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Considerações sobre ontologia[1] processual civil contemporânea e o CPC/2015.

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               “O homem é definido como um ser que evolui, como animal é imaturo por              excelência”.    Friedrich Nietzsche

 

 

Cumpre em primeiro lugar esclarecer que a virada hermenêutica e ontológica provocada pela publicação de “Ser e tempo” por Heidegger e, depois por “Verdade e método” por Gadamer[2] em 1960 fincou as bases[3] de um novo olhar sobre a hermenêutica[4] jurídica quando se saiu do plano metafísico-objetivista baseado em Aristóteles e Tomás de Aquino[5] (cuja frase que melhor sintetiza é: “justiça é dar a cada um, o que é seu”) e o paradigma subjetivista muito identificado pela filosofia da consciência e que permanecem amparando as teses exegéticas dominantes[6].

 

Tudo aponta para a indispensabilidade do método ou do procedimento para se atingir a vontade da norma, seja para acessar o espírito do legislador ou, para se procurar obter a melhor resposta.

 

A resposta que encaminhará a solução do conflito, a partir dos elementos obtidos no caso concreto, não pode depender da vontade pessoal ou da subjetividade do julgador. A superação das teses positivistas que amparam o paradigma da discricionariedade[7] judicial ocorre através da opção por uma resposta judicial correta e adequada constitucionalmente e que ganha destaque e relevância, principalmente, por que esta resposta correta tem o poder de repelir a discricionariedade e a arbitrariedade no conteúdo das decisões judiciais.

 

É que na maioria das vezes, continua-se a crer que o ato interpretativo é ato cognitivo e, que interpretar a lei significa retirar da norma, tudo o que nela contém, o que denuncia o busilis metafísico nesse campo de conhecimento. Há, pois uma clara imbricação dos paradigmas metafísicos clássicos e os modernos, residindo na doutrina pátria como também na estrangeira um problema paradigmático[8].

 

Em verdade podemos situar que desde a definição de justiça até mesmo a estruturação do processo contemporâneo que não só abandonou o julgamento como vedete principal, vindo mesmo a conceber outras formas de composição de lide tais como a arbitragem, mediação e a conciliação.

 

E, neste aspecto o CPC/2015 trouxe uma significativa alteração, pois três fatores comprovam: a exigência de diálogo entre juiz e as partes, com o dever de cooperação não somente para sanar vícios processuais, mas igualmente, para proibir a decisão surpresa, a ampliação da exigência de boa-fé objetiva (confirmando a tendência legislativa e doutrinária criada desde o Código Civil Brasileiro de 2002) e a valorização dos julgamentos de mérito (o que importa dizer que será priorizado o exame quanto à existência ou não do direito alegado pela parte).

 

Procurou-se, em síntese, resolver de uma vez o conflito de interesses, para assegurar a justiça do caso. O novo codex processual visa evitar as decisões tipicamente processuais e tão comuns no sistema vigente e que nada esclarecem ou contribuem para atender o direito das partes.

 

Neste particular sentido, o CPC de 2015, o nosso primeiro código processual nascido em contexto democrático, não só efetivou como etapa obrigatória a audiência de mediação ou conciliação[9], como também positivou que o juiz poderá utilizar-se de tais métodos sempre que possível.

 

O grande escopo do processo é afinal prover a preparação para o provimento jurisdicional final, devendo se desenvolver em contraditório entre as partes, o que só vem a ratificar a definição do processo por Elio Fazzalari[10] como sendo “procedimento em contraditório” de maneira que garanta a plena e ativa participação (além de consciente) das partes, entendendo o como e o porquê do ato jurisdicional definidor de seus direitos.

 

A hermenêutica jurídica contemporânea trouxe uma releitura do direito constitucional e da força normativa da Constituição, principalmente em razão da grande expansão e consagração dos direitos e garantias fundamentais e, ipso facto, o fortalecimento da jurisdição constitucional.
A constitucionalização do direito foi uma hábil resposta ao positivismo clássico que tanto endossou barbáries notadamente na Segunda Grande Guerra Mundial[11]. Ademais, o Tribunal de Nuremberg exibira todas as feridas epistemológicas e pustulentas deste positivismo agressivo e pseudocientífico.

 

A constitucionalização do direito trouxe a horizontalização dos direitos fundamentais bem como a força vinculante do texto constitucional[12] seja em seu aspecto explícito ou implícito (além de fazer ressurgir a necessária interpretação axiológica).

 

É certo que o direito processual fora notoriamente o mais filtrado de todos os ramos jurídicos pela Constituição, exatamente por encarnar o microcosmo democrático, reproduzindo o funcionamento do Estado de Direito, com as devidas valorações à dignidade humana, a liberdade, igualdade, e, sobretudo, a respectiva legalidade e responsabilidade.

 

É verdade que o neoprocessualismo chegou ao Brasil após muitos anos, veio mesmo muito tardiamente para trazer a efetividade de direitos que já se positivada e, que não passava de promessa abstrata sem qualquer respaldo concreto no cotidiano do cidadão.

 

A consciência de que o processo é instrumento a serviço da ordem jurídica e cuja espinha dorsal é o contraditório[13], e mesmo o significado do pós-modernismo no direito processual brasileiro só trouxeram diversas ondas reformistas que desaguaram no CPC de 1973 e, fora modificando a mentalidade burocrata e letárgica de jurisdição, mas comprometeu seriamente sua organicidade e harmonia sistêmica.

 

O primeiro grande enigma[14] processual começa no território da busca da verdade, nos limites do devido processo legal, quando até certo momento havia o evidente predomínio da verdade formal em detrimento da verdade[15] material dos fatos e das alegações.

 

O desenvolvimento científico só veio trazer maior grau de certeza nesta busca da verdade no processo, é o caso, por exemplo, do exame de DNA nas demandas que envolvem a paternidade ou maternidade.

 

Ademais a própria racionalidade jurídica sempre preocupada como alcançar o conhecimento e, ainda, como suportar as consequências resultantes, tanto na modernidade como nos atuais debates contemporâneos só vieram endossar a relevância do contraditório participativo ou dinâmico.

 

Romper com a dialética aristotélica que fora antes tão incensada pelos medievais e, finalmente se encaminhar para a lógica jurídica de Chaim Perelman[16] que mostrou a força crítica da matemática dedutiva aplicável às disciplinas práticas e que se enredam em ser exatas.

 

Assim afirmou Perelman que o direito para Hobbes o direito não é a expressão da razão, mas sim, a manifestação de vontade do soberano. E, ainda aponta que a unificação das vontades individuais em uma só pessoa, para Hobbes, chama-se Estado – o Leviatã[17].

 

Já na filosofia de Spinoza, conforme bem explicou Perelman o ideal de racionalidade universal fora inspirado em Leibniz que é autor da fórmula cum Deus calculat, fit mundus (o mundo se realiza segundo cálculos divinos)[18].

 

Enfim, para o mundo racionalista é imprescindível à formação de uma ciência processual e o abandono de juízos de probabilidade, devendo prevalecer somente as verdades claras e evidentes. Como dado fundamental para o sucesso do normativismo e da justiça distributiva. Matematizar a ciência jurídica significa não perceber que se trata de uma ciência social aplicada e, particularmente a ciência processual é a que mais se próxima do tecido social e política onde estão latentes as necessidades dos jurisdicionados.

 

A matematização da ciência jurídica fora fenômeno que consistiu na assimilação por esta ciência de duas vertentes metodológicas do jusnaturalismo (por vezes até opostas) de um lado o racionalista bem próprio do pensamento francês, com Descartes, e de outro lado, de empirismo ou sensualismo (mais peculiar do pensamento inglês, como por exemplo, com Hobbes).

 

O sábio Ovídio Baptista da Silva lecionou que a aplicação da lógica às ciências explicativas, ocorrera para a verdadeira supressão da possibilidade de o julgador descobrir a verdade. Pois o julgador resta tolhido e constrangido em sua autonomia crítica para que possa ter diante do caso concreto e, por vezes, tomando por base distintos critérios axiológicos.

 

E, neste sentido o procedimento nem teria razão de ser, pois a justiça está mesmo representada no texto da lei e, por essa razão, a lei injusta não existiria. Noutro giro, no mundo profundamente racionalista a busca pela realização do direito seria inviável na medida em que o critério de determinação do justo e do injusto são tarefas delegadas ao legislador e não ao juiz.

 

O CPC de 2015 representa o deslocamento da centralidade da lei processual para o precedente judicial[19]. Saímos da literalidade da lei para a interpretação e aplicação da lei.

 

O positivismo jurídico caracteriza-se, pois, por sua posição contrária a todas as formas de metafísica jurídica e, portanto, distanciada completamente das teorias do Direito Natural. A verdade é que alheio à experiência da realidade ou do direito positivo, não existe o direito.

 

A supremacia da legislação como fonte de direito seguiu por várias formas distintas, seja no Reino Unido, seja na Alemanha e França[20]. O neopositivismo ou o positivismo lógico (ou a doutrina do Círculo de Viena) pretendeu fazer jus à função de estabilização das expectativas, sem ser obrigado a apoiar a legitimidade da decisão na autoridade inexpugnável de tradições éticas.

 

Kelsen e Hart elaboraram um sentido normativo próprio das proposições jurídicas e uma construção sistemática de regras[21] destinadas a garantir a consistência de decisões ligadas às regras e, tornar o direito independente da política.

 

O ideal da purificação do direito fora perseguido a exaustão. A legitimação da ordem jurídica em seu todo, fora transportada para o início, ou seja, para uma regra fundamental (ou regra de conhecimento) pela qual tudo se legitima e tem justificação racional e deve ser assimilada historicamente conforme o costume.

 

É engraçado perceber que antes da primazia da lei, havia a do costume, e novamente retornam aos holofotes no processo contemporâneo à luz da teoria dos precedentes judiciais, a predominância dos costumes. Conclui-se que o movimento é cíclico, metafísico e também contínuo, construindo a verdadeira ciranda das fontes de direito.

 

Considera-se ainda muito perigosa a máxima que venha encorajar as interpretações individuais mesmo as mais cerebrinas posto que a maior liberdade do julgador adotada e defendida pela Escola do Direito Livre[22], chega ao exagero de admitir o poder jurisdicional de correção da lei. Mas, com a ênfase atual da jurisdição constitucional e, em sua crescente importância e papel no trajeto evolutivo do direito processual civil brasileiro, como podemos refutar tal poder?

 

O inicial comprometimento da ciência processual já então desgarrada do direito material, com o racionalismo veio a transformação do processo em uma ciência em busca da verdade, sem a qual não se obtém justiça concreta.

 

E, nesta oportunidade, se rejeita a cognição sumária e se endossa a cognição plena, exaustiva e quase infinita que seria a mais adequada para a busca da verdade. Novamente o CPC de 2015 veio superar o impasse ao prever a tutela de urgência e de evidência.

 

Carnelutti explicou que a semente precisa de anos e até de séculos, para se tornar- uma espiga (veritas filia temporis). Assim se explicava que o processo dura e não se pode fazer tudo de uma única vez. É imprescindível ter-se paciência.

 

O que contrasta completamente com a Reforma do Judiciário uma vez proposta pela E.C. nº45/2004 que colocou o princípio da duração razoável[23] do processo[24].

 

Construiu-se uma contradição adiecto: se a justiça é segura não é rápida e, se é rápida, não é segura. Carnelutti que delineou o conceito de lide retratou o pensamento racionalista que tanto privilegiada a máxima duração do processo tida como medida capaz de assegurar a tão proclamada segurança jurídica[25].

 

É falsa a ideia de que as instituições processuais possam ser realmente neutras e livres de compromisso com a história e de seu contexto social e cultural. Portanto o dinamismo contemporâneo infectou fatalmente a noção de tempo no processo, é o processo eletrônico é a melhor expressão cultural disto.

 

Pontes de Miranda não aceitava a função do processo civil como meramente instrumental posto que composto de regras jurídicas tidas como secundárias, ao passo que as normas de direito material seriam as normas primárias.

 

De sorte que a Legislação e a Justiça seriam funções sucessivas e que surgem em ordem decrescente. Mas o pensamento do século XX se volta para a exaltação da estética da ação, como valor em si mesmo, assim segundo Robles o século se transformou fundamentalmente destrutivo.

 

A crise do modelo processual enxerga o processo como instrumento por força da racionalidade jurídica. A ideologia sociopolítica emergente neste século na Europa carregou o fenômeno da socialização do processo civil com o fito de incorporar os clássicos princípios do liberalismo às exigências do Estado Social de Direito, evidenciando a distinção entre o objeto do processo e procedimento que é reconhecido como mera formatação do instrumento capaz de atingir a efetiva e real tutela de direitos, pelo Estado, dos interesses litigiosos.

 

A crise do processo[26] pode ser identificada a partir do momento em que o valor de segurança jurídica deixa de ter o maior peso na balança de valores e cede lugar a outros tão importantes quanto ele. E, nesta dimensão se destacam os direitos fundamentais.

 

Dworkin ao formular suas teorias para o direito tentou evitar as falhas do positivismo, mostrando que a adoção de direitos concebidos deontologicamente podem satisfazer simultaneamente as exigências de segurança jurídica e da aceitabilidade racional.

 

Apesar de nosso direito pátrio reger-se pelo sistema do civil law que principalmente privilegia as normas escritas e cujas origens datam do direito romano.

 

O modelo dogmático do direito está preparado para tratar os conflitos e disputas interindividuais. Com a ascensão do radical individualismo, deu-se a redução da importância dos grupos na estrutura social e no sistema jurídico.

 

Hoje o que se percebe é que a crise do direito reflete a crise social e, com esta, as visíveis mudanças de comportamento dos indivíduos, dos conflitos e da sociedade. Daí, a relevância do processo coletivo[27] como melhor meio de se obter uma equidade na tutela de direitos.

 

A doutrina contemporânea salienta que pelas ações coletivas se tem um meio para alcançar uma justiça mais efetiva. E, o CPC de 2015 permitirá a coletivização da demanda quando for necessário e atender as exigências da lei processual.

 

A negação da natureza e objetivo puramente técnico do processo significa, ao mesmo tempo, a afirmação de sua permeabilidade aos valores tutelados na ordem político-institucional e jurídico-material (os quais buscam efetividade através dele) e o reconhecimento de sua inserção no universo axiológico da sociedade a que se destina.

 

Inegável que o direito processual civil está em descompasso com a realidade contemporânea[28] apesar de existirem sinceras tentativas de adequação. Em suma, pode-se afirmar que o ataque de Ronald Dworkin ao positivismo baseia-se na distinção lógica existente entre as normas, as diretrizes e princípios.

 

Desta forma, defende Dworkin que os juízes diante os casos difíceis devam socorrer-se dos princípios e, como não há uma hierarquia pré-estabelecida entre princípios, é possível que estes possam fundamentar decisões distintas. E, por serem os princípios[29] dinâmicos e capazes de mudarem de forma célere então todo esforço para canonizá-los, resta mesmo fadado ao fracasso.

 

Por tal razão, a aplicação dos princípios é automática e exige fundamentação judicial e integração da fundamentação à teoria.

 

Danilo Nascimento Cruz bem destacou em seu artigo “Proto-filtros conceituais para a leitura do Novo Código de Processo Civil Brasileiro de 2015” que o traço característico da constitucionalização do direito consubstancia-se pela irradiação do conteúdo substancial e valorativo das normas constitucionais e, até alguns juristas tentaram em vão elaborar um catálogo de condições para a constitucionalização do direito dentre as quais se incluem uma constituição rígida.

 

Desta forma, identificamos a força vinculante da Constituição e a sobreinterpretação desta e, por fim, a aplicação direta das normas constitucionais.

 

Logo no primeiro artigo da Lei 13.105/2015 há clara inserção dos princípios constitucionais como evidente opção ideológica, posicionando a CF/1988 como centro gravitacional de todo sistema processual civil pátrio.

 

Com o texto constitucional vigente estabeleceu-se o Estado Democrático de Direito e, a partir daí, se desenvolveu a constitucionalização de todo o direito, até mesmo do direito privado.

 

Desta forma, a aplicação e a interpretação do direito são feitas através da moldura constitucional. A Constituição não só serve de premissa interpretativa, mas também de argumentação jurídica de direitos e garantias, mas sobretudo, como guia principal da semântica processual brasileira.

 

Ainda se consagrou direito de aplicação genérica ao contemplar as garantias constitucionais e disciplinando o autêntico devido processo legal e o contraditório remodelado que incide em todo iter processus e, não somente no momento da contestatória.

 

Há certo consenso de que todas as formas reformistas no processo civil brasileiro tiveram por escopo dar-lhe maior efetividade[30], o que acarretou o reconhecimento de certa relativização do dogma da autonomia do processo.

 

Afinal, o exagerado apego metafísico dos valores absolutos deve ceder lugar ao pragmatismo capaz de trazer a justiça aos litígios reais. Sem perder de vista os princípios e diretrizes de sustentação dogmática e do sistema jurídico que garantem a estabilidade dos critérios de julgamento e, evita a atuação tópica e casuística, o intérprete que deve buscar a melhor forma de resolver os problemas concretos trazidos pelas partes, e para isso, sua análise da lei deve ir além de traduzir sua finalidade de integração e pacificação social.

 

O progresso das teorias das lacunas do direito sejam estas normativas, axiológicas ou ontológicas culminaram no reconhecimento da incompletude do sistema processual e, também de outros microssistemas derivados como o trabalhista, tributário e administrativo.

 

Leciona Maria Helena Diniz em seu Compêndio de Introdução a Ciência do Direito que são três tipos principais de lacunas: 1- a normativa; 2- a ontológica (quando há a norma, mas não corresponde aos fatos sociais); 3 – axiológica (onde existe a norma, mas ela se revela injusta, posto que sua aplicação traga uma solução insatisfatória ou injusta).

 

Mas precisamos recordar o mestre alemão Karl Larenz[31] que afirmava que “toda a lei contém inevitavelmente lacunas”, razão pela qual se reconheceu há muito a competência de tribunais para colmatar as lacunas da lei.

 

Assim, a interpretação da lei e o desenvolvimento judicial do Direito não devem ver-se como essencialmente diferentes, mas apenas graus distintos do mesmo processo de pensamento.

 

Significa que a simples interpretação da lei por um tribunal, desde que seja a primeira ou se afaste de uma interpretação anterior, representa um desenvolvimento do Direito, mesmo que a própria jurisprudência não tenha consciência disso.

 

Alertou Karl Larenz que “só pode decidir-se a um desenvolvimento do Direito Superior da lei quando o exijam razões de grande peso”. Reconheçamos que a efetividade processual depende sinceramente da sensibilidade do jurista e, principalmente, do estudioso do direito processual, que deve criar soluções visando a tornar o instrumento adequado à realidade social a que ele será aplicado (In: Bedaque, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 3ª edição, São Paulo: Malheiros, 2003, p.33).

 

O direito ao devido processo legal, ou ao justo processo, garantia que, de certa forma, sintetiza todas as demais, é, portanto, entendido em suas dimensões: formal e material[32].

 

Deve o processo estruturar-se formalmente de maneira a dar cumprimento, tanto quanto possível, aos vários princípios implicados, estabelecendo, a cada passo, a sua devida ponderação.

 

A contemporânea noção da instrumentalidade postula um processo tecnicamente estruturado que possa atender aos aspectos éticos da atividade jurisdicional. As garantias formais não são um fim em si mesmo. Devendo oferecer, dentro das possibilidades, resultado materialmente justo.

 

Há no ordenamento jurídico pátrio no mais alto patamar estão as verdadeiras cláusulas de direito fundamental e o princípio do direito mais favorável à pessoa humana e, em particular, mais favorável ao cidadão-trabalhador, não havendo distinção constitucional entre as normas que contemplam o direito material e o direito processual.

 

O insigne doutrinador Luiz Guilherme Marinoni nos ensina in litteris: “Diante da transformação da concepção do direito, não há mais como sustentar antigas teorias da jurisdição, que reservavam ao juiz a função de declarar o direito ou de criar a norma individual, submetidas que eram ao princípio da supremacia da lei e ao positivismo acrítico. O Estado Constitucional inverteu os papéis da lei e da Constituição, deixando claro que a legislação deve ser compreendida a partir dos princípios constitucionais de justiça e dos direitos fundamentais. Expressão concreta disso são os deveres de o juiz interpretar a lei de acordo com a Constituição, de controlar a constitucionalidade da lei, especialmente atribuindo-lhe novo sentido para evitar a declaração de inconstitucionalidade, e de suprir a omissão legal que impede a proteção de um direito fundamental. Isso para não falar do dever, também atribuído à jurisdição pelo constitucionalismo contemporâneo, de tutelar os direitos fundamentais que se chocam no caso concreto”. (In: Marinoni, L.G. A jurisdição no Estado Contemporâneo. In: Marinoni, L.G. (coord.) Estudos de direito processual civil: homenagem ao professor Egas Dirceu Moniz Aragão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 65).

 

A teoria ontológica do processo se edificava sobre os parâmetros da concepção aristotélico-tomista e estabelecendo a nítida distinção entre processo e procedimento.

 

Para o processo civil devem ser sempre lembrados Pontes de Miranda, jurista notável que fora o primeiro, no Brasil, a conceituar o processo como relação jurídica, depois veio Gabriel Resende Filho que estabeleceu a ligação entre o procedimentalismo dos mestres anteriores e a renovação científica que ocorreu no Brasil a partir do CPC de 1939, e Machado Guimarães construiu cientificamente as bases da processualística em muito de seus institutos fundamentais. E, por derradeiro, Moacyr Amaral Santos que com sua maravilhosa obra didática granjeou grande prestígio e fora reeditada à luz do CPC de 1973.

 

Registre-se também a vinda de Enrico Tullio Liebman para o Brasil que se estabeleceu em São Paulo em 1940 para ficar até o final da guerra, significou decisiva contribuição para a renovação do método do processo civil que trouxe a congregação de jovens processualistas no direito brasileiro, lançando as bases do que seria a Escola de São Paulo.

 

Apesar de Liebman ser portador da ciência processual europeia, o doutrinador italiano encantou-se inteiramente pelas obras de autores luso-brasileiros mais antigos e doo espírito herdado da legislação de Portugal. Rendeu-se aos talentosos processualistas que nos anos quarenta se reuniam para debater os grandes temas da ciência processual e traduziram a perfeita simbiose que formou a alma da Escola Processual de São Paulo.

 

Foram discípulos de Liebman e que também privaram de sua companhia nos encontros de sábados à tarde, juristas como Alfredo Buzaid, José Frederico Marques, Luís Eulálio de Bueno Vidigal, Bruno Affonso de André e que elevaram a cientificidade do direito processual brasileiro e traçaram as estruturas do sistema processual e propiciaram o amadurecimento de seus conceitos fundamentais.

 

Deste contexto surgiu o CPC de 1973, também chamado de Código Buzaid que inscreveu o sistema brasileiro entre os mais modernos e avançados do mundo. E, que propunha a conciliação técnico-científica do direito processual brasileiro e que já se tornara irreversível.

 

O processo que antes então era examina sob a visão puramente introspectiva e, visto costumeiramente como mero instrumento técnico predisposto à realização do direito material, passou a ser examinado em suas conotações deontológicas e teleológicas, aferindo-se os seus resultados na vida prática, pela justiça que fosse capaz de fazer.

 

O processualista contemporâneo consciente dos níveis expressivos do desenvolvimento técnico-dogmático de sua ciência deslocou sua atenção, passando a enxergar o processo a partir de um ângulo externo, examinando-o em seus resultados junto aos consumidores da prestação jurisdicional e da justiça.

 

Logo cedo no Brasil, criou-se um clima propício aos estudos constitucionais do processo. Já na Constituição republicana de 1891 transladou para o sistema jurídico muitos institutos do direito norte-americano, desde o princípio da unidade da jurisdição e da judicial review dos atos administrativos e legislativos, passando pelas garantias do due process of law e culminando com os instrumento constitucionais de defesa das liberdades.

 

Os trabalhos de Rui Barbosa traçaram com maestria as coordenadas processuais do controle da constitucionalidade[33] das leis, tal como havia sido transplantado do sistema norte-americano para o sistema jurídico brasileiro.

 

Foram o direito judiciário e o Poder Judiciário que traçaram as bases do devido processo legal, enquanto processo necessário para assegurar os direitos subjetivos tutelados pelo direito material.

 

E por surgir o processo como instrumento para a segurança constitucional dos direitos, sendo uma espécie de processo natural e devendo o procedimento ser modelado conforme as formalidades definidas pela lei brasileira.

 

 

Apesar de este desabrochar precoce do processo constitucional entre nós, fora um início tímido até que a Escola Processual de São Paulo que se inspirando na sensibilidade constitucional[34] de Liebman e se abeberando nos ensinamentos do mestre uruguaio Couture veio trazer os estudos processuais civis para a área do direito constitucional.

 

Nos anos cinquenta os estudos de Luiz Eulálio Bueno Vidigal sobre o mandado de segurança, de Alfredo Buzaid sobre o mesmo instituto e, ainda sobre a ação direta de inconstitucionalidade, esta obra que submete o instituto a tratamento científico e sistemático, enquadrando um dos instrumentos de processo constitucional nas categorias da moderna processualística; de José Frederico Marques, cujos trabalhos em torno da jurisdição voluntária e sobre o princípio constitucional da proteção judiciária marcam o ponto inicial dos modernos estudos brasileiros e as garantias do devido processo legal.

 

Multiplicaram-se os estudos de processo constitucional em 1980 e vem a lume a tese de doutorado de Kazuo Watanabe (Princípio da inafastabilidade do controle judicial no sistema jurídico brasileiro) que fora editada junto com outro ensaio sobre o mandado de segurança contra os atos judiciais.

 

Evidentemente precisamos entender a ontologia processual brasileira e perceber o íntimo e indissociável relacionamento sobre o direito e a cultura, especificamente no direito de processual civil.

 

Nesse sentido, Castanheira Neves[35] alude que irreversivelmente “o direito compete à autonomia cultural do homem, que, tanto no seu sentimento como no conteúdo da sua normatividade, é uma resposta culturalmente humana (…) ao problema também humano da convivência no mesmo mundo e num certo espaço histórico-social, e assim sem a necessidade ou a indisponibilidade ontológica, mas antes com a historicidade e condicionabilidade de toda a cultura”.

 

Lembremos que na clássica definição de Galeno Lacerda as vivências de ordem espiritual e material que singularizam determinada época de uma sociedade são responsáveis pela informação e molde do direito, fazendo-o, ao fim e ao cabo, espelho a refletir de forma segura e fiel a realidade histórica naquele espaço e tempo socialmente considerado.

 

Ao longo da história do processo há três modelos processuais tais como praxismo, processualismo e o formalismo. O praxismo congregou todas as manifestações culturais que formam aquilo que Nicola Picardi apontou como sendo a pré-história do processo civil, e, portanto, antes do aparecimento da ciência processual. Significa apontar o processo como iudicium e, não ainda, como processus.

 

A expressão “modelos processuais” não corresponde exatamente ao que usou Miguel Reale que conceituou modelos como estruturas normativas que ordenam fatos segundo valores, numa qualificação tipológica de comportamentos futuros, e que se ligam determinadas consequências (In: Para uma Teoria dos Modelos Jurídicos. In: Estudos de Filosofia e de Ciência do Direito. São Paulo: Saraiva, 1978, p. 17).

 

A postura metodológica do praxismo era sincrética, pois baseada na noção de que o direito processual civil era adjetivo e só ostentava existência se ligado ao direito substantivo.

 

Cândido Rangel Dinamarco se refere que no período do sincretismo “os conhecimentos eram puramente empíricos, sem qualquer consciência de princípios, sem conceitos próprios e sem definição de um método”.

 

O processo mesmo como realidade da experiência perante os juízos e tribunais, era visto apenas em sua realidade física exterior e perceptível aos sentidos: confundiam-no com o mero procedimento quando o definam como sucessão quando o definiam como sucessão de atos, sem nada se dizerem sobre relação jurídica entre seus sujeitos e nem sobre a convivência política aberta para a participação dos litigantes (contraditório).

 

A racionalidade que informava o fenômeno jurídico de um modo geral era a racionalidade prática argumentativa dos sujeitos processuais direcionada à resolução de problemas concretos, à consecução do justo pelo iudicium.

 

Após, o praxismo, surgiu o processualismo que fora um movimento cultural próprio da Idade Moderna no campo do processo civil. Seu principal objetivo fora a tecnicização do direito e despolitização de seus operadores, reduzidos à condição de autênticos escravos do poder.

 

Conforme bem observou Ovídio Araújo Baptista da Silva, ao postular o processo civil como instrumento puramente técnico, totalmente alheio aos valores em sua intencionalidade operacional.

 

O método que servia o processualismo era o científico ou autonomista através do qual os estudiosos se lançaram à tarefa de expulsar da disciplina processual e qualquer resíduo de direito material, forçados que estavam a justificar o direito processual civil como ramo autônomo e próprio da árvore jurídica.

 

Identificava-se com a racionalidade teórica, do tipo positiva, apta a retirar do plano da relação jurídica processual o problema da justiça, colocando em seu lugar o problema da norma jurídica (como aquilo que provém, do Estado e, mais particularmente do Legislativo).

 

O direito tendia à norma estatal sendo passível de uma única interpretação verdadeira, onde a tarefa do juiz cingia-se a descobrir a vontade concreta da lei. Conforme bem expressa a célebre frase de Guiseppe Chiovenda, assumindo foros de clareza, certeza e previsibilidade (projeto iluminista e racionalista para a ciência jurídica).

 

O formalismo processual foi entendido como movimento cultural destinado a concretizar os valores constitucionais no tecido processual, dando força ao caráter instrumental e a racionalidade prática dirigida ao caso concreto.

 

Deixa o processo de ser visto como mera técnica assumindo a estatura de instrumento ético sem deixar de reconhecer, a sua estruturação igualmente técnica.

 

Afinal, atualmente vivenciamos o formalismo processual onde os valores constitucionais contaminam a técnica processual e propondo a delimitação de poderes, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, a coordenação de sua atividade, ordenação do procedimento e organização do processo, com vistas a que sejam atingidas suas finalidades primordiais.

 

Desta forma o formalismo investe-se na tarefa de indicar as fronteiras para o começo e o fim do processo. Neste contexto, observamos que o CPC de 2015 ampliou os limites da coisa julgada passando a incluir a questão prejudicial.

 

Cumpre assinalar que o advento do CPC de 2015 que inaugura o neoprocessualismo trazendo uma renovação dos princípios do direito processual, acentuando os poderes do juiz na relação jurídica processual, a ênfase para a autocomposição da lide pela mediação e conciliação e calcada na força normativa da Constituição Federal brasileira de 1988, além de tecer maior legitimação ao provimento judicial quando passa a exigir uma fundamentação jurídica mais detalhada das decisões judiciais.

 

Conclui-se que o processo civil brasileiro possui identidade própria que lhe são peculiares, não podendo o jurista deixar de considerar as nossas raízes, nossa evolução e nossas instituições no sentido de reafirmar o Estado de Direito e uma cidadania mais digna e atuante.

