DECISÃO: *STF – O Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou uma ação popular – autuada como Ação Originária (AO) 1725 – proposta, com pedido de liminar, por um procurador federal com o objetivo de suspender o pagamento do auxílio-alimentação de todos os magistrados brasileiros. A decisão é do ministro Luiz Fux.
Segundo a ação, o benefício tem sido pago com base em ato normativo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e em diversas leis estaduais. Em síntese, o autor sustentava que o pagamento de auxílio-alimentação a todos os juízes brasileiros é indevido por ausência de previsão deste direito na Lei Orgânica da Magistratura (Loman).
Análise da liminar
Conforme o ministro Luiz Fux, os precedentes do Supremo “que delimitam a concessão de vantagens e direitos aos magistrados ao que expressamente previstos na Loman têm como objetivo evitar o pagamento de valores sabidamente indevidos e, muitas vezes, criados por leis estaduais de ocasião”. O relator afirmou que a jurisprudência da Corte sobre o tema, que faz frequente alusão ao texto da Loman em matéria de vantagens asseguradas aos magistrados, tem o objetivo de impedir abusos e distorções no pagamento feito a magistrados brasileiros.
“Não se vislumbra, em uma visão interdisciplinar e que parta da premissa de que o texto constitucional é o cume axiológico de nosso ordenamento jurídico, qualquer ilícito no pagamento a magistrados de direitos concedidos regularmente à maioria dos trabalhadores brasileiros, servidores públicos ou não, e especialmente aos membros do Ministério Público, carreira com que a magistratura guarda plena simetria, na esteira do que reconhecido pelo Conselho Nacional de Justiça”, entendeu o ministro.
De acordo com ele, uma interpretação evolutiva do texto da Loman, que guarde compatibilidade com o texto constitucional, revela o necessário reconhecimento dos direitos aos magistrados que sejam ordinária e regularmente pagos aos trabalhadores, tal como ocorre com o pagamento do auxílio-alimentação. O relator afirmou, por exemplo, que a Loman não prevê expressamente o direito à licença-paternidade, não assegura o direito à licença-maternidade, nem o direito ao adicional de férias, mas ressaltou que não seria por esse motivo que as juízas brasileiras deixariam de ter esse direito.
Sob a ótica da Justiça, o ministro Luiz Fux considerou que o pagamento de auxílio-alimentação a juízes não representa qualquer imoralidade, ilegalidade ou inconstitucionalidade, “em uma leitura do texto constitucional que reconheça o caráter simétrico entre a magistratura, que é nacional, e os membros do Ministério Público”.
O ministro observou que o regime remuneratório da magistratura brasileira tem sido alterado constantemente, por isso nem todos os direitos previstos no rol do artigo 65 da Loman são, nos dias de hoje, efetivamente assegurados a todos os magistrados. Esse é o caso das parcelas de representação e de gratificação adicional por tempo de serviço que, segundo ele, “desde o advento do regime de subsídio, não são pagas”.
Segundo o relator, as frequentes alterações do regime remuneratório dos agentes públicos brasileiros “impedem interpretações literais e descontextualizadas da realidade social brasileira que evolui, paulatinamente, concedendo a todos os trabalhadores brasileiros, e não apenas a juízes e a membros da AGU, vantagens de natureza social, como ocorre com o auxílio-alimentação, valor que, reitero, é de diminuta expressão monetária individual, mercê de percebida por todas as categorias de trabalhadores no Brasil”. Portanto, o ministro Luiz Fux entendeu que não há o requisito da fumaça do bom direito que legitime o deferimento da medida liminar solicitada.
Cabimento da ação popular
Para o ministro, a ação popular não pode ser utilizada como alternativa à não propositura de uma ação direta de inconstitucionalidade, sob pena de uma ampliação indevida do rol de legitimados previsto no artigo 103 da Constituição da República. “Ação popular tem como objetivo anular atos administrativos lesivos ao Estado, e não a anulação de atos normativos abstratos e de leis estaduais”, explicou.
Isso porque, conforme o ministro Luiz Fux, o autor propôs a presente ação contra a União, o Distrito Federal e todos os estados da federação pretendendo a invalidação de todas as normas jurídicas, leis e atos administrativos que fundamentariam o pagamento do auxílio-alimentação a juízes. “Parte-se de uma premissa de que as Casas Legislativas de todos os estados da federação, bem como de que o Conselho Nacional de Justiça praticaram uma inconstitucionalidade ao estender aos magistrados o direito ao auxílio-alimentação”, observou.
De acordo com o relator, o demandante concluiu por si só, e sem ter recebido autoridade alguma do ordenamento jurídico, que houve inércia dos legitimados para a propositura de uma ação direta de inconstitucionalidade na hipótese dos autos. “Fica evidente que a presente ação popular foi ajuizada com o nítido intuito de substituir uma eventual ação direta de inconstitucionalidade que não foi ajuizada”, salientou, verificando que, caso a pretensão fosse acolhida, bastaria que todo e qualquer cidadão ajuizasse uma ação popular para sustentar a inconstitucionalidade de uma lei, “o que ampliaria indevida e inconstitucionalmente o rol das pessoas que possuem legitimidade para provocar o controle concentrado de constitucionalidade no Brasil”.
Dessa forma, o ministro Luiz Fux indeferiu a petição inicial e julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, com fundamento no artigo 267, inciso I, do CPC c/c artigo 21, parágrafo 1º, do Regimento Interno do STF, “por manifesta impossibilidade de manejo da ação popular para o objetivo pretendido pelo demandante de sustação de atos normativos genéricos”.
FONTE: STF, 30 de março de 2012