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CONSTITUIÇÃO EM MORA NO CONTRATO DE LEASING Notificação extrajudicial dá ciência de dívida

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DECISÃO: *TJ-MT – A empresa Safra Leasing S. A. Arrendamento Mercantil conseguiu reverter sentença de Primeira Instância que, nos autos de uma ação de reintegração de posse contra Nova Distribuidora de Bebidas Ltda., julgara extinto o processo, sem julgamento do mérito. Isso porque a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso entendeu, por unanimidade, que foram comprovadas a mora e a notificação prévia do devedor, exigências da ação.  

A Ação de Reintegração de Posse nº 45517/2011 tem por base o contrato de arrendamento mercantil n.º 75.117.576-5, para aquisição de um conjunto de bitrem (carreta/semi-reboque/carroceria) SR Fachini, ano 2006, celebrado em 16 junho de 2006, no valor de R$114.579,36, a serem pagos em 48 parcelas, entretanto apenas oito foram pagas.  

O apelante alegou ter interesse de agir e apontou que a ação de reintegração seria o único meio disponível para receber o crédito. Defendeu que a mora restou caracterizada pela recusa do devedor em fazer o pagamento, bem como pela notificação extrajudicial. Negou a existência de encargos abusivos no contrato celebrado. Pugnou pelo provimento do recurso para reformar a sentença e julgar procedentes os pedidos e inverter os ônus da sucumbência. 

Para o relator, desembargador Guiomar Teodoro Borges, em casos como o apresentado, para se buscar a proteção possessória, liminar ou não, é necessária a comprovação do inadimplemento e a caracterização da mora. “Saliente-se que o esbulho, no caso em análise, é de natureza contratual, e passa a existir a partir do momento em que o arrendatário deixa de cumprir o pactuado no contrato, tornando-se inadimplente, e após ter sido regularmente constituído em mora”, analisou. “Mister se faz ressaltar que a constituição da devedora em mora é requisito exigível legalmente para a ação de reintegração de posse no caso do arrendamento mercantil (leasing), entendimento este já está pacificado pela Súmula nº 369 do Superior Tribunal de Justiça”, citou. 

O desembargador lembrou que nas ações de reintegração de posse baseadas em contrato de arrendamento mercantil não se exige que a notificação, para efeito de constituição da arrendatária em mora, se faça por meio de cartório de títulos e documentos ou pelo protesto do título, porquanto no caso não se aplica o § 2º do artigo 2º do Decreto-lei nº 911/69. “No presente caso, observa-se que o apelante valeu-se da notificação extrajudicial para informar o devedor de que estaria constituído em mora e no aviso de recebimento encontra-se o endereço que a apelada declinou na inicial da ação revisional em apenso, bem como a assinatura de quem o recebeu”, destacou. 

“A notificação extrajudicial tem o condão de constituir o devedor em mora, desde que remetida ao endereço deste, e não se faz necessário que o próprio devedor tenha assinado o aviso de recebimento”, alertou. “Desse modo, a mora somente poderia ter sido desconstituída caso o devedor tivesse demonstrado que já realizou o pagamento das parcelas vencidas e encargos, o que não ocorreu no caso concreto”, argumentou.  

A câmara julgadora ainda foi composta pelo desembargador Juracy Persiani (vogal) e pelo juiz substituto de Segundo Grau Marcelo Souza de Barros (revisor convocado).


FONTE:   TJ-MT,  25 de janeiro de 2012

PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADEDano moral deve ser arbitrado em valor razoável

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DECISÃO: *TJ-MT – A Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso acolheu parcialmente recurso interposto pela Companhia Brasileira de Distribuição e reduziu o valor dos danos morais a ser pago ao ora apelado, de R$ 50 mil para R$ 10 mil, corrigindo ainda o termo inicial dos juros e da correção monetária. Conforme os julgadores, a falha na prestação de serviços da empresa, ao conferir crediário a falsários, impõe sua responsabilidade no ato danoso da inscrição indevida do nome do autor nos órgãos restritivos de crédito. Contudo, o valor da indenização deve ser arbitrado com obediência aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e, ainda, mirando o propósito pedagógico do ofensor (Apelação Cível nº 15718/2011). 

Consta dos autos que alguém se apresentou à empresa apelante e ali conseguiu crédito em nome do apelado, ensejando, posteriormente, a inclusão do seu nome nos órgãos restritivos de crédito. 

O recurso foi interposto pela empresa em face de decisão de Primeira Instância que, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Indenização por Danos Morais (Proc. nº 60/2008), ajuizada contra a apelante pelo ora apelado, declarara a revelia da ré/apelante e julgara procedente o pedido. Foi declarado inexistente o débito e a inscrição negativadora a partir dele efetivada em nome do apelado, sendo que a empresa foi condenada ao pagamento de R$50 mil a título de indenização por danos morais, mais custas e honorários, estes em 10% sobre o valor da causa.

No recurso, a empresa sustentou, preliminarmente, nulidade da sentença. Aduziu que a sentença seria nula por ter causado gravíssimo cerceamento do direito de defesa à recorrente ao não apreciar suas razões de tempestividade da defesa e por não ter apreciado a contestação ofertada. As preliminares não foram acolhidas em Segunda Instância. No mérito, defendeu a licitude da inscrição restritiva, decorrente de efetiva compra realizada pelo apelado. Questionou ainda o valor da indenização, tachando-o de excessivo, e que os juros e a correção monetária deveriam incidir a partir da sentença.

Em seu voto o relator do recurso, desembargador João Ferreira Filho, salientou que o apelado afirmou jamais ter contraído tal dívida, tampouco manteve com a apelante qualquer tipo de relação negocial. “A apelante não apresentou, por sua vez, qualquer justificativa aceitável para a existência da dívida, e muito menos para a efetivação da inscrição. Na peça recursal, centrou força na sustentação da tese de que a operação foi realizada pelo apelado, e que a inscrição não causou dano algum ao apelado”, assinalou o magistrado. 

Segundo ele, impõe-se, em primeiro lugar, o reconhecimento de que a dívida realmente não foi contraída pelo apelado, cuidando-se, portanto, de relação negocial cuja existência, e não apenas a validade contratual, não foi demonstrada pela parte supostamente credora. “No tocante ao reconhecimento judicial de que a dívida não existe, não enquanto expressão de relação negocial constituída validamente entre as partes, bem como, e justamente por conta disso, de que a inscrição junto à Serasa padece de nulidade insanável, tendo sido efetivada sem qualquer justa causa, a sentença não se expõe a qualquer crítica ou retificação, pois a inexistência de contratação e a falta de justa causa à negativação são aspectos acobertados pela prova dos autos”, opinou. 

Em relação ao dano moral, o magistrado explicou que o valor cabível como justa expressão financeira do sofrimento moral suportado pelo ofendido deve exprimir com equidade e equilíbrio os termos da equação indenizatória. “Cuidando-se de inscrição ilegal em cadastro de entidades de proteção ao crédito, ou de devolução indevida de cheques, ou de protesto indevido de títulos, a jurisprudência do eg. STJ vem se orientando pela fixação de valor não superior a 50 salários mínimos como expressão financeira do dano moral cabível em tais hipóteses”, salientou. Por isso, entendeu ser necessária a minoração do valor fixado a título de indenização, por avaliá-lo excessivo.

No tocante aos juros e a correção monetária, o relator acolheu a irresignação da apelante, visto que a correção monetária deve incidir a partir da fixação de valor definitivo para a indenização do dano moral e os juros moratórios devem fluir, no caso de indenização por dano moral, a partir da data do julgamento em que foi arbitrada a indenização.

A decisão foi unânime. Acompanharam o voto do relator dos desembargadores Orlando de Almeida Perri (revisor) e Marcos Machado (vogal).