 

Enfim, o CPC de 2015 representa um importante passo e trouxe inúmeras novidades que renovaram as esperanças[36] dos juristas e da sociedade brasileira principalmente por dar ênfase ao diálogo entre o juiz e as partes, prover uma prestação jurisdicional mais simples e mais uniforme, a ampliação da exigência da boa-fé objetiva e trazer o ideal da maior saneabilidade processual que possível e valorizar os julgamentos de mérito admitindo incidentes de resolução de demandas repetitivas, no objetivo de obter maior efetividade processual.

 

 

Referências:

BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Direito e processo: influência do direito material sobre o processo. 3ª edição. São Paulo: Malheiros, 2003.

BESERRA, Fabiano Holz. Processo, ideologia e tutela de urgência no pensamento de Ovídio A. Baptista da Silva. Disponível em: http://www.tex.pro.br/artigos/107-artigos-novo-2004/5216-processp-ideologia-e-tutela-de-urgencia-no-pensamento-de-ovidio-a-baptista-da-silva Acesso em 22.08.2015.

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[1] O significado de ontologia varia conforme a filosofia, para o aristotelismo, é a parte da filosofia que tem por objeto de estudo as propriedades mais gerais do ser, apartadas da infinidade de determinações que, ao qualificá-lo particularmente, ocultam sua natureza plena e integral. Já para Heidegger representa a reflexão sobre o sentido mais abrangente do ser, como aquilo que torna possível as múltiplas existências.

[2] Heidegger, e depois Gadamer, trouxeram à construção da hermenêutica filosófica, a contribuição produtiva do intérprete no movimento da compreensão, bem como a elevação da linguagem para dentro do processo interpretativo, e, também, atribuíram sentido ontológico ao conhecimento da verdade, ao contrário do apego à historicidade, realçado na hermenêutica clássica.

[3] Segundo Gadamer, o conjunto da ética humana se distingue essencialmente da natureza pelo fato de nela não atuarem simplesmente capacidades ou forças, mas que o homem vem a ser tal como veio a ser somente através do que faz e de como se comporta. A mudança e a indeterminação são as condições pela qual a justiça, a virtude e o bem podem ser qualificados como tais. O justo é essa estabilidade que se revela na própria indeterminação do mundo; na ambiguidade de que pode ser diferente do que é.

[4] Lênio Streck apesar de apontar que a hermenêutica seja identificada e conhecida por sua origem mitológica, particularmente a partir de Hermes, um semideus que corresponde ao mensageiro dos deuses com os mortais. A verdade é que apenas na modernidade que pode ser compreendida stricto sensu, a hermenêutica como a revolução provocada pelo nascimento do sujeito.

[5] A metáfora como fonte do conhecimento em Tomás de Aquino, faz-nos analisar dois conceitos fundamentais da filosofia tomista: a negatividade e participação que constituem uma chave original para o entendimento da realidade. A causa primeira das coisas é onde se encontra a explicação mais profunda da existência e, sendo suprarracional, encontra-se infinitamente afastada da inteligência e da imaginação do homem, numa transcendência radical, absoluta e incompreensível. Daí o porquê que é preciso negar qualquer qualidade e característica a essa causa, que não se confunde com nada do que existe. Descobre-se, portanto, a inutilidade de tentar subjugar a realidade sob a férrea lógica da razão humana, como fazem, os racionalistas mais exaltados.

[6] A recuperação do conceito de justiça a partir da diké de Anaximandro. Assim se revela como um cosmos, numa comunidade jurídica das coisas, descoberta só feita no fundo da alma humana, por uma faculdade intuitiva fugindo-se de qualquer investigação empírica. A justiça para Anaximandro recorda o conceito grego de culpa e que fora transferido da imputação jurídica para a causalidade física. A sua concepção de diké sobre os acontecimentos é o começo do processo de projeção da pólis no universo, contendo em germe, a ideia do futuro e harmônico ser eterno com seus valores.

[7] Com precisão cirúrgica vem a análise feita por Lênio Streck afirmar: “Em outras palavras: a escolha é sempre parcial. Há no direito uma palavra técnica para se referir a escolha: discricionariedade e, quiçá (ou na maioria das vezes), arbitrariedade. Portanto, quando um jurista diz que o “juiz possui poder discricionário” para resolver os casos difíceis, o que quer afirmar é que, diante de várias possibilidades de solução do caso, o juiz pode escolher aquela que melhor lhe convier.

[8] Há dois aspectos diferentes em relação aos quais, é possível cogitar de incerteza judicial: seja quanto aos meios da decisão e seja quanto ao seu conteúdo. O primeiro refere-se à aplicação das normas que devem reger o processo de tomada de decisão judicial. O segundo refere-se às expectativas normativas ou cognitivas que ela frustra ou confirma quando finalmente é tomada. Não existe uma relação necessária entre os dois tipos de incerteza. Nesse sentido uma pesquisa recente apontou que cerca de oitenta por cento dos magistrados brasileiros consideram que as cruciais causas da morosidade do Judiciário pátrio estariam ligadas à má qualidade da legislação processual. Com o advento do CPC de 2015 esperemos que pelo menos que venhamos reduzir as causas.

[9] Somente com a recusa de ambas as partes a respeito da realização da audiência obrigatória de conciliação ou mediação, e com fundamentadas razões, é que se deixará de realiza-la. Portanto, em regra esta será realizada, mesmo quando um dos litigantes se manifestar sobre a impossibilidade da composição amigável da lide.

[10] A teoria do processo vista como procedimento em contraditório tem suas bases em dois grandes doutrinadores: Rosemiro Pereira Leal e Aroldo Plínio Gonçalves. Essa teoria fora desenvolvida pelo processualista italiano, Elio Fazzalari, o principal estudo foi o aprofundar sobre o instituto do processo em conceitos que distinguisse do procedimento que é a sua estrutura técnico-jurídica. Acautelou-se o doutrinador italiano quando fez a distinção entre processo e procedimento, integralizando em sua teoria, o contraditório. O processo não pode ser definido pela mera sequência, direção ou finalidade de atos praticados pelas partes ou pelo juiz, mas pela presença de atendimento do direito ao contraditório entre as partes, em simétrica paridade. Portanto, o processo não pode ser entendido se não houver o contraditório, que só ocorre quando as partes em litígio possuem simétrica paridade, ou seja, o mesmo espaço-temporal no processo. O procedimento para Fazzalari, não significa o conceito particular de uma disciplina, mas um conceito geral do Direito, e deve ser colhido, extraído, de um complexo de normas. Simplificando, o procedimento não pode ser compreendido somente como atos ou série de atos realizados no processo se não for à luz de normas processuais. Enfim, consagrou Rosemiro Pereira Leal que o procedimento corresponde a uma estrutura técnica construída pelas partes, que sem a observância às normas processuais, ou sem a sua presença, o procedimento, pode ser considerado como amontoado de atos não-jurídicos sem qualquer legitimidade, validade e eficácia.

[11] As considerações de Eric Hobsbawn são importantes para ilustrar: “As orígines da Segunda Guerra Mundial produziram uma literatura histórica incomparavelmente menor sobre suas causas do que as da Primeira Guerra, e por um motivo óbvio. Com as mais raras exceções, nenhum historiador sério jamais duvidou de que a Alemanha, Japão e (mais hesitante) a Itália foram os agressores. Os Estados arrastados à guerra contra os três, capitalistas ou socialistas, não queriam o conflito, e a maioria fez o que pôde para evitá-lo. Em termos mais simples, a pergunta sobre quem ou o que causou a Segunda Guerra Mundial pode ser respondida em duas palavras; Adolf Hitler”. (In: HOBSBAWN, Eric. Era dos Extremos: O Breve Século XXI: 1914-1991. Tradução de Marcos Santarrita. 2ª edição. São Paulo: Cia. das Letras, 1995).

[12] O engraçado ou pelo menos irônico é que a Constituição Alemã de 1919 trazia inovações consideráveis em matéria de Direitos Humanos, mas a vigência efetiva dos textos constitucionais depende de sua aceitação pela coletividade. E, apesar de possuir uma escrita equilibrada e prudente, refletia valores ainda não enraizados na sociedade alemã.

[13] Contraditório é mais do que isto, afinal é um elemento de extrema importância para a teoria em estudo, portanto, este deve representar também uma forma de garantia “participação, em simétrica paridade, das partes, daqueles a quem se destinam os efeitos da sentença, daqueles que são os “interessados”“.

[14] Os enigmas da ciência processual são múltiplos e começam com a definição de justiça, passa para a concepção de verdade, depois de ética processual, vindo também a questão da forma procedimental suplantar por vezes o próprio escopo do processo que é a pacificação social. A teleologia da interpretação das leis pelo judiciário é ainda uma descoberta reticente e muito pouco observada.

[15] Deverá a verdade no processo judicial corresponder à verdade. Sabemos, porém que a verdade formal é a que resulta do processo ainda que não exista a exata correspondência com os fatos conforme ocorreram historicamente. Já a verdade real é aquela a que chega o julgador, é a revelada pelos fatos conforme ocorreram historicamente e não como querem os litigantes que apareçam realizados. A distinção entre verdade real e formal surgiu no confronto entre o processo penal e o processo civil. Onde no civil, os interesses são, supostamente, menos relevantes do que os interesses no processo penal, em face dos bens tutelados serem a vida, a liberdade, o jus puniendi do Estado e, etc. Assim, no penal se busca a verdade real ao passo que no civil apenas a verdade formal. É certo que no processo penal justifica-se a busca da verdade real pelo juiz por se referir ao direito indisponível, ou seja, aquela que a lei considera essencial à sociedade, sendo tutelado pelo Ministério Público.

[16] Chaïm Perelman (1912-1984) filósofo de Direito que viveu e ensinou a maior parte de sua vida na Bélgica, foi um dos mais relevantes teóricos da retórica do século XX. Sua principal obra o Tratado da Argumentação de 1958.

[17] O Leviatã é criatura mitológica de grandes proporções e bem comum no imaginário dos navegantes europeus da Idade Média. O nome vem do hebraico liwjathan, cujo significado é “animal que se enrosca”, sendo modificado pelo latim bíblico para leviathan. Também conhecido como monstro marinho.

[18] O Conselho Nacional de Justiça decida aprimorar o relatório da Justiça em número que representa um importante instrumento de análise da estrutura e do desempenho do Judiciário para formulação de políticas de gestão, o relatório da Justiça em Números deve ser aprimorado a partir de 2016. Pretende o CNJ acrescentar indicadores inéditos, e aperfeiçoar alguns existentes e excluir os pouco relevantes.

O objetivo é democratizar o debate e garantir a excelência da nova versão. Disponível em: http://www.trf2.jus.br/Paginas/Noticia.aspx?Item_Id=2619&js=1  Acesso em 22.08.2015.

[19] O precedente judicial deve ser entendido como sendo a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto e cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos. Um precedente judicial quando reiteradamente aplicado se transforma em jurisprudência que representa um conjunto de julgados harmônicos entre si, fruto da constante interpretação e aplicação da lei num determinado sentido. A súmula, por sua vez, é um enunciado normativo enumerado e publicado por certo tribunal e que demonstra seu posicionamento prevalente sobre determinado tema ou tese jurídica, posto que extraído da ratio decidendi de casos concretos anteriormente julgados. Quando o juiz utilizando o método de confronto, verifica que o caso em análise ou julgamento pode ou não ser considerado como análogo ao paradigma, chama-se distinguishing ou apenas distinguish.  Termos que podem ser usados para duas acepções diferentes, a saber: 1. Para designar método comparativo entre o caso concreto e o paradigma (distinguish -método); 2. Para designar o resultado desse confronto, quando se concluir haver entre estes alguma diferença.

[20] Luís Roberto Barroso, atual ministro do STF, aponta que o constitucionalismo francês procurou conceituar o postulado presente no preâmbulo da Constituição francesa de 1793, expressando-o da seguinte forma, in litteris: “A segurança consiste na proteção conferida pela sociedade a cada um de seus membros para a conservação de sua pessoa, de seus direitos e de suas propriedades”.

[21]A defesa do direito concreto quando ameaçado, não constitui apenas um dever do respectivo titular consigo mesmo, mas também para a sociedade. Assim o titular também defende a lei, e com esta, a ordem essencial à vida em sociedade, ainda haverá quem negue que tal defesa representa um dever para com a sociedade? Se esta pode convocar um cidadão para a luta contra o inimigo extremo, uma luta na qual é empenhada a própria vida, se, portanto, a qualquer um cabe o dever e os interesses comuns contra o inimigo externo, tal dever não prevalecerá também no interior do país?

[22] A Escola do Direito Livre teve como seus matizes próprios de opiniões de François Gény, Büllow, Köhler,

Kantorowicz, Schlossmann, Erlich, Stammler e Mayer que preconizava o Direito Justo. Propôs novos métodos de interpretação, permitindo-se, em alguns países, ao juiz corrigir e completar a lei, guiado por orientações subjetivas, com a valoração interesses pelos próprios sentimentos, criando no lugar e ao lado do direito positivo. Não havia acordo entre os defensores desta corrente. Para uns, o juiz só pode criar o direito no silêncio da lei; Para outros, o juiz só pode criar o direito ao proceder à interpretação lógica; E, para tantos outros, em qualquer caso, o juiz tem a liberdade para, inclusive, ao interpretar a norma ir de encontro a mesma, todas as vezes em que tiver como objetivo buscar o direito justo. O juiz guiado pelo sentimento e pela consciência jurídica deve inspirar-se nos dados da realidade social.

[23]O desenrolar do processo em um prazo razoável é, ao contrário, fator de segurança, na acepção mais ampla desse valor. Com respeito a isso, a legislação processual repele a utilização de expedientes que impedem de se efetivar e de se oportunizar a tutela jurisdicional, a teor do que dispõem, só para exemplificar, os artigos 16 a 18, 273, inc. II, 461, 600, 879 e, mais recentemente, o renovado art. 14, caput, inc. V e parágrafo único, todos do Código de Processo Civil (CPC/1973).

[24] O legislador constitucional brasileiro incluiu, assim, o direito de todos terem assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, no inovador inciso LXXVIII, do art. 5º da CF/1988. José Afonso da Silva apontava como despiciendo o novo inciso, quando afirmou que o acesso à justiça só por si já inclui uma prestação jurisdicional em tempo hábil para garantir o gozo do direito pleiteado, mas a crônica morosidade do aparelho judiciário o frustrava. Em verdade se encontra positivado apenas um princípio constitucional implícito, mas trata-se de pleonasmo benéfico.

[25] Afirmava Ovídio Baptista que a “urgência da tutela” e, não a tutela da urgência fez com que a procurada efetividade ficasse reduzida, tendencialmente, à simples celeridade na prestação da tutela processual exigida, constituindo mesmo, o tempo um dos parâmetros da justiça contemporânea. Assegura a Constituição italiana, em seu art. 111, o giusto processo e sua ragionevole durata. A segurança jurídica, porém, relaciona-se a um conceito mais amplo que, no dizer de Canotilho, porquanto subprincípio concretizador do princípio do Estado de Direito, constitui garantia de estabilidade jurídica, segurança de orientação, realização do direito, e cujos postulados são exigíveis perante qualquer ato, de qualquer poder (legislativo, executivo e judiciário). Reafirma Canotilho que a segurança jurídica abrange a ideia de proteção da confiança dos cidadãos, pode formular-se no direito do indivíduo de poder confiar que os efeitos jurídicos previstos no ordenamento são assegurados nas manifestações de seus atos ou de decisões públicas incidentes sobre o status jurídico, realizadas com base em normas vigentes e válidas.

 

[26] Os críticos opositores da Escola do Direito Livre entendem que na interpretação da norma o que deve prevalecer é a vontade da sociedade, representada pela lei e, de forma nenhuma, a vontade individual do juiz. Contra a Escola Livre ergueram-se estudiosos vários, apontando-lhe o grave defeito de comprometer a segurança jurídica, gerando um alarmante estado de anarquia. Por sua vez, os partidários da Escola do Direito Livre, todavia, centravam suas críticas na excessiva abstração do método tradicional que restava amarrado aos conceitos lógicos e formais, afastando-se da realidade concreta da vida e das relações em jogo e, fim do próprio Direito. Segundo Ferrara somente a interpretação teleológica e não há outra forma de concebê-la, pois é a que confere a eficácia prática à jurisprudência e está vinculada firmemente à lei, quer pela aplicação lógica, quer pela analógica, cujos germes e meios se contêm no Direito Positivo. O princípio não é invenção do jurista, porém descoberta do Direito, e que se encontra latente no direito positivo.

[27] É preciso combater a guetificação do processo coletivo no direito brasileiro. Guetificação conforme leciona Zygmunt Bauman é medida paralela e complementar à criminalização da pobreza, sendo um  modo de confinar e imobilizar os indesejáveis segundo determinada sociedade. A guetificação ocorreria a partir da interpretação da legitimidade coletiva dos agentes públicos em ênfase na capacidade econômica dos beneficiados por suas ações coletivas. Tal medida resultaria na redução de força dos pleitos processuais dos mais carentes, os quais teriam maiores dificuldades de batalhar por seus direitos, ao lado dos demais membros da sociedade.(In: MAIA, Maurilio Casas. O risco da guetificação no processo coletivo: breve reflexão sobre a legitimidade defensorial coletiva – o NCPC e a ADI 3943. Disponível em: http://emporiododireito.com.br/o-risco-da-guetificacao-no-processo-coletivo-breve-reflexao-sobre-a-legitimidade-defensorial-coletiva-o-ncpc-e-a-adi-n-3943-por-maurilio-casas-maia/ Acesso em 22.082015).

 

[28] As teorias contemporâneas de justiça dentro da escola do pensamento político atual, tal como o utilitarismo, o igualitarismo liberal, o libertarismo, o marxismo e o comunitarismo. Num primeiro momento o objetivo da justiça é produzir o maior grau de felicidade possível para o maior número de pessoas alcançável. Para os igualitários, é relevantíssimo que a igualdade econômica e social seja o fundamental princípio na sociedade. Já para o libertarismo se defende que a liberdade individual e de mercado sob todos os seus aspectos. Para o comunitarismo, transcende a justiça individual para o conceito de justiça coletiva.

[29] Novamente o lúcido e sagaz Lênio Streck adverte que: “Se o constitucionalismo contemporâneo que chega ao Brasil apenas ao longo da década de 90 do século XX estabelece um novo paradigma, ou  proporciona as bases para introdução de um novo, o que impressiona, fundamentalmente, é a permanência de velhas formas de interpretar e aplicar o direito, o que pode ser facilmente percebido pelos Códigos ainda vigentes (embora de validade constitucional duvidosa em grande parte). Em tempos de intersubjetividade (refiro-me à transição da prevalência do esquema sujeito- objeto para a relação sujeito-sujeito), parcela considerável de jurista ainda trabalho com modelos (liberais-individualistas) “Caio”, “Tício” e “Mévio”…!”(In: STRECK, Lênio L. O pan-principiologismo e o sorriso do lagarto. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2012-mar-22/senso-incomum-pan-principiologismo-sorriso-lagarto Acesso em 23.08.2015).

[30] O valor efetividade inspira o reconhecimento de que todas as partes devem ser tratadas com condições de igualdade, dentro da relação jurídico-processual. Basta apenas mencionar que, para um processo ser efetivo, necessário se faz que seja observado o tratamento paritário das partes que o compõem, baseando-se na regra de igualdade de armas que deve acompanhar todos os momentos da sociedade democrática. Uma vez assegurado esse tratamento, seja em seu sentido substancial ou formal, não restam dúvidas que assim se perfaz seguro. Confirmam-se com isso que segurança e efetividade são valores extremamente interligados. Podem coexistir isolados, autonomamente, mas, para a realização primordial do processo, enquanto instrumento de pacificação social justa, devem ser conjugados de maneira harmônica, entrelaçados por suas facetas interdependentes. Daí, o lugar, também, à celeridade das tramitações.

[31] Karl Larenz (1903-1993) foi jurista e filósofo do direito alemão. Foi professor de duas importantes universidades da Alemanha: Universidade de Kiel e a Universidade Munique, nesta derradeira lecionou de 1960 até o fim de sua carreira acadêmica. Foi um dos pensadores da escola da jurisprudência de valores ou de princípios. Esta escola representa no processo de evolução do direito uma superação das contradições do positivismo jurídico, e por tal razão, é considerada por alguns como semelhante à escola do pós-positivismo. A jurisprudência dos calores caracteriza uma forma de se entenderem os conceitos de incidência e a interpretação da norma jurídica, bem como sua divisão em regras e princípios, além de conceitos como igualdade, liberdade e justiça.

[32] O devido processo legal substancial transcende a simples decisão formal promovida pelo juiz de direito diante do caso concreto. Canotilho leciona que: “A teoria substantiva está ligada à ideia de um processo legal justo e adequado, materialmente informado pelos princípios da justiça, com base nos quais os juízes podem e devem analisar os requisitos intrínsecos da lei”. Dirige-se em primeiro momento ao legislador, constituindo-se num limite à sua atuação posto que deva pautar-se pelos critérios de justiça, razoabilidade e racionalidade. Já o devido processo legal em sentido formal tem como principal destinatário o juiz como representante do Estado.

Pois a ele compete o dever de obedecer aos ritos, bem como seus demais aspectos que circundam o processo, sem, portanto, o eivá-lo de nulidade, ou suprimindo de quaisquer garantias das partes. Corresponde a garantia que a parte tem em saber o que vai acontecer dentro processo, sem invocações, que possam comprometer seu direito. Em outras palavras é a regularidade formal em todo o procedimento já pré-estabelecido pela Lei em todos os seus termos.

[33] A Teoria neo-Institucionalista do processo preconiza fiscalidade (controle de constitucionalidade aberto a qualquer povo) do processo legiferante nas bases intituintes e constituintes da legalidade, vem como na atuação e modificação, aplicação ou extinção do direito constituído e trabalha a socialização do conhecimento crítico-democrático em pressupostos (direito fundamental) de auto-ilustração (dignidade) pelo exercício da cidadania como legitimação ao direito-de-ação coextenso ao procedimento processualizado”.

[34] Nesta pós-modernidade, o processo como instituição se infere “pelo grau da autonomia jurídica constitucionalizada a exemplo do que desponta no discurso do nosso texto constitucional”.

Portanto, é considerável a conquista da fundamentação do processo em princípios e institutos que repudiam a repressão e concentração política.  Hoje, a Jurisdição Constitucional realizada pelo processo, representa uma condição de igualdade institucional entre o Estado e os cidadãos.  Diante deste pensamento, Rosemiro afirma que no pós-modernismo não pode haver também “hierarquia de instituições jurídicas ou a prevalência de uma sobre as outras no bojo constitucional”, pois a constituição, sem sombra de dúvida, uma fonte jurídico-institucional, não representa um Estado instrumental.

 

[35] Antônio Castanheira Neves (1929) é filósofo do direito português e professor jubilado da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. O direito deve ser entendido através da ideia de problema jurídico, de que são principal exemplo, os casos judiciais. Os problemas têm de serem resolvidos problemas jurídicos.

Estes, sim, são o ponto de partida necessário. A oposição de Castanheira Neves ao positivismo, ao jusnaturalismo e as várias teorias do silogismo jurídico, o que o tornou um dos primeiros defensores do interpretativíssimo jurídico, posição bem próxima da hermenêutica jurídica. O doutrinador lusitano afirma que a interpretação jurídica não é um elemento necessário da argumentação jurídica. O direito provém sempre é dos problemas jurídicos, que são concretos, historicamente situados, normativos e práticos.

Toda a decisão jurídica visa determinar o que é que alguém deve fazer num caso concreto, numa situação histórica e social concreta. A decisão judicial é também, em si mesma, uma ação. E, a interpretação, pelo contrário, nem sempre é necessária e, quando o é, é instrumental.

[36] A proposta de estabilização da tutela antecipada trata-se de uma revolução operada dentro do sistema processual brasileiro que sempre primou pela cognição plena e exauriente. Portanto, resta a adoção da possibilidade de um julgamento fundado no juízo de verossimilhança e na probabilidade, antes necessariamente provisório – adquirir imutabilidade que só era atribuída aos julgamentos definitivos de mérito. Consagra-se enfim um direito autônomo à tutela de urgência. Apesar de que o sistema não abandonou completamente a ideia de ordinariedade mas apenas a condicionou à iniciativa da parte interessada.

A poesia do art. 6º da Lei 13.105/2015

1

O busilis do princípio da cooperação não reside propriamente de suas explicações metafísicas que possam se abrigar em seu conteúdo e nem mesmo em seu neoprocessualismo.

 

O tema cooperação processual resta impregnado de etiquetas que acabam por traduzi-lo de forma pífia, e até a uma concepção de que o demandante seguirá feliz ou infeliz de mãos dadas com o réu, juntamente com o juiz no caminho tal qual o Mágico de Oz. Onde Dorothy e seus amigos, a saber, o Homem de Lata, o Espantalho e o Leão seguem juntos caminhando em uma estrada de tijolos amarelos.

 

Recordando a história na terra de Oz acompanha a trajetória de uma menina de doze anos, chamada Dorothy Gale, que vive com sua família na fazenda no Kansas, mas sonha com lugar melhor, uma vez que ela se sente ignorada por seu tio e tia, que são as pessoas responsáveis por ela.

 

Depois de ter sido atingida na cabeça e até perder os sentidos no momento em que um tornado leva sua casa para as alturas.

 

Dorothy e seu cão (Totó) acordam na terra de Oz, após a casa pousar em cima da Bruxa má do Leste. Lá a Bruxa Boa do Norte aconselha Dorothy a seguir pela estrada de tijolos amarelos para encontrar a Cidade de Esmeralda onde habita o Mágico de Oz que lhe ajudará a retornar a Kansas.

 

No seu caminho Dorothy encontra o Espantalho, o Homem de Lata e o Leão[1], que se reúnem na esperança de conseguirem o que acha que lhes falta – respectivamente um cérebro, um coração e a coragem. Tudo isso enfrentando a Bruxa Má do Oeste que quer os sapatos de mágicos de Dorothy dados pela Bruxa Boa, após Dorothy acidentalmente ter matado a Bruxa Má do Leste, que é irmã da Bruxa Má do Oeste.

 

Como um bom teosófico, Frank Baum certamente baseou o argumento dessa busca dos personagens em uma frase Madame Blavatski[2]: “não há perigo que a intrépida coragem não consiga conquistar, não há prova que a pureza imaculada não consiga passar, não há dificuldade que um forte intelecto não consiga superar”. Intelecto, pureza de sentimentos e coragem, três elementos que comporiam a nossa “centelha” interior que nos conecta a Plenitude. E a busca dessa descoberta interior inicia em uma jornada espiritual representada pela estrada de tijolos amarelos.

 

É interessante notar que a estrada começa com uma espiral em expansão, da mesma forma como o tornado conduziu Dorothy a um mundo mágico. No simbolismo oculto a espiral representa a autoevolução, a alma ascendente, da matéria ao mundo espiritual. Além disso, a espiral partilha de uma complexa simbologia do eixo e da verticalidade. Enquanto forma ela enquadra-se perfeitamente no tema da identidade.

 

Então todos seguiriam a caminho do arco-íris processual, a fim de obter finalmente um efetivo e célere processo, capaz mesmo de produzir resultados justos.

 

Lembremos que se existe processo, e particularmente na jurisdição contenciosa, é inefável a crise, ou seja, a lide, como conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida e levado à resolução pelo Estado-juiz. Cada sujeito processual assume nele uma diferente função e, portanto, naturalmente representa um diferente interesse.

 

A total inviabilidade do processo civil do arco-íris resta evidente da análise das posições das partes. É legítimo e, portanto faz parte do jogo, que o litigante não regule sua atuação na busca de uma decisão justa e nem mesmo de uma jurisdição célere.

 

Especialmente referente aos advogados, cujo Estatuto da OAB, em seu art. 2º, segundo parágrafo deixa expresso que a finalidade é a postulação de decisão favorável ao seu constituinte.

 

O art. 6º da Lei 13.105/2015 é poético. A cooperação não busca o processo civil, mas configura um limite imposto ao exercício dos direitos processuais, notadamente, ao contraditório. Limite já tão conhecido e velho quando nossa atual e vigente constituição brasileira.

 

Leonardo Carneira da Cunha foi feliz ao mencionar que a cooperação impõe deveres para todos os intervenientes processuais, para que se produza, no âmbito do processo civil, um procedimento ético tal qual se deu no direito material, ao consagrar as cláusulas gerais como a da boa-fé e do abuso do direito.

 

A parte deve ser informada e ter efetivas condições de reagir e de influenciar o julgado, mas estes direitos de informação e reação somente podem ser exercidos se guardarem harmonia com os objetivos visados pela Jurisdição.

 

Evidentemente além das proibições da litigância de má-fé (boa-fé subjetiva), a cooperação exige que o comportamento processual seja pautado nos padrões razoáveis à luz do homo medius e que levem em consideração suas legítimas expectativas estabelecidas em relação aos demais sujeitos processuais (boa-fé objetiva).

 

Por sua vez, o julgador também tem deveres a observar em sua atuação no contraditório. Tem o poder-dever de impulsionar o processo, de proferir e efetivar uma decisão, mas ao fazê-lo, deve privilegiar uma comunicação clara com os litigantes e usar de modo racional o formalismo processual.

 

 

O princípio de cooperação pode ser entendido por um rol não exaustivo como: vedação de conhecer a matéria ex ofício sem antes conceder a oportunidade de manifestação das partes, vide art. 10 da Lei 13.105/2015.

 

Alerta no mandado de citação, a respeito do prazo de defesa, sob pena de revelia. Em tese não existiria a obrigação de avisar ao demandado. Mas, há muito tempo, por opção legislativa. O dever de alerta é fundamental para existir o potencial contraditório mais seguro e mais efetivo e dinâmico.

 

Ademais ninguém pode se escusar do conhecimento da norma legal, apenas alegando desconhecê-la, a lei processual com seu caráter eminentemente técnico, não intuitivo, chega até parecer antinatural, daí não ser razoável exigir de todos,  a noção de determinados riscos processuais.

 

Alerta quanto à distribuição do ônus da prova, ou da distribuição dinâmica do ônus da prova. Portanto, produzirá a prova quem melhor tiver condições de fazê-lo. Já tão interpretado preceito pela jurisprudência do STJ. Visa-se evitar surpresas no processo.

A primazia do julgamento de mérito e da instrumentalidade das formas. O que não é inovação, mais serve de parâmetro de cooperação na perspectiva do julgador.

 

A aprovação do calendário processual pelas partes. Assim a cooperação é limite ao poder de autorregulação das partes. De fato, as partes podem se manifestarem e propor datas, alegar compromissos judiciais, dificuldades na obtenção de dados e informações, assistentes técnicos, bem como apresentar outros motivos relevantes.

 

Saneamento compartilhado do processo que deve ser motivada, não podendo a parte abusar de seu direito de autorregulação e insistir na produção probatória ou na fixação de ponto controvertido, e do objeto da prova a ser produzida, devendo-se levar em consideração a vontade manifestada pelas partes. E o gestor da balança é o juiz.

