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Treinamento OAB+FACIL, um facilitador para o 39º exame da OAB

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treinamento oab mais facil

                           REGULAMENTO DO TREINAMENTO  OAB + FACIL

  I.   OBJETIVOS

O programa  de treinamento OAB + FACIL tem por objetivos:

·     Oferecer aos interessados,  uma oportunidade de estudo intensivo e sistemático das disciplinas normalmente exigidas nos Exames da OAB, pelo período de 10 (dez) semanas consecutivas, com 800 questões objetivas, divididas em 10 módulos  de 80  questões cada um.

·     propiciar a revisão dos conteúdos programáticos exigidos nos exames unificados da OAB,   bem como a familiarização com  o tipo de questões propostas.

·     adequar a solução das provas com o tempo disponibilizado pela OAB para solução das questões.

II.   PÚBLICO ALVO

·         Estudantes de Direito  do 7º, 8º, 9º e 10º semestres,  e estudantes e bacharéis em Direito que pretendem se preparar para a 1ª fase do 39º Exame da OAB a ser realizado em 19/11/2023.

III.  INÍCIO DO PROGRAMA

O Treinamento terá início no dia 15/09/2023 e se estenderá até dia 14/11/2023.

IV.  INSCRIÇÕES

Para formalização da inscrição, os interessados deverão  manifestar interesse, pelo e-mail  clovis@prolegis.com.br, indicando obrigatoriamente, em letra maiúscula:  NOME COMPLETO, INSTITUIÇÃO, CONDIÇÃO (SE ESTUDANTE/BACHAREL), E-MAIL ALTERNATIVO (SE POSSIVEL) e Nº DE WHATSAPP  até dia 13/09/2023.

V. CONFIRMAÇÕES DAS INSCRIÇÕES

As inscrições serão confirmadas  até dia 13/09/2023, mediante o depósito mínimo de R$ 50,00 pelo PIX 11974039680 até dia 13/09/2023, como contribuição para o trabalho solidário que desenvolvemos de ajuda aos moradores de rua, servindo semanalmente lanches e distribuição de cobertores através do PROLEGIS SOLIDÁRIO.

VI.  METODOLOGIA

Os participantes previamente inscritos, receberão semanalmente, a partir do dia 15/09/2023 (sexta feira), pelo e-mail cadastrado, (preferencialmente dois  endereços de e-mail), o seguinte material:

–   PRIMEIRO MÓDULO  com 80 questões objetivas, selecionadas de exames já realizados pela OAB, bem como a FOLHA DE RESPOSTA.

– A FOLHA DE RESPOSTA deverá ser devolvida, por e-mail, com a identificação do treinando, contendo obrigatoriamente seu NOME,  RA e TURMA,   após a solução da prova, até dia 18/09/2023 (segunda feira), às 18h, impreterivelmente.

– O GABARITO divulgado pela OAB, será enviado no dia 19/09/2023, através dos endereços eletrônicos cadastrados, aos  treinandos que enviarem tempestivamente a folha de respostas, para conferência e estatística.

–  Os treinandos terão de 20/09/2023 a 21/09/2023, para revisarem as questões que erraram, sanando dúvidas individualmente ou em estudo em grupo.

O SEGUNDO MÓDULO e a FOLHA DE RESPOSTA, bem como os demais MÓDULOS, serão enviados semanalmente, apenas aos treinandos que devolverem o GABARITO DO MÓDULO da semana anterior, sem interrupção e no calendário previamente fixado, seguindo o seguinte cronograma:

ENVIO QUESTÕESDEVOLUÇÃO FOLHA RESPOSTAENVIO DO GABARITO
2º MOD.    22/09/2325/09/2326/09/23
3º MOD.      29/09/2302/10/2303/10/23
4º MOD.      06/10/2309/10/2310/10/23
5º MOD.      13/10/2316/10/2317/10/23
6º MOD.      20/10/2323/10/2324/10/23
7ºMOD.       27/10/2330/10/2331/10/23
8ºMOD.       03/11/2306/11/2307/11/23
9º MOD.      10/11/2313/11/2314/11/23
10º MOD.    10/11/2313/11/2314/11/23

 

VI.              EMISSÃO DE CERTIFICADO

 Ao final do treinamento, será conferido aos alunos que participarem integralmente do TREINAMENTO OAB + FACIL, um CERTIFICADO com  24h.  de ATIVIDADE COMPLEMENTAR pelo PROLEGIS Instituto de Pesquisa e Ensino Jurídico Prof. Clovis Brasil Pereira.

 

Abuso do direito de ação: o reconhecimento de limites no acesso à Justiça

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O amplo acesso à Justiça é um direito fundamental cristalizado no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal. Mas, como qualquer outro direito, o acesso à Justiça também encontra as suas limitações no ordenamento jurídico e deve ser exercido com responsabilidade.

O abuso do direito de ação é caracterizado pela utilização exagerada ou desvirtuada desse direito, com o objetivo de prolongar, atrasar ou impedir o andamento de processos. Há ainda os que ajuízam ações com conflitos forjados ou fictícios, pretendendo obter alguma vantagem de forma ilegítima.

O STJ já analisou diversos casos sobre abuso do direito de ação e definiu as possibilidades de reconhecimento dessa situação excepcional ao amplo acesso à Justiça, inclusive do chamado assédio processual.

Ajuizamento de sucessivas ações pode configurar assédio

Entrar na Justiça com sucessivas ações desprovidas de fundamentação idônea, intentadas com propósito doloso e abusivo, pode configurar ato ilícito de abuso do direito de ação ou de defesa e levar ao reconhecimento do assédio processual. O entendimento foi adotado pela Terceira Turma, por maioria, ao dar parcial provimento ao REsp 1.817.845.

Duas famílias disputavam uma área de mais de 1.500 hectares de uma fazenda. Foram propostas diversas ações – entre elas, uma ação divisória, em 1988 – e interpostos diferentes tipos de recursos. Em 1995, foi proferida a sentença na primeira fase da ação divisória, em que se determinou a divisão do imóvel entre as famílias.

Às vésperas da restituição da área que cabia aos autores da ação divisória, a outra família ajuizou sucessivamente, entre setembro e novembro de 2011, uma série de novas ações, todas sem qualquer fundamento relevante, manejadas quando já estava consolidada, há mais de 16 anos, a propriedade da outra parte.

No voto que prevaleceu no julgamento, a ministra Nancy Andrighi apontou que tal atitude configurou abuso de direito, uma vez que, conforme o artigo 187 do Código Civil, comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

“O abuso do direito fundamental de acesso à Justiça em que incorreram os recorridos não se materializou em cada um dos atos processuais individualmente considerados, mas, ao revés, concretizou-se em uma série de atos concertados, em sucessivas pretensões desprovidas de fundamentação e em quase uma dezena de demandas frívolas e temerárias, razão pela qual é o conjunto dessa obra verdadeiramente mal-acabada que configura o dever de indenizar”, concluiu.

Reiteração de medidas processuais descabidas autoriza trânsito em julgado

Com apoio em precedentes, em 2021, a Primeira Seção determinou a certificação imediata do trânsito em julgado na Rcl 41.549, por reconhecer abuso do direito de ação na insistência da parte em apresentar medidas descabidas.

No caso, uma mulher ajuizou ação buscando receber a pensão especial deixada por ex-combatente, sob o argumento de que esta poderia ser requerida a qualquer tempo, não sendo aplicável a prescrição de fundo de direito. Com o objetivo de reverter o acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que negou sua pretensão, a mulher impetrou vários recursos e outras medidas no STJ – entre eles, agravo em recurso especial, ação rescisória, reclamação, agravo interno e pedido de reconsideração.

Após a Primeira Seção do STJ indeferir liminarmente a ação rescisória, a parte entrou com reclamação, sustentando que o colegiado teria usurpado a competência do próprio tribunal. Em decisão monocrática, o relator, ministro Og Fernandes, afirmou que não cabe reclamação dirigida ao STJ contra acórdão proferido por um de seus órgãos jurisdicionais.

“Não faz sentido reconhecer que a Primeira Seção do STJ tenha usurpado sua própria competência para julgamento da ação rescisória”, declarou o ministro ao considerar que a reclamação foi usada como sucedâneo de recurso, “o que é inadmissível”.