FONTE:   TJ-MT,  25 de janeiro de 2012

DEFENSOR DATIVODF terá que pagar advogado que atuou em benefício de necessitado

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DECISÃO: *TJ-DF – Sentença do 1º Juizado da Fazenda Pública do DF condenou o Distrito Federal a pagar a um advogado os honorários referentes aos serviços prestados em virtude de sua nomeação como Defensor Dativo em processo no qual atuou perante o Tribunal do Júri da Circunscrição de Planaltina. O DF recorreu da decisão, que agora será revista pela 2ª Turma Recursal do TJDFT.

Na decisão, o juiz declara que o Distrito Federal criou o Centro de Assistência Judiciária – CEAJUR para prestar assistência gratuita aos juridicamente necessitados e organizar o serviço de assistência judiciária nos termos de sua Lei Orgânica. Caso não o preste, no entanto, torna-se responsável pelos ônus decorrentes da ineficiência do serviço público oferecido, inclusive pelo pagamento dos honorários advocatícios a defensor nomeado pelo juiz.

O magistrado destaca, ainda, que o autor foi nomeado defensor dativo e atuou no processo criminal (na 1ª e 2ª fase do júri), em razão da interrupção dos serviços de assistência judiciária aos necessitados, por parte do CEAJUR. Dessa forma, afirma que, consoante os termos do artigo 22, §1º, da Lei 8.906/94, é inafastável seu direito de ser remunerado, eis que o serviço não foi prestado de forma voluntária.

O advogado dativo não está obrigado a aceitar o encargo, explica o juiz. "Lei nenhuma o obriga (CF, art. 5º, II). Mas se aceita, nem por isso significa que não deve ser remunerado pelo seu trabalho. Na hipótese, o autor não prestou seu serviço voluntariamente, mas em razão de nomeação judicial e, assim, deve haver uma contraprestação pecuniária. Nessa linha de pensamento, entendo que deve ser pago os honorários sob pena de violação à garantia constitucional de que todo trabalho deve ser remunerado", conclui o julgador.

Assim, valendo-se da tabela de honorários cobrados pela OAB/DF como instrumento norteador, o juiz arbitrou a quantia de 4 mil reais a ser paga pelo Distrito Federal ao autor, valor esse que deverá ser acrescido de correção e juros.

Nº do processo: 2011.01.1.053883-3


FONTE:   TJDF,  26 de janeiro de 2012

 

CONTRATOS ESCOLARES NA ÓTICA DO STJA aplicação da jurisprudência do STJ aos contratos escolares

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ESPECIAL: *STJ – A educação no Brasil é um direito definido pela Constituição, mas nem sempre é ao Estado que o cidadão recorre para tê-lo assegurado. Quando a opção é pelo ensino particular, a natureza jurídica da relação entre instituição e aluno passa ser de prestação de serviço. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem precedentes e jurisprudência consolidada sobre diversos temas relacionados à cobrança de mensalidades, reajustes e obrigações das escolas com os alunos.

O universo do ensino privado no Brasil cresceu nos últimos cinco anos. É o que revelam dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O Censo Escolar 2010 mostrou que o Brasil tinha, à época, 7,5 milhões de estudantes matriculados na educação básica privada – creche, pré-escola, ensino fundamental e médio, educação profissional, especial e de jovens e adultos. No total de estudantes, as escolas particulares ficaram com uma fatia de 14,6%. Em 2007, eram 6,3 milhões de alunos matriculados na rede privada.

Com a demanda crescente, a quantidade de escolas e faculdades particulares também se multiplicou. A Fundação Getúlio Vargas (FGV), em  estudo realizado para a Federação Nacional das Escolas Particulares (FENEP), em 2005, contabilizava 36.800 estabelecimentos de ensino privado no país.

Penalidade pedagógica

Legislação e jurisprudência são claras ao garantir que a existência de débitos junto à instituição de ensino não deve interferir na prestação dos serviços educacionais. O artigo 6º da Lei 9.870/99 diz que “são proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento”.

Os débitos devem ser exigidos em ação própria, sendo vedada à entidade educacional interferir na atividade acadêmica dos seus estudantes para obter o adimplemento de mensalidades escolares. Ainda assim, a prática é comum e o debate chega ao STJ em recursos das partes.

Em 2008, a Primeira Turma considerou nula cláusula contratual que condicionava o trancamento de matrícula ao pagamento do correspondente período semestral em que requerido o trancamento, bem como à quitação das parcelas em atraso. O relator, ministro Benedito Gonçalves, entendeu que a prática constitui penalidade pedagógica vedada pela legislação.

“Ao trancar a matrícula, o aluno fica fora da faculdade, não frequenta aulas e não participa de nenhuma atividade relacionada com o curso, de modo que não pode ficar refém da instituição e ver-se compelido a pagar por serviços que não viria receber, para poder se afastar temporariamente da universidade”, afirmou o ministro.

O ministro não nega que o estabelecimento educacional tenha o direito de receber os valores que lhe são devidos, mas reitera que não pode ele lançar mãos de meios proibidos por lei para tanto, devendo se valer dos procedimentos legais de cobranças judiciais (REsp 1.081.936).

Retenção de certificado

A inadimplência também não é justificativa para que a instituição de ensino se recuse a entregar o certificado de conclusão de curso ao aluno. O entendimento foi da Segunda Turma, que enfrentou a questão em 2008, no julgamento de um recurso de um centro universitário de Vila Velha (ES).

O relator foi o ministro Mauro Campbell. A instituição alegava que a solenidade de colação de grau não seria abrangida pela proteção legal, sendo que sua proibição não seria penalidade pedagógica. Mas para o ministro, a vedação legal de retenção de documentos escolares abrange o ato de colação de grau e o direito de obter o respectivo certificado (REsp 913.917).

Multa administrativa

Os alunos de escolas particulares são consumidores na medida em que utilizam um serviço final. Já as escolas e faculdades particulares podem ser consideradas fornecedoras, pois são pessoas jurídicas que oferecem o ensino. Assim, sujeitam-se também ao Código de Defesa do Consumidor (CDC) e aos órgãos de proteção.

Em 2010, a Primeira Turma decidiu restabelecer uma multa aplicada pelo Procon de São Paulo contra a mantenedora de uma escola que reteve documentos para transferência de dois alunos, por falta de pagamento de mensalidades. O relator foi o ministro Luiz Fux, que hoje atua no Supremo Tribunal Federal (STF).

No caso, o Procon/SP instaurou processo administrativo contra a escola, que resultou na aplicação de uma multa de R$ 5 mil, seguindo o artigo 56 do CDC. A escola ajuizou ação para que fosse desobrigada do pagamento da multa, tendo em vista que, em audiência judicial de conciliação, ela entregou a documentação e os devedores comprometeram-se a pagar os débitos.

No julgamento do recurso do Procon/SP, o ministro Fux destacou que acordo entre o consumidor e o prestador de serviços, ainda que realizado em juízo, não afasta a multa, aplicada por órgão de proteção e defesa do consumidor, no exercício do poder de punição do Estado. Isso porque a multa não visa à reparação de dano sofrido pelo consumidor, mas à punição pela infração (REsp 1.164.146).

Atuação do MP

O STJ reconhece a legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública onde se discute a defesa dos interesses coletivos de pais e alunos de estabelecimento de ensino. São diversos os recursos que chegaram ao Tribunal contestando a atuação do MP nos casos em que se discute, por exemplo, reajuste de mensalidades. A jurisprudência do STJ é pacífica nesse sentido (REsp 120.143).

Impontualidade vs. inadimplência

O aluno, ao matricular-se em instituição de ensino privado, firma contrato em que se obriga ao pagamento das mensalidades como contraprestação ao serviço recebido. Mas o atraso no pagamento não autoriza a aplicação de sanções que resultem em descumprimento do contrato por parte da entidade de ensino (artigo 5º da Lei 9.870/99).

