Direitos Humanos e o artigo 7º, alínea “b”, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher“, afirmou a relatora no STJ, ministra Laurita Vaz.

Mandado de segurança pode impugnar arquivamento de inquérito em casos excepcionais

A ministra explicou que a Constituição Federal atribuiu ao Ministério Público, de forma privativa, o exercício da ação penal pública (artigo 129, inciso I). Destacou que, por isso mesmo, o artigo 28 do Código de Processo Penal estabeleceu a regra de que, após a instauração do inquérito, o arquivamento da investigação sem a propositura da ação penal exige prévia análise judicial, podendo o magistrado discordar do pedido de arquivamento e determinar melhor análise da questão pelo chefe do Ministério Público.

A relatora lembrou que esse dispositivo recebeu nova redação com a Lei 13.964/2019, mas a sua eficácia foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.305. Contudo, ao tempo do caso em discussão, o procedimento de arquivamento do inquérito exigia a manifestação judicial.

Embora a jurisprudência majoritária do STJ considere irrecorrível a decisão do juízo singular que determina o arquivamento do inquérito a pedido do MP, a ministra observou que, em hipóteses excepcionais, nas quais há flagrante violação a direito líquido e certo da vítima, a corte admite o uso do mandado de segurança para impugnar o arquivamento.

“A admissão do mandado de segurança na espécie encontra fundamento no dever de assegurar às vítimas de possíveis violações de direitos humanos, como ocorre nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, o direito de participação em todas as fases da persecução criminal, inclusive na etapa investigativa, conforme determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos em condenação proferida contra o Estado brasileiro”, esclareceu a ministra.

Palavra da vítima nos casos de violência contra a mulher

Segundo a relatora, nas situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, a ação penal é um instrumento para garantir a observância dos direitos humanos e cumprir as obrigações internacionais do Estado brasileiro. “Portanto, deve ser compreendida, à luz do direito internacional dos direitos humanos, como parte integrante do dever estatal de garantir o livre e pleno exercício dos direitos humanos a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição e de assegurar a existência de mecanismos judiciais eficazes para proteção contra atos que os violem”, ressaltou.

Para Laurita Vaz, na hipótese em análise, a palavra segura da vítima, aliada à existência de laudo pericial constatando múltiplas lesões significativas e atestando que houve ofensa à sua integridade corporal, formam um conjunto de provas que não pode ser desprezado. “Ainda que não se formasse a convicção pelo exercício imediato da ação penal, seria necessária, no mínimo, a busca por testemunhas ou outras informações, a fim de melhor definir se existia ou não situação de violência contra a mulher”, ponderou.

Na sua avaliação, a decisão que homologou o arquivamento foi proferida sem a verificação da devida diligência na investigação e com inobservância de aspectos básicos do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero do Conselho Nacional de Justiça, sobretudo quanto à valoração da palavra da vítima, “que assume inquestionável importância quando se discute violência contra a mulher, especialmente quando há outros indícios que a amparem”.  RMS 70338

FONTE:  STJ, 05 de setembro de 2023.

Indeferimento de perícia em revisão de previdência complementar é tema da Pesquisa Pronta

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​A página da Pesquisa Pronta divulgou dois novos entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Produzida pela Secretaria de Jurisprudência, a nova edição destaca o entendimento de que a compensação indeferida na esfera administrativa não pode ser deduzida em embargos à execução fiscal e de que o indeferimento de perícia técnica, em ação revisional de benefício da previdência complementar, quando requerida na fase de conhecimento configura indevido cerceamento de defesa.

O serviço tem o objetivo de divulgar as teses jurídicas do STJ mediante consulta, em tempo real, sobre determinados temas, organizados de acordo com o ramo do direito ou em categorias predefinidas (assuntos recentes, casos notórios e teses de recursos repetitivos).

Direito processual civil – Provas

Perícia atuarial na fase de conhecimento de ação revisional de benefício da previdência privada.

“A Segunda Seção desta Corte orienta-se no sentido de que o indeferimento de perícia técnica, nos autos da revisional de benefício da previdência complementar, oportunamente requerida na fase de conhecimento, configura indevido cerceamento de defesa.”

AgInt no AREsp 2.278.087/RS, relatora ministra Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 17/8/2023.

Direito tributário – Execução fiscal

Compensação indeferida na esfera administrativa. Alegação em sede de embargos à execução fiscal.

“A jurisprudência do STJ é no sentido de que a compensação indeferida na esfera administrativa não pode ser deduzida em embargos à execução fiscal.”

AgInt no AREsp 1.890.996/RJ, relator ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 14/8/2023, DJe de 16/8/2023.

FONTE: 05 de setembro de 2023.

Associação de proteção veicular pode ser responsabilizada em ação que busca pagamento de seguro

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A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, decidiu que a associação de proteção veicular que atua na condição de estipulante de seguro automotivo coletivo tem legitimidade passiva e pode ser responsabilizada, solidariamente com a seguradora, em ação que busca o pagamento de indenização securitária.

“É possível, excepcionalmente, atribuir ao estipulante a responsabilidade pelo pagamento da indenização securitária, em solidariedade com o ente segurador, como nas hipóteses de mau cumprimento de suas obrigações contratuais ou de criação, nos segurados, de legítima expectativa de ser ele o responsável por esse pagamento”, afirmou o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, relator.

