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DIREITO À INSALUBRIDADE: Limpeza de banheiro em hospital gera direito a adicional de insalubridade em grau máximo

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A discussão diz respeito ao contato com agentes biológicos.

 

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho deferiu a uma auxiliar de higienização do Hospital Mater Dei S. A., de Belo Horizonte (MG), as diferenças relativas ao adicional de insalubridade em grau máximo. A decisão seguiu o entendimento da Súmula 448 do TST de que a limpeza nesses locais não se equipara à de residências e escritórios.

 

Grau médio

Na reclamação trabalhista, a empregada afirmou que recebia o adicional em grau médio (20%), mas sustentou que a limpeza de banheiros em locais de grande circulação caracterizaria insalubridade em grau máximo e que, portanto, teria direito ao adicional de 40%. Pediu, assim, o recebimento das diferenças.

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) concluiu pela inexistência da insalubridade em grau máximo com base no laudo pericial. Segundo o TRT, os banheiros eram utilizados apenas por empregados do andar do hospital em que a auxiliar trabalhava e por alguns visitantes, situação equiparável à limpeza em escritórios.

 

Agentes biológicos

O relator do recurso de revista da empregada, ministro Alberto Bresciani, explicou que a discussão diz respeito ao contato com agentes biológicos na limpeza de banheiros de uso coletivo de hospital. Segundo o relator, o TST tem se posicionado no sentido de que é perfeitamente aplicável a regra do Anexo 14 da Norma Regulamentadora 15 do Ministério do Trabalho quando se tratar de estabelecimento empresarial ou de local de acesso de grande número de pessoas. “Não se pode comparar a limpeza e a coleta do lixo dos banheiros de um hospital à realizada em banheiros de escritórios e residências”, concluiu. Por unanimidade, a Turma entendeu que a decisão do TRT contrariou o item II da Súmula 448 do TST e condenou a empresa ao pagamento do adicional de insalubridade em grau máximo. Processo: RR-11773-05.2016.5.03.0024

 

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FONTE: TST, 23 de outubro de 2018.

DIREITO AMBIENTAL: “Nenhuma matéria tem maior importância do que a proteção ao meio ambiente”, diz presidente do STJ

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“Nenhuma matéria tem maior importância para o Brasil e para seus juízes do que a proteção ao meio ambiente. Não podemos deixar que o direito ao meio ambiente seja apenas uma promessa do legislador constituinte, mas devemos trabalhar para que ele seja assegurado para as futuras gerações”, afirmou o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, ao discursar no encerramento do 2° Colóquio de Jurisprudência Comparada entre o Superior Tribunal de Justiça do Brasil e a Corte de Cassação da França: Direito Ambiental. Para o ministro Noronha, o STJ tem o dever de discutir, atuar e agir para assegurar o direito de todos em relação ao meio ambiente. “Esse é o papel fundamental das decisões dos tribunais, sobretudo da jurisprudência do STJ, que traça pautas de comportamento para os agentes sociais. Essa pauta de comportamento tem sido cada vez mais elaborada, detalhada, para preservar a maior riqueza do Brasil, que são nossas florestas, nossa água potável, a flora e a fauna”, afirmou.

 

Papel das associações

Durante a tarde desta segunda-feira (22), as cortes fizeram o intercâmbio de entendimentos jurisprudenciais e precedentes envolvendo questões ambientais. No painel em que se discutiu o dano ambiental e o papel das associações, o ministro Villas Bôas Cueva fez uma análise da questão do nexo de causalidade ambiental e mencionou precedente de relatoria do ministro Herman Benjamin, no qual foi estabelecido que, “para fins de apuração de nexo de causalidade no plano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam e quem se beneficia para que outros façam”. O ministro Christian Pers, da Corte de Cassação da França, afirmou que as associações têm papel essencial na proteção ambiental. Pers ressaltou a atuação das chamadas associações acreditadas, as quais podem apresentar denúncias referentes aos danos ambientais. “O papel das associações é essencial e pode evoluir”, disse. Para a ministra Assusete Magalhães, o Ministério Público Federal e o dos estados têm papel de destaque na proteção do meio ambiente. Ela afirmou que, “embora a atuação das associações seja importante para a proteção do meio ambiente, no Brasil, infelizmente, as associações têm enfrentado dificuldades de ordem financeira e organizacional para postularem a reparação de dano ambiental. Na verdade, no Brasil, a instituição que mais tem demandado a proteção de direito ambiental é, sem dúvida, o Ministério Público”. Durante o debate, a ministra Regina Helena Costa falou sobre “Responsabilização Civil Ambiental e a Teoria do Fato Consumado”. Apresentou precedente pioneiro a respeito do tema, que concluiu inexistir direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente. “No âmbito do direito ambiental, este tribunal construiu, ao longo dos últimos anos, uma jurisprudência no sentido de rechaçar a aplicação dessa teoria”, concluiu Regina Helena Costa.