Esse é o entendimento do STJ. A universidade não pode impor penalidades administrativas ao aluno inadimplente, o qual tem o direito de assistir a aulas, realizar provas e obter documentos.

A Segunda Turma reafirmou esta tese na análise de um recurso interposto por uma universidade de São Paulo. Naquele caso, a relatora, ministra Eliana Calmon, destacou, porém, que o STJ considera que a falta de pagamento até 90 dias é, para efeito da lei, impontualidade. Só é inadimplente o aluno que exceder esse prazo. Assim, a entidade está autorizada a não renovar a matrícula se o atraso é superior a 90 dias, mesmo que seja de uma mensalidade apenas. “O aluno que deve uma, duas, três ou quatro prestações, para evitar a pecha de inadimplente, deve quitá-las no prazo de 90 dias”, alertou a ministra no julgamento (REsp 725.955).

Pai devedor

Noutro caso, a Segunda Turma manteve decisão que garantiu a uma aluna a rematrícula no curso de Direito. A faculdade havia negado a renovação porque o pai da estudante, aluno do curso de Ciências Contábeis na mesma instituição de ensino, estava com mensalidades em atraso. No STJ, o recurso do centro universitário alegava que como os pais são, via de regra, os representantes capazes dos alunos, o impedimento previsto em lei deveria ser aplicado ao caso.

O relator, ministro Mauro Campbell Marques, considerou que a inadimplência não se referia à aluna, mas a terceiro, e por isso deveria ser afastada a exceção que possibilita o impedimento à renovação de matrícula prevista na Lei 9.870/99 (REsp 1.096.242).

O STJ também já definiu que é da Justiça Federal a competência para julgar mandado de segurança impetrado contra ato de dirigente de instituição particular de ensino que nega a renovação de matrícula de aluno inadimplente (REsp 883.497).

Carga horária

Em um julgamento ocorrido em 2011, a Quarta Turma decidiu que, mesmo após a colação de grau, os alunos ainda podem exigir indenização por carga horária do curso não ministrada pela instituição de ensino. A ação foi movida por ex-alunos da Fundação Universidade do Vale do Itajaí (Univali), de Santa Catarina, para obter ressarcimento por horas-aula não ministradas. O relator do recurso é o ministro Luis Felipe Salomão.

Os alunos teriam pago o equivalente a 20 créditos em aulas do 5º período do curso de direito, mas foram ministradas aulas equivalentes a 16 créditos. Em primeira instância, eles tiveram sucesso, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catariana (TJSC) considerou que, com a colação de grau, os estudantes teriam aberto mão de seus direitos.

O ministro Salomão destacou em seu voto que no processo fica claro que não foram prestadas as 3.390 horas-aula previstas para o curso e pagas pelos alunos. “O quê se verifica no caso é que a recorrida [Univali] se comprometeu em prestar um serviço, recebeu por ele, e não cumpriu com o avençado”, apontou. O relator observou que houve resistência dos alunos e que, em nenhum momento, abriram mão de seus direitos. Não houve remissão ou perdão da dívida, já que não se demonstrou o ânimo de abandonar o débito – a jurisprudência do Tribunal é nesse sentido (REsp 895.480).

Cobrança integral

Em 2002, o STJ analisou um recurso em que um aluno de Minas Gerais contestava a cobrança da semestralidade integral quando estava matriculado em apenas uma disciplina do curso de engenharia. O caso foi julgado na Quarta Turma.

Os ministros entenderam que deveria ser respeitada a equivalência entre a prestação cobrada do aluno e a contraprestação oferecida pela escola. “Se falta apenas uma disciplina a ser cursada, não pode ser exigido o pagamento de semestralidade integral, embora não se exija, nesse caso, a exata proporcionalidade”, afirmou em seu voto o relator, ministro Ruy Rosado, já aposentado.

A Turma ressaltou que não se impunha a proporcionalidade entre o número de cadeiras e o valor da prestação. Para os ministros, no caso de inscrição em apenas uma disciplina deve-se considerar o fato de que a escola deve manter o integral funcionamento das suas dependências, o que justifica a cobrança de valor maior, além do que corresponderia à exata proporcionalidade de uma matéria (REsp 334.837).

 


FONTE:   STJ,  22 de janeiro de 2012

 

Com transparência sombria, minoria arranha imagem do Poder Judiciário. Urge recuperá-la.

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*Clovis Brasil Pereira

A jurisdição como um direito do cidadão, e um dever do Estado

Aprendemos nos bancos acadêmicos  (e continuamos ensinando aos nossos alunos), que a Jurisdição  – poder de dizer o direito –  é uma das funções mais importantes do Estado, mediante a qual este se substitui aos titulares do direito em debate, para imparcialmente, buscar a pacificação do conflito que os envolve, com justiça. 

Em suma, a jurisdição é o poder-dever do Estado de aplicar o direito ao caso concreto, submetido pelas partes, através da atividade exercida pelos seus agentes  investidos na nobre função, no caso, os magistrados, mediante os quais,  o Estado busca a realização prática e efetiva da norma legal, ora declarando a lei ao caso concreto, ora impondo coercitivamente aos litigantes, medidas tendentes à satisfação efetiva da lei. 

Uma vez provocado, e decidido o conflito, as partes têm que se submeter à decisão judicial adotada. 

A sua atividade decorre de provocação das partes, sendo quase sempre contenciosa, já que é inerte, sendo indispensável que seja provocada por um dos conflitantes, decorrendo  normalmente de uma situação de litígio,  exceto no caso de jurisdição voluntária. 

Têm como princípios importantes, dentre outros:

a) A Indeclinabilidade, segundo a constituição federal nenhuma lesão de direito deixará de ser apreciada pelo Poder Judiciário; assim quando provocado, tem o estado o dever de solucionar os conflitos de interesse;

b)  A  Investidura, pois somente os agentes investidos do poder estatal de aplicar o direito ao caso concreto (julgar) é que podem exercer a jurisdição.  A investidura se dá mediante prévia aprovação em concursos públicos de títulos e conhecimento jurídico, ou pela nomeação direta, por ato do chefe do Poder Executivo, no plano estadual ou federal,  de pessoas com prévia experiência e notável saber jurídico, como nos casos de ingresso na magistratura pelo quinto constitucional ou nomeação de ministros dos tribunais superiores;

c) Da Indelegabilidade, um vez que a jurisdição não pode ser objeto de delegação pelos seus  agentes, no caso os magistrados,  que a exercem com exclusividade;

d) Da  Inércia, já que a jurisdição não pode ser exercida de ofício pelos agentes detentores da investidura, dependendo sempre da provocação das partes. 

O exercício da jurisdição, na sua plenitude, é um dos pilares do estado democrático de direito, e a profícua atuação do Poder Judiciário é indispensável para a pacificação social, através da escorreita aplicação e interpretação da legislação pátria.

 

É de ser destacado ainda, que dentre os direitos individuais fundamentais, elencados no artigo 5º, da Carta Magna, incisos XXXV, XXXVII  e LIII, todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Brasil, destinatários da norma constitucional, têm assegurada a independência do Poder Judiciário, com a garantia de que o processamento e o julgamento das causas em geral,  deve se dar perante juiz investido do poder jurisdicional, com a competência devidamente indicada pela CF,  havendo   vedação expressa aos tribunais de exceção.  É o chamado Juiz natural.

 

Garantias constitucionais dos juizes

Por sua vez, os integrantes do Poder Judiciário, têm asseguradas garantias constitucionais básicas, que asseguram aos magistrados, segurança e tranquilidade, para o exercício de suas atividades.  Os integrantes do Ministério Público, também detêm as mesmas garantias, conforme a previsão do artigo 128, inciso I do § 5º da Carta Magna.