No caso, uma mulher ajuizou ação contra uma associação de proteção veicular e uma seguradora, buscando obter indenização securitária advinda de contrato de seguro automotivo coletivo, bem como compensação por danos morais, tendo em vista a ocorrência de acidente que ocasionou a perda total do veículo segurado.

Por entenderem que a apólice contratada já estava em vigor quando o acidente ocorreu, as instâncias ordinárias condenaram as demandadas, solidariamente, ao pagamento da indenização securitária, além do valor de R$ 6 mil a título de danos morais.

No recurso ao STJ, a associação alegou que agiu como mera intermediária na formalização da apólice coletiva, de modo que não poderia figurar no polo passivo da ação proposta pela segurada. Sustentou também que o estipulante não pode ser condenado solidariamente, visto que a responsabilidade de pagar os prejuízos do sinistro é exclusiva da seguradora.

Entidade não cumpriu adequadamente suas obrigações

Segundo o relator, o STJ tem o entendimento de que o estipulante, em regra, não é o responsável pelo pagamento da indenização securitária, pois atua apenas como interveniente, na condição de mandatário do segurado, agilizando o procedimento de contratação do seguro (artigos 21, parágrafo 2º, do Decreto-Lei 73/1966 e 801, parágrafo 1º, do Código Civil).

Contudo, o ministro destacou que, excepcionalmente, o estipulante pode ser responsabilizado pelo pagamento do seguro, em solidariedade com a seguradora. Segundo o relator, no caso analisado, ficou demonstrado que a entidade estipulante não cumpriu adequadamente suas obrigações, pois era a responsável por intermediar a contratação da apólice entre seus associados, mas não diligenciou acerca do correto momento em que entraria em vigência o seguro da autora da ação.

Associação criou expectativa de que se responsabilizaria pelo pagamento dos prejuízos

Além disso, o ministro ressaltou que a associação também criou na segurada a legítima expectativa de que se responsabilizaria pelos danos decorrentes do sinistro, já que foi instituída justamente para promover proteção veicular, tendo – conforme seu próprio regulamento – o único objetivo de conferir segurança aos associados, mediante o rateio, entre eles, de eventuais prejuízos ocorridos com os automóveis.

Villas Bôas Cueva afirmou que a responsabilidade de indenizar os associados no caso de danos sofridos pelos veículos está evidenciada no regulamento da associação e até mesmo na proposta de filiação oferecida aos associados.

“A responsabilidade da entidade associativa de socorro mútuo em garantir sinistros de seus associados não é afastada por ela também atuar como estipulante em contrato de seguro em grupo, de modo que deve observar seu regulamento e o objetivo que fundamenta sua criação – no caso, a proteção veicular”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso especial. REsp 2.080.290.

FONTE:  STJ, 01 de setembro de 2023.

Na falta de juizado de violência doméstica, juízo cível pode aplicar medidas protetivas da Lei Maria da Penha

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Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), nas comarcas onde não há vara especializada em violência doméstica, é possível ao juízo cível aplicar as medidas protetivas previstas na Lei 11.340/2006 (Lei Maria da Penha). Segundo o colegiado, a concessão de medidas protetivas por juízo cível ajuda a prevenir, de maneira rápida e uniforme, a violência praticada no âmbito doméstico e familiar contra a mulher.

Após relatar diversas agressões físicas e morais do marido, uma mulher ajuizou ação de divórcio em vara cível e requereu a adoção de medidas protetivas. A juíza deferiu liminar para impor algumas medidas protetivas contra o réu – entre elas, a proibição de se aproximar da autora da ação e de sua casa.

Para o TJBA, falta de prestação jurisdicional poderia trazer prejuízos irreversíveis

Oferecida a contestação, outro magistrado foi designado para assumir a vara cível, ocasião em que revogou a decisão anterior, sob o fundamento que aquele juízo não teria competência para aplicar medidas protetivas da Lei Maria da Penha.

O Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) restabeleceu a medida protetiva de afastamento do lar, por entender que a falta da prestação jurisdicional poderia trazer prejuízos irreversíveis à mulher.

No recurso ao STJ, o réu alegou que o acórdão do TJBA violou o artigo 33 da Lei 11.340/2006, uma vez que, segundo esse dispositivo, a mulher deveria ter requerido a medida protetiva à vara criminal da comarca, e não à vara cível, a qual seria incompetente para decidir a respeito.

Juízo cível pode conceder medidas protetivas para prevenir violência doméstica

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que a Lei Maria da Penha, visando dar cumprimento ao artigo 226, parágrafo 8º, da Constituição Federal, trouxe diversos mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, entre os quais está a previsão de instalação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, com competência híbrida (criminal e cível), nos termos do artigo 14 da lei.

O ministro comentou que, enquanto não tiver sido instalado na comarca o juizado especializado em violência doméstica, e não sendo o caso de demandar no juízo criminal – como na hipótese da ação de divórcio em julgamento –, o juízo cível será competente para processar e julgar o pedido de medidas protetivas, adotando providências compatíveis com a jurisdição cível.