Não satisfeita, a parte recorreu com agravo interno. A seção negou provimento ao recurso e, em razão da insistência na utilização de um instrumento processual manifestamente descabido, aplicou a multa prevista no artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil (CPC), fixada em 1% sobre o valor atualizado da causa.

A parte, então, apresentou pedido de reconsideração, alegando não ter condições de pagar a multa processual e insistindo na procedência da reclamação. No entanto, não há previsão legal ou regimental desse tipo de pedido em relação a decisão colegiada. “A reiteração de medida judicial manifestamente descabida caracteriza abuso do direito de ação e autoriza a certificação imediata do trânsito em julgado da demanda”, decidiu Og Fernandes, que foi acompanhado de forma unânime pela seção.

Reconhecimento do abuso de direito de ação é medida excepcional

No julgamento do REsp 1.770.890, de relatoria do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, a Terceira Turma reafirmou a jurisprudência segundo a qual o reconhecimento de abuso do direito de ação é excepcional, por estar intimamente atrelado ao acesso à Justiça, devendo ser analisado com prudência pelo julgador e declarado apenas quando o desvirtuamento do exercício desse direito for amplamente demonstrado.

O colegiado afastou a condenação por danos morais de três ex-vereadores do município Rio do Sul (SC) em razão de ação popular ajuizada por eles para impugnar a venda de um imóvel pela prefeitura. Os ex-vereadores haviam sido condenados nas instâncias ordinárias porque teriam utilizado a ação popular para fins políticos, mas o STJ concluiu que não foram demonstrados nem o abuso do direito de ação nem o dano moral indenizável.

De acordo com o relator, a análise da configuração do abuso deve ser ainda mais minuciosa quando se tratar da utilização de uma ação constitucional, como é o caso da ação popular, voltada para a tutela de direitos coletivos e um importante instrumento para a efetivação da democracia participativa, pois possibilita a interferência do cidadão na gestão da coisa pública.

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, mesmo sendo válida a preocupação do julgador com um eventual uso político da ação popular – o que significaria desvirtuamento do instituto –, essa análise deve se pautar pela prudência, “de modo a não coibir o seu uso diante de possíveis lesões ao patrimônio público e à moralidade pública”.

Mandados de injunção idênticos com diferentes pessoas no polo ativo

Para a Corte Especial, a impetração de vários mandados de injunção, com diferentes indivíduos no polo ativo, não caracteriza assédio processual. O colegiado entendeu que, em tal situação, a parte impetrante não deve ser condenada ao pagamento de indenização ou multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação, pois a Constituição Federal autoriza a impetração de mandado de injunção sempre que a pessoa considerar que a demora do Estado em editar norma jurídica a impede de exercer direito assegurado constitucionalmente.

No caso dos autos, um militar entrou com o pedido de mandado de injunção contra o comandante da Aeronáutica, alegando omissão dessa autoridade na edição de norma para disciplinar o direito de promoção do Quadro Especial de Sargentos.

Durante o trâmite do MI 345 no STJ, a União sustentou a ocorrência de assédio processual, que estaria caracterizado pela impetração de diversos mandados de injunção desprovidos de fundamentação idônea e intentados sem nenhum interesse legítimo a ser tutelado. Por isso, pediu que fosse fixada indenização ou multa contra o impetrante, por abuso de direito processual e litigância de má-fé.

Ao proferir sua decisão, o ministro Raul Araújo, relator, observou que o simples fato de o litigante utilizar ação ou recurso previsto em lei ou – como no caso – na própria Constituição não significa litigância de má-fé.

“O fato de terem sido impetrados vários mandados de injunção idênticos, cada qual com um indivíduo no polo ativo, não caracteriza, por si só, a litigância de má-fé. Julgando embargos de declaração similares aos dos presentes autos, a Corte Especial já teve a oportunidade de se manifestar, concluindo pela não configuração da litigância de má-fé e do assédio processual”, afirmou.

No AREsp 952.308, de forma semelhante, a Quarta Turma considerou indevida a aplicação de multa por litigância de má-fé ou abuso do direito de ação contra a pessoa que utiliza legitimamente um recurso previsto na legislação processual civil com o objetivo de esgotar a instância ordinária e possibilitar a interposição do recurso especial ao STJ.

Nesse caso, foi ajuizada contra um banco ação declaratória de inexigibilidade de dívida, cumulada com pedido de indenização por danos morais. A instituição financeira foi condenada à reparação dos danos pela inscrição indevida do nome do autor em órgãos de restrição de crédito. Em embargos de declaração, o consumidor requereu o aumento da indenização, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), além de rejeitar o pedido, puniu o embargante com multas, dada a sua insistência em argumentos já rejeitados.

O relator, ministro Raul Araújo, ressaltou que, como a interposição de agravo interno configura legítimo exercício das garantias do devido processo legal, deve-se afastar não apenas a multa do artigo 1.021, parágrafo 4º, do Código de Processo Civil, mas também a sanção por litigância de má-fé, pois ambas foram fundadas no mesmo fato (interposição do recurso).

Inversão automática do ônus da prova pode facilitar abuso do direito de ação

Ao julgar o REsp 1.866.232, a Terceira Turma entendeu que a inversão do ônus probatório a respeito da veracidade e da correção da informação publicitária, prevista no artigo 38 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), não se aplica a demandas que discutem concorrência desleal.

Nesse processo, a rede de lanchonetes Burger King buscava fazer com que o restaurante Madero Steak House, seu concorrente, parasse de veicular propaganda supostamente enganosa com a frase “o melhor hambúrguer do mundo”. A Burger King alegou que deveria haver inversão do ônus da prova, ficando seu concorrente responsável pelo custeio da produção da perícia, pois, embora não houvesse relação de consumo entre as partes, a aplicação do artigo 38 do CDC era necessária para proteger o consumidor de práticas abusivas e desleais.

O relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido), afirmou que a norma do CDC não poderia ser aplicada nas relações entre empresas concorrentes, pois poderia facilitar o abuso do direito de ação, incentivando estratégias anticoncorrenciais, uma vez que, a partir do ajuizamento de demanda fútil, o ônus da prova estaria direta e automaticamente imposto ao concorrente com menor porte econômico.

Em tal hipótese, comentou o ministro, o processo estaria sendo utilizado não para obter um provimento jurisdicional, mas, sim, “como meio de dificultar a atividade do concorrente ou mesmo de barrar a entrada de novos competidores no mercado”.  REsp 1817845Rcl 41549REsp 1770890MI 345AREsp 952308REsp 1866232

FONTE:   STJ, 27 de agosto de 2023.

Quarta Turma vê nulidade em falta de intimação de réu revel na fase de cumprimento de sentença

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​A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou causa de nulidade processual a falta de intimação de réu revel na fase de cumprimento de sentença, nos termos do artigo 513, parágrafo 2º, inciso II, do Código de Processo Civil (CPC). De acordo com o colegiado, nas hipóteses em que a parte executada estiver representada pela Defensoria Pública ou não tiver advogado nos autos, a intimação deve ser realizada por meio de carta com aviso de recebimento.

O entendimento foi estabelecido pela turma ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) que considerou desnecessária a intimação pessoal de executada, cuja revelia foi declarada na fase de conhecimento.

Para o TJRS, ao ser citada para contestar a ação e deixar transcorrer sem manifestação o prazo de defesa, tampouco constituir defensor nos autos, a parte demonstrou desinteresse em participar do processo na fase de conhecimento.

É clara a necessidade de intimação da parte revel sobre a fase executiva

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso especial da parte executada, lembrou que, segundo o artigo 513, parágrafo 2º, inciso II, do CPC/2015, o devedor será intimado para cumprir a sentença mesmo quando não tiver procurador constituído nos autos.

“A norma processual é clara e não permite nenhum outro entendimento a respeito do tema, sendo, por conseguinte, causa de nulidade a ausência de intimação da parte revel em fase de cumprimento de sentença, não obstante ter sido devidamente citada na ação de conhecimento”, completou o ministro.

Como consequência, a Quarta Turma anulou os atos processuais posteriores ao momento em que a parte executada deveria ter sido intimada para o cumprimento de sentença, determinando o retorno dos autos à primeira instância.  REsp 2.053.868.

FONTE: STJ, 25 de agosto de 2023.