 Assim, a Constituição Federal, em seu artigo 95, assegura aos juizes as seguintes garantias:

I – vitaliciedade, que, no primeiro grau, só será adquirida após dois anos de exercício, dependendo a perda do cargo, nesse período, de deliberação do tribunal a que o juiz estiver vinculado, e, nos demais casos, de sentença judicial transitada em julgado;

II – inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público, na forma do art.93, VIII;

III – irredutibilidade de vencimentos, observado, quanto à remuneração, o que dispõem os art.37, XI, 150, II, 153, III, e 153, §2°, I".

Analisando sumariamente tais garantias, temos:

a) A vitaliciedade, que assegura  que o magistrado, depois de transcorrido o período de dois anos desde sua assunção ao cargo com o correspondente exercício, somente o perderá em decorrência de sentença judicial transitada em julgado, em processo adequado onde lhe seja assegurado o direito de ampla defesa e de contraditório. Não é de ser confundida a vitaliciedade  com a estabilidade comum do servidor público. A estabilidade do funcionário público, diferentemente da do juiz, é no serviço, e não no cargo.

b)  A inamovibilidade assegura ao magistrado de não poder ser removido de sua sede de atividade para outra sem o seu prévio consentimento, salvo em decorrência de incontestável interesse público, mediante voto de dois terços do tribunal, e de igual modo assegurada ampla defesa. Tal garantia abrange, inclusive, a possibilidade do juiz recusar promoção na carreira, quando a regalia possa mascarar uma manobra contra o juiz.

c) A irredutibilidade de vencimentos é a garantia que a Constituição oferece ao magistrado, sendo vedada a redução em seu salário em decorrência de algum ato judicial por ele praticado, o que por certo, sendo permitido, inibiria o pleno exercício da jurisdição, com independência.

Temos, em suma, que:

I – A jurisdição é um direito-dever do Estado;

II – Deve ser exercida com exclusividade pelos juizes, integrantes do Poder Judiciário;

III – Seus integrantes primam pela independência para o pleno exercício da atividade jurisdicional em geral, uma vez que não guardam subordinação a outros órgãos estatais ou privados;

IV –  Os magistrados em geral, têm asseguradas garantias constitucionais que lhes garante a isenção no julgamento, independente de pressões e influências externas, de qualquer natureza.

É importante ser lembrado, que nos Estados Democráticos de Direito, o Poder emana do  povo, e em seu nome deve ser exercido.  Pois bem.  Se a atividade jurisdicional é direito-dever do Estado,  e a sua atividade deve ser exercida com exclusividade pelo Poder Judiciário, nada mais justo, que seus integrantes, dotados das garantias constitucionais da vitaliciedade, da inamovibilidade e da irredutibilidade dos seus vencimentos, devam satisfações à sociedade, de sua conduta, podendo inclusive  ser questionados sobre sua honestidade, origem de seu patrimônio, honestidade.

O CNJ  e sua função fiscalizadora  

A partir da criação do CNJ – Conselho Nacional de Justiça, em 2004, através da Emenda Constitucional nº 45, um  órgão do Poder Judiciário brasileiro encarregado de controlar a atuação administrativa e financeira dos demais órgãos daquele poder, bem como de supervisionar o cumprimento dos deveres funcionais dos juízes,  muito tem se debatido a respeito dos limites da independência do judiciário, e da possibilidade de fiscalização de seus atos administrativos, sem que isso represente quebra de sua autonomia na função jurisdicional.

A polêmica se agravou, no ano de 2011, quando a Ministra Eliana Calmon, do STJ, na função de corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), trouxe a público, a suspeita de operações financeiras “atipicas”, com indícios de irregularidades, abrangendo nos últimos 10 anos – entre 2000 e 2010 – valores em torno de R$ 856 milhões  de reais, envolvendo 3.426 magistrados e servidores do Judiciário.

Detectados  indícios de irregularidades,  ao que se sabe, pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), o órgão de inteligência financeira do Ministério da Fazenda, a Ministra corregedora do CNJ enviou relatório ao Presidente do STF, pedido de investigação sobre a vida finacneira de juizes, desembargadores e demais servidores, relacionados em operações financeiras atípicas e em descompasso com os rendimentos percebidos portais agentes públicos nos últimos dez anos.

Foi o suficiente, assim que tais suspeitas vieram a público, com grande alarde pela imprensa, para que três entidades ligadas aos juizes, Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB, Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho – ANAMATRA, e Associação dos Juizes Federais do Brasil – AJUFE, procurassem de pronto o Supremo Tribunal Federal, intentando ação judicial, mais propriamente o Mandado de Segurança nº 31085,  pleiteando uma decisão  liminar,  visando a suspensão de imediato das investigações propostas pela Ministra corregedora do CNJ, ação esta que obteve prontamente a pretendida suspensão, através de decisão liminar concedida pelo Ministro Ricardo Lewandowski.

Troca de acusações entre Magistrados abalam a credibilidade do Poder Judiciário

Acirrou-se então, o debate entre os membros do Poder Judiciário, diretamente envolvidos nas noticias de eventuais irregularidades, expandindo-se prontamente nos diversos segmentos da sociedade brasileira, numa discussão muito oportuna, que acabará por certo dando novos contornos ao papel que o Poder Judiciário deve efetivamente desempenhar  na sua função precípua, da prestação jurisdicional, em contraste com a sua independência,   e o direito que a sociedade brasileira  tem de ter acesso às operações financeiras dos magistrados e servidores públicos, para detectar eventuais desvios de conduta.  

De um lado o pedido de investigação feito pela Ministra Eliane Calmon, seguido de um recado endereçado aos juizes que se rebelaram contra a investigação do CNJ: “Eles não vão conseguir me desmoralizar”.  A Ministra afirmou que “Eu estou vendo a serpente nascer, não posso me calar”.

Rebatendo as críticas feitas pelo Ministro Marco Aurélio Mello, do STF, que comparou a corregedora com um xerife, Eliana Calmon reafirmou:  “Os tempos mudaram e eles não se aperceberam, não querem aceitar. Mas é um momento que eu tenho que ter cuidado para não causar certo apressamento do Supremo, deixar que ele (STF) decida sem dizer: ’ah, mas ela fez isso e aquilo outro, ela é falastrona , é midiática’. Então eu estou quieta. As coisas estão muito claras”, disse.

As críticas mais ácidas vieram do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra, para quem o pedido de investigação solicitado pela corregedora é uma “devassa” na vida  de magistrados e servidores do Poder Judiciário. Justificou o representante dos juizes  que “A corregedora do CNJ (ministra Eliana Calmon) e nenhum brasileiro, por mais popular e glamoroso que seja, pode estar acima da Constituição, acima das leis, ou do Supremo Tribunal Federal”.

Asseverou ainda Calandra: “Temos uma Constituição e, por isso, as pessoas não podem nas mãos o dever de fazer justiça”.

É praxe no Poder Judiciário, exigir que todos os servidores e magistrados apresentem, logo após a apresentação da Declaração Anual do Imposto de Renda à Receita Federal, que exibam cópia do documento ao setor de Recursos Humanos dos respectivos Tribunais, no prazo de até 30 dias.

Recente manifestação do Desembargador Pedro Valls Feu Rosa, Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, confirmou ser obrigatória a declaração de bens dos magistrados no âmbito daquele Tribunal, e pode ser punido quem não apresentar documento.

No mesmo sentido foi a declaração feita pelo Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador Ivan Sartori, que  anotou que  todos os juízes têm prazo de 30 dias para entregarem cópias de suas declarações de Imposto de Renda. Cerca de 300 magistrados não cumpriram a obrigação. Quem resistir poderá ser alvo de "providências mais drásticas", como a retenção de vencimentos. "Houve uma certa omissão na fiscalização, mas é desculpável."

Em outros Tribunais, é público e notório que tal exigência é praxe, sob pena inclusive, de bloqueio do pagamento dos vencimentos, quando se trata ao menos dos servidores do Poder Judiciário.