“Deve-se, portanto, proceder a uma interpretação teleológica do artigo 33 da Lei Maria da Penha, permitindo-se ao juízo cível a concessão de medidas protetivas nessa hipótese, a fim de proteger o bem jurídico tutelado pela norma, que é justamente prevenir ou cessar a violência praticada no âmbito doméstico e familiar contra a mulher, de maneira célere e uniforme”, declarou.

Pedido do marido está em desacordo com o escopo da Lei Maria da Penha

Bellizze explicou que, a prevalecer a interpretação defendida no recurso, a vítima de violência doméstica teria que ajuizar a ação de divórcio no juízo cível e pleitear as medidas cautelares perante o juízo criminal, tendo em vista a falta do juizado especializado na comarca.

O ministro ressaltou que essa interpretação está totalmente em desacordo com o objetivo da Lei 11.340/2006, que é a proteção da mulher, “podendo gerar, inclusive, decisões contraditórias em relação ao próprio reconhecimento da prática de atos que configuram a violência doméstica, o que não se pode admitir”.

FONTE:  STJ, 31 DE AGOSTO DE 2023.

Nulidades de algibeira: a estratégia rejeitada pela jurisprudência em defesa da boa-fé processual

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De um lado, princípios consagrados no ordenamento jurídico brasileiro e reforçados pelo Código de Processo Civil (CPC) de 2015, como a lealdade, a boa-fé processual e a cooperação; do outro, uma parte que, sabendo de suposto vício no processo, prefere não se manifestar, deixando para fazê-lo em momento mais conveniente aos seus interesses.

A estratégia processual conhecida como nulidade de algibeira, ou de bolso, tão comum na esfera civil quanto na penal, tem sido recorrentemente analisada – e rechaçada – pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).

No julgamento do RHC 115.647, o ministro Ribeiro Dantas afirmou que “a jurisprudência dos tribunais superiores não tolera a chamada nulidade de algibeira – aquela que, podendo ser sanada pela insurgência imediata da defesa após ciência do vício, não é alegada, como estratégia, numa perspectiva de melhor conveniência futura”.

O ministro Raul Araújo, no AREsp 1.734.523, acrescentou que “a suscitação tardia da nulidade, somente após a ciência de resultado de mérito desfavorável, configura a chamada nulidade de algibeira, manobra processual que não se coaduna com a boa-fé processual e que é rechaçada pelo Superior Tribunal de Justiça”.

Acórdão paradigmático do STJ estabeleceu a tese das nulidades de algibeira

A difusão da expressão “nulidade de algibeira” e do entendimento jurídico correspondente é creditada ao ministro do STJ Humberto Gomes de Barros (falecido), que a utilizou pela primeira vez em 14 de agosto de 2007, quando atuava na Terceira Turma e foi relator do REsp 756.885.

A discussão tratava de intimações feitas em nome de um advogado que recebeu os poderes para representar a parte ré, por meio de substabelecimento, quando ainda era estagiário – o que poderia gerar nulidade sob a ótica do CPC de 1973.

A parte cumpriu todas as intimações recebidas, à exceção de uma, que tratava de perícia contrária aos seus interesses. Sem manifestar qualquer oposição naquele momento e nos atos seguintes, ela só alegou a nulidade muito tempo depois, em embargos de declaração contra a sentença na fase de liquidação.

Para o ministro Humberto Gomes de Barros, a parte, visivelmente, guardou a alegação de nulidade para usá-la em momento mais conveniente, e mesmo assim não demonstrou prejuízo ao exercício da ampla defesa.

“Sem que haja prejuízo processual, não há nulidade na intimação realizada em nome de advogado que recebeu poderes apenas como estagiário. Deficiência na intimação não pode ser guardada como nulidade de algibeira, a ser utilizada quando interessar à parte supostamente prejudicada”, ponderou o ministro.

Ainda que o vício de intimação seja o mais comum quando se fala sobre as nulidades de algibeira, os órgãos julgadores do STJ já identificaram essa manobra processual em diversas outras circunstâncias.

Banco tentou anular citação com base em argumento não manifestado antes

No julgamento do REsp 1.637.515, em 2020, a Quarta Turma, por maioria de votos, entendeu que um banco se valeu da nulidade de algibeira para rediscutir a validade de sua citação na medida cautelar de exibição de documentos ajuizada por uma empresa do ramo industrial.

Ainda no início do processo, o banco pediu a declaração de nulidade da citação, exclusivamente pelo fato de ela ter sido recebida por funcionário sem poderes para representar a instituição financeira. Por meio do REsp 96.229, a discussão chegou ao STJ, que declarou a validade do ato.

Após o retorno dos autos à primeira instância, o banco, em embargos de declaração, voltou a questionar uma possível nulidade da citação. Dessa vez, argumentou que faltava no instrumento a indicação do prazo para a defesa, o que foi acolhido pelo Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM).

Para o relator do caso no STJ, ministro Marco Buzzi, não poderia ter havido nova deliberação sobre vício da citação, pois a questão estava abrangida pelo efeito preclusivo da coisa julgada formal estabelecida no REsp 96.229. Na sua avaliação, havia fortes indícios de utilização da “odiosa” nulidade de algibeira.