 

Podemos esquematizar um rol não exaustivo dos deveres decorrentes do princípio da colaboração processual: Dever da parte em esclarecer de forma clara e efetiva através de depoimento pessoal, sob pena de confissão; Dever de exibição de documentos, talvez essa seja a mais velha de suas facetas; Dever de manter informações atualizadas e verdadeiras sobre o endereço físico e eletrônico no cadastro da Justiça; Dever do advogado de informar e intimar da audiência a testemunha por ele arrolada; Dever de esclarecimento ou explicação do motivo que motivou a emenda da inicial.

 

Enfim, a tipificação infraconstitucional dessa projeção do contraditório a que se resolveu chamar de cooperação ou colaboração tem o mérito de chamar a atenção para tema.

 

Mas, o princípio não pode exigir das partes e nem do magistrado o inexigível ou impossível. De sorte que os litigantes não se desgarrarão de seus objetivos privados para buscarem o etéreo ideal de justiça. Há, pois limitações ou modulações relevantes ao exercício de direitos e poderes-deveres processuais, já existentes em nosso ordenamento e há muito tempo aplicados.

 

O grande mérito é trazer a cooperação para o centro do debate, carreando uma hermenêutica criativa e construtiva sobre o conteúdo normativo do preceito,

 

A alegoria da estrada de tijolos amarelos é clara associação com termo do budismo, o caminho dourada, como a jornada da alma para a iluminação…

 

Afinal, o processo deve ser o caminho que leve até a justiça. Afinal a terra de Oz é o plano astral da humanidade, onde estão expressos de forma arquetípica os conflitos, batalhas e embates do mundo físico. Os conflitos e buscas do Homem-Lata, do Leão e do Espantalho em verdade correspondem aos mesmos dilemas e personalidades comuns da humanidade.

 

Depois da segunda metade do século vinte, se desenvolveu nova teoria sobre o papel do Direito Constitucional, de maneira que a Constituição deixa de ser uma mera carta de intenções e passa a ser a principal fonte normativa do Direito. E, o DPC passou então a ser estudado com a ideia de que deve prevalecer é o Estado Constitucional, passando a aplicar ao processo as premissas do neoconstitucionalismo.

 

E, com esse movimento ganha destaque a aplicação dos princípios na relação processo, notadamente o princípio da cooperação ou da colaboração, segundo o qual as partes e o juiz devem cooperar entre si, através de diálogo e comportamento pautado na boa-fé objetiva.

 

Precisar os contornos do princípio da cooperação na atividade jurisdicional em suas diversas facetas: dever de esclarecimento, dever de consulta, dever de proteção ou prevenção e o dever de auxílio.

 

E, para tanto é imprescindível partir do princípio contraditório e da visão dialética do processo, para melhor situar a máxima cooperação no processo civil contemporâneo.

 

Nos séculos 16 e 17 o contraditório deixou de ser visto como mecanismo intrínseco e necessário à investigação da verdade, sendo mesmo rebaixado a um princípio externo e puramente lógico-formal.

 

A garantida do contraditório passou a ser considerada como mera existência de uma audiência bilateral.

 

Mas, no século 19, tal concepção de contraditório ganhou destaca, pois o juiz exercia um papel puramente passivo, e sua função precípua era apenas a de verificar e assegurar o atendimento ás regas formas do processo.

 

Foi ao longo do século vinte já sob o influxo do neoconstitucionalismo que o contraditório passou a abranger outros valores, sobretudo, a necessidade de maior ativismo judicial e ambição de efetividade, com intuito de promover a integração das tradicionais liberdades individuais com os deveres e garantias de natureza social, visando assegurar a igualdade real das partes em face da lei.

 

Assim, começa a alterar o alcance do contraditório, deixando de ser mera contraposição à demanda, e passando a assumir a qualidade de atributo inerente a todos os momentos importantes do processo.

 

O contraditório deve atender às pautas necessárias e requeridas para o desenvolvimento de um processo justo.

 

Já a partir dos anos cinquenta ganhou destaque a dimensão retórica e a dialética do processo. Buscou-se o valor essencial do diálogo na formação do juízo, como fruto da cooperação das partes com o órgão jurisdicional e deste com os litigantes, segundo as regras formas do processo.

 

Assim, implicando num julgador mais ativo e colocado no centro da controvérsia, mas a ensejar um caráter isonômico do processo, com a participação ativa das partes.

 

O diálogo substitui com vantagem a ideia de confronto e oposição, dando relevo ao concurso de atividades dos sujeitos processuais com abrangência tanto na colaboração da pesquisa dos fatos, como também na valorização da causa.

 

O processo civil como fenômeno cultural e humano, deve estabelecer um meio para atingir suas finalidades essenciais, em razoável espaço de tempo e, principalmente, com justiça.

 

Ressalte-se que o grau de liberdade concedida ao juiz guarda pertinência com a maior ou menor confiança do cidadão no Poder Judiciário.

 

A visão social do processo impõe naturalmente um incremento dos poderes do juiz de sorte que o processo deixa de ser substancialmente privado para passar a ser dirigido discricionariamente pelo juiz, com possível comprometimento à igualdade substancial das partes.

 

Há de se lembrar de que o juiz é um agente politico do Estado, dotado de poder estatal e expressão da democracia, sendo que a extensão de seus poderes-deveres está arraigada função do processo civil, como instrumento na realização de seus objetivos.

 

Frise-se que o ativismo judicial vem a contribuir para a concreta tutela jurisdicional. O princípio da cooperação, portanto exige, pois um juiz mais ativo que visa buscar restabelecer a isonomia do processo e um ponto de equilíbrio. Havendo assim uma melhor divisão do trabalho entre o juiz e as partes, somente pode ser alcançado por meio do fortalecimento dos poderes das partes, com sua participação mais ativa, leal e proba no processo, de maneira a ajudar mais efetivamente à formação da decisão judicial com ampla colaboração tanto na pesquisa dos fatos como na valoração da causa.

 

Ao juiz não basta a direção formal do processo, mas a direção material, devendo ter uma atuação mais dinâmica e efetiva na busca de justiça. Não cabe mais se cogitar em um juiz inerte, neutro e indiferente ao drama da competição… E não vige incompatibilidade entre o contraditório e a participação mais ativa do juiz no processo.

 

Lembremos que a separação entre fato e direito é artificial, posto que no litígio tanto o fato como o direitos estão intimamente ligados e se interpenetram a todo tempo. Conquanto as partes devam trazer os fatos essenciais e constitutivos da causa petendi.

 

O legislador optou pela possibilidade de o juiz até mesmo de ofício, levar em consideração fatos secundários que possam contribuir para o desfecho da questão sobre o fato principal, ainda que não sejam alegados pelas partes.

 

Enfim, o diálogo do juiz com as partes é, na verdade, uma garantia de democratização do processo, portanto exige a aplicação do iura novit curia com olhos na efetiva e correta aplicação do direito e na justiça do caso.

 

 

 

Referências:

MARTINS, Anna Faedrich. O percurso heroico de Dorothy. Disponível em: http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:sd5qLdHDeSQJ:revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/letronica/article/download/4213/3554+&cd=6&hl=pt-BR&ct=clnk&gl=br  Acesso em 04.09.2015.

 

MACHADO, Marcelo Pacheco.Novo CPC, princípio da cooperação e processo civil do arco-íris Disponível em: http://jota.info/novo-cpc-principio-da-cooperacao-e-processo-civil-do-arco-%C2%ADiris  Acesso em 03.09.2015.

 

[1] Os três companheiros de Dorothy funcionam como um desdobramento simbólico da própria heroína em personagens – Leão Medroso, Homem de Lata e Espantalho. No seu percurso de autoconhecimento e amadurecimento, Dorothy conquistou aquilo que buscava: a coragem, o amor e a razão. As três abstrações ganham forma objetiva, concreta, através das três personificações.

[2] Helena Blavatsky (1831- 1891) mais conhecida como Madame Blavatsky foi uma prolífica escritora russa e responsável pela sistematização da moderna Teosofia e cofundadora da Sociedade Teosófica. Blavatsky surgiu em um momento histórico em que a religião estava sendo rapidamente desacreditada pelo avanço da Ciência e da Tecnologia, e que testemunhou o nascimento de uma série de escolas de ocultismo ou de pensamento alternativo, muitas delas com base conceitual pouco firme ou desenvolvendo práticas apenas intuitivas, que ganhavam grande número de adeptos em virtude do fracasso do Cristianismo em fornecer explicações satisfatórias para várias questões fundamentais da vida e sobre os processos do mundo natural.

Novo contraditório, novo processo

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O processo civil pátrio define-se como um procedimento em contraditório[1] que se desenvolve de forma isonômica perante o juiz natural[2], destinado a permitir a construção de decisões devidamente fundamentadas em tempo razoável. É incidente sobre qualquer pretensão que se deduza em juízo posto que seja garantido o acesso à justiça. Enfim, se traduz no devido processo constitucional.

 

Há uma notória ênfase ao princípio do contraditório que passa a ter uma versão dinâmica e, ser compreendido como garantia de participação das partes, permitindo a influência sobre o julgamento e a não surpresa (cuja ausência é considerada vício de fundamentação na decisão judicial, conforme o art. 489, §1º do CPC/2015).

 

Entre seus princípios integrantes há o da segurança jurídica que para existir precisa de previsibilidade das decisões judiciais e, o que requer uma estabilidade decisória que se consegue através de um sistema de precedentes judiciais que vai além da eficácia persuasiva que tradicionalmente tiveram no Brasil.

 

A formação de uma padronização decisória impede a esquizofrenia jurisprudencial formada pela intensa variedade de decisões divergentes (muitas vezes contraditórias) e incidentes em casos iguais.

 

Assevera com razão Alexandre Freitas Câmara que é fundamental preservar a segurança jurídica e a isonomia de modo que onde houver casos iguais que recebam decisões iguais.

 

Por essa razão, é louvável que os precedentes judiciais exerçam através de sua eficácia vinculante, a construção de um processo mais isonômico[3] e, por isso mesmo, mais democrático e mais justo.

 

O modelo constitucional de processo civil já vem expresso logo no primeiro artigo da Lei 13.105/2015, tal conceito se reporta aos princípios e valores constitucionais que devem nortear todo e qualquer processo que se desenvolva no Brasil.

 

Saliente-se que o CPC/2015 quando trata desses princípios traz um rol de normas fundamentais que não é exaustivo conforme elucida o enunciado 369 do FPPC.

 

De início partimos do princípio da inafastabilidade da jurisdição, ou seja, o princípio que assegura o amplo acesso à justiça, ao judiciário (art. 3º do CPC, art. 5º, inciso 33 da CF/1988), reconhecendo-se também, ser compatível com a utilização da arbitragem[4] bem como a solução consensual dos conflitos através da mediação ou conciliação.

 

Frise-se que os métodos consensuais realizados através da mediação e conciliação devem ser mesmo estimulados por todos que atuem no processo, inclusive durante o curso processual. E, devem ser feito através de um procedimento em contraditório e com a efetiva participação dos interessados. O que é relevante é a busca de soluções adequadas sejam estas jurisdicionais ou parajurisdicionais para todos os litígios.

 

Há de se destacar que se assegure igualmente a duração razoável do processo que deve ser compreendida de forma panorâmica, cogitando-se na duração total do processo, e não só no tempo necessário, para se produzir a sentença do processo de conhecimento.

 

Também não se pode compreender pela busca desenfreada pela celeridade processual a qualquer preço, mas se deve chegar ao resultado do processo sem dilações indevidas.

 

Lembremos que deve haver o amplo debate entre os sujeitos do procedimento em contraditório. Também deve haver a adequada dilação probatória bem como as dilações devidas e compatíveis com o atendimento das garantias constitucionais.

 

A observância de um sistema de vinculação aos precedentes judiciais especialmente quanto às causas repetitivas, a construção de mecanismos de antecipação de tutela, tanto para as situações de urgência como também na de evidência; a melhoria do sistema recursal, a redução das oportunidades recursais e, tudo isso, efetivamente contribui para a duração razoável do processo.

 

Mas alertamos que um processo célere, mas que não produza resultados constitucionalmente adequados, não é eficiente. E, a eficiência também é outro princípio do processo civil (art. 8º).

 

O art. 4º do CPC/2015 traz um princípio infraconstitucional (e os arts. 317 e 488) que é fundamental para o processo brasileiro, o princípio da primazia da resolução de mérito, confirmando ser o processo o instrumento ou método de resolução do caso concreto.

 

Assim, extinguir o feito sem resolução do mérito (como quando se decretar a nulidade de ato processual ou não conhecer do recurso) somente deve ocorrer quando se estiver diante de vício insanável. Espera-se que tal princípio seja capaz de auferir resultados positivos ao funcionamento o sistema de proteção da justiça civil.

 

Igualmente fundamental é o princípio da boa-fé objetiva que está estampado no art. 5º do novo codex e no enunciado 374 do FPPC que exigem não apenas a atuação da boa-fé dos sujeitos do processo, mas que se comportem de forma legal e idônea, durante todo o curso processual.
A vedação de comportamentos contraditórios, a segurança e a tutela da aparência resultante de comportamentos duradouros (tais como supressio e surrectio) entre outros corolários da boa-fé objetiva são reconhecidamente como cruciais para o regular desenvolvimento do processo civil.

 

A boa-fé objetiva também deve orientar a hermenêutica da postulação e da sentença, permitindo-se a imposição de sanção ao abuso de direitos processuais e, outras condutas dolosas e procrastinatórias de todos os sujeitos do processo (Vide os enunciados 378 e 375 do FPPC).

 

O princípio do contraditório compreendido em dupla garantia, a saber: a de participação com influência na formação do resultado e a da não surpresa. Não é coerente com o modelo constitucional do processo que apresente como resultado, o que não fora debatido, conforme o art. 10 do CPC/2015, mesmo diante das questões de ordem pública.

 

A decisão é construída através do amplo debate travado entre os sujeitos participantes do processo. Percebe-se que a autorização para conhecer de ofício não significa que possa decidir sem prévio contraditório.

 

Propugna-se por um processo coparticipativo, policêntrico e, não mais centrado na pessoa do julgador, mas aquele processo que é conduzido por diversos sujeitos (partes, juiz, Ministério Público e Defensoria Pública) que são igualmente importantes para a construção do resultado final da atividade jurisdicional.

 

Eis que o art. 6º do novo diploma legal ainda assenta o princípio da cooperação que parece ingenuamente defender que os litigantes tradicionalmente, adversários e que buscam resultados antagônicos, possam se ajudar mutuamente.

 

Mas a co-operação significa uma construção participativa para a obtenção do resultado final do processo. A atuação dos sujeitos do processo em contraditório que são legítimos interessados e, são perfeitamente compatíveis com a essência do Estado Democrático de Direito[5].

 

O art. 9º do CPC/2015 prevê apenas três exceções à exigência da prévia oitiva das partes, contra quem decide. A primeira exceção é referente à tutela provisória de urgência.

 

Neste caso, tem-se uma exceção legitimada pelo princípio constitucional[6] do acesso à justiça, já que a urgência na obtenção da medida exige que seja deferida inaudita altera parte, sob pena, de respeitada a não se ter a devida efetividade. De forma que por força do princípio da proporcionalidade, a exceção ao contraditório não significa a supressão deste, mas apenas sua postergação.

 

O contraditório em linguagem fazzalariana é verificado na equação dos poderes entre os interessados, de modo que o provimento final expedido pelo Estado-Juiz será válido somente como conjunto normativo processual se estiver regular com a garantia fundamental.

 

O elemento contraditório uma vez garantido em paridade[7] entre o autor e réu através da teoria de Fazzalari também é imprescindível no processo de controle difuso de constitucionalidade, posto que a equidade entre os sujeitos do processo reflete diretamente no acesso à justiça.

 

A concepção garantista de processo realizada por Élio Fazzalari[8] destaca o contraditório como elemento central do conceito de processo.

 

O processo em seu conteúdo apresenta-se como uma sequência de normas valoradas e geradoras de condutas em busca do provimento final. Assim o processo se qualificada como um tipo de procedimento em contraditório que é viabilizado por meio de equiparação de poderes entre os interessados processuais.

 

Fazzalari contribuiu para o fortalecimento do cidadão na lide em face do Estado e, a para qualificação do acesso à justiça que substancia não apenas pela maior paridade de armas conferidas ao cidadão, seja pelas características que o provimento final adotará no controle difuso de constitucionalidade, seja por seus efeitos erga omnes, de caráter vinculante e, ainda, a possibilidade de modulação prospectiva ou retroativa da decisão.

 

Uma imersão na teoria processualista de Fazzalari se deve à apreensão da metodologia de Merleau-Ponty, o qual defende a inexistência de objeto puro numa investigação científica, contudo, a reconstrução do elemento observado, sopesando a percepção e experiência do investigador (In: Merleau-Ponty, Maurice. Fenomenologia da percepção. Tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. 3ª.ed., São Paulo: Martins Fontes, 2006, p.70).

 

A teoria de Fazzalari é marco teórico da pesquisa bem como, o fato de que as concepções do objeto de estudo se devem às experiências do investigador, pois o resultado final da teoria sofre influência da trajetória percorrida no Estado.

 

O provimento final do controle difuso de constitucionalidade estando fundado num processo, ou seja, num procedimento em que os interessados detêm paridade de armas, respeitando efetivamente o contraditório[9], estabelece efeitos com potencial de repercutir em toda sociedade, de modo que a decisão final emitida pelo Estado-Juiz, tem o condão de gerar eficácia erga omnes, de caráter vinculante e, ainda ter seus efeitos modulados (sem para o passado ou para o futuro).

 

O provimento final do controle difuso de constitucionalidade estando fundado num processo, ou seja, num procedimento em que se efetivamente respeita o contraditório e, se impõe o potencial efeito de repercussão em toda sociedade.

 

A verdade é que balizada doutrina comenta que a existência conjunta do processo difuso de constitucionalidade ao lado do concentrado, no Brasil gerou alterações nos sistemas de controle originalmente instituídos em 1988.

 

A objetivação do processo é apurada através de inúmeras alterações interpretativas e circunstanciais identificadas no Sistema de Constitucionalidade Brasileiro.

 

Dentre essas alterações, destacam-se: a gradativa afirmação do STF como Corte Constitucional; a alteração de efeitos gerais às decisões em controle difuso de constitucionalidade, em sede de recurso extraordinário; transcendência dos motivos determinantes das decisões em controle difuso de constitucionalidade; causa de pedir aberta em recurso extraordinário; modulação dos efeitos da declaração de constitucionalidade; emergência da súmula vinculante e a exigência da repercussão geral como requisitos intrínseco de admissibilidade do recurso extraordinário.

 

A base jurídica de Fazzalari é imprescindível para a compreensão da teoria em integralidade, para então, fundamentar a qualificação do acesso à justiça pelo controle difuso de constitucionalidade.

 

A teoria fazzalariana requer esclarecimentos sobre o direito, a norma jurídica[10] e a jurisprudência. Com relação ao direito, observa-se tratar de realização de uma ordem de convivência. Regramento de condutas da vida social, assim se pode exprimir a experiência jurídica, em sentido objetivo, destacando a qualidade dinâmica do direito e, até mesmo, do ordenamento jurídico, considerando-se o resultado.

 

Fazzalari preocupa-se inicialmente em distinguir a qualificação das normas processuais. E, logo questiona a divisão correntemente empregada entre as normas de direito público e as normas de direito privado.

 

Destaca que tal distinção baseada na origem de emanação das normas, já não se mantém, considerando que todas as normas são públicas, posto que emanem do Estado, por meio de seus órgãos, em especial do Legislativo.

 

Também repudia a distinção fundada na regulamentação da disciplina de atuação de concidadãos em relação recíproca e dos Estados. A referida distinção se funda na origem das normas particulares ou privadas, fundada entre cidadãos e, teve seu nascimento no comércio.

 

O que justifica a prevalência da vontade das partes. Ao passo que as normas públicas representam aquelas onde o Estado está inserido e atuando seu ius imperiae.

 

Também se diferenciam as normas em virtude dos bens que tutelam e que são dispostos nas relações jurídicas. As normas de direito público se distinguiriam das do direito privado, posto que essas tratem de bens próprios dos interessados, dos quais podem dispor livremente. Já as normas de direito público, referem-se aos bens públicos, sendo proibido negociá-los com plena liberdade.

 

Afasta-se a primeira distinção por ser insubsistente. As normas processuais apresentam a predominância de características públicas. Há quatro tipos de processos, mas que se referem aos procedimentos: 1) processo onde há a atuação do Estado por meio de jurisdição (arquétipos processuais); 2) processo onde ocorre convergência de interesses entre o Estado e o provocador da ação, cabendo o Estado a tutela e guarda dos interesses que lhe são confiados (não se busca um provimento no qual se exija um contraditório); 3) os processos onde se destaca a atividade estatal, podendo ou não desenvolver-se na busca de um provimento final, quando o contraditório se faz imperioso; 4)processo por meio do qual o Estado determina as regras, trata-se da atuação do legislativo por meio de sua função típica, não visando provimento imediato, reafirmando-se a direção do Estado em suas diversas formas.
A guarda dos interesses particulares se realiza sempre pelas normas estatais. Portanto, mesmo as normas de direito privado estão inclusas no objeto de estudo de Élio Fazzalari e, que todos os processos resguardam também interesses dispostos pelo Estado, vigiados e tutelados pelo poder público.
Apresenta Fazzalari normas de direito privado dentro do processo arbitral por meio do qual se busca o provimento privado seria um mecanismo privado de justiça.
A soberania conferida ao Estado retira do homem uma parcela da liberdade que lhe é nata, no que concerne à imposição e exigência pessoal daquilo que considera direito subjetivo, transferindo-se para Estado a guarda e a tutela e o reconhecimento de seus direitos, a imposição de respeito aos mesmos, por meio do ius imperiae.

 

Não só quando o exercício de determinado direito subjetivo é contrariado, mas também, para o exercício de alguns outros, mesmo que não negados e nem ameaçados, o Estado deve intervir, pois assim estabeleceu em sua origem por meio da CF/1988. Sendo o que se costuma chamar de jurisdição voluntária.

 

Quando o Estado autoriza o cidadão o exercício de justiça executiva privada, através do juízo arbitral que dispõe de meios de exercício mínimos que devem ser observados para que os provimentos finais sejam válidos.
Pois que não se verifiquem os preceitos mínimos, o Estado intervém para afinal garantir os direitos por ele estipulados.

 

De sorte que se pode afirmar a inexistência da jurisdição verdadeiramente privada, pois mesmo os direitos privados disponíveis são regulados por preceitos mínimos, a fim de que o Estado intervenha para reestabelecer a “ordem” por ele imposta.

 

Fazzalari limita seu objeto aos processos contemplados e regulados pelo ordenamento estatal excluindo o juízo arbitral. Entendendo em discordância,  principalmente porque o juízo arbitral, vem a receber o tratamento estatal no Brasil.

Evidentemente o processo se revela também fora do ordenamento do Estado, referindo-se à configuração de processo enquanto procedimento em contraditório para o fim de um provimento final.

 

Sublinha Fazzalari a atuação de órgãos transnacionais derivados de diversas leges mercatoriae, repercutindo em decisões para além do Estado, definidos por fatores econômicos (extra ao ius imperiae estatal) conforme é o caso da Corte Internacional de Justiça.

 

O due process of law que reverbera na garantia do contraditório que representa o elemento principal caracterizador do processo em sua teoria. O caráter jurídico da norma deve-se à qualidade de ordem vinculante e exclusiva da conduta. A norma vinculante se não tiver tais características, não se configura como norma jurídica, apesar de ser norma social para qual não se tem a obrigatoriedade de cumprimento sob pena de coerção.
Elabora a diferenciação, Fazzalari alude in litteris: “a norma é o barro de nosso trabalho de ceramistas, excluído do estudo todas as normas não jurídicas, ou seja, aquelas que não imponham vinculação e que não sejam exclusivas do Estado”.

 

Afinal, a tese de Fazzalari recomenda que a norma jurídica deva ser inscrita na esfera de valor, de maneira a agregar os valores sociais, éticos, científicos, dentre outros, os valores estatais de imposição e exclusividade.

 

Os caracteres de vinculação e exclusividade são garantidores da jurisdicidade da norma, ao passo que estam se apresenta como condição de existência e reconhecimento da sociedade, sejam tais normas aprovadas ou não, diretamente, pelos que lhes são submetidos.

 

Enquanto condição de existência, a sociedade e ordenamento jurídico estabelecem entre si correspondência biunívoca: para determinada sociedade um correspondente ordenamento jurídico e, vice-versa.

 

Quanto à jurisprudência, tem-se que seja a atividade desenvolvida pelo jurista nas etapas de procedimento de fixação e aplicação das normas, desenvolvendo-se nos planos de escolha da norma relacionada ao contexto histórico, ao reconhecimento, identificação, interpretação e criação da norma.

 

A identificação da norma se dá por etapas: escolha e elucidação do conteúdo singular da norma; extração do conteúdo das formas; e, teste do conteúdo. No que tange aos conteúdos, destaca-se dependendo do ordenamento que integre a norma, a diversidade de interpretações e, a mutação destas, com validade quanto ao conteúdo.

 

Ressalte-se a influência exercida pelo o aspecto histórico na extração do conteúdo, visto que a interpretação humana, independente do contexto, é sempre histórica e relativa.

 

Nesse sentido, a teoria fazzalariana muito se aproxima da filosofia de Sartre ao defender a impossibilidade de se excluir o homem de seu contexto histórico. Portanto, o principal passo para a interpretação é a situação do objeto em relação ao conjunto social de sua localização, no interior do processo histórico.

 

Assim, a relatividade do conteúdo da norma fixado pelo contexto histórico traz a necessidade de o jurista teorizar e sistematizar as normas visando uma melhor compreensão destas.

 

De modo que, a externação[11] da interpretação se limita, em certa medida, pelo conteúdo objetivo da norma, conquanto, carregue consigo a valoração histórica do intérprete. Após o ato de interpretar, mas não fora da interpretação, tem-se a aplicação da norma ao caso concreto, ou seja, a valoração jurídica do ato.

 

Nesse contexto, ainda que se trate de interpretação anterior ou posterior ao ato, o jurista revela-se enquanto autor qualificado e privilegiado do direito. Antes de considerar o fato no direito, o jurista realiza o juízo de fato, ou seja, a reconstrução do fato, gerando o ato projetado ou completo.

 

Confirmando-se a norma que tem natureza valorativa, sua estrutura lógico-formal ocorre pela descrição e ligação ao ato enquanto lícito e obrigatório. Pois ao lado da qualificação de licitude e de obrigação, não se deve contemplar a característica do ilícito, com efeito, não é correto pensar que, pela norma, matar um homem seja ilícito, pois o correto é considerar que não matar seja um dever.

 

Ilícita é a qualidade que pode ligar-se não à conduta abstrata contemplada na norma, mas àquela concretamente mantida por um sujeito e, de forma diferente do modelo de conduta devida: assim como a conduta daquele determinado devedor que, em concreto, não paga a dívida.

 

Se a conduta revela uma vontade, portanto expressa o padrão de valoração A escolha feita por integrantes da sociedade em face da regra geral e abstrata do Estado, refletindo um ato vinculado.

 

A conduta ilícita apresenta-se como comportamento contrário ao disposto na norma, ou seja, esta não se encontra dentro da norma abstrata. Tal entendimento contraria a posição adotada por Kelsen ao focalizar o estudo da juridicidade no ilícito. De modo que o ilícito é a inobservação do dever, inclusive na seara criminal.

 

A norma é, em consequência, um ato valorado do qual se extrai os conceitos de faculdade e dever, de modo que valorada, a norma apresenta traços objetivos mínimos, relativamente estáveis sobre os quais se exerce a interpretação. Extrai-se da norma a descrição de uma conduta que se relaciona com a valoração normativa, posição subjetiva de primeiro grau[12].

 

Verificada a situação da norma, é importante destacar qual a situação do sujeito em relação a esta, ou seja, qual seria posição jurídica subjetiva indicada pela faculdade, uma vez que a conduta se relaciona com a norma por meio da valoração.

 

A conduta é valorada como lícita quando retrata uma faculdade, como dever, quando impõe uma obrigação, cabendo ainda, a valoração enquanto poder, todas representando posições subjetivas primárias[13].

 

Tem-se então, que a partir da norma se posiciona o sujeito. Nesse contexto, revela-se o conceito de direito subjetivo é aquele extraído da posição do sujeito em relação ao comportamento exposto na norma e, dessa posição subjetiva tem-se um dever para os demais sujeitos.

 

Por meio do vínculo entre o objeto do comportamento contido na norma e o sujeito que apresenta uma posição de proeminência através da própria valoração, alcança-se o direito subjetivo que retrata uma posição fundamental de segundo grau. Pelo exposto, tem-se que a norma pode apresentar-se como cânone de valoração, ato jurídico ou posição jurídica subjetiva.

 

O ordenamento jurídico é frequentemente visto pelo ponto de vista das normas, já o contrato, do ponto de vista dos atos e, a ação judicial, por sua vez, do ponto de vista de posições jurídicas. Mas, em verdade, qualquer norma pode ser contemplada por todas as três angulações.

 

A concepção de processo de Fazzalari não sofre influências das teorias processualistas de Liebman e de Chiovenda[14]. O procedimento se apresenta como uma sequência de normas, atos e posições subjetivas, por meio da qual a norma anterior, valorada como lícita ou devida, juntamente com a conduta, desencadeia outras normas e condutas, de modo que aquela representa o pressuposto desta: culminando em seu ato final, o ato conclusivo.

 

Fazzalari enxerga o procedimento como sequência de normas valoradas, geradoras de condutas em busca do ato final. E, não vem a estabelecer a situação das partes em face da norma. Ao revés, em qualquer situação, tem-se procedimento.

 

Em outras palavras, o procedimento como uma sequência de normas constituída dentro da qual uma norma valora uma ou mais condutas, enquanto lícitas ou devidas e, a norma sucessiva utiliza-se da conduta anterior como pressuposto para sua própria validação, ou qualificação, de faculdade ou de obrigação de outro comportamento.

 

A diferença situa-se no momento em que se faz necessária a garantia de um procedimento em que as partes possuam a paridade simétrica de garantias, ou seja, nos quais deve haver a garantia caracterizada pelo contraditório[15]. Assim, finalmente, tem-se a definição do processo.

 

O processo se revela como procedimento em contraditório, sendo o procedimento gênero dentro do qual o processo se inclui e, é espécie. O critério teleológico que distingue processo e procedimento não se destaca na teoria fazzalariana que tem por foco o contraditório.

 

É através dessa exigência garantista que se terá a qualificação de um processo, enquanto tipo de procedimento. Fazzalari emprega o critério lógico para distinguir o processo do procedimento, subtraindo o elemento teleológico de ambos, ainda que não possa ser eliminado de fato, pois o procedimento almeja um fim específico.

 

Ressalte-se a posição de inclusão do processo do procedimento, após passa-se à caraterização da distinção entre estes.

 

Sublinhando-se que se diferem pela caracterização do processo enquanto procedimento em contraditório, o que pressupõe a oposição de interesses entre as partes, bem como o objetivo final de uma prestação jurisdicional imperativa, ou seja, norma reguladora do ato final.