Sabe-se agora, que muitos juizes não apresentaram tais documentos, passando em branco a exigência administrativa, em favor da transparência exigida pela sociedade,  na atividade dos integrantes do Poder Judiciário.

O simples pedido de investigação feita pela corregedoria do CNJ, não nos parece que represente ofensa ao sigilo fiscal dos pretensos magistrados e funcionários públicos sob suspeita, e muito menos, uma “devassa” em suas vidas particulares, como alardeou o presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), Nelson Calandra, um dos signatários da ação intentada perante o STF.

Como bem esclareceu a Ministra Eliana Calmon, a relação dos eventuais “suspeitos” não veio a público com os nomes e CPFs, não  configurando-se a alegada quebra do sigilo fiscal invocada pelos Magistrados, que agem, ao que parece, movidos por inegável e deplorável corporativismo.

É bom ressaltar que o Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador  Ivan Sartori, que teve acesso ao relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), quando visitou a Ministra corregedora, declarou  que não houve quebra de sigilo bancário. Segundo ele, o relatório não contém nomes. “Por ali não teve quebra de sigilo”, afirmou. “Não sei se há outros documentos, então não posso afirmar”, ponderou.

A quem deve servir  a independência do Poder Judiciário?

Uma indagação que merece reflexão profunda, no desencadear dessa polêmica, é a quem deve servir e interessar a independência do Poder Judiciário.

Certamente não deve ser aos juizes ou servidores  que estão sob suspeita de operações financeiras irregulares. A propalada independência, deve servir à sociedade, para que veja no Poder Judiciário, o último guardião de  suas aspirações legítimas, onde possa fazer o resgate de seus direitos desrespeitados. Jamais para camuflar eventuais ilicitudes, acobertadas por atitudes e desmandos que não se coadunam com a ética e a moralidade, exigidas dos agentes públicos, seja eles quem forem.

Imaginemos que  a  dúvida sobre a movimentação irregular de recursos financeiros, ao longo de 10 anos, pairasse sobre políticos em geral, ou funcionários públicos de outros poderes que não do Judiciário, quais seriam as conseqüências mais concretas?   O próprio Poder Judiciário, já teria autorizado busca e apreensões de pessoas e coisas, determinado a suspensão de direitos políticos, cassado mandatos de políticos eleitos pela vontade popular, dentre outras ações tão conhecidas de todos.

Porque não pode ser feito o mesmo com os magistrados suspeitos de movimentações financeiras estranhas, atípicas?  Estão os magistrados, por acaso,  acima das Leis, que eles próprios tem a obrigação constitucional de fazer cumpri-las?    

Certamente, que a resposta da sociedade brasileira,  de forma geral, é NÃO!!!

Irregularidades no CNJ não apagam  denúncias contra os Magistrados

Repentinamente, com a ação firme da Ministra Eliana Calmon, surgiram denúncias de irregularidades em contratos firmados pelo CNJ, sem licitação, de concorrências sob suspeitas, e com valores muitas vezes maiores do que o valor real.

Por certo, essas irregularidades ora denunciadas, devem também ser apuradas, o que não elide o Poder Judiciário, de cortar na própria carne, se necessário for, pois ilicitudes, se comprovadas, devem ser combatidas e punidas em todas as esferas do Poder.   O que não se pode admitir, é tolerar que  irregularidades aconteçam no Judiciário, simplesmente porque  o CNJ, também as comete.

Aliás, é bom ressaltar que ambos pertencem à mesma esfera de Poder, e que o presidente do CNJ é exatamente o mesmo presidente do STF, Ministro César Peluso,  a quem caberia tomar pulso firme  no combate de qualquer suspeita de ilicitude, e preservar a transparência na gestão das coisas do judiciário. 

O que pode resultar da atuação do CNJ

O que o CNJ está questionando, são as  atitude dos juízes, que se rebelaram contra a transparência exigida pela sociedade, sobre transações financeiras tidas como “atípicas”, e por isso, suspeitas. 

Os Magistrados, particularmente, tem uma função constitucional muito particular, com garantias excepcionais, e por essa razão, devem se subordinar à regras específicas, demonstrando comportamento ético ímpar, e por isso, exemplar.

Deve valer para eles, a máxima registrada na História, sobre a mulher de César: Não  basta ser  honesto.  Tem que parecer honesto!!!

No mais, quem não deve, não teme. Ora, se o patrimônio dos juizes e servidores do Poder Judiciário, teve origem nos vencimentos percebidos pelo exercício da atividade jurisdicional, ou em negociações regulares, ao longo do tempo, porque tentar esconder a origem das operações financeiras decorrentes de  tais vencimentos ou recursos?

Em favor da transparência efetiva no Poder Judiciário, seria salutar que todos os magistrados do Brasil, seguissem o exemplo de um grupo de Juizes do Rio de Janeiro, que ofereceram ao Tribunal, a abertura dos respectivos sigilos fiscais.

Foi um gesto simbólico, porém, muito significativo,  que  poderia ser seguido pelos demais, pelo Brasil afora, e por certo, com tal gesto, estaríamos abrindo a  suposta “caixa-preta” que envolve o Judiciário Brasileiro, e que por ação ou omissão de poucos, acaba por atingir a grande maioria honrada dos magistrados que integram o Poder Judiciário, indispensável à sobrevivência do Estado Democrático de Direito, e da própria sociedade brasileira.

Em favor da moralidade e da ética, valores essenciais que devem primar no meio social, e impulsionar a atividade do Poder Judiciário, é chegada a hora da transparência sem trevas, onde a verdade se sobreponha, sem armadilhas ou camuflagens,  a velar as atividades dos juizes e servidores responsáveis pela prestação jurisdicional.

Somente assim, estaremos recuperando a confiança no Poder Judiciário, Poder que tem que estar acima de qualquer suspeita, valorizando a prestação jurisdicional e contribuindo de forma decisiva e efetiva para a construção de uma sociedade mais justa, ética e humana.

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

CLOVIS BRASIL PEREIRA:  Advogado, Especialista em Direito Processual Civil, Mestre em Direito, Professor Universitário,  Editor Responsável da Revista JurÍdica Prolegis – ISSN 1982-386X,  Presidente do Departamento Cultural da OAB-Guarulhos,  colaborar com artigos publicados em diversos sites e  revistas jurídicas.

Elaborado em janeiro de 2012


O novo artigo 311-a do Código Penal e o nominalismo mágico do Congresso Nacional

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*Eduardo Luiz Santos Cabette 

Ao que parece, o legislador pensa que basta dar um “nomen juris” para um crime e então ele, magicamente, passa a tipificar a conduta desejada independentemente do que se escreva em seu preceito primário.

Em 15 de dezembro de 2011 o legislador brasileiro oferta um "presente de natal" à população. É a Lei 12.550/11 que, na verdade, trata da criação da chamada Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH).

Sem qualquer espécie de conexão com a matéria dessa lei, por incrível que pareça, cria, ao final, um novo tipo penal e uma nova pena de interdição temporária de direitos!

A nova interdição se constitui na inclusão de um inciso V no artigo 47, CP prevendo a "proibição de inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos". Já o crime recebe o "nomen juris" de "Fraude em certame de interesse público" e passa a ser descrito no artigo 311 – A, CP.