O relator comentou que, tendo o banco alegado a nulidade da citação por um motivo desde o ano de 1994, ficou evidente sua atitude de guardar “na algibeira”, para usar em momento oportuno, outro defeito contido no mesmo mandado de citação.

Provocação tardia de intervenção do MP configura nulidade de algibeira

A Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.714.163, apontou o uso da nulidade de algibeira em uma discussão sobre a necessidade de intimação do Ministério Público (MP) para representar herdeiros incapazes, cujo pai morreu no curso de ação em que figurava como uma das partes.

Na origem, o pai ajuizou ação de adjudicação compulsória, mas os pedidos foram considerados improcedentes. Somente mais tarde, em recurso especial dos filhos, alegou-se que a intervenção do MP deveria ter ocorrido não apenas no inventário, mas também na ação de adjudicação compulsória, razão pela qual todos os atos praticados desde a comunicação do falecimento seriam nulos.

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, a jurisprudência do STJ estabelece que o reconhecimento de nulidade processual, ainda que absoluta, pressupõe a existência de efetivo prejuízo. No caso, a ministra observou que o espólio do pai foi representado adequadamente pelo inventariante, não havendo menção no recurso a prejuízos decorrentes da falta de intervenção do MP. A arguição de nulidade – destacou a relatora – se deu apenas depois que o espólio já havia apresentado apelação e embargos de declaração.

“Causa profunda estranheza, no ponto, que a arguição de nulidade apenas tenha ocorrido após a confirmação da improcedência dos pedidos deduzidos pelo espólio em segundo grau de jurisdição”, avaliou Nancy Andrighi ao concluir que a suscitação tardia da participação do MP configurou nulidade de algibeira.

Invocação tardia de nulidade em oitiva de testemunha não muda julgamento

Em dezembro de 2022, a Sexta Turma negou provimento a um agravo em recurso especial (AREsp 2.204.219) por entender que a invocação tardia de nulidade da oitiva de testemunha, a fim de reverter resultado desfavorável, demonstra a utilização da nulidade de algibeira.

A defesa, buscando reverter uma condenação por tráfico de drogas, alegou ao STJ que não concordou com a inversão da oitiva de testemunhas – procedimento adotado na audiência de instrução e julgamento –, mas não se manifestou sobre isso nas alegações finais por acreditar, entre outras razões, que o julgamento caminharia para a absolvição.

No entanto, o relator do recurso, ministro Rogerio Schietti Cruz, salientou que os próprios autos demonstram claramente que a defesa concordou com a realização posterior da oitiva de uma das testemunhas de acusação, sem apontar qualquer nulidade nas alegações finais e trazendo o assunto à discussão apenas no recurso de apelação.

“Como decorrência do disposto no artigo 565 do Código de Processo Penal e tendo em vista a proibição de comportamento contraditório da parte (venire contra factum proprium), não se reconhece nulidade a que deu causa a própria parte”, concluiu o relator.

Falta de intimação em contrarrazões configura nulidade sanável

No julgamento de recurso especial (REsp 1.372.802) em ação de substituição de penhora, a Terceira Turma rejeitou a argumentação apresentada pela empresa recorrente, que se valeu da nulidade de algibeira para apontar um possível vício no processo. No caso, ela alegou omissão por parte do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), que não lhe deu a chance de apresentar contraminuta ao agravo de instrumento interposto pela parte contrária.

Para o colegiado, a parte agravada não teve a oportunidade de se manifestar naquele momento, mas, após o julgamento monocrático do agravo, todos os envolvidos foram intimados da decisão, o que renovou o contraditório e sanou qualquer dúvida quanto à ciência da interposição do recurso e da inexistência de intimação para contraminuta.

O relator no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), destacou que a parte ficou em silêncio quando intimada da decisão monocrática e suscitou a nulidade somente nos embargos de declaração opostos ao acórdão do agravo regimental.

“Essa estratégia de permanecer silente, reservando a nulidade para ser alegada em um momento posterior, já foi rechaçada por esta turma, tendo recebido a denominação de nulidade de algibeira”, alertou o relator.

De acordo com Sanseverino, o STJ entende que a intimação para apresentação de contrarrazões é condição de validade da decisão que causa prejuízo à parte não intimada. No entanto – ponderou –, trata-se de uma nulidade sanável, pois o contraditório se renova continuamente ao longo do processo, abrindo-se oportunidade às partes para se manifestarem.

Vício de patrocínio duplo deve ser alegado na primeira oportunidade

No julgamento do AREsp 2.197.101, a Terceira Turma entendeu que o vício de patrocínio duplo deve ser alegado na primeira oportunidade em que couber à parte se manifestar no processo. A suscitação tardia, ou seja, somente após a ciência do resultado de mérito desfavorável, configura nulidade de algibeira.

A origem do caso foi uma execução de título extrajudicial proposta por concessionária de veículos, em que se discutia a validade da citação por edital de uma cliente apontada como inadimplente.

Após o STJ restabelecer a sentença que havia declarado a nulidade da citação, a empresa alegou em agravo interno que a consumidora tinha advogado constituído nos autos quando interpôs recurso na corte ainda sob a representação da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul, na condição de curadora especial.