 

A intenção da teoria de Fazzalari é, após o isolamento do processo sob o ponto de vista formal da teoria geral, analisar os processos positivos a fim de identificar uma forma, por meio de identificação e separação em face do conteúdo, isto é, a identificação de um modelo constante de processo.

 

Analisando os processos jurisdicionais[16] nos quais se verifica a jurisdição penal, constitucional, civil e administrativa[17] inclusive. Em segundo momento, e considerando a possibilidade da jurisdição civil ser substituída pela composição privada, analisar-se-á os processos arbitrais. O terceiro momento investigativo se volta aos processos de liquidação concorrencial, nos quais é possível identificar parcelas de jurisdição voluntária. Em quarto e derradeiro momento, estudar-se-á os processos, destacadamente, os processos referentes à atuação da Administração Pública, o processo legislativo.

 

O direito processual geral e o processo civil representam os arquétipos de processo, visto que são os modelos mais completos, referindo-se ao direito processual civil de modo a refletir o conjunto de conceitos relativos à jurisdição civil.

 

O processo revela-se pela sequência de normas que materializa o mundo empírico por uma conduta, que pode ser qualificada como direito ou obrigação, até a norma reguladora de um ato final. Já o procedimento é uma sequência de atos previstos e valorados pelas normas.

 

Frise-se que a norma pode não estar totalmente estabelecida num dispositivo ou numa lei, representando apenas uma fração da norma, necessitando de outra para se completar e disciplina integralmente uma conduta.

 

Assim, conclui-se que o procedimento corresponde a uma série de faculdades, poderes e deveres, quantas e quais sejam as posições subjetivas possíveis de serem extraídas das normas em discurso e, que resultam também estas necessariamente ligadas.

 

Desta forma, considerando-se a norma, o ato e a posição jurídica, ter-se-á o procedimento sob o ponto de vista de atos, visto que, numa série, um ato segue ao outro, consoante a determinação da lei. Essa sequência válida ou não dos atos em virtude da observância de sua ordem.

 

O provimento final de um procedimento é o que identifica e denomina, o que pressupõe a apreensão das normas que o constitui, cada norma em especial, para então, alcançar-se a regra do procedimento.
 

A validade e a eficácia de cada ato do procedimento prescindem da análise da regularidade do ato anterior, que pode vir a maculá-lo, bem como aos demais atos posteriores.

 

O procedimento de um provimento final pode apresentar-se por sequência de fases, a exemplo da fase preparatória, da constitutiva e da integrativa da eficácia, quando se identifiquem mais de um provimento, cada um destes estabelece o epílogo da fase seguinte.

 

A estrutura dialética[18] do procedimento, isto é, o contraditório, é que qualifica o procedimento enquanto processo. Dentro do processo, os destinatários do ato final dialogam em simétrica[19] paridade de posições e, exercem conjunto de escolhas, reações e controles, bem como devem sofrer controle e reações dos demais interessados, estando sempre o autor do ato responsável pelos resultados; compondo-se a dialética entre interessados e contra-interessados, identificando-se autores de atos e destinatários das consequências destes, sempre em exercício de contraditório.

 

Sublinhe-se que não é o tipo de interesse ou conflito que qualifica o processo, conquanto, é a estrutura fundada no contraditório por meio da dialeticidade de modo que, se a norma não o contempla em sua estrutura procedimental, não há que se cogitar em processo.

 

As normas que definem o processo devem resguardar aos destinatários dos efeitos do provimento final, os contraditores, um contraditório equilibrado e igualitário. A qualificação como possíveis destinatários do provimento final é que legitima a atuação dos contraditores.
O autor da sentença, ou seja, do provimento final não é um contraditor, o julgador se situa distante dos interesses das partes, a paridade de contraditório é garantida entre o interessado e o contra-interessado e, o processo se qualifica pela garantia de que os contraditores exerçam seus poderes em paridade simétrica.

 

O processo como espécie do gênero procedimento se denomina ou identifica em face do ato final que lhe põe fim, apesar de que esse ato, deva representar o epílogo de um processo regular que tenha garantido a paridade simétrica entre o autor e contraditor.

 

De modo que, se um ato da sequência processual é irregular, maculando a exigência do contraditório, todos os demais serão alcançados e maculados, por fim, o provimento final, de modo a repercutir na validade de todo o processo.

 

De nada adiantaria garantir o direito de postulação ao Estado-juiz, sem o devido processo em direito, ou seja, sem processo devido e munido de garantias processuais, tais como o contraditório, a ampla defesa[20], a produção de provas, obtida por meios lícitos, ciência dos atos processuais, julgamento em tempo razoável, fundamentação das decisões judiciais e julgamento justo, dotado de eficácia e legitimidade.

 

É importante perceber que a teoria fazzalariana identifica o processo não mais como uma relação jurídica[21] angularizada, conquanto como procedimento em que as partes interessadas gozam de paridade de poderes, ou seja, do contraditório, possibilitando a visualização mais clara do processo de qualificação do acesso à justiça por intermédio da objetivação do controle difuso de constitucionalidade.

 

Tal paridade de poderes é viabilizada ainda que não integralmente, na técnica de mutação constitucional de controle difuso.

 

De forma que, as características antes restritas ao controle concentrado, mormente estão atribuídas ao difuso, possibilitando ao litigante comum a postulação e defesa[22] de seus interesses em maior paridade possível de poderes, visto que as armas que agora lhe são conferidas no controle difuso o fortalece em face do Estado.

 

Trata-se de um processo que não só observa as partes com interesses contrapostos, mas e, sobretudo, a garantia do contraditório, a equiparação de poderes entre interessado e contra-interessado, com vistas a um provimento final que será válido caso o conjunto de normas, os atos e resultados estiverem de acordo com a regra maior do processo, em termos de Fazzalari, o contraditório.

 

É possível identificar as mutações e alterações nas normas de controle subjetivo, destacando-se a definição gradativa do STF como Corte constitucional; a atribuição de efeitos gerais às decisões em controle difuso de constitucionalidade, em sede de recurso extraordinário; a transcendência dos motivos determinantes das decisões em controle difuso de constitucionalidade; a causa de pedir aberta em recurso extraordinário; a modulação dos efeitos da declaração de constitucionalidade nas decisões em controle difuso de constitucionalidade; a emergência da súmula vinculante; a exigência da repercussão geral como requisito intrínseco de admissibilidade do recurso extraordinário.

 

A garantia do contraditório serve para caracterizar o processo, sendo aplicável perfeitamente à investigação na qual se busca demonstrar a qualificação do acesso à justiça por meio da objetivação do controle difuso de constitucionalidade. Evidentemente não se cogita da aplicação do contraditório no inquérito, posto que seja um procedimento investigativo prévio ao processo propriamente dito.
A visão garantista do processo, exigindo-se paridade de condições processuais entre os interessados e contra-interessados, fortalece o cidadão na lide em face do Estado.  Ademais, a qualificação do acesso ocorre não só por meio da paridade de armas conferidas ao cidadão, contudo, pelas características que o provimento final do processo de controle difuso apresenta, quais sejam: efeito erga omnes, o caráter vinculante e a possibilidade de modulação prospectiva ou retroativa dos efeitos da decisão.

 

Assim o contraditório alicerça e qualifica o acesso à justiça[23] por meio da objetivação do processo difuso de constitucionalidade. Efetivando a cidadania e a legitimidade das decisões judiciais.

 

 

Referências:

DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Meios de Impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais. 5ª. Ed., revista e ampliada e atualizada. Salvador: Jus Podivm, 2008.

LIEBMAN, Enrico Tulio. Manual de direito processual civil. Vol.1 Rio de Janeiro: Forense, 1985.

MERLEAU-PONTY, Maurice. Fenomenologia da percepção. Tradução de Carlos Alberto Ribeiro de Moura. 3ª ed., São Paulo: Martins Fontes, 2006.

FAZZALARI, Élio. Istituzioni di diritto processuale. Padova: Cedam, 1992.

ANDOLINA, Italo; VIGNERA, Giuseppe. I fondamenti constituzionali della giustiziacivile: il modello constituzionale Del processo civile italiano. 2. ed. Torino: G. Giappichelli Editore, 1997.

 

CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo CPC e o princípio do contraditório. Disponível em: http://justificando.com/2015/04/17/o-novo-cpc-e-o-principio-do-contraditorio/ Acesso em 20.09.2015.

 

NASSIF, Elaine Noronha. Conciliação Judicial e Devido Processo Legal. Disponível em: https://aplicacao.mpmg.mp.br/xmlui/bitstream/handle/123456789/141/concilia%C3%A7ao%20judicial_Nassif.pdf?sequence=1

Acesso em 20.09.2015.

 

 

[1]  Para se identificar, portanto, o processo é fundamental a participação dos destinatários da decisão em contraditório paritário.  Isso não significa a mera participação dos sujeitos do processo, não é o dizer e o contra dizer, não se resume em discussão. O “contraditório é a igualdade de oportunidade no processo, é a igual oportunidade de igual tratamento, que se funda na liberdade de todos perante a lei”.

[2] A figura do juiz natural decorre do devido processo legal, assim como o contraditório e a ampla defesa.

A instituição do devido processo legal aos moldes atuais, remonta à publicação da Magna Charta Libertatum, imposta ao Reio João Sem Terra, na Inglaterra em 1215.

Firmou também o princípio do juiz natural o Bill of Rights, nos idos de 1688, quando vedou a criação de comissões destinadas a substituir a pessoa do juiz. A república francesa ainda sobre o calor da revolução estabeleceu com a organização judiciária de 1790 e seguida pela Constituição de 1791, que os cidadãos não poderiam ser subtraídos dos juízes que a lei lhes indicasse por nenhuma comissão nem por outras atribuições que as determinadas pelas leis.

[3] Brota a noção de contraditório em simétrica paridade, que vincula compulsoriamente o autor, o réu, o interveniente, o juiz, o representante do Ministério Público (quando necessário) e seus auxiliares a atuarem em “pé de igualdade”. Novamente visualiza-se um contraponto, a noção instrumental do processo, pois garante a dialética participação não só de autor e réu, tradicionais destinatários do ato, mas também, das demais pessoas envolvidas na atividade jurisdicional. Sob este enfoque, todos são partes, como bem observa Pellegrini.

[4] Sobre os processos arbitrais, Elaine Nassif oferece melhores esclarecimentos, na tradução realizada da obra “Instituições de Direito Processual” de Elio Fazzalari, assim abordado. As ‘arbitragens’ são sequências de atividades por meio das quais se realiza uma espécie de justiça civil privada, isto é, a resolução de controvérsias por obra de um privado em vez de por um juiz. Por isso o seu exame é igual ao dos processos jurisdicionais. […] As arbitragens são processo, porque deles participam os destinatários dos efeitos do laudo (a pronúncia com que cada uma de tais sequências termina), em pé de simétrica paridade: à qual corresponde a imparcialidade do árbitro.

[5] Com urgência, na perspectiva do Estado Democrático de Direito, é preciso recuperar o devido processo legal e, especialmente o princípio do contraditório. Assim, as partes poderão, através deste princípio, trazer ao processo [administrativo disciplinar] todas as suas alegações de modo democrático eis que, a democracia não é somente o “governo do povo”, mas essencialmente a [garantia da] participação popular nas deliberações do Estado.

[6] Dierle José Coelho Nunes, em sintonia de sentido, entende que a “metodologia normativa do processo constitucional” é que permite ao cidadão assumir a “função de autor-destinatário” dos provimentos cujos efeitos sofrerá. Na mesma linha de reflexão democrática está André Del Negri, para quem devido processo constitucional é instituição regente de qualquer tipo de procedimento, e representa, no processo legislativo, um direito-garantia do cidadão a uma produção democrática do direito, “em consonância com o eixo-teórico-discursivo atual (Direito democrático)”,

 

[7]paridade de armas proposta por Ihering evoluiu, na teoria de Fazzalari, para o contraditório, garantidor de participação em simétrica paridade no processo, dos sujeitos a quem se destinam os efeitos da sentença. São sujeitos processuais todos os atores envolvidos no processo, cabendo à figura do juiz o papel de um terceirodesinteressado, a quem compete a titularidade dos provimentos a serem emanados, e a responsabilidade de assegurar o contraditório como princípio jurídico, além das atribuições previstas em lei. Não se limitará o juiz a uma postura estática, porque assim não espera a sociedade, preconiza José Calos Barbosa Moreira, colacionado na obra de Aroldo Plínio Gonçalves. O juiz não é um contraditor, porque não tem interesse a ser disputado com as partes. “O contraditório se passa entre as partes porque importa no jogo de seus interesses em direções contrárias, em divergência de pretensões sobre o futuro provimento que o iter procedimental prepara”.

[8] Simplicidade e genialidade foram os dois adjetivos atribuídos pela doutrinadora Ada Pellegrini Grinover para a obra de Elio Fazzalari, que lecionou na Universidade de Perugia até 1964, na de Pisa até 1972, e na Universidade de Roma La Sapienza, quando desta se deligou em outubro de 200, sendo agraciado com o título de Professor Emérito.

[9] O contraditório, então, não será apenas o dizer e contradizer no processo, mas sim oportunidade igual às partes de atuação no processo, por meio de igual oportunidade de tratamento, como forma de garantia da liberdade de todos perante a lei. Essa é a essência do contraditório “enquanto garantia de simétrica paridade de participação no processo”, na teoria do processo como procedimento em contraditório, organizada por Elio Fazzalari.

[10] Contudo, as lições de Fazzalari não se encerram na noção de processo como procedimento em contraditório. Traz a baila o conceito de norma como um cânone de valoração de uma conduta, entendida como alguma coisa de aprovável, de preferível em determinada cultura. Assim, a exposição deste panorama permite afastar a nefasta proposta de Kelsen que concentrou o estudo da juridicidade no ilícito, para quem o processo traduz um ilícito. Para Fazzalari, portanto, o processo deve ser compreendido e praticado como uma garantia, logo, quando se inicia um processo não se exercita um ilícito, ao reverso, se pratica um direito constitucionalmente assegurado.

 

[11] Acrescente-se, que, na proposta de Fazzalari, a exteriorização do princípio do contraditório se opera em dois momentos, conforme atesta Alexandre Morais da Rosa. Inicialmente, com a informazione, se estabelece o dever de informação a fim de que possam ser exercidas as posições jurídicas em face das normas processuais e, em seguida, num segundo momento, a reazione, revelada pela possibilidade de movimento processual, sem se constituir, todavia, em obrigação

[12] Pela teoria discursiva é proposto um novo conceito de democracia que supera as concepções esgotadas e insuficientes do modo liberal-republicano. É a democracia deliberativa procedimental, proveniente de uma sociedade multicultural e racionalista que nega o individualismo exacerbado e a metafísica dos costumes. Júlio Cesar Marcellino Junior atesta que Habermas, por sua vez, entende que “um paradigma jurídico é deduzido, em primeira linha, das decisões exemplares da justiça, sendo geralmente confundido com a imagem implícita que os juízes formam da sociedade”.

[13] São consideradas posições subjetivas primárias: a faculdade, o poder e o dever. O direito subjetivo é uma posição de vantagem que um sujeito possuem em face de um bem descrito na norma jurídica. O conceito de direito subjetivo extraído a partir da posição de vantagem que um sujeito possui em face da norma.

[14] O estudo de Chiovenda sobre o processo começa com a demonstração de alguns conceitos imprescindíveis, como o de direito subjetivo. Para o italiano, o direito objetivo é a lei, em sentido lato, ou seja, a manifestação da vontade coletiva geral.

Fundando-se, com efeito, na vontade da lei, o sujeito jurídico pode aspirar à consecução ou à conservação daqueles bens, inclusive por meio de coação. Constitui tal aspiração o denominado – direito subjetivo, que se pode, portanto, assim definir, a expectativa de um bem da vida garantida pela vontade da lei. Assim a ideia do direito subjetivo, verificamos que se resolve numa vontade concreta da lei.

A superação da teoria do processo como relação jurídica, fundada em um vínculo de sujeição entre as partes, de supra-ordenação, demanda uma reflexão a respeito dos demais institutos estruturantes da teoria do processo.

[15] Nessa linha, Lênio Luiz Streck observa em Habermas a propositura de um modelo de democracia constitucional que não se fundamenta nem em valores compartilhados, como a ideia da jurisprudência de valores, nem em conteúdos substantivos, “mas em procedimentos que asseguram a formação democrática da opinião e da vontade”

[16] O mapeamento conceitual desenvolvido por Élio Fazzalari revela a incompatibilidade de sua teoria com a noção difundida por Dinamarco — e remanescentes da Escola Processualista de São Paulo —, de processo como instrumento da jurisdição, sobretudo, em razão da abertura democrática proporcionada pela atuação e influência das partes afetadas e interessadas, na elaboração do provimento final, antes somente a cargo do entendimento íntimo do julgador, desvinculado da construção processual erigida pelas partes.

[17] No Brasil, a incidência do princípio do contraditório no processo, inclusive, administrativo disciplinar, É garantido pela Constituição de 1988, está previsto como Direito Fundamental no art. 5º, LV. Assim, enquanto Direito Fundamental, segundo Ferrajoli configura-se o princípio do contraditório como vínculo substancial imposto à democracia política: vínculo positivo que nenhuma maioria pode deixar de satisfazer; e, vínculo negativo que impede a violação por qualquer maioria.

[18] Nestes termos, o princípio do contraditório não deve ser oportunizado em um único momento singular; ou melhor, o princípio do contraditório não é garantia que se esgote no cumprimento de um único ato. Ele requer toda uma série de manifestações e uma série de normas disciplinadoras, em conexão entre si, de forma a reger a sequência de seu desenvolvimento. Sem maiores rodeios, o princípio do contraditório importa a condução dialética do processo, haja vista, que compreende o acesso a qualquer informação necessária à defesa, bem como a condição de reação [facultativa] das partes.

[19] A doutrina italiana defende que a defesa substancial compreende a equação: defesa = contraditório, contraditório = participação, participação = audiência preventiva sobre elemento relevante para decisão. (Cf. ANDOLINA, VIGNERA, 1990, p 173). Propondo uma nova compreensão e justificação dos referidos princípios no modelo constitucional italiano, ressaltam os autores Andolina e Vignera, que o art. 3º da Constituição Italiana por si só é suficiente para fundamentar o contraditório como um princípio constitucional.

[20] O princípio da ampla defesa na teoria neo-institucionalista do processo é que vai permitir defesas não só em face de defeitos procedimentais ou contra o mérito, mas numa concepção expansiva da negação ou afirmação de constitucionalidade dos atos e conteúdos jurídicos das pretensões e de sua procedimentalidade formal. Ampla defesa é nessa concepção o direito processualmente garantido a um espaço procedimental cognitivo à construção de fundamentos obtidos dos argumentos jurídicos advindos das liberdades isonômicas exercidas em contraditório na preparação das decisões.

[21] O estudo da estrutura do procedimento que é uma das formas possíveis, posto que seja uma sequência de normas, atos e posições subjetivas.

A primeira norma e a conduta dela decorrente ligam-se à segunda como um pressuposto ou como sua fattispecie. Büllow e seus sucessores realizaram a separação entre os conceitos de processo e procedimento, assim se absorvia o processo no procedimento, como simples sequência de atos, e construir uma distinção baseada no critério teleológico. Assim, se distingue o processo por seu fim, sendo o instrumento pelo qual a jurisdição é operada, sendo mera sucessão lógica de atos, desvestido de qualquer finalidade. Atuou Fazzalari no sentido de excluir o critério teleológico, buscou em um critério lógico de inclusão, definir o que seja processo e que seja procedimento,

[22] Assim, tomando estes dois conceitos como base – direito de ação e contraditório –, a ampla defesa será compreendida como garantia das partes de amplamente argumentarem, ou seja, as partes além de participarem da construção da decisão (contraditório), têm direito de formularem todos os argumentos possíveis para a formação da decisão, sejam estes de qualquer matiz. Isto, pois a recorrente afirmação da distinção entre argumentos de fato e de direito, aqui estão compreendidos como indissociáveis.  Assim, a ampla argumentação garante como consequência lógica a possibilidade de ampla produção de prova para a reconstrução do fato e circunstâncias relevantes para o processo.

[23] A superação da teoria do processo como relação jurídica, fundada em um vínculo de sujeição entre as partes, de supra-ordenação, demanda uma reflexão a respeito dos demais institutos estruturantes da teoria do processo.

Já a adoção da teoria do processo como procedimento em contraditório se funda na adoção do paradigma do Estado Democrático de Direito, mas ela deve ser compreendida a partir deste marco definidor e da compreensão do modelo constitucional do processo.

O Neoprocessualismo do CPC de 2015

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Desde 2004, mais precisamente, com E.C. 45 iniciou-se decididamente a busca por uma justiça mais acessível, célere e efetiva. E, nesse sentido, militara toda uma série de reformas legislativas incidentes no sistema processual brasileiro.

 

Além da indispensável harmonia entre as funções do Estado, a acepção jurídica que corresponde a uma cláusula pétrea, contudo, de maneira mais profunda passou a significar uma estreita colaboração entre Legislativo, Judiciário e o Executivo.

 

Por essa razão, ao final de setembro de 2009 começou-se no Senado através de uma comissão de juristas com a incumbência de elaborar o anteprojeto de novo CPC presidida por um notável processualista, o Ministro Luiz Fux (na época componente do STJ), e atualmente, no STF.

 

O denominado Projeto de Lei 166/10 surgiu porque de fato o CPC/73 após tantas reformas e alterações legislativas havia perdido a sistematicidade.

 

Já pela exposição de motivos é possível se perceber que a grande meta é obter a maior celeridade processual, aplacando-se o desprestígio do Judiciário brasileiro, e detectando as barreiras para haver a prestação jurisdicional mais célere e segura, bem como legitimando democraticamente as soluções que fogem do extremo formalismo e promove um enxugamento do sistema recursal e uma sintetização dos procedimentos.

 

 

Buscou-se a reestrutura do CPC à luz dos paradigmas doutrinários e jurisprudenciais, corrigindo-se e eliminando-se institutos considerados inadequados, além de acrescentar outros institutos novos. Entre os institutos eliminados, pode-se citar, a ação declaratória incidental e os embargos infringentes.

 

Registre-se que houve protestos tanto por parte dos membros da Comissão como de comunidades jurídicas que afirmaram que as audiências públicas foram realizadas antes da conclusão total dos trabalhos, e sem a divulgação prévia de um texto-base para orientar melhor as sugestões e os debates.

 

“A sábia professora e doutrinadora Ada Pellegrini Grinover alertou que: …” a simples edição de um novo CPC não bastará para dar maior celeridade aos processos, porque se trata de um problema de mentalidade. “Segunda ela, seriam necessários estudos para identificar os problemas que atrasam o andamento do processo nos cartórios, o que até hoje não foi feito”. (vide em http://portaldoholanda.com/noticia44231-ministros-do-stf-e-advogados-discutem-a-necessidade-de-um- novo-CPC).

 

Restou evidenciado que o labor da Comissão do novo CPC procurou alinhar o diploma legal ao Estado Constitucional e ao modelo constitucional de processual civil conforme já se extrai de seus dispositivos iniciais (arts. 1º ao 11), o que por si, só é louvável.

 

A sintonia fina da dita lei ordinária, a Lei 13.105/2015, com a Constituição Federal vigente, inclusive abarcou os princípios constitucionais processuais.

 

Assim, muitas regras foram elaboradas, para dar concreção aos princípios constitucionais, como as que, por exemplo, preveem um procedimento em contraditório e a produção de provas prévia à decisão que desconsidera a pessoa jurídica, tanto em sua versão tradicional e também inversamente.

 

Desta forma, o juiz mesmo diante da matéria de ordem pública não dispensará a obediência ao contraditório bem como se criou um incidente de julgamento conjunto de demandas repetitivas, com inspiração germânica e, com intento de se atingir maior segurança jurídica e, ainda, evitar a dispersão da jurisprudência, rendendo-se definitivamente aos laivos maviosos da common law, onde a jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores devem nortear as decisões de todos os demais Tribunais e Juízos singulares brasileiros, de maneira a concretizar plenamente o princípio da legalidade e da isonomia.

 

Diante de tal postura da Comissão, percebemos a necessidade de se abordar alguns comentários sobre as influências sofridas pelo nosso ordenamento jurídico. As linhas metodológicas do processo civil brasileiro seguem pelo neoconstitucionalismo, neoprocessualismo, o formalismo valorativo ou ético e que muito influenciaram os membros dessa Comissão.

 

Para entender melhor o atual estágio metodológico do processo civil brasileiro, se faz necessário que abordemos, ainda que brevemente, as fases metodológicas pelas quais passou…

 

A rigor, foram quatro fases. A primeira fase chamada de praxismo ou fase sincretista, quando ocorria uma confusão entre o direito material e o processual, o processo era estudado somente em seu viés prático e sem preocupações científicas.

 

 

 

A ação se revelava em ser o direito material em movimento, ou seja, uma vez lesado ou ameaçado o direito material, este adquiria forças para então se obter em juízo a reparação da lesão sofrida.

 

Nessa fase, ainda não se visualizava a autonomia da relação jurídica processual em confronto com a relação jurídica material. O direito processual não era um ramo autônomo do direito e, então, não havia estudos para uma pretensa autonomia científica.

 

No século XIX, com estudo feito pelos alemães da natureza jurídica da ação, bem como a natureza jurídica do processo, essa fase chegou ao fim, pois os conhecimentos eram empíricos, sem nenhuma consciência de princípios ou de embasamento científico.

 

A segunda fase do processualismo é a da autonomia, ou autonomismo. Quando o processo passou a ser estudado de forma autônoma, ganhando destaque a afirmação científica do processo. E a diferença existente entre processo e procedimento. Durante praticamente um século, tiveram em evolução as grandes teorias processuais, especialmente sobre a natureza jurídica da ação e do processo, as condições da ação e dos pressupostos processuais.

 

A afirmação da autonomia científica do direito processual fora uma grande preocupação desse período, em que as grandes estruturas do sistema foram traçadas e os conceitos largamente difundidos e amadurecidos.

 

Tratou-se de uma fase muito introspectiva, sendo o processo pelo processo, por essa razão, fora distanciada da realidade, acarretando um radical culto das formas processuais, no afã sempre de enfatizar a sua autonomia científica.

 

A terceira fase é a do instrumentalismo. Quando o processo apesar de autônomo era principalmente reconhecido como instrumento de realização do direito material, estando a serviço da paz social.

 

A instrumentalidade surgiu para negar o caráter puramente técnico do processo, e reafirmando não ser o processo um fim em si mesmo, mas um meio para se atingir o acesso à justiça.

 

Essa fase fora muito criticada, pois a ciência processual galgou expressivo grau de desenvolvimento, porém, o sistema se revela falho na sua missão de produzir justiça. E, então, passamos analisar o processo, a partir de seus resultados práticos, levando em conta o consumidor do serviço judiciário.

 

Há doutrinadores que apontam que tal fase ainda não se esgotou completamente, em seu potencial reformista, posto que o relevante papel do sistema processual e sua complexa missão perante a sociedade e o Estado, ainda não foram totalmente cumpridos.

 

Eis que ocorrera a criação dos Juizados Especiais Cíveis, a ação civil pública, o mandado de segurança individual e coletivo, a Defensoria Pública e, ainda o CDC, etc.

 

Apesar de todas as diferenças cruciais existentes entre o direito processual e o direito material, se estabeleceu entre estes, uma relação circular de interdependência: o direito processual concretiza e efetiva o direito material, que confere ao primeiro o seu sentido.

 

É a chamada teoria circular dos planos processual e material, vislumbrada por Carnelutti, onde o processo serve ao direito material, ao mesmo tempo em que é servido por ele.

 

A fase do neoprocessualismo ou formalismo valorativo ou ético surgiu sob a influência do neoconstitucionalismo, e interage com o instrumentalismo, sendo igualmente denominado por uma parte da doutrina de formalismo-valorativo ou formalismo ético.

 

Tradicionalmente o ordenamento jurídico brasileiro é positivista, onde o papel do juiz é tão somente de descobrir e revelar a solução contida na norma. Assim, o julgador elabora um juízo de fato para o conhecimento da realidade, porém, não faz juízo de valor, o que envolve uma tomada de posição diante da realidade.

 

No positivismo jurídico a análise do juiz conduz ao entendimento sobre a imposição das leis, como sendo verdade única e sua configuração representa a expressão máxima do direito e da justiça. Com a crença lastreada na obediência à lei, muitas barbáries foram cometidas, particularmente pelo nazismo e fascismo.

 

Por essa razão, é tão salutar a ideia de que o direito processual civil venha consagrar a teoria dos direitos fundamentais, bem como a força normativa da Constituição Federal. Tal fenômeno é designado por renomados autores de neoconstitucionalismo ou pós-positivismo. Assim, o neoprocessualismo se consagra em ser a acepção neoconstitucionalista no direito processual.

 

Tendo como premissa maior o neoconstitucionalismo, tais métodos e resultados, principalmente auxiliados pelos métodos de integração que não mais podem ser avaliados independentemente do texto constitucional vigente.

 

O que hoje parece tão banal, outrora fora revolucionário numa época em que a nossa cultura jurídica hegemônica não tratava a Constituição Federal como norma, mas como pouco mais do que um repositório de promessas eloquentes, cuja efetivação dependeria quase sempre da boa vontade do legislador e dos governantes do momento.

 

Para o constitucionalismo dar efetividade é promover a incidência da Constituição Federal vigente sobre a realidade social, transformando-a como guia principal para a compreensão, interpretação e aplicação do direito pátrio.

 

Destacando-se que nossa Constituição que fora chamada de Cidadã por conter proclamações generosas de direitos com o fito autêntico de promover a justiça, a igualdade e a liberdade.

 

Nesse modelo constitucional de processo, o magistrado deve estar preparado para constatar que a solução não está integralmente na norma, o que demanda um papel criativo na formulação da solução para o problema, tornando-se, assim, coparticipante da produção do direito, mediante a integração com suas próprias valorações e escolhas, das cláusulas abertas constantes do sistema jurídico.

 

Renomada lição da doutrina nos informa que o processo na sua condição de autêntica de ferramenta de natureza pública indispensável para a realização da justiça e da pacificação social, não pode ser compreendido apenas como mera técnica, mas, sim, como instrumento de realização de valores e, especialmente de valores constitucionais, impõe-se, portanto, considerá-lo como direito constitucional aplicado.

 

Há de se observar que a relação entre a Constituição Federal e o processo ocorre tanto de forma direta como indireta.

 

Diretamente ocorre quando a lei fundamental estabelece quais são os direitos e garantias processuais fundamentais, quanto à estrutura das instituições essenciais à realização da justiça, ou, ainda, ao estabelecer mecanismos formais de controle constitucional.

 

Será, contudo, indireta quando tutelando diversamente determinado bem jurídico (por exemplo, os direitos da personalidade ou os direitos coletivos ou difusos) ou uma determinada categoria de sujeitos (crianças, adolescentes, idosos e consumidores) dá ensejo a que o legislador infraconstitucional preveja as regras processuais específicas e, para que o juiz concretize a norma jurídica no caso concreto.