Reconhecimento judicial de falha do cartório abre prazo prescricional da ação indenizatória contra tabelião

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​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o prazo prescricional para ajuizar pedido de indenização contra o tabelião, em razão dos danos materiais decorrentes de procuração nula lavrada por ele, começa a contar a partir do trânsito em julgado da sentença que reconheceu a nulidade.

De acordo com os autos, a empresa autora da ação indenizatória negociou a compra de um imóvel com uma pessoa que possuía procuração supostamente passada pela proprietária. Após a concretização do negócio, a antiga dona do imóvel ajuizou ação declaratória de nulidade e cancelamento de registro e uma ação de reintegração de posse. A primeira, julgada procedente, transitou em julgado em 2017.

Diante disso, em 2019, a empresa compradora do imóvel acionou judicialmente o tabelião, pedindo indenização pelos prejuízos sofridos em decorrência da lavratura de procuração pública com base em identidade falsa, e obteve êxito nas instâncias ordinárias, que reconheceram a legitimidade passiva do tabelião e afastaram a prescrição.

No recurso especial dirigido ao STJ, o tabelião sustentou que o prazo de prescrição da reparação civil, de três anos nesse caso, deveria ser contado da data da lavratura da procuração, conforme o artigo 22, parágrafo único, da Lei 8.938/1994.

Configuração do efetivo prejuízo depende do trânsito em julgado

A relatora, ministra Nancy Andrighi, afirmou que o ato notarial e de registro tem presunção legal de veracidade e, por isso, no caso em julgamento, o efetivo prejuízo só se configurou com o trânsito em julgado da sentença que reconheceu a nulidade documental e resultou na reintegração da antiga proprietária na posse do imóvel.

“A pretensão indenizatória da autora contra o tabelião nasceu somente quando infirmada, definitivamente, a autenticidade do ato notarial e de registro lavrado no cartório de que ele é titular”, acrescentou.

A ministra apontou uma decisão semelhante, também da Terceira Turma, no AREsp 2.023.744, que aplicou a teoria da actio nata por entender que “a pretensão indenizatória da parte recorrida dependia do reconhecimento judicial do vício no registro”.

“Não merece reparo o acórdão exarado pelo tribunal de origem, ao manter a decisão que afastou a alegada prescrição, fundado na teoria da actio nata“, concluiu a relatora.  REsp 2.043.325.

FONTE:  STJ, 24 de agosto de 2023.

Juiz não pode marcar audiência para retratação em caso de violência doméstica sem pedido da vítima

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Por unanimidade, o STF entendeu que obrigar a mulher a comparecer à audiência viola sua livre vontade.

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o juiz não pode, sem pedido da vítima, marcar audiência para que ela desista de processar o agressor nos crimes de violência contra mulher em que a ação penal seja condicionada à sua manifestação. A decisão unânime foi tomada na sessão virtual finalizada em 21/8,no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7267.

Retratação tácita

Segundo o artigo 16 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), nas ações penais públicas condicionadas à representação da vítima (lesão corporal leve e lesão culposa), a renúncia tem de ser admitida perante o juiz, em audiência especialmente designada para essa finalidade.

Na ação, a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) questionava a interpretação do dispositivo que tem levado magistrados a designar a audiência por conta própria, sem a manifestação da vítima. Segundo a entidade, o não comparecimento tem sido interpretado como renúncia tácita, com o arquivamento do processo. A Conamp sustenta que a finalidade da audiência é verificar o real desejo da ofendida de, se for o caso, retirar a representação contra o agressor, e não confirmá-la.

Livre vontade da vítima

Para o relator da ação, ministro Edson Fachin, a obrigatoriedade da audiência, sem manifestação nesse sentido, viola o direito à igualdade, porque discrimina injustamente a vítima. Ele explicou que a função da audiência perante o juiz não é apenas avaliar um requisito procedimental, mas permitir que a mulher possa livremente expressar sua vontade.

Segundo Fachin, a garantia da liberdade só é assegurada se a audiência for solicitada pela própria mulher, e obrigá-la a comparecer viola a intenção da vítima. Assim, o eventual não comparecimento não pode ser entendido como retratação ou renúncia tácita ao direito de representação.

FONTE: STF, 25 de agosto de 2023.

Sancionada perda da herança após sentença definitiva contra herdeiro indigno

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Publicada no Diário Oficial da União – DOU, dessa quinta-feira (24), a Lei 14.661/2023 prevê perda da herança após sentença definitiva contra herdeiro indigno. A norma altera o Código Civil e determina a perda automática da herança após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

O texto, sancionado sem vetos pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, no exercício da Presidência da República, exclui da herança aqueles que participarem de homicídio doloso, ou tentativa, contra quem deixa os bens.

Também são considerados indignos e excluídos da herança aqueles que acusarem caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a honra; e os que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente dos bens por ato de última vontade.

Atualmente, o Código estabelece que a perda da herança deverá ser declarada em sentença judicial, e o direito de demandar na Justiça a exclusão do herdeiro ou legatário extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.

FONTE: IBDFAM, 25 de agosto de 2023.

Clube de futebol deve reintegrar fisiologista dispensado durante tratamento de câncer

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Para o TST, a dispensa foi discriminatória

A Subseção 1 em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho considerou discriminatória a dispensa de um fisiologista do São Paulo Futebol Clube durante o tratamento de câncer de próstata. Com isso, o clube deverá reintegrá-lo e restabelecer seu plano de saúde, e o processo retornará à Quinta Turma do TST para exame de matérias que não haviam sido julgadas no recurso anterior.

Dispensa

Na reclamação trabalhista, o fisiologista, contratado em 2012, disse que, no mesmo ano, foi diagnosticado com câncer e iniciou o tratamento. Em 2014, o clube chegou a lhe dar aviso-prévio, mas, ao ser informado da doença, afastou-o das atividades, mantendo o salário. Oito meses depois, foi afastado pelo INSS e ao receber alta, em 2016, foi dispensado.

Sem preconceito

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) acolheu o argumento da discriminação e determinou a reintegração e o restabelecimento do plano de saúde, além de deferir indenização por danos morais. Contudo, a Quinta Turma do TST reformou essa decisão, por entender que o câncer de próstata não se enquadra na Súmula 443 do TST, que presume discriminatória a dispensa em casos de doenças que gerem estigma ou preconceito.

A Turma também considerou que o clube paulistano, ciente da doença, havia permitido que o fisiologista frequentasse o local de trabalho e almoçasse no centro de treinamento, e, espontaneamente, mantido o pagamento dos salários no período do afastamento previdenciário.

Indício

No julgamento dos embargos do profissional à SDI-1, prevaleceu o voto da ministra Kátia Arruda, para quem a permissão para frequentar o centro de treinamento e a manutenção do pagamento de salários não têm relação direta com a ruptura do contrato de trabalho. Segundo a ministra, a dispensa logo após o término do benefício previdenciário é indício de que o empregador tomou a medida justamente em razão da necessidade de afastamento para tratamento.

Doença estigmatizante

O presidente do TST, ministro Lelio Bentes Corrêa, que havia pedido vista regimental do processo, associou-se à divergência, ressaltando que a jurisprudência da SDI-1 reconhece a natureza estigmatizante do câncer de próstata. Em voto convergente, ele elogiou a conduta do São Paulo de manter os salários durante o afastamento previdenciário, mas entendeu que não ficou demonstrada uma razão lícita e plausível para a demissão.

Ficaram vencidos os ministros Alexandre Ramos, Hugo Scheuermann,  Breno Medeiros e Evandro Valadão e a ministra Dora Maria da Costa.

Tutela de urgência

No dia 10 de agosto, a ministra Kátia Arruda concedeu tutela provisória de urgência determinando que a reintegração do fisiologista no prazo de 15 dias a contar da intimação da decisão, sob pena de multa diária de R$ 5 mil.  Processo: E-ED-RR-1001897-90.2016.5.02.0006

FONTE:  TST, 23 de agosto de 2023.

A Dimensão Trágica da Justiça

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Resumo. Seja a justiça divina[1] ou humana. Seja virtuosa ou apenas legalista. As lutas pelo poder trazem o questionamento sobre a legitimidade do detentor do poder, que se manifesta normalmente hoje diante da imagem do governante justo. Não há poder legítimo sem haver justiça e, também não existe justiça sem a dimensão do poder.  O conteúdo político e filosófico contido na literatura nos resgata e nos faz perceber no jogo de linguagem o quão difícil é harmonizar o poder com a justiça.