Para o relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, a concessionária não tinha razão ao pedir a anulação da decisão em que a Defensoria Pública representava a parte contrária.

“Isso porque não houve a manifestação na primeira oportunidade em que poderia tê-lo feito, visto que a constituição do patrono foi protocolizada nos autos em 9/5/2002, antes do ajuizamento do agravo em recurso especial pela Defensoria Pública, na qualidade de curadora especial, tendo a insurgente deixado transcorrer in albis o prazo de resposta”, avaliou o ministro.

Vício na formação de comissão de PAD só foi alegado após demissão

A Primeira Seção identificou a utilização da nulidade de algibeira ao julgar mandado de segurança (MS 22.757) impetrado por dois ex-servidores da Polícia Federal no Amazonas, que foram demitidos após a apuração de atos ilícitos em processo administrativo disciplinar (PAD).

Conforme os impetrantes, a escolha da comissão processante violou os princípios do juiz natural e da impessoalidade, pois recaiu em servidores especificamente contrários a eles. Além disso, a substituição de um dos membros teria ocorrido de forma contrária à lei.

O relator do caso, ministro Gurgel de Faria, observou que esses fundamentos não foram alegados na via administrativa, embora supostamente existentes desde a designação da comissão, ou seja, desde o início do PAD.

“Sobre a nulidade de algibeira, presume-se de óbvio conhecimento a composição da comissão processante por ser fato público e notório, determinado por ato administrativo desde o início do processo”, avaliou o ministro.

Ainda de acordo com Gurgel de Faria, se a alegação das partes era no sentido de que a escolha da comissão processante não atendeu aos requisitos formais da lei, este seria o primeiro ato de prejuízo aos processados, devendo ter sido apontado ao longo do trâmite do PAD.

Prática de ato processual sem a substituição da parte falecida gera nulidade relativa

No julgamento do REsp 2.033.239, a Terceira Turma decidiu que a prática de um ato processual após a morte da parte, sem a respectiva substituição pelo espólio, gera nulidade relativa. Para o colegiado, o ato somente deve ser anulado se a não regularização do polo processual representar prejuízo concreto ao espólio.

No caso analisado, entretanto, tentou-se usar uma nulidade de algibeira quando a coexecutada – que era esposa da parte falecida –, de forma deliberada, não comunicou o juízo sobre a morte do executado para anular a avaliação de um imóvel penhorado a pedido de um banco.

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, observou que, nos termos do artigo 313, inciso I, do CPC, a morte de uma das partes enseja a imediata suspensão do processo, a fim de viabilizar a sua substituição processual pelo espólio e, assim, preservar o interesse do espólio e dos herdeiros. Porém, o magistrado apontou que a nulidade resultante da inobservância dessa regra é relativa, passível de ser declarada apenas se a não regularização do polo causar real prejuízo ao espólio. Do contrário, os atos processuais praticados são considerados válidos.

“A caracterização de alegado prejuízo processual, advinda da não suspensão do feito, mostra-se absolutamente incoerente quando a parte a quem a nulidade aproveitaria, ciente de seu fato gerador, não a suscita nos autos logo na primeira oportunidade que lhe é dada”, afirmou.

Audiência não realizada em ação de reintegração de posse só beneficiaria parte contrária

Em outro recurso julgado pela Terceira Turma (REsp 1.699.980), também de relatoria do ministro Bellizze, uma empresa buscava reverter a decisão em ação de reintegração de posse que teve sentença proferida sem a realização de audiência de justificação prévia.

Para o ministro, a falta da audiência não causou prejuízo à empresa, já que o único provimento que poderia decorrer desse ato seria a concessão de providência liminar à parte contrária.

“Ainda que se pudesse vislumbrar a possibilidade de dano à parte ré no caso concreto, a jurisprudência desta Corte Superior é firme no sentido de que a decretação de nulidade processual não prescinde da efetiva demonstração do prejuízo, ônus do qual a parte não se desincumbiu”, ressaltou Bellizze.

Ao lembrar que eventuais vícios processuais devem ser alegados na primeira oportunidade que a parte tiver de se manifestar nos autos, sob pena de preclusão, o relator concluiu que a empresa se valeu dos instrumentos do processo para condicionar o apontamento do suposto vício a uma decisão anterior desfavorável – situação compatível com a nulidade de algibeira.

Vício no prazo para apelação só foi alegado dois anos após o trânsito em julgado

Ao dar provimento ao REsp 1.833.871, a Terceira Turma rechaçou o uso da nulidade de algibeira e decidiu que a parte ré não poderia ter o prazo para apelação restabelecido, sob alegação de nulidade da intimação, após o decurso de aproximadamente dois anos do trânsito em julgado da sentença.

Na origem do processo, discutia-se a divisão de bens de uma empresa de artefatos de cerâmica após a saída de um de seus sócios, que teve o pedido julgado parcialmente procedente. Em seguida, as partes foram intimadas sobre uma decisão que rejeitou embargos de declaração contra a sentença. Por meio eletrônico, o juízo estabeleceu o prazo recursal de dez dias, quando a lei é expressa ao definir que o prazo correto é de 15 dias. No entanto, sem que qualquer recurso fosse apresentado, a sentença transitou em julgado.