Primeiro salta aos olhos a absurdidade caótica da previsão de matéria penal oculta no final de uma lei que trata da criação de uma empresa referente a serviços hospitalares, parecendo que o Congresso Nacional agora vai se aventurar no ramo da gastronomia, criando ao invés do "escondidinho de carne – seca", o "escondidinho de lei penal". Para além disso, segundo consta o tal artigo 311 – A, CP teria a pretensão de incriminar a denominada "cola eletrônica" ou quaisquer outras fraudes perpetradas em concursos e exames públicos em geral. Acontece que numa simples leitura do dispositivo criado verifica-se claramente que não incrimina o que devia ou pretendia incriminar. Acaba a lei tratando da divulgação ou utilização indevida com fim de benefício próprio ou alheio ou de comprometer a credibilidade do certame, de conteúdo sigiloso dos concursos, avaliações, processos seletivos e exames que arrolada em quatro incisos. Também tipifica a permissão ou facilitação de acesso de pessoas não autorizadas às informações supra mencionadas. Finalmente prevê uma qualificadora quando há resultado de dano à administração pública e um aumento de pena se o agente é funcionário público.

Pergunta-se: onde se enquadra a conduta de quem leva uma cola para um concurso, sem saber previamente das questões e respostas? Onde se tipifica a "cola eletrônica", em que o candidato dita as perguntas por meio de comunicação eletrônica a uma pessoa fora do local, a qual responde com seus próprios conhecimentos, sem acesso prévio às questões e/ou gabarito? Em nenhum desses casos há indevida divulgação ou utilização de qualquer informação privilegiada. Portanto, o que era atípico, continua atípico.

A doutrina incipiente sobre o tema já vai apontado essa solução: 

“Apesar de muitos acreditarem que a ‘cola eletrônica’, agora, passou a ser crime, pensamos que a tipicidade vai depender da análise do caso concreto. Vejamos: Se o modo de execução envolve terceiro que, tendo acesso privilegiado ao gabarito da prova, revela ao candidato de um concurso público as respostas aos quesitos, pratica, junto com o candidato beneficiário, o crime do art. 311 – A (aquele, por divulgar, e este, por utilizar o conteúdo secreto em benefício próprio). Já nos casos em que o candidato, com ponto eletrônico no ouvido, se vale de terceiro expert para lhe revelar as alternativas corretas, permanece atípico (apesar de seu grau de reprovação social), pois os sujeitos envolvidos (candidato e terceiro) não trabalharam com conteúdo sigiloso (o gabarito continuou sigiloso para ambos)". [01]

Note-se que a verdadeira "cola eletrônica" não é mesmo prevista, vez que a conduta que pode ser incriminada nada tem a ver com os casos de fraude que acontecem nessa espécie de prática. Neste sentido também se manifesta Siena:

“Assim sendo, na hipótese em que os agentes, sem conhecimento prévio das questões ou respostas, se utilizam de meios fraudulentos, como no caso da conhecida ‘cola eletrônica’, valendo-se apenas de seus conhecimentos para resolver a prova ou exame, a conduta será fatalmente atípica". [02]

E mais, se a intenção era incriminar somente a conduta de utilização ou divulgação indevida de conteúdo sigiloso, o dispositivo criado é supérfluo, pois que o ordenamento jurídico já contava com essa espécie delitiva no artigo 325, CP e no artigo 94 da Lei 8.666/93. Conseguiu apenas o legislador engendrar mais um caso de norma especial para o tormento de todos quantos lidem com a legislação penal brasileira.

Ao que parece o legislador pensa que basta dar um "nomen juris" para um crime e então ele, magicamente, passa a tipificar a conduta desejada independentemente do que se escreva em seu preceito primário. Isso é mais do que sonharia Guilherme de Ockam, conhecido como o maior pensador do nominalismo. É, em verdade, o protótipo de um "nominalismo mágico" que se assemelha ao infantilismo das crianças e dos povos primitivos que acreditam que palavras e pensamentos têm poderes para alterar a realidade. Se a "mens legis" era a de incriminar a "cola eletrônica" ou a "cola" em qualquer de suas categorias em certames de interesse público, falhou o legislador porque parece pensar que o simples nome "fraude em certame de interesse público" é suficiente para incriminar a conduta desejada. É como se uma pessoa pensasse que seu filho adquiriria força descomunal ao dar-lhe o nome de Hércules ou que sua filha seria Presidente da República se fosse chamada de Dilma!

Infelizmente neste, como em muitos outros casos, é difícil concatenar a "mens legis" com a dicção legal. È muito mais fácil diagnosticar uma "dementia legis" do que encontrar coerência entre intenção e texto legal.

A seguir nessa senda infantilizada não demorará o dia em que será criado um crime cujo "nomen juris" será "Abracadabra", o preceito primário descreverá "Pirlimpimpim" e a pena será "O Estado ficou de mal com você"!

Quando o legislador chegará à maturidade ou pelo menos à adolescência? Mas, afinal, é bom brincar ganhando remuneração de gente grande e seguindo no ritmo e no "molejo" do pagode: "Brincadeira de criança, como é bom, como é bom…" [03]

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Notas

1. CUNHA, Rogério Sanches. Novo artigo 311 – A do Código Penal. Disponível em www.atualidadesdodireito/rogeriosanches , acesso em 06.01.2012.

2. SIENA, David Pimental Barbosa de. Fraudes em certames de interesse público e a Lei n. 12.550/11. Disponível em www.juristas.com.br , acesso em 05.01.2012.

3. Letra do pagode "Brincadeira de Criança" do Grupo Molejo.

REFERÊNCIAS

CUNHA, Rogério Sanches. Novo artigo 311 – A do Código Penal. Disponível em www.atualidadesdodireito/rogeriosanches , acesso em 06.01.2012.

SIENA, David Pimental Barbosa de. Fraudes em certames de interesse público e a Lei n. 12.550/11. Disponível em www.juristas.com.br , acesso em 05.01.2012.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

EDUARDO LUIZ SANTOS CABETTE:  delegado de polícia, mestre em Direito Social, pós-graduado com especialização em Direito Penal e Criminologia, professor da graduação e da pós-graduação da Unisal
Elaborado em dezembro de 2011

Ficha suja, vade retro

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*João Baptista Herkenhoff 

          “Vade retro, Satanás”, ou simplesmente “Vade retro”, é um exorcismo medieval utilizado para afastar o demônio. A expressão latina “vade retro” pode ser traduzida pelo vernáculo: “afasta-te”.

          Suponho que é bastante apropriado recorrer à formula medieval para esconjurar os políticos manchados por condenação criminal: “vade retro, ficha suja”.

          O Supremo Tribunal Federal ainda não se pronunciou sobre a aplicação, nas próximas eleições municipais, da lei que obsta a candidatura dos ficha-suja.

          Será lamentável que fichas sujas possam disputar mandato de Prefeito e de Vereador no pleito eleitoral que se avizinha.

As pessoas mais simples e humildes, por sabedoria intuitiva, pensam que larápio não deve legislar ou governar. Mas essas pessoas mais simples e humildes, cuja consciência moral repudia os ladrões, não sabem o nome deles, nem mesmo o nome daqueles de seu município. É bastante difícil para o eleitor comum a análise da vida pregressa dos candidatos.

A lei que exclui da disputa eleitoral o ficha suja cumprirá esse papel: revelar ao povo, por exclusão, a face oculta dos desonestos.

Seria altamente pedagógico que a lei que barra o ficha suja tivesse sua primeira vigência num pleito municipal. O Município é a célula fundamental da vida política.

          Os mandatos municipais – de Prefeito, Vice-Prefeito, Vereador – são os que devem ter maior significado moral para aqueles que por tais mandatos sejam consagrados. Não são apenas mandatos, são medalhas de mérito: representam o reconhecimento do povo a cidadãos da cidade onde a pessoa vive. Quanto à vereança, não é um emprego, é um serviço que, em outros tempos, era exercido gratuitamente. É razoável que hoje se admita um moderado jeton indenizatório dos dias de trabalho do Vereador, sempre que o exercício da Vereança impuser perda de renda. A gula revelada por algumas Câmaras Municipais tem causado perplexidade. Justamente porque ser Prefeito ou Vereador é altissimamente honroso, os pretendentes a esses cargos não podem estar maculados por sujeira na biografia.