Palavras-chave: Ciência Política. Filosofia do Direito. Justiça. Poder. Tragédia.

 

De fato, a literatura é uma defesa contra as injustiças da vida. É a famosa frase de Cesare Pavese, um grande escritor e poeta italiano. Sendo um combatente antifascista pelo o que obteve três anos de prisão no Sul da Itália.

Reconheçamos que há uma tragédia potencial na relação complexa existente entre poder e justiça[2]. A tragédia é mais que mero gênero dramático-literário, pois nos faz pensar, sentir e refletir sobre a relação do ser humano com o mundo onde está inserido. Envolto nas laboriosas teias da genética, da história e da geografia.

O trágico é mesmo uma concepção antropológica e filosófica que nos seduz de diversas formas pois nos faz enxergar as múltiplas esferas da existência humana.

William Shakespeare não produziu somente tragédias, também foi hábil na comédia. E, tradicionalmente, os dramas históricos não ingleses que são inseridas nas obras do Bardo, há realmente cerca de dez peças mui especiais, a saber: de acordo com a ordem de composição são Tito Andrônico, Romeu e Julieta, Júlio César, Hamlet, Othello, Rei Lear, Macbeth, Antônio e Cleópatra, Coriolano e Timão de Atenas[3].

Shakespeare escreveu 154 sonetos, 4 poemas – sendo 2 narrativos – e 37 peças (ou 38, se considerarmos The Two Noble Kinsmen, recentemente incorporada ao cânone), que lhe renderam um lugar de destaque entre os “clássicos” da literatura[4] ocidental.

É certo que o poder[5] resta dissociado da justiça na perspectiva de Maquiavel, ou o poder estaria determinado pela concepção do justo, na perspectiva de Shakespeare.

Para Maquiavel[6], há a eterna possibilidade de haver um poder sem justiça, um poder baseado na força e na astúcia, um poder que nem precisa, forçosamente, ter qualquer compromisso com o ideal de justiça. Poder que não reconhece o conceito de legitimidade de modo como a entendemos contemporaneamente[7].

Shakespeare aponta para uma concepção em que não se pode dissociar o poder da justiça. No fundo, seriam os dois lados da mesma moeda, existiria então uma relação de implicação entre os dois conceitos de Shakespeare teria percebido e expresso de forma artística. Para o Bardo existia a justiça, uma que era divina e outra a dos homens que depende sinceramente de uma relação de poder.

Na justiça divina, dá-se uma adequação ou não aos desígnios do cosmos e a vontade de Deus. Já na justiça humana, a questão é saber quem poderá legitimamente executar a justiça. Só há justiça se cogitarmos em relações de mando[8] e obediência[9].

Mas, o poder, sua concepção e funcionamento estão condicionados à questão de justiça. Só existirá um poder legítimo onde houver a justiça manifesta. Sempre há o questionamento sobre o caráter legítimo do detentor do poder, que se expressa, na maioria das vezes, por meio da imagem consagrada do governante justo.

O combustível das tragédias é composto de justiça e poder. O poder, sem justiça, é via de arbitrariedades e autoritarismo. E, justiça sem poder é inócua e vazia. Além de não concretizar os valores que almeja implementar na sociedade humana.

Justiça é um conceito abstrato que se refere a um estado de interação social ideal onde há um equilíbrio, por si só, razoável e imparcial, entre os interesses, riquezas e oportunidades das pessoas envolvidas em determinado grupo social.

O memorável Oscar Wilde afirmou: Só há uma coisa pior que a Injustiça, que é a Justiça sem a espada na mão. Sem força, o Direito age a favor do Mal. (In: WILDE, Oscar. Aforismos ou mensagens eternas. São Paulo: Landy, 2006, p. 45).

O direito, sem a balança para pesá-lo, é força bruta e irracional. O direito, sem a espada para obrigar sua aplicação, é fraco. Da mesma forma, a ausência da venda nos olhos lhe retira a imparcialidade. Cada elemento deve completar o outro para que a justiça seja a mais justa possível[10].

Tercio Sampaio Ferraz Jr. (2014) já nos alertou sobre a relação intrínseca entre razão, comunicação e poder. A maior parte dos discursos humanos não se revela racional. Pois, a racionalidade é apenas forma possível entre tantas outras, de enfrentar a situação comunicativa, de enfrenta o jogo entre emissor e receptor, entre orador e ouvinte. No fundo, é um jogo de poder. O mestre em tom provocativo aponta para as relações entre filosofia política, literatura e filosofia do Direito.

Maquiavel como era pragmático sustentou que o poder é um fim a ser perseguido pelos homens de virtù[11]. E, para tal pensamento, o exercício do poder não precisa, necessariamente, de justificação. Poder e justiça restam plenamente apartados. E, tudo se passa como se o poder, por si só, tivesse validade na medida em que tenha efetividade[12].

A importância de Sócrates[13] para o estudo do conceito de justiça desde o momento em que o mesmo rompe da virtude (areté), transferindo-a de bens materiais para o comportamento humano, ou seja, a justiça se concretiza através de um comportamento reto, ela é aplicável independente de bens materiais, posição social do indivíduo, não se nasce justo[14].

Porém, ainda não se encontrava a preocupação com a justiça distributiva na filosofia socrática, mas sim, questionamentos e postulados éticos fundamentais para o desenvolvimento jusfilosófico ocidental.

Já para Platão, um socrático maior, foi atribuído o mérito de ter escrito a primeira obra dedicada à filosofia da justiça no Ocidente, a República. Para Platão, a justiça é um fenômeno secular, apesar de não a definir ocasionalmente de divina, o mesmo não se refere a uma obrigatoriedade de natureza religiosa. No lugar da origem divina aparece um elemento metafísico: último fundamento de legitimação é a ideia do Bem.

Já o mais genuíno discípulo de Platão[15], segundo Diógenes Laércio, o Estagirita, filho do médico Nicômaco, Aristóteles seguiu para Atenas aos dezoito anos para que ali consolidasse sua vocação filosófica. O local pra se efetivar tal intento é a Academia de Platão, onde ficou durante vinte anos. Aristóteles superou seu mestre, não o repetindo e, sim, o repensando.

Apesar de Aristóteles considerar a doutrina da virtude-ciência, resolvendo o problema da aquisição da virtude pelo sábio, como o surgimento da história da Ética como ciência do ethos, virtude não existe pelo seu simples conhecimento, ela somente se concretiza através da prática, como é exemplo a justiça.

Aristóteles tratando a justiça como virtude assemelhada às outras tratadas em sua obra (coragem, benevolência), atribuiu à mesma o fim de se evitar a pleonexia, isto é, evitar que se tire alguma vantagem em benefício próprio tomando o que pertence a outrem, sua propriedade, sua recompensa, seu cargo, e coisas semelhantes, ou recusando a alguém o que lhe é devido. Sendo a justiça uma virtude, é um justo meio (mesótes)[16].

Portanto, a justiça é o elemento que vincula os homens no Estado. Pois o Estado deve almejar o bem nas maiores proporções e excelência possíveis. Antes do Estado, há, primeiramente, a associação da família, qual tem por objetivo suprir as necessidades diárias dos homens.

Como continuador do pensamento platônico, Aristóteles prosseguiu a secularização da justiça, conseguindo separar a justiça, além do conteúdo religioso ou teológico, do conteúdo metafísico. E, assim, de acordo com o Estagirita, observa-se que todos os homens, quando falam da justiça, creem que é um modo de ser pelo qual estão dispostos a praticar o que é justo, a obrar justamente e querer o justo, do mesmo modo, o seu contrário, a injustiça, acreditam ser um modo de ser através do qual obram injustamente e querem o injusto.

Já Shakespeare apontou que o poder precisa ser justificado, ou seja, tem algo a ver com a justiça. E, campo de atuação do poder é delimitado pelo justo. Na obra do Bardo, a injustiça exercida pelos humanos que detêm o poder nos agride e aponta para a dimensão trágica em que a verdadeira ordem das coisas deve ser restabelecida, mesmo que isso signifique, como sempre, o sacrifício do personagem trágico principal.