Cerca de dois anos depois, a ré apresentou apelação e, informando o erro na intimação eletrônica, requereu o restabelecimento do prazo recursal.

O relator no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, ressaltou que a empresa não apelou em nenhum dos prazos possíveis, permanecendo inerte por cerca de dois anos. “Salta aos olhos a má-fé da apelante, pois guardou a suposta nulidade da intimação para suscitá-la apenas muito tempo depois, no momento em que lhe pareceu mais conveniente”, declarou o ministro ao associar essa estratégia processual às nulidades de algibeira. RHC 115647AREsp 1734523REsp 756885REsp 1637515REsp 96229REsp 1714163AREsp 2204219REsp 1372802AREsp 2197101MS 22757REsp 2033239REsp 1699980REsp 1833871.

FONTE:  STJ, 03 DE SETEBRO DE 2023.

Treinamento OAB+FACIL, um facilitador para o 39º exame da OAB

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treinamento oab mais facil

                           REGULAMENTO DO TREINAMENTO  OAB + FACIL

  I.   OBJETIVOS

O programa  de treinamento OAB + FACIL tem por objetivos:

·     Oferecer aos interessados,  uma oportunidade de estudo intensivo e sistemático das disciplinas normalmente exigidas nos Exames da OAB, pelo período de 10 (dez) semanas consecutivas, com 800 questões objetivas, divididas em 10 módulos  de 80  questões cada um.

·     propiciar a revisão dos conteúdos programáticos exigidos nos exames unificados da OAB,   bem como a familiarização com  o tipo de questões propostas.

·     adequar a solução das provas com o tempo disponibilizado pela OAB para solução das questões.

II.   PÚBLICO ALVO

·         Estudantes de Direito  do 7º, 8º, 9º e 10º semestres,  e estudantes e bacharéis em Direito que pretendem se preparar para a 1ª fase do 39º Exame da OAB a ser realizado em 19/11/2023.

III.  INÍCIO DO PROGRAMA

O Treinamento terá início no dia 15/09/2023 e se estenderá até dia 14/11/2023.

IV.  INSCRIÇÕES

Para formalização da inscrição, os interessados deverão  manifestar interesse, pelo e-mail  clovis@prolegis.com.br, indicando obrigatoriamente, em letra maiúscula:  NOME COMPLETO, INSTITUIÇÃO, CONDIÇÃO (SE ESTUDANTE/BACHAREL), E-MAIL ALTERNATIVO (SE POSSIVEL) e Nº DE WHATSAPP  até dia 13/09/2023.

V. CONFIRMAÇÕES DAS INSCRIÇÕES

As inscrições serão confirmadas  até dia 13/09/2023, mediante o depósito mínimo de R$ 50,00 pelo PIX 11974039680 até dia 13/09/2023, como contribuição para o trabalho solidário que desenvolvemos de ajuda aos moradores de rua, servindo semanalmente lanches e distribuição de cobertores através do PROLEGIS SOLIDÁRIO.

VI.  METODOLOGIA

Os participantes previamente inscritos, receberão semanalmente, a partir do dia 15/09/2023 (sexta feira), pelo e-mail cadastrado, (preferencialmente dois  endereços de e-mail), o seguinte material:

–   PRIMEIRO MÓDULO  com 80 questões objetivas, selecionadas de exames já realizados pela OAB, bem como a FOLHA DE RESPOSTA.

– A FOLHA DE RESPOSTA deverá ser devolvida, por e-mail, com a identificação do treinando, contendo obrigatoriamente seu NOME,  RA e TURMA,   após a solução da prova, até dia 18/09/2023 (segunda feira), às 18h, impreterivelmente.

– O GABARITO divulgado pela OAB, será enviado no dia 19/09/2023, através dos endereços eletrônicos cadastrados, aos  treinandos que enviarem tempestivamente a folha de respostas, para conferência e estatística.

–  Os treinandos terão de 20/09/2023 a 21/09/2023, para revisarem as questões que erraram, sanando dúvidas individualmente ou em estudo em grupo.

O SEGUNDO MÓDULO e a FOLHA DE RESPOSTA, bem como os demais MÓDULOS, serão enviados semanalmente, apenas aos treinandos que devolverem o GABARITO DO MÓDULO da semana anterior, sem interrupção e no calendário previamente fixado, seguindo o seguinte cronograma:

ENVIO QUESTÕES DEVOLUÇÃO FOLHA RESPOSTA ENVIO DO GABARITO
2º MOD.    22/09/23 25/09/23 26/09/23
3º MOD.      29/09/23 02/10/23 03/10/23
4º MOD.      06/10/23 09/10/23 10/10/23
5º MOD.      13/10/23 16/10/23 17/10/23
6º MOD.      20/10/23 23/10/23 24/10/23
7ºMOD.       27/10/23 30/10/23 31/10/23
8ºMOD.       03/11/23 06/11/23 07/11/23
9º MOD.      10/11/23 13/11/23 14/11/23
10º MOD.    10/11/23 13/11/23 14/11/23

 

VI.              EMISSÃO DE CERTIFICADO

 Ao final do treinamento, será conferido aos alunos que participarem integralmente do TREINAMENTO OAB + FACIL, um CERTIFICADO com  24h.  de ATIVIDADE COMPLEMENTAR pelo PROLEGIS Instituto de Pesquisa e Ensino Jurídico Prof. Clovis Brasil Pereira.