          Torcemos para que, com lei de ficha limpa, ou sem lei de ficha limpa, sejam oferecidas ao povo informações seguras, de modo que o eleitorado possa dizer “vade retro, satanás”, “vade retro, politico de ficha suja”.

          Se houver uma grande campanha de esclarecimento, da qual deverão participar as instituições da sociedade civil, as igrejas, as escolas, será possível obter esse resultado.

          Se o Supremo boicotar a lei que exige ficha limpa, mas mesmo assim o povo recusar os ficha-suja, ficará evidente que o sentimento de cidadania do eleitorado supera o sentimento de cidadania dos ministros do STF.

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA 

João Baptista Herkenhoff, magistrado aposentado, é professor da Faculdade Estácio de Sá do Espírito Santo e escritor. Acaba de publicar: Curso de Direitos Humanos, pela Editora Santuário, de Aparecida, SP. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br Homepage: www.jbherkenhoff.com.br


MUNICÍPIO É CONDENADO A INDENIZARAcidente causado por placa de Pare encoberta é responsabilidade do Município

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FONTE:  *TJ-RS – A 11ª Câmara Cível do TJ manteve a sentença de 1º Grau que condenou o Município de Novo Hamburgo a indenizar parcialmente os prejuízos que um proprietário de motocicleta teve ao bater em um automóvel em um cruzamento da cidade, depois de não visualizar a placa de pare, encoberta por vegetação. 

O Município pagará a metade do prejuízo, pois a Justiça considerou que o autor da ação também contribuiu para o acidente ao avançar sobre o cruzamento de forma imprudente.  Em razão do acidente, o motociclista, autor da ação, gastou R$ 250,00 para a compra de um colete para imobilizar a coluna temporariamente e o valor de R$ 2.823,81, correspondente ao menor orçamento para o conserto de sua motocicleta. Metade desses valores será pago pelo Município de Novo Hamburgo.

Os fatos se deram em julho de 2009, quando as moto abalroou um automóvel no cruzamento da rua Oscar Odacílio Brenner com a rua Albino Momberger. O motociclista defendeu que foi induzido em erro pela municipalidade, pois não percebeu que trafegava pela via secundária.

Apelação

Observou o relator no colegiado, Desembargador Bayard Ney de Freitas Barcellos, que, conforme o boletim de ocorrência, a placa estava em péssimas condições de visibilidade, e encoberta por galhos de uma árvore.  A afirmação está comprovada pelas fotos juntadas aos autos, que mostram a placa completamente encoberta.

Considerou ainda o magistrado que o Município não demonstrou que houvesse sinalização horizontal no local dos fatos.

Acompanharam o voto do relator os Desembargadores Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard e Katia Elenise Oliveira da Silva.    AC 70045687902


FONTE:  TJ-RS, 12 de janeiro de 2012.

OFENSA GERA DANO MORAL NA JUSTIÇA DO TRABALHO Conduta arbitrária de supervisora leva empresa a ser condenada por dano moral

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DECISÃO: *TST – A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho arbitrou em R$ 10 mil o valor da indenização por dano moral que a empresa paranaense Contact Center Américas Assessoria em Marketing Ltda. deve pagar a uma empregada ofendida por uma supervisora. A primeira instância havia fixado o valor da indenização em R$ 20 mil, mas o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) o reduziu para R$ 5 mil, motivo que levou a empregada a recorrer ao TST.

A empregada, atendente de telemarketing, contou que, após o retorno de uma licença médica para tratamento de depressão, em novembro de 2008, passou a sofrer pressões e humilhações de uma supervisora durante todo o mês, até ser demitida.  A chefe havia assumido a função recentemente e passou a lhe "pegar no pé", inclusive com repreensões na frente das colegas, com as quais não podia nem conversar, informou. Testemunhas disseram que a supervisora era de fato pessoa de difícil trato e que algumas vezes "esfregava um papel" na colega, dizendo que era quem dava as ordens lá dentro.

Ao examinar o recurso da empregada na Sexta Turma, o relator, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, não concordou com a tese do Regional para reduzir o valor da indenização de que a supervisora apenas tratava a empregada de forma autoritária, o que tornou insuportável o ambiente de trabalho e culminou com a sua dispensa.No seu entendimento, ao retornar da licença médica, as ofensas da chefe acabaram levando a empregada a ser demitida sem justa causa, sendo certo que a conduta da supervisora ainda prejudicou o tratamento psiquiátrico para depressão a que a vinha se submetendo – quando, por outro lado, o seu retorno ao trabalho junto a colegas que a admiravam e solicitavam seu auxílio "poderia ter auxiliado sobremaneira a melhora do seu quadro", que acabou agravado.

A empresa também recorreu, alegando que o valor da condenação era alto e desproporcional à ofensa moral alegada, mas o relator concluiu que não se trata de "um pequeno desentendimento pessoal", mas de arbitrariedades da supervisora que culminaram com a dispensa da empregada. Assim, avaliou que a empresa deveria reparar o dano causado à trabalhadora, "na medida de sua extensão, independente da possibilidade de desempenho de outras atividades", como estabelece os artigos 944, parágrafo único, e 945 do Código Civil. Arbitrou o valor da indenização em R$ 10 mil e foi seguido por unanimidade pelos demais ministros da Sexta Turma.

Processo: RR-1153700-63.2009.5.09.0009


FONTE:  TST, 13 de janeiro de 2012.

DIREITO DAS SUCESSÕESAs batalhas judiciais após a perda do familiar

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ESPECIAL: *STJ – Ainda sob o efeito da dor de perder um parente, muitas famílias precisam enfrentar uma batalha judicial para dispor dos bens deixados pela pessoa falecida. Ao longo de 2011, a disputa por herança foi tema recorrente no Superior Tribunal de Justiça, principalmente na Terceira e Quarta Turma, especializadas em direito privado.

De acordo com as regras do direito das sucessões, expressas no Livro V do Código Civil (CC) de 2002, quando uma pessoa morre sem deixar testamento, a herança é transmitida aos herdeiros legítimos. Os artigos 1.845 e 1.846 estabelecem que são herdeiros necessários os descendentes, os ascendentes e o cônjuge. Pertence a essas pessoas, de forma obrigatória, metade dos bens da herança. Ou seja, havendo herdeiros necessários, a pessoa só pode doar a outros herdeiros metade do seu patrimônio.

Outro dispositivo que merece destaque é o artigo 1.790, que trata da companheira ou companheiro em união estável. Essa pessoa participa da sucessão do outro. Se houver filhos em comum do casal, o que sobrevive terá direito a uma cota equivalente à que for atribuída ao filho por lei. Se os filhos forem apenas do autor da herança, o companheiro terá metade do que couber a cada descendente. Caso a concorrência seja com outros parentes sucessíveis, o direito será a um terço da herança; e na ausência desses parentes, o companheiro ficará com a totalidade dos bens.

Herdeiros colaterais

Em outubro de 2011, a Terceira Turma julgou a destinação de herança cuja autora não tinha descendente, ascendente nem cônjuge. O artigo 1.839 determina que nessas hipóteses, os herdeiros serão os colaterais até quarto grau. No caso, os irmãos da falecida também já estavam mortos.

A herança ficou, então, para os sobrinhos, colaterais de terceiro grau, que apresentaram um plano de partilha amigável e incluíram uma sobrinha-neta, filha de um sobrinho já falecido. Com base no artigo 1.613 do CC de 1916, segundo o qual os colaterais mais próximos excluem os mais remotos, o juiz de primeiro grau excluiu a sobrinha-neta da partilha. No CC de 2002, a regra foi reproduzida no artigo 1.840.

A decisão foi mantida em segundo grau, o que motivou recurso da excluída ao STJ. Alegou que era herdeira por representação de seu pai, que, se fosse vivo, participaria da herança. Ela invocou a ressalva do artigo 1.613, que concede direito de representação aos filhos de irmão do autor da herança.