A revelação da dimensão trágica do poder e da justiça[17] traz uma reflexão filosófica e, a arte do bardo é tão política quanto a escrita de Maquiavel. O que vem a ser filosofia para Deleuze e Guattari é a arte de formar, de inventar, de fabricar conceitos.[18]

Dessa forma, aproxima-se perigosamente a arte de filosofia, na formulação de conceitos, o que está em jogo, sendo a mais pura produção de estruturas do pensamento que são responsáveis por nossas formas de viver, sentir e pensar[19].

Ben Jonson escreveu um poema em homenagem ao Bardo, onde encontramos o seguinte verso: “Ele não era de uma época, mas de todos os tempos”. (In: WELLS, Stanley. Oxford Dictionary of Shakespeare. Oxford: Oxford University Press, 1998, p.88).

Também Maquiavel galgou notoriedade por suas ideias, por suas ideias políticas não tão convencionais. E, logo lembramos da associação as palavras como falsidade, astúcia, cálculo, perfídia.

E, assim tais palavras parecem realmente apontar para o pensamento de Maquiavel. E, suas ideias causaram relevante impacto no pensamento político ocidental tanto que a maioria da Europa incorporou um adjetivo em seus léxicos e dicionários para caracterizar certas condutas humanas, ao denominá-las de maquiavélicas.

Shakespeare e Maquiavel são clássicos, pois, apesar de ter sido produzidos para certo momento histórico, se revelou particularmente relevante para melhor compreensão de nosso próprio tempo. Segundo Joseph Koller: “O Direito deve mais ao Mercador de Veneza[20] do que a todos os compêndios jurídicos escritos até o século XIX”. (Citado por Teófilo Silva. A paixão segundo Shakespeare, W. Edições, 2010, p. 233).

“O mundo inteiro é um palco, e todos os homens e mulheres meros atores; que têm suas entradas e saídas; E um homem representa, em seu tempo, diversos papéis” (…) Jacques em “Como Gostais”[21] de W. Shakespeare[22].

Realmente, é possível tecer a relação entre política e o direito e encarar sua dimensão trágica. O poder sendo núcleo estruturante da política, e a justiça sendo o eixo estruturante do Direito. Nessa visão de universo, detectamos o início da modernidade.

O drama do Bardo transcende as convenções medievais e ainda apresenta em sua forma as contradições do período que retrata. E, Maquiavel numa ruptura com a noção clássica de bom governo ou bom governante[23] e, portanto, de uma política que se estabelece a partir de Deus, da razão ou da natureza.

Assim, a justiça era um elemento constituinte de uma política fundada nestas figuras, não afirma mais nada ao poder enquanto exercício de homens que pautam suas ações pelos critérios práticos da conquista e manutenção deste poder.

Foi na transição entre uma concepção de mundo moderno e mundo pós-moderno[24], já vislumbramos uma dimensão trágica na relação entre poder e justiça[25].

O pensamento pós-moderno trouxe para o Direito uma nova maneira de pensar acerca das questões da justiça. Depois da corrente positivista e das teorias idealistas, percebeu-se que  urgia uma forma de pensar o Direito de maneira a abranger toda a complexidade  epistemológica que o conhecimento humano já pode conhecer até então.

O pensamento pós-modernista pôde colocar as questões relativas à justiça de maneira mais realista, livre de ideais transcendentais do que seria uma sociedade justa.

As teorias jurídicas mais recentes[26] foram fortemente influenciadas pela onda pós-modernista[27] e pode-se dizer que a pós-modernismo inaugurou uma nova forma de pensar o Direito, uma forma mais comprometida com a realidade e pluralista, capaz de fazer dialogar com diversas teorias e culturas para a formação da noção de justiça no caso concreto, contextualizado historicamente e estruturalmente.

E, o lapso entre o discurso, a teoria e a prática traz a justificação e o descompasso entre o justo e poderoso. São insuficientes as dimensões éticas e jurídicas para a sobrevivência no jogo de poder. Assim, a verdade real das coisas e dos fatos não está nas abstrações bastardas sobre política que podem ser diletantes, porém, carecem de utilidade prática.

Seu texto pode ser estendido como espécie de teoria[28] da ação política, negando toda a tradição filosófica teórica anterior ao seu tempo.  Maquiavel nos aterroriza ao revelar os princípios políticos de realismo autenticamente assustador.

A educação no sentido da justiça, além da sabedoria prática, necessita ser analisada, a partir da sabedoria moral[29] que objetiva apontar que o mundo humano não é apenas constituído apenas das exigências de cálculo ou da prudência, isto é, de direitos, deveres e responsabilidades.

Existe algo além do direito e do dever, há o mistério da gratuidade, de onde brota o mundo de obrigações que não podem exigir-se, porém, compartilhar-se graciosamente, o mundo do dom e do presente, do consolo em tempos de tristeza, do apoio em tempos de desgraça, da esperança quando o horizonte parece desfigurar-se, do sentido diante da experiência do absurdo. (Cortina, 2007).

Nas pioneiras formulações científicas[30] sobre a política presentes tanto em Maquiavel como em Shakespeare, a dissociação entre poder e justiça que torna possível a existência de imagem do governante injusto tido como um representante viável, plausível e, real. O poder poderá ser teoricamente justo[31], mas poderá ser na prática injusto. As aparências e a literatura jurídica torneiam o conceito de justo e de justiça o tempo todo.

 

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[1] A justiça para Agostinho era dividida em duas: a justiça humana e a divina. A primeira seria estabelecida pelas leis humanas, feitas pelo homem, e, portanto, é falha. É considerada ainda, temporal e mutável. Quanto à finalidade, a paz social é o que objetiva a justiça humana. A falha vista na justiça humana se deve ao fato do homem ser pecador, pois possui o livre arbítrio, o poder de escolher, um “dom extraordinário que o Criador concedeu à criatura racional”, de acordo com o teólogo. Esta liberdade é transformada em boa ou má no momento em que o indivíduo faz uma escolha, e, para se tornar um ser pecaminoso, deve fazer uma escolha ruim.

[2] A justiça tida como a virtude das virtudes serve para orquestrar e ordenar as demais virtudes, conduzindo-as à ideia do Bem.

[3] Muitas dessas peças estão ligadas ao conceito aristotélico sobre os fundamentos da tragédia: o protagonista deve ter um caráter admirável, mas imperfeito, e o público precisa compreendê-lo e simpatizar com ele. Provavelmente todos os protagonistas trágicos de Shakespeare são capazes tanto do bem como do mal. Ele sempre insiste no funcionamento da livre vontade. Romeu e Julieta, Antônio e Cleópatra e Otelo são peças consideradas como romances trágicos. Elas se diferem das outras no sentido de que os amantes dessas não são condenados por si, mas pelo mundo de fora. Nestas tragédias, a morte é quase uma espécie de consumação do amor — como se o amor não pudesse ter sucesso em ambientes trágicos!

[4] As principais características que podem ser observadas nas obras de William Shakespeare são as seguintes: presença da natureza humana, seus defeitos e qualidades; humanismo e subjetivismo; personagens de diversas regiões e classes sociais; diálogos fluidos; foco no conteúdo das ações, não nos gestos teatrais “exagerados”; caráter nacionalista, pois foca na Inglaterra e sua história; representação de costumes sociais.

[5] O poder dos que dominam é que decide sobre a constituição do direito e da justiça na Pólis. Justiça é o resultado de um acordo entre os homens e este acordo estabelece o meio termo entre fazer injustiça sem ser penalizado, que seria a tendência fundamental do egoísmo humano, e sofrer injustiça sem poder se defender ou se vingar.

[6] Uma grande fonte de inspiração de Nicolau Maquiavel foi o grande orador romano Marco Túlio Cícero. Nessa linha de raciocínio, para Cícero, a virtude (virtus) é algo indissociável da vida pública. Ou seja, o homem que almeja a virtude não pode perder de vista a noção de dever para com os outros. “De fato, parcela alguma da vida, quer nos negócios públicos, quer-nos da esfera estritamente pessoal pode prescindir do dever”. E o que seria exatamente esse dever na visão de Cícero? Ele mesmo nos responde: “Toda investigação a respeito do dever é de dois tipos. Um envolve o limite dos bens, o outro os preceitos pelos quais o seu uso para a vida passa ser confirmado em todas as partes”. Recapitulando, o homem honesto deve praticar o dever, em seu sentido mais amplo, para que possa ser considerado virtuoso.