 

Abuso do direito de ação: o reconhecimento de limites no acesso à Justiça

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O amplo acesso à Justiça é um direito fundamental cristalizado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Mas, como qualquer outro direito, o acesso à Justiça também encontra as suas limitações no ordenamento jurídico e deve ser exercido com responsabilidade.

O abuso do direito de ação é caracterizado pela utilização exagerada ou desvirtuada desse direito, com o objetivo de prolongar, atrasar ou impedir o andamento de processos. Há ainda os que ajuízam ações com conflitos forjados ou fictícios, pretendendo obter alguma vantagem de forma ilegítima.

O STJ já analisou diversos casos sobre abuso do direito de ação e definiu as possibilidades de reconhecimento dessa situação excepcional ao amplo acesso à Justiça, inclusive do chamado assédio processual.

Ajuizamento de sucessivas ações pode configurar assédio

Entrar na Justiça com sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa e levar ao reconhecimento do assédio processual. O entendimento foi adotado pela Terceira Turma, por maioria, ao dar parcial provimento ao REsp 1.817.845.

Duas famílias disputavam uma área de mais de 1.500 hectares de uma fazenda. Foram propostas diversas ações – entre elas, uma ação divisória, em 1988 – e interpostos diferentes tipos de recursos. Em 1995, foi proferida a sentença na primeira fase da ação divisória, em que se determinou a divisão do imóvel entre as famílias.

Às vésperas da restituição da área que cabia aos autores da ação divisória, a outra família ajuizou sucessivamente, entre setembro e novembro de 2011, uma série de novas ações, todas sem qualquer fundamento relevante, manejadas quando já estava consolidada, há mais de 16 anos, a propriedade da outra parte.

No voto que prevaleceu no julgamento, a ministra Nancy Andrighi apontou que tal atitude configurou abuso de direito, uma vez que, conforme o artigo 187 do Código Civil, comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

“O abuso do direito fundamental de acesso à Justiça em que incorreram os recorridos não se materializou em cada um dos atos processuais individualmente considerados, mas, ao revés, concretizou-se em uma série de atos concertados, em sucessivas pretensões desprovidas de fundamentação e em quase uma dezena de demandas frívolas e temerárias, razão pela qual é o conjunto dessa obra verdadeiramente mal-acabada que configura o dever de indenizar”, concluiu.

Reiteração de medidas processuais descabidas autoriza trânsito em julgado

Com apoio em precedentes, em 2021, a Primeira Seção determinou a certificação imediata do trânsito em julgado na Rcl 41.549, por reconhecer abuso do direito de ação na insistência da parte em apresentar medidas descabidas.

No caso, uma mulher ajuizou ação buscando receber a pensão especial deixada por ex-combatente, sob o argumento de que esta poderia ser requerida a qualquer tempo, não sendo aplicável a prescrição de fundo de direito. Com o objetivo de reverter o acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que negou sua pretensão, a mulher impetrou vários recursos e outras medidas no STJ – entre eles, agravo em recurso especial, ação rescisória, reclamação, agravo interno e pedido de reconsideração.

Após a Primeira Seção do STJ indeferir liminarmente a ação rescisória, a parte entrou com reclamação, sustentando que o colegiado teria usurpado a competência do próprio tribunal. Em decisão monocrática, o relator, ministro Og Fernandes, afirmou que não cabe reclamação dirigida ao STJ contra acórdão proferido por um de seus órgãos jurisdicionais.

“Não faz sentido reconhecer que a Primeira Seção do STJ tenha usurpado sua própria competência para julgamento da ação rescisória”, declarou o ministro ao considerar que a reclamação foi usada como sucedâneo de recurso, “o que é inadmissível”.

Não satisfeita, a parte recorreu com agravo interno. A seção negou provimento ao recurso e, em razão da insistência na utilização de um instrumento processual manifestamente descabido, aplicou a multa prevista no artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil (CPC), fixada em 1% sobre o valor atualizado da causa.

A parte, então, apresentou pedido de reconsideração, alegando não ter condições de pagar a multa processual e insistindo na procedência da reclamação. No entanto, não há previsão legal ou regimental desse tipo de pedido em relação a decisão colegiada. “A reiteração de medida judicial manifestamente descabida caracteriza abuso do direito de ação e autoriza a certificação imediata do trânsito em julgado da demanda”, decidiu Og Fernandes, que foi acompanhado de forma unânime pela seção.

Reconhecimento do abuso de direito de ação é medida excepcional

No julgamento do REsp 1.770.890, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma reafirmou a jurisprudência segundo a qual o reconhecimento de abuso do direito de ação é excepcional, por estar intimamente atrelado ao acesso à Justiça, devendo ser analisado com prudência pelo julgador e declarado apenas quando o desvirtuamento do exercício desse direito for amplamente demonstrado.