 

Nesse sentido, o processo é importante mecanismo de afirmação dos direitos reconhecidos na Constituição Federal. A expressão neo que significa novo,  chama a atenção do operador para mudanças paradigmáticas, pois o Direito não pode restar embalsamado aos métodos arcaicos, engendrados pelo pensamento iluminista do século XVIII, devendo ser focado em sua caracterização, em pensamentos contemporâneos, não se dissociando da realidade e das múltiplas relações sociais, politicas e econômicas existentes.

 

Esse é o grande desafio dos doutrinadores contemporâneos ao combater o imobilismo conceitual, buscando as práticas mais adequadas àquilo que a Constituição põe como objetivo fundamental, que é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, conforme dispõe o art. 3º, inciso I do CF/88.

 

Basicamente, os direitos foram assegurados, ou seja, formalmente existiam, porém, isso não era suficiente. Devem ser materialmente concretizados. Busca-se então a melhor forma de interpretá-los e aplicá-los.

 

Zygmunt Bauman destaca que vivenciamos a modernidade líquida, numa perplexidade e angústia diante da frenética aceleração da vida, e onde o Direito e os sistemas processuais vivenciam uma crise existencial.

 

Não se consegue entregar dois produtos que fizeram a reputação do Direito ao longo de toda sua evolução. Realmente, a injustiça caminha impune pelas ruas e com passos firmes, e a insegurança é cada vez mais a característica de nossa época.

 

Nesse oceano de acontecimentos e de grande progresso tecnológico, a aflição atinge o intérprete que não consegue obter um distanciamento crítico. Ao contrário, precisa operar também em meio à fumaça, à penumbra e mesmo à espuma.

 

Talvez seja uma explicação poética e mais recorrente para o uso dos prefixos de NEO… Que se refere a pós-modernidade, pós- positivismo, neoliberalismo e neoconstitucionalismo.

 

É certo que tem a pretensão de ser novo, trazendo redimensionamento. Pode ser apenas mais um movimento circular, ou um ciclo… Depois de uma guinada de trezentos e sessenta graus.

 

O neoconstitucionalismo pode ser dividido em três aspectos distintos, a saber:

  1. a) histórico; b) filosófico e c) teórico.

 

A respeito do neoconstitucionalismo histórico, as transformações mais relevantes no Direito Constitucional contemporâneo se deram a partir da Segunda Grande Guerra Mundial, na Europa, pois, com a derrota dos regimes totalitários, verificou-se a necessidade de serem criados catálogos de direitos e garantias fundamentais para frear os abusos que poderiam ser cometidos pelo Estado ou por quaisquer detentores do poder em quaisquer de suas manifestações (como político, econômico, intelectual), bem como criar mecanismos efetivos de controle da Constituição (jurisdição constitucional).

 

A era da validade meramente formal do direito fora superada, não bastando o Estado cumprir o processo legislativo para que a lei viesse a ser expressão do Direito. Foram estreitados e atados os vínculos entre o Direito e a Política, na medida em que conceitos como os de razoabilidade, senso comum, interesse público, etc, são informados por relações de poder.

 

A dignidade da pessoa humana passa a ser o núcleo axiológico da tutela jurídica, não se restringindo ao vínculo entre governantes e governados, mas se estendendo para toda e qualquer relação, mesmo entre dois sujeitos privados.

 

Os reflexos das alterações constitucionais, ocorridas na Europa, foram sentidos, significativamente, no Brasil, com o advento da Constituição Federal de 1988 que marca, historicamente, a transição para o Estado Democrático de Direito.

 

Já no aspecto filosófico o significado da expressão “vontade da lei” foi superada pela hermenêutica jurídica, distinguindo regras e os princípios, para dar força normativa a estes, com o escopo de ampliar a efetividade da Constituição.

 

Percebe-se que seria de pouca valia, caso os direitos fundamentais não dispusessem de aplicabilidade imediata, porque não passariam de meras e vagas promessas.

 

A tal raciocínio denomina-se de pós-positivismo, na medida em que os princípios jurídicos deixam de ter aplicação meramente secundária, como forma de colmatar lacunas, para ter especial relevância jurídica na conformação judicial dos direitos. Nesse sentido que Lênio Streck alardeia sobre os perigos do panprincipiologismo.

 

Ao lermos o art. 126 do CPC/73, atualmente reprisado no art. 140 do CPC de 2015, reconhece-se que se trata de reprodução do art. 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro que é de 1942 e, fora remodelada pela Lei 12.372 de 2010 e, que consagra a proibição ao non liquet, impondo ao magistrado ter que decidir o litígio, não podendo abster-se, demonstra esse resquício, pois não resiste às interpretações evolutivas do direito e teológica do papel do juiz, na medida em que a norma jurídica, enquanto resultado do processo hermenêutico, não mais se enquadra na arcaica visão da decisão enquanto um silogismo jurídico (premissa maior: a regra jurídica e a premissa menor: os fatos; e a conclusão), seja porque se adota no Brasil, desde a Constituição Republicana de 1891, o judicial review (ou seja, o controle difuso de constitucionalidade), nos moldes norte-americanos decorrente do caso Marbury versus Madison (1803), com a possibilidade de se negar – no plano formal e/ou material – validade à regra jurídica por se opor a um princípio constitucional, seja porque a técnica legislativa se ampara cada vez mais nas cláusulas gerais (p.ex.: art. 421 CC/2002, ao tratar da função social do contrato; art. 1.228, §1º do CC/2002, ao prever a função social da propriedade; art. 113 do CC/2002, prevendo que os contratos devem ser interpretados à luz da boa-fé ou de sua função social), sendo os textos legislativos polissêmicos, possibilitando-se mais de uma interpretação possível.

 

Em atenção ao dispositivo, observamos que os princípios gerais do direito são a última fonte de integração das lacunas legislativas. Há uma grave imprecisão, inadequada à nova realidade do atual pensamento jurídico.

 

EM 1942, a norma era a lei, entendida como regra e os princípios não gozavam de eficácia normativa, portanto, dependiam das regras para concretizar-se.

 

Como o pensamento jurídico mudou, a interpretação há de mudar também. O juiz não decide a lide com base na lei, e sim, conforme o Direito, que se compõe de um conjunto de espécies normativas, inclusive e principalmente de princípios.

 

Esses princípios não estão exilados da órbita da legalidade, como entendia o Direito positivista, afinal, os princípios compõe o Direito de forma axiológica e metodológica.

 

No constitucionalismo teórico há três vertentes: o reconhecimento da força normativa da Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova dogmática da interpretação constitucional.

 

Afirmar a força normativa da CF é afastar o modelo que vigorou na Europa até meados do século passado, no qual a CF era vista como um documento essencialmente politico. Sua concretização ficava, invariavelmente, condicionada à liberdade de conformação do legislador ou à discricionariedade de administrador. Ao Judiciário não se reconhecia qualquer papel relevante na realização do conteúdo da Constituição.

 

E, a partir dessa noção que se deduz que a Constituição é uma carta de intenções. A vinculação positiva de todas as normas constitucionais inclusive aquelas que a doutrina clássica taxava de programáticas, implica consequentemente, na expansão da jurisdição constitucional.

 

A expansão da jurisdição constitucional nunca esteve tão crescente, principalmente diante da explosão de litigiosidade, bem como do acesso à justiça.

 

A difusão das causas de menor complexidade, os litígios de massa (a regulamentação da ação popular e da ação civil pública), ampliação da atuação do Ministério Público, possibilitaram que questões relevantes ficassem mais em evidência e pudessem possibilitar um melhor acesso à justiça, efetivando os direitos fundamentais, colocando o Judiciário no centro das atenções e das perspectivas da sociedade.

 

O judicial review aproxima o Judiciário da política, pois ações governamentais podem contestadas judicialmente.

 

E, nesse contexto, surgem críticas ao neoconstitucionalismo, onde se questiona o papel do juiz como protagonista do sistema, eis que o magistrado não goze de legitimidade democrática, pois, na maioria das hipóteses, a vontade do representante não coincide com a vontade do representado, bem como pela falência do parlamento, pelo excessivo número de medidas provisórias; mesmo os que os membros do judiciário não tendo sido eleitos pelo povo, isso não lhes retira a missão constitucional de efetivar os direitos fundamentais e defender a dignidade humana e o Estado Constitucional.

 

A reserva do possível, a reserva de consistências, o princípio da motivação e da proporcionalidade são os principais limites da atuação judicial.

 

A postura do ativismo judicial deve ser reservada à concretização das condições materiais mínimas de tutela da dignidade da pessoa humana (estatuto do mínimo existencial).

 

A questão, por fim, do que vem a compor a esfera do mínimo existencial não está colocada de forma explícita na Constituição, não prescindindo da necessária interação entre a Política e o Direito.

 

Atua o judiciário quando concede remédio para aidéticos, internações urgentes para doentes graves, e em outras frentes onde há direitos fundamentais a serem respeitados.

 

Como derradeiro óbice à atuação do Poder Judiciário, impõe-se o mito de legislador positivo, pelo qual o juiz pode, nos moldes do pensamento iluminista, apenas declarar a vontade concreta da lei ou, no máximo, atuar como legislador negativo declarando a inconstitucionalidade de uma lei contrária à Constituição, não tendo ampla liberdade para a concretização de direitos.

 

Tal compreensão não se compatibilizando com o modelo de Estado aclamado na Constituição brasileira de 1988, o Estado Democrático de Direito.

 

Requerendo, pois, além das prestações negativas para a garantia dos direitos de liberdade, também as prestações positivas inerentes à implementação dos direitos fundamentais à subsistência, à alimentação, ao trabalho, à educação, à saúde e à moradia.

 

As críticas são indispensáveis e construtivas para a evolução do pensamento jurídico e da justiça brasileira que acompanha um movimento pendular, onde as transformações puxam para um lado; as críticas para o outro; no final do cabo de guerra, chega-se finalmente ao equilíbrio.

 

Gradativamente a lei deixou de ser o centro do ordenamento jurídico, e os princípios ao invés de regras passaram orientar a interpretação e aplicação da lei, e a subsunção cedeu lugar à ponderação; também a justiça geral cedeu lugar à justiça individual (ou seja, priorizando-se a análise individual e concreta).

 

A nova dogmática reposiciona os poderes da república, dando maior ênfase ao Judiciário em face do Executivo e Legislativo. Assim a Constituição em substituição à lei (ou maior, ou direta aplicação constitucional em vez da lei).

 

Nesse entendimento o STJ já reconheceu expressamente que a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito e que ilumina a interpretação da lei ordinária.

 

Sob a égide da Constituição Cidadã, o direito constitucional brasileiro passou da desimportância para o apogeu em menos de uma geração. E esse sentimento constitucional deve ser celebrado, e traz maior efetividade a cidadania brasileira.

 

A relevância do respeito à dignidade da pessoa humana vem se revelando cada vez mais, quando no caso concreto é possível viabilizar a interrupção de gravidez de feto anencefálico, ou quando a gestação é reconhecidamente e cientificamente inviável.

 

Evidentemente não escapamos das controvérsias, e dos que defenderão a tutela da vida do feto, sendo indisponível e acima de qualquer outro direito. Mas, não podemos tornar a dignidade da pessoa humana como uma fórmula vazia, sem valor argumentativo efetivo.

 

É verdade, no entanto, que tanto um lado como outro traz a baila o valor relativo da dignidade da pessoa humana, em face das circunstâncias situacionais impostas pelo caso concreto.

 

Nesse contexto, quanto ao papel da norma, verificou-se que a solução dos problemas jurídicos nem sempre se encontra no plano abstrato do texto normativo, bem como o papel do magistrado não é somente a de ter conhecimento técnico, voltado para revelar a solução contida no enunciado normativo.

 

A constitucionalização do processo indica que a CF é o ponto de partida para a interpretação e da argumentação jurídica, sendo fundamental para erigir o neoprocessualismo que ampara e contempla os amplos direitos fundamentais e as garantias constitucionais.  Alterando-se diametralmente a exegese da norma jurídica.

 

A lei (e sua visão codificada do século XIX) perdeu sua posição central como principal fonte do direito e, passou a ser subordinada à CF, não valendo, por si só, mas somente se conformada com a Constituição e, especialmente, se adequada aos direitos fundamentais.

 

A função dos juízes, contrariamente ao que apregoava Chiovenda, no início do Século XX deixou de ser apenas atuar (declarar) a vontade concreta da lei e assumiu o caráter constitucional, possibilitando, a partir da judicial review, o controle de constitucionalidade das leis e dos atos normativos.

 

Contemporaneamente já se cogita claramente que a jurisdição é uma atividade criativa da norma jurídica do caso concreto, bem como bem como se cria, muitas vezes, a própria regra abstrata que deve regular o caso concreto.

 

Deve-se abandonar a falácia que aponta que o Judiciário só exerce a função de legislador negativo, para compreender que ele concretiza o ordenamento jurídico diante do caso concreto.

 

O processo tem uma missão especial que é materializar o direito fundamental de acesso à justiça, previsto constitucionalmente no art. 5º, inciso XXXV da CF/88, significa o direito à ordem jurídica justa.

 

Assim, a que vai além de mero admissão do processo ou à possibilidade de ingresso em juízo, mas, ao contrário, essa expressão deve ser interpretada extensivamente, compreendendo, a saber:

  1. a) o ingresso em juízo;
  2. b) a observância das garantias compreendidas na cláusula do devido processo legal;
  3. c) a participação dialética na formação do convencimento do juiz que irá julgar a causa (efetividade do contraditório ou contraditório dinâmico);
  4. d) a adequada e tempestiva análise, pelo juiz, natural e imparcial das questões discutidas no processo, que redunda numa decisão justa e devidamente motivada;
  5. e) a construção de técnicas processuais mais adequadas à tutela dos direitos materiais, confirmando a instrumentalidade do processo e a efetividade dos direitos.

 

Com a constitucionalização dos direitos e garantias processuais, retira-se o CPC da centralidade do sistema processual, o que significa o fenômeno da descodificação, e ressalta o caráter publicístico do processo.

 

Concluímos que o direito processual está atualmente divorciado da visão privatista, deixando de ser mecanismo de utilização pessoal, para ser visto como um meio de realização de justiça, democracia e principalmente cidadania.

 

O neoprocessualismo é polissêmico, mas por amor à didática devemos nos remeter ao neoconstitucionalismo, lembrando que a tutela jurisdicional além de ser direito fundamental, deve ser prestada de forma célere e adequada. Havendo uma vinculação do legislador, do administrador e do juiz, pois os direitos fundamentais possuem uma dimensão objetiva, constituindo um conjunto de valores básicos e diretivos da ação positiva do Estado.

 

Assim, como é sabido, os direitos fundamentais geram influência certeira sobre todo o ordenamento, servindo de norte para a ação de todos os poderes constituídos.

 

Precisamos nos afastar da vetusta dicotomia entre direito e processo, passando-se a cogitar na instrumentalidade do processo e em técnicas processuais… Mas, como bem salienta, Cândido Rangel Dinamarco, possui aspectos negativos e positivos.

 

 

Do lado negativo, como a instrumentalidade se combate o formalismo, afastando a visão do processo como um conjunto de armadilhas ardilosamente preparadas pela parte mais astuta em detrimento da mais incauta, todavia, sem gerar alternativismo desorganizado, capaz de produzir a insegurança jurídica.

 

Do lado positivo, com a instrumentalidade o processo torna-se apto a produzir todos os seus escopos institucionais (que são jurídicos, políticos e sociais) como na ampliação dos Juizados Especiais, ampliação das defensorias públicas, consolidação do papel do MP, o dinamismo do processo não só em relação às partes, entre estas e o juiz, como também entre o juiz e o processo, a plenitude e a restrição das garantias processuais, dentro da proporcionalidade, a justiça das decisões, a efetividade das decisões (como a melhor distribuição do ônus do tempo), a ampliação das sentenças mandamentais, e executivas lato sensu, a concretização de provimentos urgentes calcados em cognição sumária, o abandono da rígida separação entre cognição e execução e a desmitificação da verdade processual extraída formalmente com a coisa julgada.

 

Portanto, a arquitetura e funcionamento das técnicas processuais hábeis a tutelar os direitos materiais tornaram-se o grande desafio do legislador e do juiz na concretização do direito a tutela jurisdicional adequada. Aquilo que depender do processo civil, da técnica processual, deve ser solucionado de modo adequado.

 

Assume grande importância o princípio da adequação do procedimento à causa: pensar na tutela de interesses coletivos, pois o CPC fora idealizado numa visão individualista; a melhor distribuição dos ônus, de forma dosá-lo de maneira isonômica entre as partes, a maior aproximação da cognição da execução, incentivando poderes de efetivação da decisão (princípios da atipicidade dos meios executivos); a ampliação das chamadas cláusulas gerais ou conceitos jurídicos indeterminados, superando-se o princípio da congruência, e permitindo mesmo ante o pedido genérico, que o juiz aplique o melhor meio apto a dar efetividade à tutela jurisdicional.

 

Desde 2004 a E.C. 45 já ressaltava a necessidade imperiosa de existir a razoável duração do processo, enfatizando a necessidade de ampliação de técnicas como as do art. 273, 461 e 84 do CPC /73, adotando-se meios de coerção diretos e indiretos, bem como uma maior adoção do sincretismo processual, extinguindo-se o processo autônomo de execução, transformando-o em uma fase executiva, chamada de cumprimento de sentença, conforme o art. 475-I do CPC/73.

 

Restam superados os princípios da unidade e da unicidade do julgamento, que havia sido formulado por Chiovenda com base na preocupação com a oralidade no processo e seus desdobramentos como a concentra dos atos processuais, imediatidade do contato entre juiz e as partes e com as testemunhas, além da identidade física do juiz do começo ao fim do processo, o que na prática, no entanto, tanto no Brasil como na Itália não resultaram em maior celeridade processual.

 

Portanto, a efetivação do direito fundamental à tutela jurisdicional e a realidade forense implicou na necessária cisão do julgamento do mérito, ao contrário do que propugnava o modelo processual clássico.

 

Mas, a celeridade esbarra no garantismo. Perdendo-se de vista a segurança jurídica. Construir técnicas processuais adequadas e efetivas é enfim adequar o sistema, compatibilizando o processo em razão dos direitos e garantias fundamentais do demandado.

 

Segundo Luigi Ferrajoli, o garantismo se sustenta em três pilares: o Estado de Direito, a teoria do direito e a crítica do direito e, por último, a filosofia e a crítica da política.

 

Busca-se a base teórica da democracia, em sentido substancial, que só se concretiza com o respeito e observância aos direitos fundamentais, influenciando na construção do neoprocessualismo.

 

Assim como a inversão do ônus da prova, bem como a teoria dinâmica da distribuição do ônus probatória são bons exemplos de técnicas processuais mais aptas a dar melhor tutela jurisdicional, todavia, a decisão que inverter o ônus da prova, na sentença fere a garantia do contraditório, inviabilizando a ampla defesa.

 

Por outro lado, é irrazoável haver decisões que condicionem sempre à antecipação de tutela à prévia realização do contraditório, ignorando por completo a urgência do pedido, bem como aquelas que tornam impossível a aplicação de presunções probatórias, exigindo, de forma rígida, que o demandante apresente prova de fato, cuja demonstração seria facilmente realizado pelo demandado, o que contraria em princípio a moderna teoria do ônus dinâmico da prova.

 

Entre as tendências instrumentalistas e garantistas, há de se procurar adotar o princípio da proporcionalidade que permitirá que os conflitos de direitos fundamentais sejam resolvidos, conforme o caso concreto, sem posturas rígidas e inflexíveis que negariam os escopos preconizados tanto pelo neoconstitucionalismo como pelo neoprocessualismo.

 

Nesta dimensão, o neoconstitucionalismo e o neoprocessualismo servem como suporte crítico para a construção de novas teorias e práticas que sejam capazes de trazer técnicas mais efetivas, rápidas e adequadas para prestar a tutela jurisdicional.

 

Evidentemente com a formação da ciência processual, a partir da doutrina de Büllow, o escopo do processo foi redefinido e relacionado com a atuação do direito e na realização da justiça ou, pelo menos, na justa composição da lide.

 

Já a contribuição de Liebman que veio fundar a Escola Paulista de Processo, contando com ilustres discípulos como Alfredo Buzaid, Moacir Amaral Santos, José Frederico Marques, bem como Dinamarco e Ada Pelegrini Grinover inaugurando o estudo da instrumentalidade do processo, onde o direito processual civil passou a regular o modo de atuação em concreto do conteúdo das normas jurídicas.

 

O processo passou então a visar aspectos jurídicos, sociais e políticos. A instrumentalidade passou a ser o núcleo e a síntese dos movimentos doutrinários que procuraram o aperfeiçoamento da sistemática processual. O processo é instrumento, e como tal é meio só é tal e se legitima, em função dos fins a que se destina.

 

Nesse sentido, a visão do formalismo valorativo não tem galgado a merecida atenção principalmente, mas foi desenvolvida na UFRS sob a liderança de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira que buscou combater o exacerbado formalismo brasileiro, que não é condizente com atual estágio do desenvolvimento dos valores do processo, ou então, a parte insiste em levar até as últimas consequências as exigências formais do processo.

 

O formalismo valorativo traz um neoprocessualismo com maior ênfase na ética e na boa-fé objetiva, trazendo também a ponderação entre a efetividade e a segurança jurídica. Percebe-se que advogam as mesmas premissas do chamado neoprocessualismo, que aliás, já fora considerado um formalismo ético.

 

O formalismo dá sentido amplo e não se confundo com o ato processual individualmente considerado.

 

O formalismo se refere à totalidade formal do processo, a ritualidade não só quanto à forma, formalidades, mas especialmente, a delimitação de poderes, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua atividade, ordenação do procedimento e organização do processo, com vistas a que sejam atingidas suas finalidades primordiais.

 

O formalismo valorativo vem a indicar as fronteiras do processo, a circunscrever o material a ser formado e estabelecer dentro de quais limites devem cooperar e agir os personagens atuantes no processo para o seu pleno desenvolvimento, que culmina com a pacificação social.

 

De sorte que o formalismo controla os eventuais excessos de uma parte em face da outra, gera um poder catalisador e organizador, bem como disciplinador. O formalismo enxerga o processo sempre polarizado pelo fim.

 

O processo vez que é fruto do homem, não se encontra na natureza, portanto, a criação não pode ser desprovida de qualquer valor… Assim o processo não se esgota dentro da realização do direito material, constituindo, mais abertamente, a ferramenta pública indispensável para a realização da justiça e da pacificação social.

 

Para a organização de um processo justo, em tempo razoável, a efetividade e a segurança apresentam-se como valores essenciais para a conformação do processo aos valores constitucionais, todavia, ambos se encontram em permanente conflito, em relação proporcional, pois quanto maior efetividade, menor segurança e vice-versa.

 

Também a efetividade está constitucionalmente consagrada, pois não é suficiente abrir as portas do Judiciário, mas prestar a jurisdição tanto quanto possível eficiente, efetiva e justa, mediante um processo sem dilações temporais ou formalismos excessivos, que conceda ao vencedor no plano jurídico e social tudo a que faça jus.

 

Ao longo da história da evolução do processo, após a segunda grande guerra mundial abandonou-se a tramitação fechada e a minúcia dos procedimentos, para a adoção de princípios e a sua constitucionalização.

 

O direito passou a ser mais flexível, menos rígido, determinando uma alteração no que concerne à segurança jurídica, que passa de um estado estático para estado dinâmico.

 

A segurança jurídica é uma norma que se mede pela estabilidade de sua finalidade abrangida em caso de necessidade pelo seu próprio movimento. A segurança deve ser um coeficiente de uma realidade, permitindo a efetividade dos direitos e garantias do processo.

 

Afinal, a versão positivista do processo foi sendo, gradualmente, abandonada o problema enfrentado é posto como o centro das preocupações hermenêuticas. O emprego de princípios, conceitos jurídicos indeterminados e juízos de equidade em detrimento de uma visão puramente formalista na aplicação do direito geraram reflexos no processo contemporâneo.

 

A lógica argumentativa fora definitivamente adotada, incentivado o diálogo judicial na formação do convencimento judicial, na cooperação das partes com o magistrado e deste com as partes.

 

O contraditório, nesse contexto, passou a ser essencial para um processo justo. A sentença deve resultar do trabalho conjunto de todos os sujeitos do processo, exigindo um juiz ativo e leal, colocado no centro da controvérsia.

 

Não se pode admitir uma valorização excessiva do rito, como afastamento total ou parcial da substância, conduzindo à ruptura com o sentimento de justiça.

 

O combate ao formalismo excessivo é justificado pelo fato de não existir mais espaço para a aplicação mecanicista do direito, o operador de se atentar às particularidades do caso concreto no trabalho de adaptação da norma, a rigor, o processo de aplicação do direito mostra-se, necessariamente, obra de acomodação do geral ao concreto, a requerer incessante trabalho de adaptação e criação.

 

Assim, o legislador não é onipotente na previsão de todas e inumeráveis possibilidades oferecidas pela riqueza da vida.

 

Assim como outros ramos do direito, seu caráter finalístico é evidente, finalismo que não pode ser voltado para si, pois inexiste finalismo em si, senão direcionado para os fins últimos da jurisdição.

 

Visa-se se atingir um processo equânime, peculiar do Estado Constitucional, que sirva à ideia de um equilíbrio ideal entre os litigantes e ao fim material do processo que é a realização da justiça material.

 

Mas, lembremos que a forma não pode transcender à matéria, por não possuir valor próprio, devendo por equidade, atender a essência… e não sobrepujá-la.

 

Deve-se combater o excessivo formalismo, em prol da equidade com a função interpretativa- individualizadora, tomando-se sempre como medidas as finalidades essenciais do instrumento processual, os princípios e valores que são sua base, desde que respeitados os direitos fundamentais da parte e na ausência de prejuízo.

 

Vejamos alguns casos que exemplificam a aplicação do formalismo-valorativo: a adoção do rito ordinário, em uma causa que deveria tramitar pelo sumário, pois será atingida de modo mais cabal a finalidade do rito sumário; a sublevação do prazo da ação rescisória, para uma melhor interpretação da lei e a busca de uma solução justa; a decisão que evitar a extinção do processo sem resolução de mérito, após toda a instrução probatória; a decisão que admite a denunciação da lide, mesmo em hipótese de garantia imprópria, para se evitar uma ação regressiva autônoma; a visualização da existência de interesse de agir mesmo quando autor ajuíza a ação de conhecimento, muito embora disponha de título executivo extrajudicial; as raríssimas decisões do STJ que, aplicando o princípio da cooperação, determinar que seja suprida a falha na formação do instrumento que acompanha o agravo, quando se trate de peça não obrigatória.

 

Pelo mesmo formalismo-valorativo informa a aplicação da lealdade e da boa-fé, não somente para as partes, mas para todos os sujeitos do processo, inclusive o órgão jurisdicional com as partes e destas com aquele. É exatamente o emprego da lealdade no emprego dessa liberdade valorativa é que pode justificar a confiança atribuída ao juiz na aplicação do direito justo.

 

Ora, tanto a boa-fé, quanto a lealdade do órgão jurisdicional, seriam flagrantemente desrespeitadas sem um esforço efetivo para salvar o instrumento de vícios formais.

 

Igualmente se considera excessivo formalismo a inadmissão de recurso por estar ilegível um determinado carimbo ou certidão lavrada pela serventia, bem como, a informação processual prestada de forma equivocada, por meio do site do respectivo tribunal, não pode inviabilizar, por exemplo, um recurso da parte. À evidência, não pode a parte pagar por erro da secretaria do Tribunal.

 

Outro exemplo pungente é a hipótese de interposição de agravo de instrumento via faz, perante o tribunal de origem, sem as cópias que formam o instrumento, posteriormente apresentadas juntamente com o original, o STJ aplicando o formalismo valorativo afirmou que como a Lei 9.800/99 não disciplina em o dever e nem a faculdade do advogado, ao usar o protocolo via fac-símile, transmitir, além da petição de razões do recurso, cópia dos documentos que o instruem, a interpretação que deve ser orientada pelas diretrizes que levaram o legislador a editá-la, agregando-lhe os princípios gerais do direito.

 

Assim, a finalidade da retromencionada lei deve ser preservada pelos seguintes motivos:

  1. a) não houve prejuízo para a defesa do recorrido, porque só será intimado para contrarrazoar após a juntada dos originais aos autos;
  2. b) o recurso remetido por fac-símile deverá indicar o rol de documentos que o acompanham, sendo vedado ao recorrente fazer qualquer alteração ao juntar os originais;
  3. c) evita-se um congestionamento no trabalho da secretaria dos gabinetes nos fóruns e tribunais, que terão de disponibilizar um funcionário para montar os autos do recurso, especialmente quando o recurso vier acompanhado de muitos documentos;
  4. d) evita-se a discussão de disparidade de documentos enviados, com documentos recebidos;
  5. e) evita-se o congestionamento nos próprios aparelhos de fax disponíveis para recepção do protocolo;
  6. f) é vedado ao intérprete da lei editada para facilitar o acesso ao judiciário fixar restrições, criar obstáculos, eleger modos que dificultem sua aplicação.

 

Também é excesso de formalismo cogitar em ilegitimidade da comissão de defesa do consumidor de assembleia legislativa estadual para ajuizar ação civil pública em defesa dos interesses e direitos individuais homogêneos do consumidor, relativamente ao aumento efetuado pela recorrida das mensalidades de plano de saúde dos segurados com mais de sessenta anos, pois nos termos dos arts. 81, parágrafo único, art. 82, III, 83 todos do CDC, e 21 da Lei 7.347/1985, pois a legislação somente exige a atuação em prol dos direitos dos consumidores, motivo pelo qual exigir o regimento interno da referida  comissão preveja expressamente, à época da propositura da ACP, sua competência para demandar em  juízo constitui excesso de formalismo.

 

 

Por outro lado, há inúmeros casos em que o formalismo valorativo não se aplica, como o caso dos documentos do agravo de instrumento. A falta de procuração no recurso interposto na instância especial é causa de sua inadmissão, sendo é inaplicável o disposto no art. 13 do CPC, não se admitindo, inclusive, a juntada da procuração no agravo interno.

 

De igual modo, se não comprovado no agravo de instrumento a existência de feriado local, não se admite a comprovação em embargos de declaração, tampouco em agravo interno.

 

 

Um dos pontos reconhecidos pela comissão de juristas responsáveis pela elaboração do Código Fux é que com a ineficiência do sistema processual, todo ordenamento jurídico passa a carecer de real efetividade.

 

Assim, a coerência substancial há de ser vista como objetivo fundamental e mantida em termos absolutos, no que tange à Constituição Federal. Afinal, é na lei ordinária e em outras normas de escalão inferior que se explicita, a promessa de realização dos valores encampados pelos princípios constitucionais.

 

Com evidente redução da complexidade inerente ao processo de criação de um novo Código de Processo Civil, poder-se-ia dizer que os trabalhos da Comissão se orientaram precipuamente por cinco objetivos:

1) estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição Federal;

2) criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa;

3) simplificar, resolvendo problemas e reduzindo a complexidade de subsistemas, como, por exemplo, o recursal;

4) dar todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado; e,

5) finalmente, sendo talvez este último objetivo parcialmente alcançado pela realização daqueles mencionados antes, imprimir maior grau de organicidade ao sistema, dando-lhe, assim, mais coesão.

