* Felícia Ayako Harada
Uma questão muito comum nos condomínios diz respeito ao “quorum” para deliberação de determinadas reformas ou melhoramentos do condomínio.
Tive notícia de um condomínio que queria construir uma garagem no campinho de futebol lá existente. A polêmica foi voraz. Muitos queriam outros não.
Os que queriam a nova garagem argumentavam não haver sentido, em tempos atuais, a existência de edifícios de três ou quatro dormitórios com apenas uma vaga de garagem por apartamento.
Logo se conclui, que a necessidade surgiu, pois, os “jogadores de futebol” cresceram e passaram a motoristas de seus próprios carros.
Os que não queriam as novas vagas argumentavam que quando compraram as suas respectivas unidades, os condôminos tinham conhecimento da limitação de vaga e que a finalidade seria apenas de ostentação. Isto sem dizer do aumento de circulação de veículos pelo edifício.
Após inúmeras discussões, inúmeras assembléias, os vizinhos se digladiando, aprova-se a construção da garagem por deliberação de maioria simples (metade dos condôminos presentes mais um) em assembléia extraordinária.
Poderia a deliberação por maioria simples aprovar a construção da garagem?
A maioria vitoriosa foi buscar seus argumentos na convenção, onde consta:
1. para alterar ou substituir coisas ou bens do condomínio o quorum para deliberação é de 2/3 dos condôminos;
2. porém:
1. para as benfeitorias necessárias, o síndico poderia executá-las mediante aprovação do Conselho Consultivo;
2. para as benfeitorias úteis, necessária a deliberação por maioria simples, isto é, metade mais um dos condôminos presentes em assembléia;
3. para as voluptuárias, 2/3 da totalidade dos condôminos.
O cerne da questão se resume no fato de a deliberação para construção da garagem ter sido aprovada por maioria simples, que no meu entender é vedado por lei, neste particular.
Não resta a menor dúvida de que as novas vagas constituem benfeitorias úteis nos moldes da família moderna, que felizmente ou infelizmente, possuir mais de um carro virou regra. Ainda, alegaram os vencedores que o valor imobiliário da propriedade aumentaria.
Entretanto, a minoria vencida trouxe sabiamente à baila o art. 1342 do Novo Código Civil que dispõe:
“Art. 1342. A realização de obras, em partes comuns, em acréscimo às já existentes, a fim de lhes facilitar ou aumentar a utilização, depende de aprovação de dois terços dos votos dos condôminos, não sendo permitidas construções, nas partes comuns, suscetíveis de prejudicar a utilização, por qualquer dos condôminos, das partes próprias, ou comuns.”
Imediatamente, revidaram os vencedores argumentando que o inciso III do Art. 1334 do referido Código Civil outorga à convenção de condomínio o poder de estabelecer “quorum” exigido para as deliberações.
Todavia, este argumento dos vencedores não pode prevalecer. Realmente, a lei civil permite que a convenção determine o quorum para as deliberações, desde que respeite o quorum de algumas deliberações, que dada a sua importância ou repercussão social está previsto em lei, como o disposto no artigo 1342 acima citado. Esclareça-se, o art. 1342 não está de enfeite no Código e há de ser observado.
Não se nega que a construção da garagem é um acréscimo em parte comum que facilitaria e aumentaria a sua utilização, porém, o quorum de aprovação há de ser o previsto no citado art.1342, isto é, por 2/3 da totalidade dos condôminos, respeitando-se ainda, a limitação nele contida.
Ademais, o que a convenção previu, nos moldes da lei civil, é a deliberação por maioria simples na instalação de benfeitorias úteis. Não se pode concluir que a construção da garagem pelo fato de ser benfeitoria útil, por si só, poderia ser deliberada por maioria simples. Ela assim o poderia se não houvesse regra expressa como a contida no citado Art. 1342 do Código Civil, que exige 2/3 da totalidade dos condôminos.
REFERÊNCIA BIOGRÁFICA