[7] John Rawls fundou uma concepção de justiça própria: a justiça como imparcialidade e um marco neocontratualistas geral, a partir do qual as diferentes concepções de justiça podem ser comparadas: a posição originária, que possibilita, que sejam investigados, com muita nitidez, os pressupostos e implicações de cada concepção particular de justiça. A posição originária é uma situação hipotética, a partir da qual qualquer pessoa colocada em uma situação de ignorância a respeito da posição que ocupa ou que virá a ocupar na sociedade, escolhe quais princípios de justiça devem reger as futuras instituições.   Rawls estabeleceu ainda outra distinção de grande importância para a discussão sobre a justiça nas sociedades complexas e plurais contemporâneas: a distinção entre as teorias éticas gerais que se ocupam com os ideais de bem viver, com as diversas dimensões da vida, tanto material, como social ou cultural, e as teorias mais modestas e específicas que se limitam a expor determinada visão sobre as instituições justas. A justiça como imparcialidade se propõe a ser uma teoria deste segundo tipo, que busque um consenso mínimo possível com outras cosmovisões, sejam filosóficas ou religiosas que coexistem nas sociedades contemporâneas pluralistas.

[8] A desobediência civil, em outras palavras, é o direito de defender-se da ordem posta quando esta ordem nega ao cidadão um direito que, pelos critérios de justiça, pode ser considerado mais importante do que o que está estabelecido na lei.

[9] A justiça para Tomás de Aquino, de acordo com Bittar (2001, p. 197), é: […] um hábito, portanto, uma prática, que atribui a cada um o seu, à medida que cada um possui uma medida, e que nem todos são materialmente iguais.  A justiça tem a ver com uma atividade da razão prática, de discernir o meu do seu, e o seu do meu. Mais que isso, a justiça não tem a ver com as paixões interiores, que são objeto das outras virtudes; a justiça é fundamentalmente um hábito à medida que pressupõe a exterioridade do comportamento, ou seja, de um comportamento que sabe atribuir a cada qual o seu.

[10] São símbolos usuais da justiça: a espada, a balança e a deusa de olhos vendados. Espada – simboliza a força, coragem, ordem, regra e aquilo que a razão dita; e a coerção para alcançar tais determinações; Balança – simboliza a equidade, o equilíbrio, a ponderação e a igualdade das decisões aplicadas pela lei; Deusa de olhos vendados – usualmente uma imagem da deusa romana Iustitia, que corresponde à grega Dice, que significa o desejo de nivelar o tratamento jurídico de todos por igual, sem nenhuma distinção. Tem o propósito da imparcialidade e da objetividade. É a afirmação de que todos são iguais perante a lei; portanto, uma vez que seus olhos estão vendados, elucidam o disposto clara e evidentemente. Há que se dizer que a imagem original não comportava tal venda. No entanto, com a evolução da humanidade, por obra dos alemães, eis que se faça presente até hoje; Deusa de olhos abertos e sem venda – pode ser interpretada como a necessidade de não deixar que nenhum pormenor, relevante para a aplicação da lei, seja desconsiderado e avaliar o julgamento de todos os ângulos.

[11] A Virtù é a capacidade do príncipe para ser flexível às circunstâncias, mudando com elas para agarrar e dominar a Fortuna. Isto é, um príncipe que agir sempre da mesma maneira e de acordo com os mesmos princípios em todas as circunstâncias fracassará e não terá Virtù alguma. Em sua obra, Maquiavel descreve quais as qualidades que um príncipe deve possuir e como deve usá-las. O príncipe deve ser ponderado, humanitário, prudente, agir de forma equilibrada.

[12] A justiça como equidade expõe a tensão existente entre os direitos à igualdade e à diferença, argumentando que ser justo é tratar o igual de maneira igual e o diferente de maneira diferente. O legalmente justo é ser justo, é ser ético e ser ético é preservar a igualdade dentro da diversidade. Para Aristóteles o princípio da igualdade não é suficiente para garantir a justiça plenamente, posto que as demandas e as necessidades não são sempre iguais para todos.

[13] Sócrates percebe nas leis um somado de preceitos cuja obediência é indiscutível, sendo elas justas ou não. Diz que o direito surge como um instrumento do homem para manter a coesão social, visando a efetivação do bem comum, que ocorreria quando a humanidade alcançasse todas as suas potencialidades por meio do cultivo de virtudes. Cita também o juiz, que deve julgar de acordo com o direito (leis) e a sua consciência (ética e moral). E por mais que as leis sejam injustas devese segui-las para alcançar um bem comum, entendido como a possibilidade de os homens atingirem todas as suas potencialidades.

[14] A Equidade é definida como a liberdade instrumental igual e independente de diferentes justiciáveis (dos indivíduos, por exemplo) era. um espaço de escolha definido, ou como uma situação equivalente. E o conceito básico e mais simples da análise da liberdade igual, e o instrumento básico da análise de situações mais complexas. (A palavra ‘eqüidade’ provém do termo latino que significa igual, e liberdade igual é a igualdade ética geral; semioticamente, a palavra Equidade corresponde, aqui a ‘liberdade instrumental igual e independente’).” (SergeChristophe Kolm, Teorias modernas da justiça, p. 191).

[15] A tragédia e a comédia estão muito imbricadas na vida e na obra de Platão. É famosa anedota de Diógenes Laércio em sua Vida e Doutrinas dos Filósofos Ilustres, em que narra que Platão: […] enquanto se preparava para participar de um concurso de tragédias, ouviu Sócrates em frente ao teatro de Dionísio, e então jogou os poemas, dizendo: “Efesto! avança assim, Platão precisa de ti!” Dizem que a partir de então, aos 20 anos, tornou-se discípulo de Sócrates. (D.L. 3.5-6).

[16] A justiça para Aristóteles é uma virtude (areté) prática ou moral, da mesma forma, por exemplo, que a coragem e a temperança. As virtudes éticas são hábitos que, como tais, se adquirem pela experiência.

[17] Rawls ao identificar quais eram os seus princípios da justiça e defender que os homens encobertos pelo véu da ignorância os escolheriam, a imprecisão de Dworkin foi defender todas as decisões jurídicas orientadas pelo ideal político da integridade seriam justas.

[18] Diante das inúmeras dificuldades que o conceito de Justiça levanta, as duas soluções mais recorrentes foram a do Positivismo Jurídico e a do Realismo Jurídico. A primeira, procura anular o valor da justiça como uma questão exterior ao direito. A segunda, encabeçada não apenas por Oliver Holmes Jr, como também por Jerome Frank, alimenta um ceticismo ríspido contra as normas, as regras e os fatos, abrindo mão de qualquer possibilidade de produzir justiça. Mas estas tentativas claramente não esgotaram o problema.

[19] O filósofo é o amigo do conceito, ele é conceito em potência. Quer dizer que a filosofia não é uma simples arte de formar, de inventar ou de fabricar conceitos, pois os conceitos não são necessariamente

formas, achados ou produtos. A filosofia, mais rigorosamente, é a disciplina que consiste em criar conceitos. O amigo seria o amigo de suas próprias criações? Ou então é o ato do conceito que remete à potência do amigo, na unidade do criador e de seu duplo? Criar conceitos sempre novos é o objeto da filosofia. É porque o conceito deve ser criado que ele remete ao filósofo como àquele que o tem em potência, ou que tem sua potência e sua competência. Não se pode objetar que a criação se diz antes do sensível e das artes, já que a arte faz existir entidades espirituais, e já que os conceitos filosóficos são também sensibiliza. Para falar a verdade, as ciências, as artes, as filosofias são igualmente criadoras, mesmo se compete apenas à filosofia criar conceitos no sentido estrito. Os conceitos não nos esperam inteiramente feitos, como corpos celestes. Não há céu para os conceitos.

[20] A peça ” Mercador de Veneza “foi escrita há mais de quatro séculos, mas ainda coloca em cena temas que permanecem relevantes, como discriminação racial, intolerância e violência. A trama é repleta de passagens que evocam uma reflexão sobre identidade e igualdade, como o famoso discurso do personagem Shylock.

[21] Em “Como gostais” nona das dezoito comédias do autor, escrita em 1599, é contada a história de Rosalinda, uma jovem que, em meio a uma disputa sucessória em um ducado na França, precisa fugir da vida na corte. Para chegar ao seu final feliz, ela terá de passar por mil provações, inclusive se disfarçar de homem.