 

O primeiro anseio doutrinário foi atingido que foi a harmonização da lei ordinária em relação à C/1988.

 

A metodologia jurídica atual contemporânea reconhece a força normativa dos princípios e tal ponto não poderia ser ignorado pela Comissão.

 

Linhas fundamentais de CPC realmente só podem ser atingidas se pautadas das premissas de um Estado Constitucional e no modelo constitucional de processo civil, refletindo princípios de segurança jurídica, igualdade de todos perante o Direito e o direito de participação no processo.

 

Com forma de uma melhor organização, o novo CPC irá ganhar, inclusive uma parte geral, onde restam disciplinados os princípios e garantias fundamentais do processo civil.

 

E, ainda o art. 6º do novo CPC enfatiza essa visão neoconstitucional, deixando evidente que a atividade do juiz, ao aplicar a lei, deverá atender aos fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, observando sempre os princípios da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

 

O princípio non liquet é reescrito, com nítido fim atualizando, metodologicamente, apesar de alguns desacertos redacionais, como por exemplo, a firma que princípio é fonte de integração de lacuna (princípio é uma norma), o art. 108 do novo CPC afirma que “o juiz não se exime de decidir alegando lacuna ou obscuridade da lei, cabendo-lhe. no julgamento da lide, aplicar os princípios constitucionais e as normas legais; não as havendo recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”.

 

Percebe-se que o Código Fux consagra explicitamente, alguns princípios constitucionais processuais, como a inafastabilidade da tutela jurisdicional, a razoável duração do processo, princípio do contraditório e seus decorrentes como o da cooperação e o da participação e a publicidade.

 

Há uma cláusula geral onde o magistrado ao aplicar a lei atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum, observando sempre os princípios da dignidade da pessoa humana, da razoabilidade, da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência.

 

Nesse ponto, a redação deveria ser aprimorada para não se confundir o neoprocessualismo com o formalismo valorativo.

 

E, consagrando a técnica da tutela jurisdicional a partir de cláusulas gerais como prazo razoável, fins sociais a que esta se dirige e às exigências do bem comum (art.6), a lealdade e boa-fé (art. 66, II), medidas que considerar adequadas (art. 278), lesão grave e risco de lesão grave e de difícil reparação (art.278 e 283).

 

Assegura-se, ainda, a isonomia material (art.7) das partes no tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz velar pelo efetivo contraditório em casos de hipossuficiência técnica.

 

O tratamento igual de todos perante o ordenamento determina a necessidade de um processo civil cooperativo, uma distribuição dinâmica do ônus da prova, bem como uma assistência judiciária integral aos hipossuficientes.

 

Assim diante das peculiaridades do caso concreto, poderá o magistrado, em decisão fundamentada, observando o contraditório, distribuir de modo diverso o ônus da prova, impondo-o à parte que estiver em melhores condições de produzi-la, como se extrai do art. 262 do projeto.

 

A adoção da teoria dinâmica de distribuição do ônus da prova supera a vetusta teoria estática que consagrada no art. 333 do atual CPC, prestigiando a isonomia material, evitando-se situações onde o próprio acesso à justiça seria negado.

 

Com toda a potencialidade para a justa solução do caso concreto, afastando normas frias e estáticas, construindo o direito em conformidade com suas peculiaridades, sempre respeitando o contraditório.

 

Tal postura rompe com a vetusta visão do Estado liberal, assiste-se com surgimento da democracia social, à intensificação da participação do juiz, a quem cabe zelar por um processo justo, capaz de permitir, nas palavras de Marinoni e Arenhart. O processo não busca somente atender ao interesse das partes, há um interesse público na correta solução do litígio.

 

A nova lei processual assegura o direito ao benefício da gratuidade de justiça, melhor organizando a Lei 1.060/50, permitindo que o magistrado determine de ofício a comprovação da insuficiência, bem como informa que das decisões que apreciarem o requerimento de gratuidade de justiça, caberá agravo de instrumento, salvo quando a decisão se der na sentença.

 

O Estado Constitucional é legítimo e qualificado pela segurança jurídica, pois exala confiança em seus cidadãos, na proteção à coisa julgada material, bem como pela adoção dos precedentes vinculativos.

 

Há o dever constitucional de se proteger a coisa julgada como postulado extraído do art. 5º inciso XXXV da CR/88, nesse sentido, os meios para a sua revisão devem ser bem delimitados.

 

Pretende-se reduzir os vícios rescisórios, conforme se observa no art. 884 do projeto, retirando-se, por exemplo, a rescisória por incompetência absoluta, bem como reduzindo o seu prazo para um ano (art.893).

 

Também permitiu a revisão da chamada coisa julgada inconstitucional, sem contudo, deixar claro que somente é admissível tal revisão se ao tempo da formação da coisa julgada, já existia firmada jurisprudência no STF sobre o assunto.

 

Enfim evidencia a forte tendência do sistema da common law, emprestando mais destaque à jurisprudência pátria.

 

E, são variadas passagens como o art. 285, IV, art. 317, 847, 853, 895 , 906 e 959.

 

O sistema de precedentes persuasivos enfatiza além da segurança jurídica, a isonomia perante o Direito, evitando tratamento diferenciado entre os jurisdicionados. Cumpre, contudo, registrar que o projeto perdeu a oportunidade de aprimorar o sistema de precedentes.

 

Há de se cogitar na igualdade diante das decisões judiciais, ou seja, não basta igualdade perante a lei, mas igualdade na interpretação da lei.

 

O precedente constitui decisão acerca de matéria de direito, ou, nos termos do common law, de um point of law e não de matéria de fato. A maioria das decisões judiciais diz respeito às decisões de fatos.

 

Houve imprecisão técnica no NCPC que não introduz um sistema de precedentes, não reconhecendo a eficácia vinculante dos fundamentos determinantes das decisões judiciais, tampouco aborda os institutos da ratio decidendi, obter dicta, distinguishing, overrling, prospectiver overruling e entre outras.

 

 

É sabido que não é função do legislador definir conceitos, contudo, estabelecer uma melhor compreensão das técnicas de confronto, interpretação, superação e aplicação do precedente seria ideal, inclusive para uma melhor obtenção dos anseios do Novo CPC bem como mais coerência à ordem jurídica.

 

Incorreu em contradição pois se utiliza muito a técnica das cláusulas gerais o que, naturalmente, provoca por parte da jurisprudência a outorga de sentido aos textos normativos.

 

Assim é curial se atribuir força vinculante aos precedentes, do contrário, haverá um enorme estado de insegurança, pois cada magistrado poderá interpretá-lo no sentido que lhe aprouver.

 

Lembremos que o Código Buzaid de 1973 provocou uma brutal ruptura com as premissas do CPC de 1939, estabelecendo no plano normativo o que de melhor se havia pensado na primeira metade do século XX, principalmente na Itália.

 

A verdade que os operadores de Direito não sentirão tanto o choque da mudança, com o Novo do CPC do que os que sentiram com a reforma da execução judicial determinada pela Lei 11.232?2005. Pois, a rigor, houve muitas meras incorporações de textos constitucionais e de diplomas legislativos infraconstitucionais extravagantes.

 

Ademais o novo CPC deu maior organização ao sistema processual, principalmente por positivar os primados constitucionais no texto legal. Enfim, esse parece ser o grande lucro a ser obtido com tal mudança. Não obstante ser uma mudança de conteúdo simbólico, justamente por estar positivado, talvez alcance maior eco e melhor profundidade nos escaninhos da justiça.

 

Referências

Marinoni, Luiz Guilherme; Mitidiero, Daniel. O projeto do CPC: crítica e propostas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

 

Barroso, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n.851, 1. nov. 2005. Disponível em: http://jus.uol.com.br/revista/texto/7547. Acesso em 26.09.2015.

 

Borring, Felipe. Considerações iniciais sobre a teoria geral dos recursos no Novo Código de Processo Civil. Revista Eletrônica de Direito Processual. REDP Ano. 5, V. VII Janeiro a Junho de 2011. Rio de Janeiro.

 

DIDIER Jr., Fredie. A teoria dos princípios e o projeto de Novo CPC. In DIDIER Jr., Fredie. Mouta Araújo, José Henrique. KLIPPER, Rodrigo. O projeto do Novo Código de Processo Civil. Estudos em homenagem ao Prof. José de Albuquerque Rocha, JusPodivm, 2011.

 

A preclusão e o Novo CPC

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A palavra preclusão[1] provém do latim praeclusio, de precari (rogar, tolher e encerrar) entende-se o ato de encerrar ou de impedir que alguma coisa se faça ou prossiga. Continua informando o Vocabulário Jurídico Conciso de autoria de De Plácido e Silva que indica propriamente a perda de determinada faculdade processual civil em razão de: a) não exercício dela na ordem legal; b) haver realizado atividade incompatível com esse exercício; c) já ter sido validamente exercitada.

 

Representa em última análise a perda de exercício de ato processual que, por inércia, a parte não promove, no prazo legal ou judicial. Mas, uma vez verificada a justa causa o juiz assinará à parte novo prazo para a prática do ato.

 

O recém aprovado Código de Processo Civil brasileiro pelo Senado trouxe várias novidades e, nos exige a atualização para melhor compreender o substituto vindouro do Código Buzaid.

 

Observamos que há avanços e retrocessos. Mas, enfim, além de um rápido trâmite legislativo, o novo CPC foi resultado de um maior diálogo com o meio jurídico.

 

Apresenta-se como real novidade a Parte Geral do CPC de onde emerge a possibilidade de atuação, mas proativa dos advogados das partes em escolher, em paridade de condições e forças, os meios probatórios lícitos que darão desenvolvimento a fase instrutória.

 

 

 

 

É verdade que a versão final do CPC conferiu ao Estado-Juiz poderes para prorrogar prazos e inverter a ordem das provas[2] (em matérias disponíveis), a possibilidade de as partes atuarem para melhor aproveitamento da fase instrutória, a fim de que o julgador tivesse bons subsídios para proferir decisão de mérito sem que precise recorrer às malfadadas regras de julgamento do ônus da prova.

 

Os litigantes são mais capazes a estabelecer os reais pontos controvertidos e da melhor forma de produzir a prova sobre a controvérsia para que finalmente o agente político do Estado possa melhor proferir com quem está o direito.

 

A novidade é chamada de acordo[3] de procedimento o que vai reger, em certa medida, a forma de exercício de direitos e deveres processuais e dispor sobre o ônus que contra si recaiam.

 

É bom frisar que a eventual adaptação procedimental não é resultado de ato unilateral do juiz, e sim, como fruto de consenso entre as partes e o julgador mediante situações excepcionais.

 

A razão de ser do processo judicial, em seu procedimento em contraditório, onde se desenvolvem múltiplas relações entre o Estado-Juiz e as partes litigantes, pautados nos prazos estabelecidos em lei. Sendo relevante destacar a preclusão processual constante em todas as etapas como limitadora da atividade processual dos sujeitos envolvidos, trazendo lógica e ordem, além de celeridade processual.

 

Apesar do Estado ter subtraído dos seus cidadãos a possibilidade de se valer da justiça privada, impondo o monopólio para a utilização do processo judicial, impondo igualmente uma série de limitações à atividade dos litigantes, pautando o instrumento público da jurisdição para que possa ter de regular andamento, com ordem e rapidez, dentro dos prazos preestabelecidos retirando a marcha processual do arbítrio do Estado-juiz, representando deste modo indiscutível garantia dos jurisdicionados.

 

A preclusão deve ser compreendida como instituto que envolve a impossibilidade, por regra, a partir de determinado momento, serem suscitadas matérias no processo, tanto pelas partes como pelo juiz, visando à aceleração, a simplificação do procedimento.

 

Integra a preclusão, portanto, um ônus processual das partes ou um poder do juiz. A preclusão se relaciona com as decisões judiciais[4] (tanto interlocutórias como a final) e às faculdades conferidas às partes com tempo definido de exercício, atuando nos limites do processo.

 

Na Itália a preclusão foi sistematizada a partir dos estudos de Chiovenda quando se chegou a criticar o fato de ter destacado como fenômeno vinculado às atividades das partes – deduzindo que representaria a perda, extinção ou consumação da faculdade processual pelo fato de se haverem alcançado os limites assinalados por lei ao seu exercício.

 

A preclusão de questões para o juiz não conste expressamente na definição do instituto desenvolvido por Chiovenda (Cosa giudicata e preclusione in Revista Italiana per le scienze giuridice n. 11(1933); 3/53).

 

Analisando as obras carnelutiana há uma espécie de preclusão que é voltada para as partes, referente às faculdades para as partes, tanto é que para diferenciar a coisa julgada material da preclusão (ou seja, diferenciar coisa julgada[5] e questões julgadas).

 

Discorre detalhadamente sobre o que seja a preclusão de questões e sua ramificação interna, deixando transparecer que decisões interlocutórias[6] ou finais não impugnadas “transitam em julgado em sentido formal”, não podendo ser modificadas pelas partes e pelo julgador.

 

Cabe grifar que a preclusão opera como grande limitador para a atividade processual das partes sujeita à rigorosa sistemática de prazos e formas que se desenvolvem desde a fase postulatória, no rito de cognição, até a extinção definitiva da fase de execução do julgado mesmo porque, por outro lado, há matérias de ordem pública não sujeitas ao regime preclusivo para o Estado-juiz.

 

O Código Buzaid apresenta rigidez na aplicação da técnica, à medida que a grande maioria das decisões judiciais e dos atos de impulsionamento estão submetidos à preclusão. As exceções seriam, respectivamente, os despachos de mero expediente e os prazos meramente dilatórios.

 

Há pois a incidência de preclusão sobre as decisões interlocutórias e as sentenças, doravante só cabendo conforme o art. 1.015 do Novo CPC o agravo de instrumento. Pois o novo codex subtraiu do sistema processual o agravo retido.

 

Também incide sobre os atos de impulsionamento processuais tais como a contestação, apresentação de documentos, quesitos, laudo pericial e de assistentes técnicos, rol de testemunha, impugnação à ata de audiência, ao cálculo de execução, dentre outros.

 

A preclusão acelera a marcha processual, moldando os julgamentos, preservando a sequência válida e lógica os atos processuais. A preclusão acelera a marcha processual, moldando os julgamentos, preservando a sequência válida e lógica dos atos processuais. A preclusão representa a maior limitação ao agir das partes no processo, impondo ordem e celeridade ao procedimento principalmente para se galgar com êxito a duração razoável do processo.

 

A técnica da preclusão emerge do fato de o instituto pode ser aplicado, com maior ou menor intensidade, tornando o processo mais ou menos célere, impondo uma maior ou menor rigidez na ordem entre as sucessivas atividades que o compõem, tudo dependendo dos valores a serem perseguidos prioritariamente pelo ordenamento processual de regência de uma determinada sociedade, em um dado estágio cultural.

 

Na versão originária do CPC/73 já disciplinava a diferença do regime preclusivo disposto para as partes e para o Estado-juiz, restringindo a aplicação da preclusão pelo juiz, especialmente ao passo em que autorizava ao magistrado voltar atrás em decisão já tomada (relativização da preclusão consumativa), quando se tratasse de matéria de ordem pública: como as condições da ação e pressupostos processuais, provas, nulidades absolutas e erro material.

 

Com as sucessivas reformas do CPC trataram de alargar o rol de matérias não sujeitas à preclusão para o juiz, agregando-se a prescrição. A principal novidade[7] é tratar a possibilidade de aplicação oficiosa da media ao disciplinar o julgamento da demanda com resolução do mérito. A decretação ex officio da prescrição fora encaminhada pela Lei 11.280, de 2006.

 

O novo CPC veio disciplinar que cabe ao juiz pronunciar, de ofício ou a requerimento da parte, não só a decadência (como historicamente se admitia), mas também agora a prescrição (antes só reconhecida quando expressamente requerida pelo demandado em preliminar contestacional.

 

Cumpre salientar que o tema prescricional, nos estritos limites da esfera laboral, não parece ser tão simples. Boa parte da doutrina trabalhista observa que não caberia aplicação subsidiária do art. 219, quinto parágrafo do CPC, já que a decretação da prescrição virá sempre em prol do empregador. Sendo uma vantagem vinculada à parte mais forte, o que colide com o impostergável princípio de proteção ao trabalhador.

 

Mas no âmbito do processo civil, a questão está pacificada, e as demais matérias não preclusivas são mantidas no novo codex (art. 487, II do NCPC).

 

Interessante é sublinhar a previsão do art. 278 do Novo CPC que informa que a nulidade deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.

 

O art. 293 do Novo CPC in litteris: “O réu poderá impugnar, em preliminar da contestação, o valor atribuído à causa pelo autor, sob pena de preclusão e o juiz decidirá a respeito, impondo, se for o caso, a complementação das custas.

 

No estudo das preclusões que atuam sobre o juiz, faz-se presente a regra da preclusividade, que muito bem pode ser confirmada com a omissão da parte prejudicada, diante de decisão gravosa, em interpor a competente recurso no prazo e na forma prevista pelo ordenamento.

 

Há ainda hipóteses em que a parte não possui mais viabilidade de ingressar com a medida recursal típica, mas pode ter a questão não preclusa revista, em face da mudança de posicionamento incrementada de ofício pelo próprio julgador.

 

Preclusão então como perda da faculdade da parte referente ao ato de recorrer, já que o juiz do reanalisar a decisão judicial incidental a qualquer tempo abre oportunidade para que a parte possa, em tese, apresentar mesmo fora do prazo recursal.

 

Há de se diferenciar a preclusão das partes ligada às faculdades da preclusão referente aos atos necessários ao desenvolvimento de fases do procedimento estabelecido por lei.

 

A preclusão mais gravosa é a decorrente de ato processual de recorrer, já a outra espécie de preclusão impõe a atitude da parte no sentido de impulsionar o feito da melhor maneira que possível, especialmente nas fases postulatória e instrutória, sob pena de ser enclausurada uma etapa e dando início à fase subsequente, uma vez expirado o prazo de duração da fase procedimental precedente (refere-se a preclusão decorrente de ato processual necessário no desenvolvimento do rito).

 

Concluímos, pois que a preclusão é fenômeno complexo sendo mesmo um fator estruturante do procedimento, se manifestando em diversas vertentes seja para os litigantes e interessados, seja par ao Estado-juiz.

 

Há cinco momentos peculiares de destacada participação da preclusão, a saber: a) preclusão da parte referente ao ato de recorrer da sentença; b) preclusão para parte referente ao ato de recorrer de decisão interlocutória de maior gravidade; c) preclusão da parte referente ao ato de recorrer de decisão de menor gravidade; d) preclusão para a parte referente aos atos destinados ao desenvolvimento do procedimento; e) preclusões para o Estado-juiz.

 

Em resumo: preclusão para apelação, para agravo de instrumento, preclusão para o juiz[8] sobre as questões já decididas onde não poderá voltar atrás.

 

Há modificação sobre a preclusão referente à decisão interlocutória de menor monta e, não houve grande alteração quando as demais preclusões.  A verdade é que o novo codex reduziu o tamanho da preclusão como técnica principalmente pela eliminação do agravo retido.

 

Inegavelmente a solução adotada pelo novo CPC muito se aproximou da construção já formatada no processo laboral. Simplificando o procedimento, sendo menos burocrático, onde se continua a pautar pela necessidade de apresentação junto ao juízo a quo de um protesto antipreclusivo.

 

A flexibilização procedimental é dada pela supressão do agravo retido. Reconhecendo ser vasta a atividade preclusiva referente aos atos de impulsionamento procedimental, o que são próprios da fase postulatória (como a contestação e réplica) e até atividades próprias da fase instrutória como requerimentos para produção de provas técnicas e orais).

 

É forçoso admitir que a fase instrutória é aquela não sujeita à imediata preclusão de provas técnicas e orais. Pois quando se cogita em prazo peremptório ou o prazo fatal o juiz não pode dilatar tal prazo, como ocorre com o prazo contestacional (que é de quinze dias úteis).

 

O objetivo do Novo CPC fora mesmo o de restringir a possibilidade de dilação de prazo à fase instrutória, já que o art. 139 do Novo CPC que cataloga os poderes do juiz particularmente o seu inciso VI, referindo-se inclusive à distribuição dinâmica do ônus da prova e eventual dilação de prazos.

 

O novo CPC veio facilitar a difícil diferenciação[9] do que seja prazo dilatório e peremptório na fase de conhecimento, a partir do momento que passa a admitir que todo prazo da instrução deva ser compreendido não mais como peremptório, já que poderá ser dilatado pelo juiz, o gestor do processo.

 

O Código Buzaid se destacou pelos prazos peremptórios e alguns prazos dilatórios[10] sem que descrevesse em quais hipóteses o julgador deveria aplicar um e outro. A jurisprudência pátria sendo cada vez mais contundente veio confirmar, como peremptórios, os específicos prazos fundamentais dentro do procedimento tais como os de contestações, exceções (doravante liminares de contestação tais como a reconvenção) e os recursos em geral.

 

O ato central de defesa bem como os recursos são onde ocorrem os verdadeiros atos peremptórios de que trata genericamente o CPC e, não são passíveis de prorrogação, mesmo havendo consenso das partes nesse sentido.

 

Não é admissível cogitar em relativização de preclusão posto sendo patente a intempestividade recursal revela a desídia ou o desinteresse da parte somada a preocupação com a efetividade processual e a própria presunção de correção da decisão mal embargada que acarreta a consolidação deste decisum, operando-se enfim a preclusão.

 

Considerando ainda que alguns magistrados consideram que a maioria dos prazos do CPC são peremptórios (inclusive os presentes na fase instrutória) inviabilizando qualquer discussão a respeito.

 

A jurisprudência pátria oscila em reconhecer os prazos dilatórios, na instrução sendo conhecidas as teses proeminentes do STJ de que o prazo do art. 421 (apresentação de quesitos), art. 464, terceiro parágrafo (que é prazo dilatório), mas outros importantes prazos do art. 407 (rol de testemunhas) e, especialmente o prazo do art. 433 (juntada de laudo de assistente técnico) sendo todos prazos peremptórios.

 

Consigna-se como contraditórias essas posições firmadas sem observar uma interpretação conjunta desses dispositivos que integram a fase instrutória, razão pela qual seguimos defendendo que devem ser reconhecidos todos esses prazos como dilatórios, mesmo porque existe um direito à produção de provas que seja feita em tempo razoável.

 

Para se alcançar no processo a maior possível certeza do direito a ser declarado as disposições processuais precisam passar no filtro de sua compatibilidade com os princípios e valores fundamentais pertinentes à espécie e reconhecidos em dado momento histórico.

 

É óbvio que o CPC/73 deve ser interpretado à luz do texto constitucional vigente, fato este já presente no primeiro artigo do novo CPC. A mitigação da aplicação da técnica preclusiva não significa que não haverá mais preclusões na fase instrutória.

 

Nelson Nery afirma que prazos próprios[11] são aqueles “fixados para o cumprimento do ato processual, cuja inobservância acarreta desvantagem para aquele que o descumpriu, consequência essa que normalmente é a preclusão”. Para o doutrinador paulista “prazos impróprios são aqueles fixados na lei apenas como parâmetro para a prática do ato, sendo que seu desatendimento não acarreta situação agravante para aquele que o descumpriu, mas apenas sanções disciplinares. O ato praticado além do prazo impróprio é válido e eficaz”.

 

A diferença fundamental entre ambos está em que, nos prazos próprios, o descumprimento do ônus processual de praticar determinado ato implica consequências processuais típicas. Já os prazos impróprios não acarretam consequências processuais, mas disciplinares, conforme dispõem os artigos 194 e 198 do CPC/73 (aplicáveis, respectivamente, aos serventuários e aos juízes).

 

Afinal, o prazo quando dilatório, ou impróprio não é sinônimo de não preclusivo. Se o Estado-Juiz realmente não possui propriamente prazos para se manifestar nos autos, o mesmo, no entanto, pode não se dar com os litigantes, que mesmo diante de prazos dilatório precisam se manifestar, se não exatamente dentro do termo processual fixado, em momento razoavelmente próximo, sob pena, ocasionalmente, de o magistrado decretar a preclusão e, enfim, dar seguindo à marcha procedimental.

 

Nesse sentido, andou muito bem o Novo CPC[12] ao fixar majoritariamente o prazo de quinze dias úteis e, também ao proibir que juízes, sem anuência das partes, reduzir prazos peremptórios.
Em verdade, a duração de prazo, a toda evidência se projeta bem em defesa do direito constitucional e prioritário à prova a fim de se conseguir maior material probatório para se aproximar da verdade material quando da decisão sobre o mérito.

 

Desta forma, se coloca mais a favor da segurança jurídica, no sentido de fornecer maior certeza ao direito a ser declarado em sentença, do que a favor da efetividade processual.

 

A tendência é a de que a instrução se prolongue, o que justifica que o juiz dirigirá o processo conforme as disposições do Novo CPC, incumbindo-lhe ao longo da instrução, dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito, de modo a conferir maior efetividade e certeza à tutela da pretensão e do bem jurídico, respeitando sempre o contraditório (substancial) e a ampla defesa.

 

Concluímos que as alterações incrementadas são, em linhas gerais, realmente positivas, não excluindo a preclusão do sistema mesmo porque a preclusão consolidou-se como um dos centrais princípios processuais, mas sim diminuindo os seus préstimos em questões pontuais oportunas como: a) a supressão do agravo retido, deixando de ser preclusivas as decisões interlocutórias de menor gravidade; b) a diminuição do tamanho da preclusão na fase instrutória.

 

Referências:

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CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Volume 1. São Paulo: Editora Atlas, 2012.

CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 21ª edição. São Paulo: Editora Malheiros, 2004.

ALVIM, J.E. (José Eduardo Carreira). Código de Processo Civil Reformado. 5ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

DE AZEVEDO, Antonio Danilo Moura. A teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova no direito processual civil brasileiro. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/10264/a-teoria-dinamica-de-distribuicao-do-onus-da-prova-no-direito-processual-civil-brasileiro Acesso em 29.05.2015).

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GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. Introdução ao Direito Processual Civil. Volume 1. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2010.

HARTMANN, Rodolfo Kronemberg. Curso Completo de Processo Civil. Niterói, RJ: Impetus,2014.

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LEITE, Gisele. Roteiro sobre o princípio da boa-fé objetiva. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7293 Acesso em 12.05.2015.

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MARINONI, Luiz Guilherme. Curso de Processo Civil. V.1., Teoria Geral do Processo. 4ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.

MEDINA, José Miguel Garcia. (Coord.). Quadro Comparativo entre o CPC/1973 e o CPC/2015. 2ª versão, revista e atualizada (19.03.2015).

MONTENEGRO FILHO, Misael. Novo Código de Processo Civil. Modificações Substanciais. São Paulo: Editora Atlas, 2015.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Volume Único. 7ª edição. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Editora Método, 2015.

NOGUEIRA, Guilherme Santana. Processo Civil Tomo I. 2ª edição. Rio de Janeiro: Lúmen Juris Editora, 2006.

Novo Código de Processo Civil colaboração de Luiz Roberto Curía, Lívio Céspedes e Fabianna Dias da Rocha. São Paulo: Editora Saraiva, 2015.

PEREIRA, Alexandre Demetrius. [et al.] organização de Tania Faga. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. Vol. I 53ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

SILVA, Edward Carlyle. Direito Processual Civil. 3ª edição. Niterói, RJ: Impetus, 2014.

WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil. Vol. 1., 12ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

 

[1] No século XVIII os franceses tratavam de fenômeno similar ao da preclusão e alcunhavam-no de forclusion, sinônimo de caducidade, que correspondia alternadamente a elementos de direito substantivo e de direito processual.

Atribui-se Chiovenda a sistematização científica do conceito de preclusão, com base nos estudos do processualista alemão Oskar Büllow, que fora o primeiro doutrinador a se preocupar em criar uma conceituação genérica ao instituto, partindo de casos singulares previstos pelo ordenamento jurídico italiano.

 

[2] Como cuidadosamente mencionado por LUIZ GUILHERME MARINONI, a modificação do ônus da prova só deve ocorrer quando “ao autor é impossível, ou muito difícil, provar o fato constitutivo, mas ao réu é viável, ou muito mais fácil, provar a sua inexistência. No que pertine à natureza das regras que fixam a distribuição do ônus da prova entre as partes, a doutrina especializada é divergente. Para uma parte dela, as regras em comento são regras de procedimento, destinadas às partes, indicando-lhes como devem ser suas condutas no processo, notadamente fixando-lhes a função de trazer as provas para o processo. Em contraponto, outra corrente doutrinária, da qual comungamos, sustenta que estas regras determinadoras do ônus probatório são regras de julgamento, dirigida ao juiz, que as utilizará no momento de sua decisão, onerando a parte a quem caberia a prova do fato e não a fez ou a fez de modo insuficiente ou deficiente. Deduz-se disto que estas regras não são destinadas às partes, tampouco postas para determinar como elas devem proceder na produção das provas que lhe competem, mas direcionadas ao juiz para influir na forma de seu julgamento quando o mesmo constatar no processo a ausência ou insuficiência de prova dos fatos ventilados no transcurso do processo. (In DE AZEVEDO, Antonio Danilo Moura. A teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova no direito processual civil brasileiro. Disponível em: http://jus.com.br/artigos/10264/a-teoria-dinamica-de-distribuicao-do-onus-da-prova-no-direito-processual-civil-brasileiro Acesso em 29.05.2015).
[3] Incontestavelmente que o ônus probatório persiste em ser encargo dos litigantes. E, estes competem provar cabalmente os fatos que alegarem. Posto que alegação sem prova é alegação infundada. Mas, por outro lado, ao magistrado também interessa a produção de prova pois a carência probatória ou eventual falha em sua produção certamente prejudicará em muito seu entendimento e capacidade de decidir fundamentadamente. E, na visão publicísta de processo, o juiz pode e deve determinar a prova de ofício, bem como atuar simultaneamente e igual condições com as partes, respeitando sobretudo as garantias constitucionais tais como contraditório, ampla defesa, o devido processo legal e da obrigatoriedade de motivação (agora uma pouco mais complexa), com o escopo primordial de elucidar os fatos imprescindíveis para formação de sua convicção sobre o mérito da causa. Importante ressaltar que apesar da grande ênfase para os negócios processuais, aos litigantes não é permitido pactuar sobre a verdade a ser demonstrada nos autos que se relevante para se decidir a causa.

 

[4] Por conta da topologia no CPC/73 alguns doutrinadores acreditavam que tal dispositivo deva somente ser aplicado à sentença, já que o juiz decide inúmeras questões em momento anterior à sua prolação, sendo o dispositivo aplicável em todas as decisões.

 

[5] Cabe, no entanto, diferenciar a coisa julgada da preclusão. A primeira caracterizada pela imutabilidade. Enquanto que a coisa julgada material tem efeitos exteriores ao processo, a coisa julgada formal opera-se somente no âmbito endoprocessual onde fora proferida a sentença.  Muitos doutrinadores apontam a extrema similitude da coisa julgada formal com a preclusão, posto que seus efeitos se operam tão-somente nos processos em que se deram, ao ponto de chamarem a coisa julgada de preclusão máxima. Havendo doutrinadores, inclusive, que dispensam o conceito de coisa julgada formal, englobando o fenômeno no conceito de preclusão.