O recurso foi negado. A relatora, ministra Nancy Andrighi, destacou que, por expressa disposição legal, o direito de representação na sucessão colateral está limitado aos filhos dos irmãos, não se estendendo aos sobrinhos-netos (REsp 1.064.363).

De acordo com o artigo 1.844, na falta de parente sucessível ou renúncia à herança, ela ficará nos cofres do município onde estiver. Caso esteja em território federal, ficará com a União.

União estável

A Quarta Turma deu provimento a recurso especial para excluir irmão de mulher falecida do inventário como herdeiro. O autor do recurso é o companheiro da autora da herança, que alegou ter convivido em união estável com a falecida por mais de 20 anos, tendo construído com ela patrimônio comum.

A justiça do Rio de Janeiro considerou que não existia documento capaz de comprovar a relação familiar entre o recorrente e a falecida. Por isso, deferiu a habilitação do irmão, parente colateral, como herdeiro. A mulher não deixou descendente ou ascendente. Importante ressaltar que a sucessão foi aberta ainda na vigência do CC de 1916.

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, observou que a união estável foi reconhecida judicialmente, ainda que após a interposição do recurso especial. Segundo ele, em sucessão aberta antes do CC de 2002, aplica-se o disposto no art. 2º, inciso III, da Lei 8.971/94, o que garantiu ao companheiro a totalidade da herança (REsp 704.637).

Única moradia

Quando o casal adota regime de separação total de bens e o proprietário do imóvel em que residem morre, como fica a pessoa que sobrevive? O STJ entende que ela deve continuar residindo no local, mesmo que não tenha direito à herança.

O entendimento foi adotado no julgamento de um recurso especial em que as filhas do dono do imóvel tentavam retirar a segunda esposa do pai do apartamento que tinham herdado. O bem também é parte da herança da mãe delas. No recurso ao STJ, elas alegaram que a segunda esposa do pai não teria direito real de habitação sobre o imóvel, porque era casada sob o regime de separação total de bens.

O ministro Sidnei Beneti, relator, explicou que o CC de 2002, no artigo 1.831, garante ao cônjuge sobrevivente, qualquer que seja o regime de bens e sem prejuízo do que lhe caiba por herança, o direito real de habitação sobre o imóvel destinado à residência da família, desde que ele seja o único a ser inventariado. Mesmo antes do novo código, a Lei 9.278/96 já havia conferido direito equivalente às pessoas ligadas pela união estável (REsp 821.660).

Antes da partilha

Ao falecer, a pessoa deixa um conjunto de bens, rendimentos, direitos e obrigações, o chamado espólio. Antes da partilha dos bens, é preciso fazer um inventário, que é descrição detalhada do patrimônio deixado. De acordo com o artigo 1.997, a herança responde pelo pagamento das dívidas do falecido. Feita a partilha, os herdeiros respondem, cada um, na proporção da parte que lhe coube na herança.

Enquanto não há individualização da cota pertencente a cada herdeiro, ou seja, a partilha, o espólio assume a legitimidade para demandar e ser demandado nas ações judiciais em que o falecido, se fosse vivo, integraria o polo ativo ou passivo. Quando a pessoa falecida deixa dívidas, é comum o ajuizamento de ação de cobrança contra o espólio.

Também em outubro passado, a Terceira Turma julgou recurso do Banco do Estado do Rio Grande do Sul S/A (Branrisul), que ajuizou ação de cobrança contra um espólio, citado na pessoa da viúva. O banco pretendia receber R$ 5 mil decorrentes de dois empréstimos contratados pelo autor da herança.

O processo foi extinto sem julgamento de mérito por decisões de primeira e segunda instância. Os magistrados da Justiça gaúcha consideraram que a falta de abertura do inventário do falecido, sem a definição do inventariante (responsável pela administração dos bens), todos os herdeiros devem ser citados, e não apenas a viúva.

Mas não é esse o entendimento do STJ. Relator do recurso do banco, o ministro Massami Uyeda apontou que a inexistência de inventariante não faz dos herdeiros, individualmente considerados, parte legítima para responder a ação de cobrança. Isso porque, enquanto não há partilha, é a herança que responde por eventual obrigação deixada pelo falecido e é do espólio a legitimidade passiva para integrar o processo.

Uyeda afirmou também que o espólio e o inventariante não se confundem, sendo o primeiro parte na ação e o segundo, o representante processual. O relator aplicou a regra do artigo 1.797, segundo o qual, até o compromisso do inventariante, a administração da herança caberá, sucessivamente, ao cônjuge ou companheiro, ao herdeiro mais velho que estiver na posse e administração dos bens, ao testamenteiro ou a pessoa de confiança do juiz. Por isso, a Turma deu provimento ao recurso para dar seguimento à ação contra o espólio, na qual a viúva foi citada (REsp 1.125.510).

Universalidade da herança

O artigo 1.784 do CC estabelece que o patrimônio deixado pelo falecido transmite-se, desde a morte, aos herdeiros legais ou apontados em testamento. É a adoção pelo direito brasileiro do princípio da saisine. Desta forma, o patrimônio deixado não fica sem titular em momento algum.

Já o artigo 1.791 define que a herança é um todo unitário, ainda que existam vários herdeiros. Até a partilha, o direito dos herdeiros é indivisível e obedece às normas relativas ao condomínio, que é formado com a abertura da sucessão.

Com base nesses dois dispositivos, a Terceira Turma entendeu que um único herdeiro tem legitimidade para reivindicar individualmente, mesmo sem a participação dos demais herdeiros na ação, bem comum que esteja indevidamente em poder de terceiros.

O relator, ministro Massami Uyeda, afirmou que “o espólio é representado em juízo pelo inventariante. Todavia, tal legitimação não exclui, nas hipóteses em que ainda não se verificou a partilha, a legitimidade de cada herdeiro vindicar em juízo os bens recebidos a título de herança. Trata-se, pois, de legitimação concorrente”. O julgamento reformou decisão da justiça de Minas Gerais, que entendeu pela ilegitimidade da herdeira para propor a ação (REsp 1.192.027).

Deserdação

Os herdeiros necessários podem ser excluídos da sucessão ou deserdados, mas não é tão simples. Os casos em que isso pode ocorrer estão expressamente previstos no Código Civil. O artigo 1.814 estabelece que serão excluídos da sucessão os herdeiros que tiverem sido autores, co-autores ou participantes de homicídio contra o autor da herança, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente.

Também será excluído quem tiver acusado caluniosamente, em juízo, o autor da herança ou praticar crime contra sua honra, do seu cônjuge ou companheiro. O mesmo vale para quem usar de violência ou fraude para impedir a livre disposição dos bens por ato de última vontade do dono do patrimônio.

Já a deserdação pode ocorrer quando o descendente praticar contra o ascendente ofensa física, injúria grave, relações íntimas com a madrasta ou padrasto ou desamparo perante alienação mental ou doença grave.

Com base nessas regras, um homem ajuizou ação de deserdação contra o irmão, alegando que o pai deles teria manifestado em testamento o desejo de excluir aquele filho da sucessão de seus bens. Isso porque ele o teria caluniado e injuriado nos autos do inventário da esposa. O pedido foi negado em primeiro e segundo grau.

No recurso ao STJ, o autor da ação alegou que, para configurar a denunciação caluniosa, não é necessária a existência de ação penal. Argumentou que a propositura de ação de interdição infundada seria injúria grave.

Seguindo o voto do relator, ministro Massami Uyeda, a Terceira Turma também negou o pedido. Para os ministros, o ajuizamento de ação de interdição e o pedido de remoção do pai como inventariante da mãe são, na verdade, o exercício de regular direito garantido pela legislação. Por isso, esses atos não podem justificar a deserdação (REsp 1.185.122). 


FONTE:  STJ, 08 de janeiro de 2012.