[22] Os três primeiros Seminários de Lacan põem em evidência uma primazia: do significante (I), do sujeito efeito do significante (II), do significante Nome-do-Pai (III), substituição metafórica do desejo primordial materno. Uma explicitação da mediação da linguagem se imporia para uma abordagem mais adequada da temática do objeto (IV), se destacando sobre o pano de fundo da falta, lugar do desejo. E assim, uma vez assinalada a primazia do significante, surgem os quatro Seminários seguintes sobre o desejo: desejo do Outro (para Hamlet, ser ou não ser o falo da mãe) (VI), desejo de morte articulado à falta do Bem Supremo, a propósito da Ética da psicanálise (VII), e, neste Seminário VIII, cuja última parte vai agora reter nossa atenção, desejo do analista,  pondo verdadeiramente em questão o amor-ódio da transferência.

[23] Para Platão, a maioria das pessoas, principalmente, os sofistas colocam a justiça como pertencente a ideia de bem. Importante na fundação da cidade, por entender que a justiça é um Bem que se quer pelo que ela é e pelas consequências que produz na vida dos cidadãos. A finalidade da justiça é conseguir o máximo de bem-estar para o súdito, velando pelo bem de quem é cuidado pelo governante. A finalidade de governar está no coletivo dos cidadãos, ou seja, da proteção do bem alheiro, e não nos interesses individuais do governante.

[24]  Julgar com justiça apresenta-se como o desafio constante do juiz moderno, uma vez que ele deve se valer dos princípios jurídicos, como o da razoabilidade e da proporcionalidade, num balanceamento dos interesses em conflito, observando sempre, os fins sociais da lei e as exigências do bem comum, na fundamentação de suas decisões. Também, é necessário que o magistrado tenha prudência, pois ao aplicar a lei em cada caso, ele interpreta o fenômeno jurídico. A interpretação e aplicação possuem um conteúdo eminentemente prático da experiência humana, vez que se espera uma decisão não apenas jurídica, mas, também, de conteúdo social.

[25] Para Alf Ross, há uma conexão entre o direito vigente e a ideia de justiça. Dentro deste pensamento pode-se distinguir dois pontos: primeiro, a exigência de que haja uma norma como fundamento de uma decisão; segundo a exigência de que a decisão seja uma aplicação correta de uma norma. E, por isso, o problema pode ser formulado de duas maneiras, a saber:

  1. a) Podemos nos indagar sobre o papel desempenhado pela ideia de justiça na formação do direito positivo, na medida em que é entendida com uma exigência de racionalidade, isto é, uma exigência de que as normas jurídicas sejam formuladas com a ajuda de critérios objetivos, de tal maneira que a decisão concreta tenha a máxima independência possível diante das reações subjetivas do juiz e seja, por isso, previsível.
  2. b) Pode-se perguntar, então, que papel desempenha a ideia de justiça na administração da Justiça, na medida em que essa ideia é entendida como uma exigência de que a decisão do caso individual aplique corretamente o direito vigente. (ROSS, 2000, p. 326-330).

[26] Dworkin, ao contrário de Hart, não entendia que um sistema jurídico válido deixaria de guardar correspondência com a moral e a justiça. Como desdobramento dessa ideia, entende que os homens e mulheres possuem direitos morais que não são necessariamente sancionados pela ordem política vigente. Defende o autor que determinados direitos do homem existem independente de prescrição legal e, assim, nega a noção positivista de que o Direito apenas existe nos temos da lei.

[27] Levar os direitos a sério, afastando-se do que preconizou Ronald Dworkin que cunhou a frase, para muitos autores pós-modernos, não significa mais estabelecer uma dita “ciência do direito” eliminando todas as variáveis que atrapalhem a metodologia do trabalho. O que se observa agora é que o comprometimento do cientista jurídico se dá em termos de considerar todos os fatores importantes para determinada questão, levando em conta seu contexto, seu momento histórico, o aparato jurídico disponível e teorias que venham a auxiliar no enfrentamento dos problemas, de maneira que os termos verdade e justiça estejam contextualizados segundo a realidade momentânea que estão inseridos.

[28] As principais teorias modernas sobre justiça revelam-se em duas grandes categorias: para uma primeira corrente, a ideia de justiça relaciona-se diretamente com a ideia de equidade (ou ainda, fairness, utilizando-se da expressão inglesa). Para uma segunda corrente, a ideia de justiça está mais ligada ao conceito de bem-estar (welfare). Cada uma dessas correntes comporta uma série de teorias diferentes, que se utilizam de distintas perspectivas para tratar do tema.

[29] Outro aspecto importante da obra de Hart é a relação estabelecida entre justiça e moral e a distinção entre estes conceitos. Hart separa a ideia de justiça que está relacionada ao campo do Direito e as características que distinguem os princípios morais das regras jurídicas ou de qualquer outro  conjunto de regras. O autor identifica o conceito de justiça com o de eqüidade -justice as fairness- e faz sua análise no campo da segunda para chegar à outra. O justo então seria tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Esta premissa somente se justifica enquanto tem por finalidade o bem comum, ou seja, o bem da sociedade, que não for considerada apenas pelas necessidades de uma determinada  classe ou parcela mais forte.

[30] Importante é lição de Cavalieri Jr., ao apontar que a criação do Direito não é obra exclusiva do legislador, mas, principalmente do jurista, do magistrado, do advogado, enfim de todos os operadores do direito. O que o legislador faz é a lei, mas o Direito é muito mais amplo que a lei. A Lei não esgota o Direito tanto como a partitura não esgota a música. Ao interpretar a lei, constrói-se uma concordância aceitável entre o caso concreto e a justiça.

[31] O jurista Ronald Dworkin também dedicou o seu pensamento a analisar o conceito de justiça e a obra de John Rawls, especialmente nos livros “A Virtude Soberana” e “Justiça para Porcos-Espinho”. Duas ideias desempenham um papel vital na teoria desenvolvida por Dworkin: a ideia do “igual cuidado” (equal concern) e a ideia de responsabilidade especial (special responsibility). A primeira significa que a distribuição das riquezas sociais deve refletir nas escolhas das pessoas, de forma que uma distribuição idêntica das riquezas não se traduziria per se em uma distribuição justa. Já a ideia de responsabilidade implica que não seriam justificadas as desigualdades materiais que não pudessem ser atribuídas às escolhas das pessoas, assim como não se justificariam aquelas que decorressem de circunstâncias que se encontram fora do controlo das pessoas. Ao defender uma concepção de igualdade de recursos, Dworkin parte do pressuposto de que as pessoas são responsáveis pelas escolhas que fazem nas suas vidas, mas essa premissa não é suficiente para prover a sua concepção de fundamentos sólidos. Por isso, Dworkin pressupõe também que os atributos naturais de inteligência e talento são moralmente arbitrários e por isso não devem surtir efeitos sobre a distribuição dos recursos na sociedade.

Liminar suspende despejo da Livraria Cultura do Conjunto Nacional

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A desembargadora Maria Lúcia Ribeiro de Castro Pizzotti Mendes, da 30ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, suspendeu decisão de 1º grau que determinou a desocupação da unidade física da Livraria Cultura localizada no edifício do Conjunto Nacional, na Avenida Paulista, na Capital.

Consta nos autos que a determinação de despejo levou em conta a falta dos pagamentos de aluguéis, mas a desembargadora reconheceu a probabilidade do direito e o perigo da demora.

“Nada mais evidente que o risco de a Livraria Cultura, lutando por sua sobrevivência econômico-financeira, vir a sucumbir diante da perda de seu principal ponto histórico-cultural, a loja localizada na Avenida Paulista, um símbolo para a empresa e para a região. A importância dessa livraria para sua agenda econômica já foi, e continua sendo, enfatizada pelos agravantes, que, acaso despejados prematuramente, poderiam assistir à consumação de sua derrocada financeira”, destacou a magistrada.
Não poderá ser realizado qualquer ato de despejo até a conclusão do julgamento do agravo de instrumento. As partes terão prazo de cinco dias úteis para se manifestarem caso tenham interesse em realizar audiência para tentativa de conciliação sobre a controvérsia.  Agravo de instrumento nº 2218502-66.2023.8.26.0000

FONTE:  TJSP, 22 de agosto de 2023.