[6] Segundo classificação proposta por Teresa Arruda Alvim Wambier, as decisões interlocutórias podem ser distribuídas entre as que: a) Dizem respeito às provas, deferindo-as ou não, e determinando, de ofício, a sua realização;  b) concedem ou não providências urgentes (ou que as prescrevem ex officio); c) admitem (ou não admitem) recursos e declaram em que efeitos estão sendo recebidos; d) que são relativas a nulidades; e) resolvem, de ofício ou a pedido da parte, sobre a possibilidade de terceiros ingressarem no feito; f) se manifestam sobre a validade e a adequação das medidas executivas.

 

[7] Assim, as decisões que não estiverem definidas no art. 1.015 do NCPC, deverão ser atacadas quando da apelação, tendo em vista a já citada alteração no sistema de preclusão e a extinção do agravo retido. Inovação que demonstra evolução, a qual informa que a falta de peça obrigatória não implicará na inadmissibilidade do recurso, se o recorrente após intimado sanar o problema dentro do prazo de 05 dias (art. 932, parágrafo único do NCPC).  Humberto Dalla Bernardina elogia a inovação, pois o código dá mais valor à finalidade ao invés da forma, prezando pela efetividade do processo ao prever que a falta do documento obrigatório não torne inadmissível o recurso.

 

[8] De acordo com as lições de Celso Agrícola Barbi a respeito da preclusão pro judicato,’ o doutrinador explica que não é a perda da faculdade da parte de, em processo novo, suscitar a questão já decidida em processo anterior, mas sim, o poder do juiz de resolver novamente a questão. A verdade que a preclusão para o juiz é uma preclusão sui generis. Evidentemente os atos praticados pelo juiz no processo são diferenciados dos das partes, mas não o suficiente para ser criada uma preclusão particular ao magistrado.

 

[9] Portanto, os prazos classificam-se em: a) Dilatórios e Peremptórios –  O simpósio Nacional de Direito Processual Civil, realizado em 1975, em Curitiba, aprovou o entendimento de que “para os fins do art. 181 CPC/73, por prazo dilatório deve ser entendido o que é fixado por norma dispositiva e por prazo peremptório o fixado por norma cogente”. É dilatório o prazo quando, embora fixado na lei, admite ampliação pelo juiz ou que, por convenção das partes, pode ser reduzido ou ampliado. Reza o art. 181 que “podem as partes, de comum acordo, reduzir ou prorrogar o prazo dilatório; a convenção, porém, só tem eficácia se, requerida antes do vencimento do prazo, se fundar em motivo legítimo”. Já os prazos peremptórios são aqueles que a convenção das partes e, ordinariamente, o próprio juiz, não podem alterar. É o que diz o art. 182 do CPC/73: “é defeso às partes, ainda que todas estejam de acordo, reduzir ou prorrogar os prazos peremptórios”.

[10] Leciona com maestria habitual Cândido Rangel Dinamarco que “a teoria dos prazos está intimamente ligada à das preclusões, porque, máxime num sistema de procedimento rígido como é o brasileiro, sua fixação visa na maior parte dos casos a assegurar a marcha avante, sem retrocessos e livre de esperas indeterminadas”. E, continua o grande processualista mencionando que “nem todos os prazos são preclusivos, ou próprios, pois existem também os prazos impróprios, destituídos de preclusividade.

Desta forma, são impróprios todos os prazos fixados para o juiz, muitos dos concedidos ao Ministério Público no processo civil e quase todo os que dispõem os auxiliares da justiça, justamente porque tais pessoas desempenham funções públicas no processo, onde têm deveres e não faculdades – seria um contrassenso dispensá-las do seu exercício, como penalidade (penalidade?)pelo não exercício tempestivo.

 

[11] Com relação aos prazos próprios, sua duração é a que a lei estabelece, sem possibilidade de alteração por convenção entre as partes. Segundo a doutrina, não podem tais prazos, também ser objeto de suspensão convencional (a suspensão do processo, prevista no artigo 265, II, não impede a fluência dos prazos preclusivos).

[12] Significativo avanço da melhor gestão dos prazos, na medida em que elimina o excessivo número de prazos díspares, para diferentes modalidades de recursos. Estabelece um procedimento comum, aplicável a todas as causas, salvo disposição em contrário, bem como aos procedimentos especiais e ao processo de execução (art. 319), simplificando o rito processual.

 

MENSALIDADE ESCOLAR: Na cobrança de mensalidade escolar, juros incidem a partir do vencimento da parcela

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Os juros de mora em cobrança de mensalidades escolares devem incidir a partir da data de vencimento da dívida. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu o recurso de uma instituição de ensino para reformar decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que havia entendido pela incidência a partir da citação.

O ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, considerou que nos casos que tratam de mora ex re (decorrente do vencimento, ou seja, quando não há necessidade de citação ou interpelação judicial por parte do credor), os juros da dívida são contados a partir do final do prazo para pagamento das obrigações fixadas em acordo.

No processo analisado pela turma, a Fundação Armando Álvares Penteado ajuizou ação de cobrança contra uma aluna para receber a importância de R$ 2.522,33, relativa às parcelas dos meses de setembro, novembro e dezembro de 2004.

Advertência desnecessária

O juízo de primeiro grau condenou a aluna ao pagamento do valor principal acrescido de juros simples de 1% ao mês desde o vencimento das parcelas e correção de acordo com o IGP-M/FGV, conforme pactuado.

Em apelação, o TJSP determinou a incidência dos juros moratórios a partir da citação e manteve os demais termos da sentença. A fundação recorreu ao STJ sustentando que, em tais situações, o próprio tempo constitui o devedor em mora, razão pela qual os encargos deveriam incidir desde o inadimplemento da obrigação, sem a necessidade de citação ou interpelação judicial, conforme dispõe o artigo 397 do Código Civil.

Em seu voto, Villas Bôas Cueva destacou que a questão já foi amplamente debatida no STJ em outras ocasiões, e ficou decidido que os juros devem ser contados a partir do vencimento da prestação, por ser tratar de mora ex re.

Segundo o ministro, “se o devedor acertou um prazo para cumprir a prestação e se não há dúvida quanto ao valor a ser pago, não há também razão para se exigir que o credor o advirta quanto ao inadimplemento”.


 

FONTE: STJ, 22 de setembro de 2015.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: Para Quarta Turma, cláusula que exige honorários em cobrança extrajudicial não é abusiva

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A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou que não é abusiva a cláusula de contrato de leasing que impõe ao consumidor inadimplente a responsabilidade pelo pagamento de honorários advocatícios decorrentes de cobrança extrajudicial. A decisão foi tomada em julgamento de recurso especial interposto pelo Citibank Leasing S/A contra o Ministério Público do Distrito Federal (MP).

O recurso teve origem em ação civil pública ajuizada pelo MP para que fosse declarada a ilegalidade da cláusula. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDF) julgou a ação procedente por entender que o direito aos honorários do advogado deve ser exercido em face de quem o contratou, uma vez que não há relação jurídica que vincule os consumidores àquele profissional.

Além disso, o TJDF destacou que “a fixação prévia de honorários advocatícios impõe ao consumidor o pagamento de despesas sem que ele possa aferir a realidade do pagamento ao causídico”.

Divergência

No STJ, o relator, ministro Marco Buzzi, também considerou a cobrança ilegal. Ele afirmou que os honorários deveriam ser suportados pelo credor e somente então exigidos do devedor, em reembolso, não cabendo “cobrança direta do advogado em relação ao devedor em mora, pois não há entre eles relação jurídica decorrente da celebração do contrato de prestação de serviços advocatícios”.

A maioria do colegiado, entretanto, acompanhou a divergência inaugurada pelo ministro Raul Araújo. Segundo ele, a prática, além de comum, “tem apoio nos artigos 389, 395 e 404 do Código Civil de 2002, que atribuem ao devedor a responsabilidade pelas despesas e prejuízos causados em razão de sua mora ou inadimplemento, neles incluindo expressamente os honorários advocatícios”.

Para o ministro, “não há dúvidas acerca da responsabilidade do devedor pelos honorários advocatícios do profissional que seu comportamento inadimplente obriga o credor a contratar”, obrigação essa que deriva diretamente da lei e “independe de previsão contratual”.

Precedente

Ele citou precedente da Terceira Turma (REsp 1.274.629) que analisou a questão dos honorários à luz do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC) para concluir que a previsão de reembolso das despesas advocatícias deve constar expressamente dos contratos, “com redação clara e ostensiva”, sem o que “a cláusula não obrigará o consumidor”.

No caso analisado, o ministro constatou que ficou demonstrada a existência de cláusula que previa a cobrança de honorários extrajudiciais em caso de mora. “Havendo expressa previsão contratual, não se pode afirmar que a cobrança, ainda que em contrato de adesão, seja indevida. Anote-se que, no caso, a imposição de previsão idêntica em favor do arrendatário é decorrente de extensão legal, nos termos do artigo 51 do CDC, e não depende de expressa previsão contratual”, afirmou.

Raul Araújo disse que seria desnecessário e injustificável exigir que o credor arcasse com o pagamento do advogado para depois ir à Justiça cobrar esses honorários do devedor. Segundo ele, a judicialização da cobrança em tais situações “vai na contramão de um contexto moderno em que se pretende desafogar o Judiciário”.


 

FONTE: STJ, 22 de setembro de 2015.

DIREITO TRIBUTÁRIO: Quarta Turma admite extinção das obrigações de falido sem prova de quitação de tributos

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Em decisão unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que o pedido de extinção das obrigações do falido não exige a apresentação de certidões de quitação fiscal, mas a quitação dada nessas condições não terá repercussão no campo tributário, de acordo com o artigo 191 do Código Tributário Nacional (CTN).

A decisão foi tomada em julgamento de recurso especial interposto por um empresário e uma sociedade empresária falida que ajuizaram ação declaratória de extinção das obrigações da falência. O pedido foi indeferido porque não foram juntadas ao processo as certidões de quitação fiscal.

No STJ, as partes alegaram que, em razão do decurso do prazo de cinco anos do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência, a prescrição relativa às obrigações do falido já teria ocorrido.

Duas possibilidades

O relator, ministro Raul Araújo, entendeu por dar parcial provimento ao recurso. Segundo ele, como o artigo 187 do CTN é taxativo ao dispor que a cobrança judicial do crédito tributário não se sujeita a concurso de credores ou habilitação em falência, concordata, inventário ou arrolamento, não haveria como deixar de inferir que o crédito fiscal não se sujeita aos efeitos da falência.

Para Raul Araújo, o pedido de extinção das obrigações do falido poderá ser deferido, então, de duas maneiras. A primeira, com maior abrangência, quando satisfeitos os requisitos da Lei das Falências e também os do artigo 191 do CTN, mediante a prova de quitação de todos os tributos. A segunda maneira, em menor extensão, quando atendidos apenas os requisitos da lei falimentar, mas sem a prova de quitação dos tributos.

“Na segunda hipótese, como o fisco continua com seu direito independente do juízo falimentar, a solução será a procedência do pedido de declaração de extinção das obrigações do falido consideradas na falência, desde que preenchidos os requisitos da lei falimentar, sem alcançar, porém, as obrigações tributárias, permanecendo a Fazenda Pública com a possibilidade de cobrança de eventual crédito tributário, enquanto não fulminado pela prescrição”, concluiu o relator.


FONTE: STJ, 24 de setembro de 2015.

Os principais argumentos que discutem a redução da maioridade penal

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INTRODUÇÃO

 

A discussão sobre a redução da maioridade penal tem tomado cada vez mais espaço em debates políticos, jurídicos e no meio social. A própria mídia, através de diversos meios de comunicações, tem noticiado, quase que diariamente, alguma novidade sobre os calorosos debates quanto à maioridade penal, especialmente por conta da PEC 171/1993 que, atualmente, encontra-se pendente de análise pelo Senado, já tendo sido aprovada pela Câmara dos Deputados.

Por conta da relevância do tema, o presente artigo visa apresentar os principais argumentos daqueles que defendem a redução da maioridade penal, bem como daqueles que são contrários. Entretanto, antes de tratar propriamente de ambas as correntes, se faz necessário breve análise jurídico-penal sobre a discussão, situando o leitor sobre o presente tema dentro da estrutura analítica do delito e, em seguida, breve análise sobre a PEC 171/93.

 

A MENORIDADE COMO CAUSA DE INIMPUTABILIDADE

 

Cediço que, conforme a maioria da doutrina e jurisprudência, a estrutura analítica do crime é composta pelo fato típico, ilicitude (ou antijuridicidade) e culpabilidade, sedo que as duas primeiras curvam-se para a análise do fato praticado pelo agente e a terceira visa analisar a capacidade de entendimento e autodeterminação do mesmo no momento da ação ou omissão.

Voltando as atenções para o campo da culpabilidade, a doutrina aponta três elementos que integram sua estrutura, qual sejam: a imputabilidade, a exigibilidade de conduta diversa e o potencial conhecimento sobre a ilicitude do fato praticado. A discussão “maioridade penal”, por sua vez, reside no elemento imputabilidade, motivo pelo qual iremos nos ater exclusivamente ao estudo do primeiro elemento da culpabilidade.

Sem maiores delongas, podemos definir a imputabilidade como sendo a “capacidade de imputação, ou seja, possibilidade de se atribuir a alguém a responsabilidade pela prática de uma infração penal”[1].

Ficando a definição de imputabilidade a cargo da doutrina, o Código Penal apenas enumera as causas de inimputabilidade e, para tanto, alguns critérios norteiam o assunto: (a) Critério Biológico (considera apenas o desenvolvimento mental do agente, ignorando a capacidade de entendimento e autodeterminação no momento da ação ou omissão); (b) Critério Psicológico (ao contrário do anterior, considera se, ao tempo da ação ou omissão, o agente possuía capacidade de entendimento e autodeterminação, pouco importando sua idade ou condição mental; e, (c) Critério Biopsicológico (junção dos anteriores, levando em consideração o desenvolvimento mental do agente, bem como a capacidade de entendimento e autodeterminação do mesmo no momento da conduta).

Em relação à menoridade como causa de inimputabilidade, a Constituição Federal e o Código Penal, através de seus artigos 228 e 27, respectivamente, adotaram o Critério Biológico, bastando que o agente tenha idade inferior aos 18 (dezoito) anos no momento da conduta para que seja considerado inimputável de forma absoluta, não se admitindo, portanto, prova em sentido contrário (análise puramente objetiva).

Com isso, surge a seguinte pergunta: quais as razões que levaram o legislador, quando da reforma do Código Penal em 1984, bem como o legislador constituinte originário, a elegerem a idade de 18 anos como início da capacidade penal no Brasil?

O questionamento acima pode levar o leitor a acreditar na existência de algum postulado científico que fundamente tal escolha, acreditando se tratar de eleição fundamentada na física, biologia ou até mesmo na psicologia. Ocorre que, se assim fosse, a escolha dos 18 anos como início da capacidade penal seria realidade universal e, sabemos que não é esta a realidade de outros países, como por exemplo nos Estados Unidos onde a maioridade penal começa entre os 6 a 18 anos, a depender da legislação estadual; ou na Inglaterra, onde a maioridade penal começa aos 10 anos; ou até mesmo na África do Sul, causando espanto ao eleger o início da maioridade penal aos 7 anos de idade.

Com base nos referidos exemplos, podemos concluir que de fato não há postulado científico fundamentando a escolha da maioridade penal, ficando tal eleição à critério da política criminal adotada por cada país. Sendo assim, respondendo a indagação acima, as razões que levaram o legislador a optar pelos 18 anos como gênese da maioridade penal pautaram-se exclusivamente sob critérios de política criminal.

Essa conclusão também se extrai de tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário, valendo citar como exemplo o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (Decreto nº 4.388/02) que, em seu artigo 26, deixa claro (mesmo que indiretamente) da possibilidade da escolha da maioridade penal de idade inferior aos 18 anos, in verbis:

 “Artigo 26

Exclusão da Jurisdição Relativamente a Menores de 18 anos

O Tribunal não terá jurisdição sobre pessoas que, à data da alegada prática do crime, não tenham ainda completado 18 anos de idade”.

No mesmo sentido, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), em seu artigo 5º, §5º, também respeita a política criminal de cada país signatário ao não eleger nenhuma idade, cite-se:

“Artigo 5º – Direito à integridade pessoal.

[…]

5. Os menores, quando puderem ser processados, devem ser separados dos adultos e conduzidos a tribunal especializado, com a maior rapidez possível, para seu tratamento”.

Logo, podemos concluir que a escolha da idade de 18 anos como início da maioridade penal no Brasil se deu puramente por questões de política criminal.

 

BREVES COMENTÁRIOS SOBRE A PEC 171/1993

 

A Proposta de Emenda Constitucional nº 171 de 1993 objetiva, como já foi adiantado, a redução da maioridade penal dos 18 para os 16 anos de idade.

Até o presente momento, a PEC 171/93 encontra-se pendente de análise do Senado para que, em caso de aprovação, seja encaminhada para promulgação em sessão no Congresso Nacional pela Presidente da República.

Importante esclarecer que a PEC 171 não foi levada ao Senado em sua integralidade, isso porque, após derrota no plenário da Câmara dos Deputados (aproximadamente 24 horas após), através de manobra regimental levada a efeito pelo presidente da Casa, Eduardo Cunha, com apoio de grupo de líderes partidários, foi aprovado na Câmara dos Deputados a Emenda Aglutinativa[2] 16, no qual modifica a redação do art. 228 da Constituição Federal, reduzindo a maioridade penal dos 18 para os 16 anos, apenas em relação aos crimes de homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos. Além disso, outra relevante alteração da PEC 171/93 reside no fato de que jovens de 16 a 17 anos, condenados pelos respectivos crimes mencionados, terão que cumprir pena em estabelecimento penal separado dos menores de 16 anos e maiores de 18 anos (como já ocorre, por exemplo, com condenados do sexo masculino e feminino).

O grande absurdo sob o enfoque jurídico reside no fato da mencionada proposta objetivas a redução da maioridade penal apenas para os crimes de homicídio doloso, lesão corporal seguida de morte e crimes hediondos.

Ora, como alhures aludido, a análise da culpabilidade recai sobre o agente no momento da ação ou omissão. Além disso, no caso da menoridade como causa de inimputabilidade, adotou-se o critério biológico, havendo presunção juris et de iure de incapacidade em se tratando de menor de idade.

Sendo assim, como se poderia presumir que um jovem de 17 anos tivesse plenas condições de entendimento e autodeterminação para a prática de um homicídio doloso, por exemplo, e, ao mesmo, se presumir de forma absoluta que o mesmo agente não possui capacidade de entendimento e autodeterminação para a prática de um furto ou lesão corporal simples, por exemplo?

Clarividente que a PEC 171/93 está à margem da técnica jurídico-penal em vigor no Brasil. A conclusão diante do exposto até aqui é simples: ou reduz a maioridade penal em relação a todos os crimes (visto que o critério biológico recai sobre o agente, e não sobre o fato), ou não se reduz para nenhum caso.

Ultrapassada esta breve crítica à PEC 171/93, passaremos a apresentar os principais argumentos que discutem a redução da maioridade penal, sem levar em consideração a emenda aglutinativa 16 acima comentada.

 

PRINCIPAIS ARGUMENTOS DAQUELES QUE SÃO CONTRÁRIOS À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

 

Não contribuição para a diminuição da violência

 

Para os adeptos desta corrente, a redução da maioridade penal não será a solução para a diminuição do índice de criminalidade em nosso país. Entendem se tratar de instrumento de manobra para desviar a atenção da população dos verdadeiros problemas que assolam a sociedade.

Afirmam que os crimes praticados por menores de 18 anos representam porcentagem inferior a 1% (um por cento) se comparado aos crimes praticados por adultos. Nesse sentido, Gilmar Penteado, em matéria publicada no jornal Folha de São Paulo, apresenta dados afirmando se tratar de estatísticas da Secretaria Pública do Estado de São Paulo, cite-se:

“Dados da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo revelam que de janeiro a outubro de 2003 os menores participaram de apenas 1% dos homicídios dolosos, 1,5% do total dos roubos e 2,6% dos latrocínios”.[3]

O problema estaria sendo exageradamente aumentado pela mídia que, apresentando fatos isolados, daria a entender que crimes praticados por menores de 18 anos estariam tomando proporções fora de controle.

 

Inconveniência diante da falência do sistema carcerário

 

Não se discute que o Brasil não possui mínima estrutura prisional necessária para tornar possível a redução da maioridade penal. Não há como atingir a finalidade ressocializadora da pena colocando jovens de 16 e 17 anos de idade juntamente com adultos, criminosos reiterados e em presídios superlotados. Ao contrário, para os jovens isso seria verdadeira “escola para o crime”.

A estrutura prisional do país é uma das piores do mundo. É preciso compreender que há uma enorme falha com relação a isso. Não há, por exemplo, como comparar os índices de criminalidade do Brasil com os índices de países como a Inglaterra, por exemplo, porque a estrutura e o investimento são completamente diversas.

A prioridade não seria primordialmente reduzir a maioridade penal, mas sim reestruturar o sistema prisional brasileiro para que, posteriormente, a redução da maioridade penal tenha ao menos aplicação prática.

Logo, seria necessário, além de investimentos na segurança, a reestruturação do sistema prisional, com a construção de novos presídios, respeitando o limite de acomodações por ambiente, sendo que isso seria apenas o início para que o Brasil ao menos tivesse condições mínimas para alcançar as principais finalidades da pena e, por conseguinte, discutir a redução da maioridade penal.

 

A solução está na educação e na aplicação efetiva do ECA (Lei nº 8.069/90)

 

Para os defensores da não redução da maioridade penal, a solução estaria no investimento efetivo e amplo em educação, bem como na aplicação adequada do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Sem dúvida, a educação (ou a falta de educação) é fator determinante no índice de atos infracionais equiparados a crimes cometidos no Brasil. Basta olharmos para o índice de criminalidade em países desenvolvidos, cuja educação encabeça a lista de suas respectivas prioridades de investimento. A conta é simples: a longo prazo, se não se investe em educação, o índice de crianças e adolescentes marginalizados, ingressando no mundo do crime, aumentará progressivamente.

Não obstante, para esta corrente o ECA já prevê em seu bojo medidas socioeducativas eficientes, e, ainda que assim não fosse, bastaria a criação de medidas socioeducativas mais rigorosas, como por exemplo estender o prazo de internação de três para cinco anos.

O problema residiria na aplicação insuficiente do ECA, ou seja, basta que o Estado utilize dos instrumentos previstos no ECA de forma efetiva, juntamente com o devido e necessário investimento na educação, para que o país consiga caminhar para a solução dessa celeuma.

 

Ofensa a cláusula pétrea

 

Não mais se discute que a maioridade penal é cláusula pétrea implícita, justamente por estar classificada entre os direitos e garantias fundamentais (artigo 228 c.c. artigo 60, §4º, inciso IV, ambos da Constituição Federal).

Apesar de parcela da doutrina tentar equiparar a capacidade estabelecida por outros ramos do direito (Direito Civil, Direito Eleitoral, etc.), levando-se em consideração, por exemplo, a possibilidade de emancipação para os atos da vida cível – ao exemplo do casamento –, ou o direito facultativo de voto aos 16 anos, para viabilizarem a redução da maioridade penal, os defensores da não redução da maioridade penal rechaçam tal argumento sob o fundamento de que tal tese não vincula os direitos universais de ser votado, bem como de não obrigatoriedade do voto, além de que o instituto da emancipação não possui status constitucional.

Além disso, conforme já dito, ao adotar o critério biológico para determinar a menoridade penal, não significa o mesmo que dizer que o jovem de 16 anos não possui discernimento de compreender o caráter ilícito dos próprios atos, mas sim de fixar um critério objetivo para assegurar a segurança jurídica do país.

Diante da adoção do critério biológico (objetivo) por razões de política criminal, bem como diante de previsão constitucional (constituindo verdadeira garantia individual), os defensores dessa corrente entendem pela impossibilidade da redução da maioridade penal, por se tratar de cláusula pétrea.

Nesse sentido, prelecionam Luiz Flávio Gomes e Alice Bianchini:

“Do ponto de vista jurídico é muito questionável que se possa alterar a Constituição brasileira para o fim de reduzir a maioridade penal. A inimputabilidade do menor de dezoito anos foi constitucionalizada (CF, art. 228). Há discussão sobre tratar-se (ou não) de cláusula pétrea (CF, art. 60, § 4.º). Pensamos positivamente, tendo em vista o disposto no art. 5.º, § 2.º, da CF, c/c arts. 60, § 4.º e 228. O art. 60, § 4º, antes citado, veda a deliberação de qualquer emenda constitucional tendente a abolir direito ou garantia individual”.[4]

Logo, diante dos fundamentos acima, seria impossível reduzir a maioridade penal.

 

PRINCIPAIS ARGUMENTOS DAQUELES QUE SÃO FAVORÁVEIS À REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL

 

A redução como medida de justiça e o mito do 1%

 

Para os defensores da redução da maioridade penal, pouco importa a análise de perspectiva futura no sentido de se afirmar se seria ou não a solução para a criminalidade brasileira. Não se trata de analisar o presente debate sob o enfoque do efeito para a redução da violência.

Isso porque, se valem do seguinte raciocínio: analisando casos concretos, se os personagens entre 16 e 18 anos incompletos possuem capacidade de entendimento e autodeterminação para discernirem o caráter ilícito dos fatos por eles praticados, é justo que sejam responsabilizados adequadamente por suas condutas e resultados com pena.

Trata-se da aplicação de um conceito de justiça.

Ou seja, para esta corrente o ideal seria a aplicação do critério biopsicológico, da mesma forma que é utilizado para os maiores de 18 anos, analisando se o agente, ao tempo da conduta, possuía discernimento para entender o caráter ilícito do fato por ele praticado e que, em caso positivo, seja responsabilizado por crime.

Além disso, sob o mesmo fundamento do conceito de justiça, argumentam que o fato de não haver delinquência generalizada entre menores não seria argumento suficiente para impedir a redução da maioridade penal.

Nesse sentido, vale citar que recentemente o colunista da Revista Veja, Leandro Narloch, após profunda pesquisa e contatos com o Ministério da Justiça, Unicef, e outros meios de comunicação, concluiu que as diversas notícias que mencionavam a porcentagem de 1% como sendo parcela dos ilícitos penais praticados por menores em comparação aos adultos não passavam de boatos, inverdades, frutos de diversos cálculos indiretamente relacionados com o tema. Vale transcrever trecho do mencionado artigo:

“O MITO DO 1%

Numa nota contra a redução da maioridade, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) reproduziu a estimativa e deu a Secretaria de Direitos Humanos como referência. Mas a Secretaria de Direitos Humanos diz que nunca produziu uma pesquisa com aqueles dados.

O Congresso em Foco, hospedado pelo UOL, afirma que “segundo o Ministério da Justiça, menores cometem menos de 1% dos crimes no país”. Um punhado de deputados e sites do PT diz a mesma coisa. Mas basta um telefonema para descobrir que o Ministério da Justiça tampouco registra dados de faixa etária de assassinos. “Devem ter se baseado na pesquisa do Unicef”, me disse um assessor de imprensa do ministério.

Seria então o Unicef a fonte da estimativa? Uma reportagem do Globo de semana passada parece resolver o mistério: “Unicef estima em 1% os homicídios cometidos por menores no Brasil”. Mas o Unicef também nega a autoria dos dados. Fiquei dois dias insistindo com o órgão para saber como chegaram ao valor, até a assessora de imprensa admitir que “esse número de 1% não é nosso, é do Globo”. Na reportagem, o próprio técnico do Unicef, Mário Volpi, admite que a informação não existe. “Hoje ninguém sabe quantos homicídios são praticados por esse jovem de 16 ou 17 anos que é alvo da PEC.” Sabe-se lá o motivo, o Globo preferiu ignorar a falta de dados e repetir a ladainha do 1%. O estranho é que o Unicef não emitiu notas à imprensa desmentindo a informação.

Também fui atrás da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo, mas nada: o governo paulista não produz estimativas de faixa etária de assassinos, somente de vítimas. Governos estaduais são geralmente a fonte primária de relatórios sobre violência publicados por ONGs e instituições federais. Se o estado com maior número absoluto de assassinatos no Brasil não tem o número, é difícil acreditar que ele exista. Resumindo: está todo mundo citando uma pesquisa fantasma.

Na verdade, uma estatística parecida até existiu há mais de uma década. Em 2004, um pesquisador da Secretaria da Segurança Pública de São Paulo lançou um estudo afirmando que menores de idade eram responsáveis por 0,97% dos homicídios e 1,5% dos roubos. Foi assim que nasceu a lenda do 1% de crimes cometidos por adolescentes.

Mas a pesquisa de 2004 tropeçou num erro graúdo. Os técnicos calcularam a porcentagem de crimes de menores em relação ao total de homicídios, e não ao total de homicídios esclarecidos. Sem ligar para o fato de que em 90% dos assassinatos a identidade dos agressores não é revelada, pois a polícia não consegue esclarecer os crimes.

Imagine que, de cada 100 homicídios no Brasil, apenas oito são esclarecidos, e que desses oito um foi cometido por adolescentes. Seria um absurdo concluir que apenas um em cada cem homicídios foi praticado por adolescentes. Um estatístico cuidadoso diria que menores foram culpados por um em cada oito crimes esclarecidos (ou 12,5%).

Adotando esse método, os números brasileiros se aproximariam dos de outros países. Nos Estados Unidos, menores praticaram 7% dos homicídios de 2012. No Canadá, 11%. Na Inglaterra, 18% dos crimes violentos (homicídio, tentativa de homicídio, assalto e estupro) vieram de pessoas entre 10 e 17 anos. Tem algo errado ou os adolescentes brasileiros são os mais pacatos do mundo?

Sim, tem algo errado: a estatística”.[5]

Em que pese o mito acima que por muito tempo acalorou os debates sobre a redução da maioridade penal, há também de se levar em consideração o fato de que a presunção absoluta no sentido de ser o menor de idade inimputável tem gerado enorme revolta em parcela considerável da sociedade, isso por conta do sentimento de injustiça e impunidade. Nesse diapasão, bem observa Rogério Greco:

“Tal presunção, nos dias de hoje, tem gerado revolta na sociedade, que presencia, com impressionante frequência, menores de 18 anos praticando toda sorte de injustos penais, valendo-se, até mesmo, da certeza da impunidade que a sua particular condição lhe proporciona”.[6]

Clarividente que esta corrente lança ao descrédito a política criminal adotada pelo legislador quando da reforma do Código Penal em 1984, por acreditarem ser mais justo a adoção do sistema biopsicológico para a aferição de imputabilidade dos personagens menores de 18 anos e maiores de 16 anos.

 

Criação de um sistema prisional diferenciado

 

Para os adeptos dessa corrente, reduzir a maioridade penal não significaria a colocação de jovens para o cumprimento de pena juntamente com adultos, como tenta fazer crer a corrente anterior.

A redução da maioridade penal estaria umbilicalmente ligada à necessidade de um sistema prisional apto a receber agentes condenados a penas privativa de liberdade entre os 16 e 18 anos incompletos, ao exemplo da divisão carcerária entre homens e mulheres.