O colegiado afastou a condenação por danos morais de três ex-vereadores do município Rio do Sul (SC) em razão de ação popular ajuizada por eles para impugnar a venda de um imóvel pela prefeitura. Os ex-vereadores haviam sido condenados nas instâncias ordinárias porque teriam utilizado a ação popular para fins políticos, mas o STJ concluiu que não foram demonstrados nem o abuso do direito de ação nem o dano moral indenizável.

De acordo com o relator, a análise da configuração do abuso deve ser ainda mais minuciosa quando se tratar da utilização de uma ação constitucional, como é o caso da ação popular, voltada para a tutela de direitos coletivos e um importante instrumento para a efetivação da democracia participativa, pois possibilita a interferência do cidadão na gestão da coisa pública.

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, mesmo sendo válida a preocupação do julgador com um eventual uso político da ação popular – o que significaria desvirtuamento do instituto –, essa análise deve se pautar pela prudência, “de modo a não coibir o seu uso diante de possíveis lesões ao patrimônio público e à moralidade pública”.

Mandados de injunção idênticos com diferentes pessoas no polo ativo

Para a Corte Especial, a impetração de vários mandados de injunção, com diferentes indivíduos no polo ativo, não caracteriza assédio processual. O colegiado entendeu que, em tal situação, a parte impetrante não deve ser condenada ao pagamento de indenização ou multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação, pois a Constituição Federal autoriza a impetração de mandado de injunção sempre que a pessoa considerar que a demora do Estado em editar norma jurídica a impede de exercer direito assegurado constitucionalmente.

No caso dos autos, um militar entrou com o pedido de mandado de injunção contra o comandante da Aeronáutica, alegando omissão dessa autoridade na edição de norma para disciplinar o direito de promoção do Quadro Especial de Sargentos.

Durante o trâmite do MI 345 no STJ, a União sustentou a ocorrência de assédio processual, que estaria caracterizado pela impetração de diversos mandados de injunção desprovidos de fundamentação idônea e intentados sem nenhum interesse legítimo a ser tutelado. Por isso, pediu que fosse fixada indenização ou multa contra o impetrante, por abuso de direito processual e litigância de má-fé.

Ao proferir sua decisão, o ministro Raul Araújo, relator, observou que o simples fato de o litigante utilizar ação ou recurso previsto em lei ou – como no caso – na própria Constituição não significa litigância de má-fé.

“O fato de terem sido impetrados vários mandados de injunção idênticos, cada qual com um indivíduo no polo ativo, não caracteriza, por si só, a litigância de má-fé. Julgando embargos de declaração similares aos dos presentes autos, a Corte Especial já teve a oportunidade de se manifestar, concluindo pela não configuração da litigância de má-fé e do assédio processual”, afirmou.

No AREsp 952.308, de forma semelhante, a Quarta Turma considerou indevida a aplicação de multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação contra a pessoa que utiliza legitimamente um recurso previsto na legislação processual civil com o objetivo de esgotar a instância ordinária e possibilitar a interposição do recurso especial ao STJ.

Nesse caso, foi ajuizada contra um banco ação declaratória de inexigibilidade de dívida, cumulada com pedido de indenização por danos morais. A instituição financeira foi condenada à reparação dos danos pela inscrição indevida do nome do autor em órgãos de restrição de crédito. Em embargos de declaração, o consumidor requereu o aumento da indenização, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), além de rejeitar o pedido, puniu o embargante com multas, dada a sua insistência em argumentos já rejeitados.

O relator, ministro Raul Araújo, ressaltou que, como a interposição de agravo interno configura legítimo exercício das garantias do devido processo legal, deve-se afastar não apenas a multa do artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, mas também a sanção por litigância de má-fé, pois ambas foram fundadas no mesmo fato (interposição do recurso).

Inversão automática do ônus da prova pode facilitar abuso do direito de ação

Ao julgar o REsp 1.866.232, a Terceira Turma entendeu que a inversão do ônus probatório a respeito da veracidade e da correção da informação publicitária, prevista no artigo 38 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), não se aplica a demandas que discutem concorrência desleal.

Nesse processo, a rede de lanchonetes Burger King buscava fazer com que o restaurante Madero Steak House, seu concorrente, parasse de veicular propaganda supostamente enganosa com a frase “o melhor hambúrguer do mundo”. A Burger King alegou que deveria haver inversão do ônus da prova, ficando seu concorrente responsável pelo custeio da produção da perícia, pois, embora não houvesse relação de consumo entre as partes, a aplicação do artigo 38 do CDC era necessária para proteger o consumidor de práticas abusivas e desleais.

O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), afirmou que a norma do CDC não poderia ser aplicada nas relações entre empresas concorrentes, pois poderia facilitar o abuso do direito de ação, incentivando estratégias anticoncorrenciais, uma vez que, a partir do ajuizamento de demanda fútil, o ônus da prova estaria direta e automaticamente imposto ao concorrente com menor porte econômico.

Em tal hipótese, comentou o ministro, o processo estaria sendo utilizado não para obter um provimento jurisdicional, mas, sim, “como meio de dificultar a atividade do concorrente ou mesmo de barrar a entrada de novos competidores no mercado”.  REsp 1817845Rcl 41549REsp 1770890MI 345AREsp 952308REsp 1866232

FONTE:   STJ, 27 de agosto de 2023.