Produção antecipada de provas: questões sobre o tempo, a memória e a inversão dos atos no processo penal

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No processo penal – iniciado, formalmente, com a decisão de recebimento da denúncia –, a legislação brasileira prevê uma ordem específica para a realização dos atos processuais, entre eles a produção de provas. Essa fase, como regra, é realizada após a citação do réu, e envolve atos como a oitiva das testemunhas, o interrogatório do réu e a colheita de outras provas. O objetivo é garantir a efetividade da ação penal e proteger direitos constitucionais, como o contraditório e a ampla defesa.

Entretanto, a própria lei brasileira prevê situações em que é permitida a antecipação da produção probatória, em geral por razões de urgência ou pela possibilidade de que, com o decurso do tempo, não se tenha mais como produzir uma prova fundamental. O iminente perecimento de prova frágil e o tempo entre a prática do crime e o momento da produção da prova no processo, por exemplo, podem justificar a autorização da medida.

artigo 156, inciso I, do Código de Processo Penal (CPP) autoriza que o juiz, de ofício, ordene a produção antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, mesmo antes de iniciada a ação penal. Já o artigo 366 do CPP estipula que, caso a ação penal fique suspensa em razão do não comparecimento aos autos de réu citado por edital, o magistrado também poderá decretar a antecipação da produção de provas.

Além de inverter a ordem normal do processo penal, a produção antecipada de provas tem reflexos potenciais no exercício do contraditório, já que, caso seja autorizada, é possível a mitigação da participação da defesa no ato. É exatamente a alegação de violação do direito de defesa que leva muitas partes a recorrer contra a antecipação da produção probatória, e essas controvérsias, frequentemente, chegam ao STJ.

Em 2010, a Terceira Seção, responsável por matéria de direito penal, editou a Súmula 455, estabelecendo a exigência de fundamentação concreta para a produção antecipada de provas com base no artigo 366 do CPP.

Rotina policial justifica tomada antecipada de depoimentos

No RHC 64.086, a Terceira Seção considerou legal a antecipação da prova testemunhal de policiais, sob o risco de esquecimento devido à submissão a eventos similares diariamente.

Na origem, um denunciado por tentativa de homicídio, após ter sido citado por edital, não compareceu em juízo nem constituiu advogado. O juízo decretou a suspensão do processo e do prazo prescricional, além de deferir a produção antecipada de provas.

Por sua vez, a Defensoria Pública impetrou habeas corpus alegando falta de fundamentação concreta que justificasse a produção antecipada de provas e invocando a Súmula 455 do STJ. O tribunal local denegou a ordem, sob o fundamento do risco de perecimento da prova testemunhal.

O ministro Rogerio Schietti Cruz, cujo voto prevaleceu no julgamento no STJ, ressaltou que, na hipótese de ser desconhecido o paradeiro do acusado após a citação por edital, o juiz pode determinar a produção antecipada de provas urgentes com o objetivo de preservar os detalhes relevantes para a solução do caso.

Schietti destacou que o Estado deve exercitar seu jus puniendi de forma equilibrada, protegendo não somente o acusado, mas também a sociedade, “sob pena de desequilibrarem-se os legítimos interesses e direitos envolvidos na persecução penal”.

Segundo ele, a atividade policial é uma circunstância que agrava as limitações normais da memória humana. “A testemunha corre sério risco de confundir fatos em decorrência da sobreposição de eventos semelhantes”, avaliou o ministro.

O aproveitamento de prova emprestada e o princípio da economia processual

A Sexta Turma, no REsp 1.959.984, decidiu pelo aproveitamento de provas antecipadas, produzidas em relação aos demais denunciados, para aquele que teve o processo suspenso por não ter sido encontrado.

A ministra Laurita Vaz, relatora do recurso, destacou que a produção de provas foi realizada no curso regular da ação penal em relação aos denunciados citados pessoalmente. Conforme explicou, “a oitiva das testemunhas iria ocorrer, independentemente do deferimento da medida antecipatória”.

Dessa maneira, a relatora apontou que não havia necessidade de demonstrar requisitos específicos para a antecipação de provas, pois “ela consistiria tão somente em validar a utilização da prova em relação ao réu que teve o processo suspenso”.

Segundo Laurita Vaz, o aproveitamento da prova ocorreu com observância do contraditório e da ampla defesa, pois o acusado esteve representado por defensor público durante a audiência de instrução. Conforme observou, “localizado o recorrido e retomada a marcha processual, poderá a defesa, caso entenda necessário, postular a repetição da prova” que será avaliada pelo juiz.

Presença da defesa afasta risco de prejuízo ao réu

Em 2022, a Quinta Turma negou provimento ao agravo regimental no HC 751.023, que buscava anular a antecipação na produção de provas em processo que havia sido suspenso, pois o réu, citado por edital, não compareceu em juízo nem constituiu advogado.

Na origem, o juízo, como forma de produção antecipada, havia determinado o aproveitamento de prova devidamente produzida contra o corréu do paciente, sob o fundamento de evitar a sua perda.

Conforme acórdão do tribunal local, a antecipação não prejudicaria a renovação da prova em eventual retomada do processo em relação ao acusado, caso se demonstrasse sua necessidade.

No entanto, a defesa, insatisfeita, sustentou não haver hipótese autorizadora para a produção antecipada da prova em relação ao paciente, e pediu a aplicação da Súmula 455.

O relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ressaltou a decisão da Terceira Seção que entendeu ser justificável a antecipação da oitiva de testemunha quando houver o risco de perecimento da prova. Segundo explicou, o fato de já se terem passado sete anos desde a data do crime era suficiente para justificar a colheita antecipada da prova.

O ministro completou que, além disso, a defesa não demonstrou efetivo prejuízo decorrente da providência adotada em primeira instância. Segundo explicou, a defesa se limitou a demonstrar uma suposta insuficiência de fundamentos para pleitear a nulidade da prova.

Em decisão similar, a Quinta Turma também negou provimento ao agravo regimental no HC 557.840, por entender que a decisão do juízo de primeiro grau demonstrou fundamentadamente a necessidade da produção antecipada de prova.

O ministro Ribeiro Dantas, relator do habeas corpus, destacou que o transcurso de uma década entre o fato delitivo e a produção probatória indicava risco concreto de perecimento das provas. Além disso, o ato foi realizado com a presença do Ministério Público e de defesa técnica, atendendo aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Para o ministro, “a realização da produção antecipada de provas não traz qualquer prejuízo para a defesa, porquanto o agravante se encontra representado pela defensoria pública estadual”.

Não se pode atribuir à testemunha o encargo de preservar os fatos na memória

Em outra decisão, num agravo regimental em segredo de Justiça, a Quinta Turma novamente entendeu que a produção antecipada de provas não havia trazido qualquer prejuízo para a defesa, já que o ato foi realizado na presença de defensor nomeado e, caso o acusado comparecesse no processo futuramente, poderia requerer a produção das provas que entendesse necessárias para a sua defesa.

Nesse processo, ficou evidenciado o temor de que, com a demora na colheita de provas, fossem perdidos detalhes relevantes para a elucidação dos fatos.

“Não há como negar o concreto risco de perecimento da prova testemunhal, tendo em vista a alta probabilidade de esquecimento dos fatos distanciados do tempo de sua prática”, afirmou o relator, ministro Jorge Mussi.

O ministro observou que não é justo atribuir a uma testemunha o encargo de guardar na memória os detalhes dos fatos presenciados, enquanto o acusado se esquiva da ação penal deflagrada contra ele.

Em 2020, a Sexta Turma cassou uma decisão de primeira instância que ordenou a oitiva antecipada dos depoimentos de testemunhas sob o argumento de que, com o passar do tempo, elas poderiam esquecer detalhes dos fatos.

O ministro Rogerio Schietti Cruz, relator do recurso em habeas corpus – que tramitou em segredo de Justiça –, afirmou que a hipótese contida no artigo 366 do CPP só poderia ser aplicada diante da concreta possiblidade de perecimento da prova, a fim de resguardar a efetividade da prestação jurisdicional.

No entanto, segundo o relator, a produção antecipada foi justificada tão somente em razão do decurso do tempo, faltando algum apontamento específico que, no caso concreto, justificasse a medida.

Para o ministro, “a decisão que determinou a antecipação não apresentou fundamentação idônea, em clara ofensa ao princípio do devido processo legal, de modo que não se aproveitam os atos nela realizados”. RHC 64086REsp 1959984HC 751023HC 557840

FONTE:  STJ, 20 de agosto de 2023.