Sendo assim, a redução não mudaria apenas a baliza para aferição de imputabilidade, mas também alteraria o próprio sistema prisional brasileiro.

 

A impotência do ECA para remediar casos mais graves

 

Defendem pela insuficiência na aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente em casos mais graves, diante de medidas socioeducativas incompatíveis e desproporcionais com a gravidade de determinados crimes praticados por menores.

Não haveria proporção na aplicação de medidas socioeducativas para jovens latrocidas, homicidas, traficantes, estupradores, etc.

A simples aplicação das medidas previstas no ECA aos menores que praticam crimes de maior gravidade acabam por gerar, invariavelmente, sentimento de revolta na população. Nesse sentido, explica Rogério Greco:

“O argumento de que ao inimputável por imaturidade natural que pratica um ato infracional será aplicada a medida socioeducativa, nos termos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/90), não tem o condão de convencer a sociedade, que cada dia pugna pela redução da maioridade penal para os 16 anos”.[7]

Para os defensores desta corrente, não haveria eficácia alguma na aplicação de medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente para um jovem com 17 anos, por exemplo, que estupra ou mata com dolo direto.

Nesses casos mais graves, somente a pena privativa de liberdade prevista no Código Penal seria proporcionalmente capaz de reprimir tais barbaridades, além de possibilitar o alcance da prevenção geral, finalidade essa acaba por inalcançável ao utilizar-se de medidas socioeducativas.

 

A modificação do art. 228 da Constituição Federal não é inconstitucional

 

Parcela considerável da doutrina entende que a alteração do art. 228 da CF/88 não seria inconstitucional, isso porque o art. 60, §4º, da Bíblia Política proíbe apenas emenda que busque abolir os direitos e garantias individuais e, reduzindo-se a maioridade penal, a referida garantia individual não seria subtraída, mas sim readequada à atual realidade do nosso país.

Nesse sentido, vale citar o entendimento de Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino:

“Essa expressão, vazada no caput do §4º do art. 60 da Carta, ponta o verdadeiro sentido e alcance das chamadas cláusulas pétreas.

Da expressão “tendente a abolir” infere-se, com segurança, que nem sempre aprovação de uma emenda à Constituição tratando de uma das matérias arroladas nos incisos do § 4º do art. 60 afrontará cláusula pétrea. Somente haverá desrespeito a cláusula pétrea, caso a emenda “tenda” a suprimir uma das matérias ali arroladas. O simples fato de uma daquelas matérias ser objeto de emenda não constitui, necessariamente, ofensa a cláusula pétrea (expressões, muitas vezes utilizadas pela doutrina e pelos tribunais, tais como “cláusulas de imutabilidade”, “núcleo imodificável”, “cláusula de imodificabilidade”, “intangibilidade absoluta”, devem ser compreendidas como verdadeiras hipérboles, cunhadas com o escopo de se enfatizar a importância das matérias que receberam do constituinte originário a especial proteção ora em estudo.

(…) Como se disse, o simples fato de uma emenda versar sobre assunto gravado como cláusula pétrea não a torna inconstitucional. É que o texto proíbe tão só emenda “tendente a abolir” as matérias enumeradas no §4º do art. 60 (incisos I a IV). Assim, caso o texto da emenda não restrinja os direitos e garantias individuais, não enfraqueça a forma federativa de Estado etc., não há que se cogitar ofensa a cláusula pétrea”.[8]

O Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, já firmou orientação no mesmo sentido, nas palavras do Ministro Sepúlveda Pertence:

“As limitações materiais ao poder constituinte de reforma, que o art. 60, § 4º, da Lei Fundamental enumera não significam a intangibilidade literal da respectiva disciplina na Constituição originária, mas apenas a proteção do núcleo essencial dos princípio e institutos cuja preservação nelas se protege”.[9]

Ou seja, a modificação do art. 228 da CF não seria inconstitucional, ao passo que o art. 60, §4º, da Lei Maior estabelece que “não será objeto de deliberação a proposta de emenda constitucional tendente a abolir os direitos e garantias individuais” e, conforme já dito, a redução da maioridade penal aboliria a garantia individual da maioridade penal, mas apenas readequaria a norma do art. 228 aos atuais anseios da sociedade, aplicando de forma eficaz penas para os agentes com idade entre os 16 e 18 anos incompletos, com capacidade de entendimento e autodeterminação.

Obviamente, a política criminal que influenciou o legislador em 1984 e o legislador constituinte originário de 1988 já não é mais a mesma, especialmente pelo aumento do índice de ilícitos penais praticados por menores e pelo avanço dos meios de comunicação que proporcionaram precoce alcance de entendimento e maturidade daqueles que ainda não atingiram a maioridade.

 

CONCLUSÃO

 

Diante de todo o exposto acima, considerando todos os argumentos que gravitam em torno da discussão da maioridade penal, não vislumbramos qualquer das correntes com absoluta razão.

Da mesma forma, não enxergamos óbice constitucional capaz de inviabilizar a redução da maioridade penal. Ao contrário, tal medida seria perfeitamente possível, pautando-se por critérios de política criminal, assim como também o fez o legislador constituinte originário.

Entretanto, somos partidários do seguinte entendimento: se o Estado demonstrar que investiu a longo prazo e de forma efetiva na educação, se demonstrar que investiu no esporte, na saúde, saneamento básico, bem como demonstrar que aplicou rigorosamente o ECA, objetivando de todas as formas desviar a criança e o adolescente do caminho da criminalidade e ainda assim o problema persistir, aí sim defenderemos a redução da maioridade penal.

Ocorre que essa não é a realidade do Brasil. Um país que pouco investe na educação, com enorme desigualdade social, que não aplica o ECA de maneira devida, não pode agora querer reduzir a maioridade penal como forma de resposta à sociedade. Ao contrário, reduzir a maioridade penal hoje seria verdadeiro instrumento nas mãos de políticos corruptos e egoístas de tentarem de alguma forma induzir a ideia de que estariam trabalhando para reduzir a criminalidade no país, quando na verdade já estão em débito com o povo brasileiro há muitos anos quando optaram pela corrupção ao invés de investirem rigorosamente em educação.

Portanto, apesar de entendermos possível, concluímos por inviável a redução da maioridade penal no atual cenário do nosso país, não descartando, entretanto, a redução da maioridade em futuro distante, no caso do Estado comprovar que mesmo não falhando o problema persistiu.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – Parte Geral. Salvador: Editora Jus Podivm, 2ª edição. 2014.

 

GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Redução da maioridade penal. Disponível em: http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080414120820300&mode=print Acesso em 11 de setembro 2015.

 

GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 15ª. edição. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2013.

 

NARLOCH, Leandro. Mito: “Os adolescentes cometem menos de 1% dos homicídios do Brasil e são 36% das vítimas”. Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/cacador-de-mitos/2015/04/09/mito-os-adolescentes-cometem-menos-de-1-dos-homicidios-do-brasil-e-sao-36-das-vitimas/. Acessado em 11 de setembro de 2015.

 

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 7ª edição, São Paulo: Editora Método, 2011.

 

PENTEADO, Gilmar. “Menor participa de 1% dos homicídios em SP,” Folha de S. Paulo, 1 de janeiro de 2004, pág. C3.

 

Supremo Tribunal Federal. MS 23.047-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.2003.

[1] CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – Parte Geral. Salvador: Editora Jus Podivm, 2ª edição. 2014, p. 258.

[2] Conforme o § 3º do artigo 118 do Regimento Interno da Câmara dos Deputados, “emenda aglutinativa é a que resulta da fusão de outras emendas, ou destas com o texto, por transação tendente à aproximação dos respectivos objetos”.

[3] Gilmar Penteado, “Menor participa de 1% dos homicídios em SP,” Folha de S. Paulo, 1 de janeiro de 2004, pág. C3.

[4] GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. Redução da maioridade penal. Disponível em: http://ww3.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20080414120820300&mode=print Acesso em 11 de setembro 2015.

[5] NARLOCH, Leandro. Mito: “Os adolescentes cometem menos de 1% dos homicídios do Brasil e são 36% das vítimas”. Disponível em: http://veja.abril.com.br/blog/cacador-de-mitos/2015/04/09/mito-os-adolescentes-cometem-menos-de-1-dos-homicidios-do-brasil-e-sao-36-das-vitimas/. Acessado em 11 de setembro de 2015.

[6] GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral. 15. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2013, p. 390.

[7] Ob. cit. 2013, p. 390.

[8] PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo, Direito Constitucional Descomplicado, 7ª edição, São Paulo: Método, 2011, p. 612-614.

[9] MS 23.047-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.2003.

PROCESSO CIVIL, ESTATÍSTICAS E DIREITO COMPARADO: TRÊS SUGESTÕES

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PROCESSO CIVIL, ESTATÍSTICAS E DIREITO COMPARADO: TRÊS SUGESTÕES
CIVIL PROCEDURE, STATISTICS AND COMPARATIVE LAW: THREE SUGGESTIONS

Thiago Serrano Lewis (Analista Judiciário na Justiça do Trabalho, Ex-Técnico Judiciário na Justiça Federal, Ex-Estagiário na Justiça Estadual, Especialista em Direito Processual Civil pelas Faculdades Integradas de Jacarepaguá, Professor de Direito Processual Civil na Faculdade Maurício de Nassau)

Ana Mirela da Silva Dantas Lewis (Discente do Curso de Direito da Faculdade Maurício de Nassau)

Resumo: Por meio deste trabalho, o Direito Processual Civil Brasileiro é comparado com Direitos Processuais de outros países, objetivando localização de deficiências e sugestão de aprimoramentos. Através de métodos indutivo, dedutivo e comparativo, com base em pesquisa bibliográfica e referências estatísticas, chega-se à conclusão de que o Processo Civil do país é mais deficiente do que a média internacional em termos de celeridade e que, portanto, alterações mais enérgicas na legislação processual seriam positivas. São abordadas a relativização da exigência de fundamentos em sentenças, a atribuição excepcional de efeito suspensivo aos recursos e a imutabilidade de decisões relativas a direitos menos vultosos.

Palavras-chave: Direito Processual Civil; Estatísticas; Direito Comparado; Sugestões.

Abstract: By this work, the Brazilian Civil Procedural Law is compared to Procedural Laws in other countries, aiming to find deficiencies and suggest improvements. By inductive, deductive and comparative methods, based on literature references and statistics, we can take the conclusion that the country’s Civil Procedure is more deficient than the international average in terms of speed and that therefore bigger changes in procedural law would be positives. Are discussed the relativization in the requirement of motivation in judgments, the exceptional granting of appeal’s suspensive effect and the immutability of decisions regarding less significant rights.

Keywords: Civil Procedural Law; Statistics; Comparative Law; Suggestions.

Sumário: Introdução. 1 Relativizar a exigência de fundamentação em julgamentos. 2 Atribuir efeito suspensivo aos recursos excepcionalmente. 3 Tornar irrecorríveis sentenças que envolvem direitos disponíveis em até determinado valor. Conclusão. Referências.

 

INTRODUÇÃO

Em uma avaliação feita entre 189 países, constatou-se que o Judiciário Brasileiro é 121º mais eficiente. Em termos de celeridade, é o 146º mais rápido. Os dados são de estudo do Grupo Banco Mundial[1], que, embora mencione o título “Execução de Contratos”, também engloba fase processual de conhecimento, conforme demonstra sua metodologia[2].

Diante de tal estatística, constata-se que o processo brasileiro é um dos mais lentos do mundo.

Por que o processo brasileiro é tão moroso? Os Magistrados são lentos? Não, pelo contrário.

Cada Magistrado julgou, em média, 1.564 processos no ano-base (2013) do último relatório Justiça em Números, produzido pelo Conselho Nacional de Justiça[3]. Considerando os dias úteis de trabalho (normalmente menos de 200 dias por ano) e considerando que, em sua jornada, o Magistrado tem outras atividades além de julgar, podemos estimar que cada processo foi julgado em cerca de 45 minutos.

Para julgar cada causa, o Magistrado deve ler uma média de 10 a 50 páginas de petições, analisar diversos documentos, lembrar-se do que foi dito em audiência ou reler sua ata, fazer eventuais pesquisas e escrever uma média entre 2 e 10 páginas de sentença ou voto (números estimados com base na experiência de um dos autores em três esferas do Judiciário). Tudo isso em meros 45 minutos. Ainda que sejam consideradas as causas repetitivas e a eventual ajuda de Assessores, a carga de trabalho dos Magistrados continua sendo extrema. Conforme o caso, para a realização adequada de tantas tarefas, seria necessário um dia inteiro de trabalho destinado exclusivamente a uma única sentença.

Sendo gravíssima a situação do processo brasileiro, todas as medidas no sentido da celeridade processual deveriam ser concretizadas.

Por meio deste texto, são abordados exemplos de práticas processuais do Direito Comparado que poderiam (e deveriam) ser adotadas no Brasil para que nosso deficiente processo fosse aprimorado.

1 Relativizar a exigência de fundamentação em julgamentos.

Como se observa com o art. 489, § 1º, do novo Código de Processo Civil (CPC), o Legislador estabeleceu mais requisitos relativos à fundamentação das sentenças, exigindo, na prática, que sejam mais fundamentadas do que já são.

Sob primeira análise, a medida parece positiva. Mais fundamentação, mais cuidado nos julgamentos, mais justiça nas decisões.

Voltemos, porém, aos números acima referidos. O Judiciário Brasileiro é extremamente lento, e não por culpa dos Juízes. Devemos nos espelhar na média mundial para deixar as últimas colocações em termos de celeridade.

Entendemos, portanto, que foi equivocada a escolha do Legislador. Não deveria ter elevado as exigências relativas à fundamentação dos julgados. Aliás, entendemos que o Legislador deveria ter caminhado em sentido oposto, deveria ter dispensado a fundamentação em muitos dos julgados.

Decisões não fundamentadas? Parece absurda a sugestão, mas não é. Em reforço a tal possibilidade, seguem referências do Direito Comparado.

O site do Senado Federal publicou, com o título “A Sentença Estrangeira sem Fundamentação Pode Ser Homologada?”, artigo de Marcela Harumi Takahashi Pereira[4]. Em seu texto, constam os seguintes trechos:

 

No processo civil alemão, a fundamentação é dispensada: “nos casos em que ocorrer revelia, desistência da ação ou reconhecimento jurídico do pedido” (TUCCI, 1987, p. 82-83); e “quando as partes, após o encerramento da instrução, mas antes da sentença, desistirem da interposição de recurso” (TUCCI, 1987, p. 82-83), caso em que as custas judiciais serão reduzidas (SEC 5.157-6 – Alemanha, rel. Néri da Silveira, j. em 19.06.96).

 

Na Inglaterra e nos Estados Unidos, de onde às vezes nos vêm sentenças desmotivadas, não existe lei que obrigue os juízes a fundamentarem suas decisões. Mas, nesses países, o julgador desempenha um papel passivo, e os protagonistas do processo são as partes. Enquanto o civil law – tradição à qual nos filiamos – tende ao processo inquisitivo, o common law – que inclui os Estados Unidos e a Inglaterra – tende ao adversarial.

 

Portanto, como se observa pelas transcrições, nos Estados Unidos, na Inglaterra e na Alemanha, muitos dos julgamentos não são fundamentados.

Além do Direito Comparado, o próprio Ordenamento Jurídico Brasileiro fornece exemplo de julgamento sem fundamentação: o que ocorre no Tribunal do Júri (exceto na parte relativa à dosimetria da pena).

O Jurista pode argumentar que a dispensa de fundamentação ocorre pelo fato de o Tribunal do Júri ser formado por representantes da sociedade, sem exigência de graduação em Direito, e que tal dispensa não se justificaria perante os Juízes de carreira. Não nos parece, contudo, argumento razoável. O Tribunal do Júri trata justamente dos processos mais delicados do ordenamento jurídico, os que envolvem crimes dolosos contra a vida, e não costuma ter a qualidade de suas decisões questionada pelos Doutrinadores.

Há quem diga que a ausência de fundamentação inviabilizaria o oferecimento de recursos. Entendemos que não formaria qualquer obstáculo à recorribilidade. Assim como são possíveis recursos em face do Júri quando a decisão é contrária às regras jurídicas ou à prova dos autos (art. 593, III, do Código de Processo Penal), sentenças civis sem fundamentação admitiriam plena recorribilidade.

A falta de fundamentação diminuiria a qualidade dos julgamentos? Talvez sim, mas diminuiria pouco. Alguns detalhes poderiam passar despercebidos pelos Juízes. Mas a inovação tornaria os julgamentos extremamente mais céleres. Numa estimativa baseada em matemática empírica, a falta de fundamentação poderia diminuir a qualidade dos julgamentos em 10% a 20%, mas poderia aumentar a celeridade em 100% a 200% (ou mais).

Se a dispensa da fundamentação em todos os processos seria uma mudança muito radical, poderia ocorrer apenas com determinados tipos de ações, como, por exemplo, as seguintes:

  1. Processos relacionados a direitos disponíveis;
  2. Processos relacionados a obrigações de valores inferiores a determinados patamares;
  3. Quando a(s) parte(s), com vistas à celeridade processual, autorizar(em) a dispensa da fundamentação (alternativa adotada na Alemanha, conforme referência acima transcrita).

A presente ideia, mesmo com as limitações sugeridas nos itens acima, costuma encontrar resistência nos círculos de debate, tanto profissionais quanto acadêmicos. De fato, uma mudança profunda sobre séculos de tradição jurídica não seria aceita facilmente. Mas o ranking internacional de celeridade e os exemplos de países mais desenvolvidos (além do exemplo do próprio ordenamento brasileiro – Tribunal do Júri) demonstram a necessidade de quebra de paradigmas.

2 Atribuir efeito suspensivo aos recursos excepcionalmente.

Diferentemente da sugestão acima, a presente ideia não é isolada, encontra correspondência em inúmeras doutrinas que tratam do novo CPC. São muito comuns opiniões no sentido de que o Legislador deveria ter ampliado as hipóteses de recursos sem efeito suspensivo.

A regulamentação do tema, constante nos arts. 520 e 521 do CPC anterior e no art. 1.012 do novo Código, não passou por alterações substanciais. Continua sendo regra a ausência de efeito suspensivo no recurso de apelação, o que inviabiliza a execução provisória da sentença.

O argumento principal pela manutenção do efeito suspensivo como regra genérica é a possibilidade de modificação do julgado. Parece razoável. Se o julgamento pode ser modificado, sua concretização imediata aparenta ser temerária. O condenado e executado provisoriamente, se vence nas instâncias superiores, pode ter sua esfera de direitos violada.

Outro ponto de vista, contudo, demonstra-se adequado. É extremamente comum o vencedor de uma demanda não receber o que lhe é de direito. É o que ocorre, por exemplo, nas incontáveis execuções de valor cujos demandados não têm bens penhoráveis. Qualquer vara que trate de ações condenatórias civis (a maioria das varas do Brasil) tem em seu acervo inúmeros processos em tal situação. Portanto, o credor de uma obrigação está sempre sob o risco considerável de não receber o que lhe é de direito.

Se o credor está sempre sob o perigo da injustiça, por que não submeter, eventualmente, o devedor a esse perigo? Por que a demora do processo deve penalizar somente o credor? Aliás, por exercício de lógica, é intuitivo afirmar: se as circunstâncias do processo devem prejudicar alguém, que seja o devedor, e não o credor. O devedor, como a própria gramática do nome revela, está em dívida, está com mais do que tinha de estar. Consequentemente, o ordenamento jurídico deveria fornecer mais cuidados ao credor do que ao devedor.

Mas, como afirmado, o novo CPC praticamente não avançou quanto aos efeitos recursais. Continua mantendo como regra a impossibilidade de execução provisória. Permanece protegendo de maneira extrema o devedor. Enquanto isso, um número enorme de credores tem suas execuções frustradas no Brasil.

Sugere-se, em síntese, distribuição mais equânime dos riscos da execução. O autor frequentemente não recebe o que lhe é de direito. Deixemos o réu, então, eventualmente com o risco de pagar mais do que é devido.

A sugestão encontra ressonância em outras legislações.

A respeito do Direito Italiano, Ravi de Medeiros Peixoto[5] informa o seguinte:

 

A partir do uso do direito comparado, observamos que no direito italiano, o efeito suspensivo é tido no segundo plano, em face da celeridade processual, conforme é possível auferir do art. 282 do CPC italiano. Neste ordenamento jurídico, a regra é pela não concessão do efeito suspensivo.

 

Situação semelhante é relatada, a respeito do Direito Inglês, por Rosana Silva[6]:

Na Inglaterra, por sua vez, a sentença é de imediato executiva, a menos que seja determinada a suspensão da execução (stay of execution). Normalmente, essa suspensão é concedida apenas em situações especiais, desde que preenchidas certas condições, como, por exemplo, a possibilidade de êxito no recurso de apelação.

Ainda como exemplo, o Código de Processo Civil de Portugal, em seu art. 647-1, assim dispõe: “A apelação tem efeito meramente devolutivo, exceto nos casos previstos nos números seguintes (…)[7].

Com o exposto, demonstra-se que a concessão de efeito suspensivo aos recursos como regra geral é algo que afronta argumentos de lógica e referências do Direito Comparado. Não deveria, portanto, constar no novo CPC.

3 Tornar irrecorríveis sentenças que envolvem direitos disponíveis em até determinado valor.

Os recursos servem como garantia de direitos, para que o indivíduo não fique excessivamente submetido ao arbítrio do julgador. De fato, como ser humano que é, o juiz pode errar, tanto in procedendo quanto in judicando. Logo, é razoável que se permita ao irresignado, como regra genérica, a reanálise da sua situação. Além disso, quanto mais reavaliada uma decisão, mais aprimorada ela fica.

Em síntese, os recursos têm de existir. Mas no Brasil há, obviamente, um exagero na sua utilização.

Um bom exemplo para demonstrar isso é a comparação entre o número de processos julgados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América.

As referências divergem quanto ao número de ações apreciadas por ambos anualmente, mas a disparidade, seja qual for a base de dados considerada, é enorme.

Segundo notícia publicada no jornal Gazeta do Povo[8], o STF julgou cerca de 70.000 recursos em 2013, enquanto a Suprema Corte dos EUA julgou cerca de 60 (não “sessenta mil”, mas somente “sessenta”). De acordo com esses dados, para cada processo julgado pela Suprema Corte dos EUA, o STF teria julgado 1.167 processos.

Por sua vez, no site Direitonet, consta artigo de Gabriel Nogueira[9] com a seguinte informação: “enquanto são julgados menos de 200 (duzentos) recursos por ano nos EUA, no Brasil são apreciados e julgados por nossa corte maior mais de 20.000 (vinte mil) no ano”. Trata-se de estimativa mais conservadora, porém, ainda assim, demonstrativa de extrema disparidade: para cada processo julgado pela Suprema Corte dos EUA, o STF teria julgado 100 processos.

“Mil, cento e sessenta e sete vezes mais recursos” ou “cem vezes mais recursos” na nossa Suprema Corte em comparação com a norte-americana. Seja qual for a estatística mais aproximada da realidade, demonstra que a disparidade é absurda, revela que o processo brasileiro sofre de carências extremas, devendo passar por substancial aprimoramento.

Voltamos a afirmar que, a respeito dos recursos, o Legislador do novo CPC não estabeleceu melhora considerável. Poderia ter ido além em suas reformas. Poderia ter estabelecido irrecorribilidade em determinados tipos de ações.

Parece grande ousadia a defesa da irrecorribilidade, parece até contrária às justificativas apresentadas no início deste tópico, mas a medida é, sim, defensável.

Obviamente, a irrecorribilidade seria adequada para ações de menor vulto. Por exemplo, as que envolvessem cobranças inferiores a vinte ou a dez salários mínimos. Naturalmente, os indivíduos ficariam mais sujeitos ao arbítrio dos juízes em tais situações. Mas os juízes normalmente não erram. Quando errassem, os prejuízos à esfera de direitos dos indivíduos seriam reduzidos. Em compensação, as instâncias recursais seriam consideravelmente desafogadas e os processos seriam solucionados mais brevemente. Assim, o Brasil saltaria posições no ranking internacional de celeridade e, indiretamente, atrairia mais investimentos externos. Enfim, a relação “custo x benefício” seria compensatória.

Mais uma vez, o Direito Comparado serve como base para os presentes argumentos.

O Código de Processo Civil Português, também mencionado acima[10] denomina como recursos ordinários os de apelação e de revista (art. 627-2). A respeito de tais recursos, embora admita exceções em seu art. 629-2, diz o seguinte no art. 629-1:

 

O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.

 

Outra referência é o Processo Civil Alemão. Seguem palavras de Edson Rodrigues Baptista[11] a respeito do assunto:

 

No Direito Alemão, o recurso de apelação é cabível em face de sentença definitiva proferida por órgão jurisdicional de primeira instância (…) Em se tratando de controvérsias de natureza patrimonial, a apelação somente é admissível quando o gravame exceder a certo valor.

No mais, assim como o Tribunal do Júri serve como referência brasileira para a ausência de fundamentação em julgados, também temos em nossa legislação referência para a irrecorribilidade. A Lei nº 5.584/70, em seu art. 2º, §§ 3º e 4º, estabelece irrecorribilidade, quanto a matérias não constitucionais, em processos que envolvem menos de dois salários mínimos no âmbito da Justiça do Trabalho.

Por fim, com a necessidade de observância dos precedentes jurisprudenciais (o que foi estabelecido pelo Legislador com o art. 489, § 1º, VI, e o art. 927 do novo CPC), os Magistrados seguirão mais rigorosamente os julgamentos das instâncias superiores. Assim, parte da função dos recursos (uniformização de jurisprudência) terá sua utilidade substancialmente reduzida. Eis, portanto, mais um argumento, este surgido recentemente, em defesa da presente ideia.

 

CONCLUSÃO

O novo Código de Processo Civil estabeleceu alguns avanços pela celeridade processual.

A necessidade de observância dos precedentes jurisprudenciais (art. 489, § 1º, VI, e art. 927), que deriva em decisões mais uniformes e menos recursos, é algo positivo. As críticas acima dirigidas ao art. 489, § 1º são referentes aos seus demais incisos.

A elevação dos valores das multas por litigância de má-fé (art. 81) evita protelação indevida e também resulta em mais celeridade.

A realização da audiência de conciliação antes que seja preparada a contestação (arts. 334 e 335) também é procedimento dos mais elogiáveis, pois favorece a composição amigável das lides e poupa o trabalho dos Advogados.

O novo CPC, no entanto, deveria ter ido além. O Brasil tem um dos processos mais lentos do mundo. Portanto, pode-se dizer que é um dos mais deficientes do ponto de vista científico. As mudanças estabelecidas com o novo código foram limitadas e, em alguns aspectos, representaram retrocesso, como relativamente à exigência de fundamentação exaustiva nos julgamentos (art. 489, § 1º, I a V).

Os principais valores a serem satisfeitos pelo ordenamento jurídico são justiça e segurança jurídica. O processo brasileiro já busca por justiça em níveis exaustivos. Os incontáveis recursos em diversas instâncias, os inúmeros meios conferidos às partes para a defesa dos seus argumentos e a relativização da coisa julgada são atributos que viabilizam decisões muito refletidas.

É tempo, portanto, de mais cuidado com a segurança jurídica. Um processo lento traz constante sensação de insegurança aos indivíduos. Insegurança e insatisfação diante das instituições estatais.

Por fim, salientamos que um processo lento, em última análise, traz obstáculos ao crescimento da economia e empobrece a sociedade. O relatório informado na introdução deste artigo, o qual coloca o processo brasileiro na posição 146º/189 em termos de celeridade, foi elaborado pelo Banco Mundial para recomendar às empresas os melhores ambientes para a realização de negócios. Nosso Processo Civil, portanto, é um “cartão de visitas” negativo para a atração de investimentos externos.

 

REFERÊNCIAS

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______. Lei nº 5.584, de 26 de junho de 1970. Atualizada até 29 de julho de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/leis/L5584.htm>. Acesso em: 29 jul. 2015.

______. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973: Institui o Código de Processo Civil. Atualizada até 29 de julho de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 29 jul. 2015.

______. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015: Código de Processo Civil. Atualizada até 29 de julho de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13105.htm>. Acesso em: 29 jul. 2015.

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[1] GRUPO BANCO MUNDIAL. Doing Business: Medindo Regulamentação de Negócios. Washington, DC, p. 1, 2014. Disponível em: <http://portugues.doingbusiness.org/data/exploretopics/enforcing-contracts>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[2] ______. Doing Business: Medindo Regulamentação de Negócios: Metodologia. Washington, DC, p. 1, 2014. Disponível em: <http://portugues.doingbusiness.org/Methodology/enforcing-contracts>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[3] BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Justiça em Números 2014. Brasília, DF, p. 39, 2014. Disponível em: <http://cnj.jus.br/programas-e-acoes/pj-justica-em-numeros>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[4] PEREIRA, Marcela Harumi Takahashi. A Sentença Estrangeira sem Fundamentação Pode Ser Homologada? Revista de Informação Legislativa do Senado Federal, Brasília, DF, v. 43, n. 169, p. 220-221, jan./mar. 2006. Disponível em: <http://www2.senado.leg.br/bdsf/item/id/92448>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[5] PEIXOTO, Ravi de Medeiros. Breves considerações sobre os efeitos dos recursos. Revista Âmbito Jurídico, Rio Grande, RS, ano 13, n. 74, p. 1, mar. 2010. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7366>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[6] SILVA, Rosana Josefa Martins Dias Bizarro Borges Cardoso da. Efetividade da Tutela Executiva Defensiva: Enfoque Comparado. Revista CADE-FMJ, Rio de Janeiro, RJ, p. 7, 2001. Disponível em: <http://www.mackenzie.br/fileadmin/FMJRJ/coordenadoria_pesq/Revista_CADE/CADE_8/tutela.doc>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[7] PORTUGAL. Código de Processo Civil. Atualizado até 26 de junho de 2013. p. 3603, Disponível em: <http://www.dgpj.mj.pt/sections/leis-da-justica/livro-iii-leis-civis-e/leis-de-processo-civil/codigo-de-processo-civil>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[8] GAZETA DO POVO apud PARANÁ, Ministério Público. MP na Imprensa. Curitiba, PR, p. 15, 02 mai. 2014. Disponível em: <http://www.mppr.mp.br/arquivos/File/imprensa/2014/Clipping/0205.pdf>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[9] NOGUEIRA, Gabriel José de Andrade. Recursos ordinários e extraordinários: peculiaridades e divergências doutrinárias. Direitonet, Sorocaba, SP, p. 1, 28 abr. 2012. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/7242/Recursos-ordinarios-e-extraordinarios-peculiaridades-e-divergencias-doutrinarias>. Acesso em: 29 jul. 2015.

[10] Op. cit., p. 3599.

[11] BAPTISTA, Edson Rodrigues. Apelação Civil no Direito Comparado. Rio de Janeiro, RJ: Universidade Cândido Mendes, p. 33, 2010. Disponível em: <http://www.avm.edu.br/docpdf/monografias_publicadas/k212260.pdf>. Acesso em: 29 jul. 2015.