 

Terrorismo ecológico

O ministro Rogerio Schietti Cruz coordenou o painel “Jurisprudência Comparada na Voz dos Ministros Julgadores da Corte de Cassação da França e do STJ: Direito Penal Ambiental”. O ministro Christian Pers destacou que o novo Código Penal francês reconhece o crime de terrorismo ecológico – tudo que causa dano à saúde animal e do homem. Mas, para o magistrado, isso não é suficiente quando se trata da questão ambiental. “Buscamos também a diretiva de harmonizar a questão das infrações com as sanções, para evitar que autores desses delitos não se aproveitem das divergências.” O ministro Nefi Cordeiro, por sua vez, ressaltou o reconhecimento pelo STJ da possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica em matéria ambiental, embora ainda persista a dificuldade dessa abordagem com relação ao processo penal. “Vivemos uma situação de inúmeros danos em uma grande extensão territorial, o que dificulta a persecução penal, inclusive com relação à definição do ramo do Judiciário que julgará cada questão, por exemplo”, salientou. Presidente da Quinta Turma do STJ, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca apresentou sua contribuição ao colóquio ressaltando que “o Brasil está avançando, desde a Constituição Federal de 1988, para a garantia dos direitos de terceira geração, com uma jurisprudência que efetivamente aplica o direito penal para a proteção do meio ambiente”. Para o ministro, a Lei 9.605/98 consolidou a responsabilização penal ambiental não só para pessoa física, mas também para pessoa jurídica”. Ele destacou julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que reconheceu a possibilidade de responsabilização penal de pessoa jurídica de direito público. O ministro Ribeiro Dantas fechou a discussão do painel comparando que a França inseriu a questão dos crimes ambientais no Código Penal; o Brasil, por sua vez, optou por definir o tema em uma lei, a 9.605/98, que criminalizou a pessoa jurídica em matéria ambiental. O ministro lembrou a grande extensão do território brasileiro – “15,4 vezes o tamanho da área da França” – e a dificuldade enfrentada na fiscalização de uma área tão vasta. Para ele, deve-se contar cada vez mais com a estrutura do Ministério Público Federal nessa fiscalização. O magistrado lembrou o caso de uma empresa do ramo alimentício acusada de crime ambiental que tentou trancar uma ação penal por meio de habeas corpus, o que foi negado pelo STJ, por entender ser inviável, por meio de habeas corpus, o trancamento de ação penal envolvendo pessoa jurídica.

Ao abrir o painel de conclusões do colóquio, o ministro Luis Felipe Salomão enfatizou a importância da discussão sobre o direito ambiental e da troca de experiências ocorrida durante o evento, o que enriqueceu o debate e demonstrou a evolução do tema.

 

Participantes

O encontro aconteceu no STJ e contou com a presença de juízes brasileiros e ministros do STJ, além de dois membros da Corte de Cassação da França, os ministros Denis Jardel e Christian Pers. Participaram do evento os ministros Maria Thereza de Assis Moura (vice-presidente do STJ), Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Luis Felipe Salomão, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Moura Ribeiro, Regina Helena Costa, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro Dantas. Estiveram presentes ainda a presidente em exercício da Associação dos Magistrados Brasileiros, Renata Videira; o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Fernando Mendes; o desembargador Eladio Lecey, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam); a juíza Patrícia Leydner e o juiz Álvaro Valery Mirra.

 

Livro

O ministro Herman Benjamin agradeceu a participação dos ministros franceses, dos ministros brasileiros, dos juízes e desembargadores, e destacou que mais da metade dos integrantes do STJ estiveram presentes ao evento. Herman Benjamin destacou que as conclusões de todos os participantes do 2º Colóquio de Jurisprudência Comparada a respeito dos aspectos comuns e divergentes da jurisprudência das duas cortes sobre direito ambiental serão apresentadas pelos participantes no livro que está sendo preparado sobre o encontro.

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FONTE: STJ, 22 de outubro de 2018.

DIREITO CIVIL: Mantida sentença que condenou ex-funcionárias de creche por morte de criança

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Duas ex-funcionárias de uma creche de Ribeirão Preto terão que indenizar em R$ 200 mil a mãe de um garoto morto por asfixia após ingerir leite regurgitado. Além disso, elas pagarão pensão mensal correspondente a 2/3 do salário mínimo, desde a data em que a criança completaria 14 anos até a data em que faria 25 anos, e, a partir de então, 1/3 do salário mínimo até o momento em que atingiria 65 anos de idade.

A decisão foi proferida pela 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, em apelação interposta por uma das acusadas, que pleiteava a redução do valor da indenização e alteração na forma de arbitramento da pensão.

A relatora, desembargadora Marcia Dalla Déa Barone, afirmou que a sentença deu correta solução ao caso, o que impõe sua manutenção. “Com efeito, a morte prematura do filho da autora, em tenra idade, causada por acidente que poderia ter sido evitado caso tivessem sido observados os cuidados mínimos exigidos ao se supervisionar um menor, causou danos psicológicos à autora, que devem ser indenizados e dispensam comprovação.”

Além da relatora, participaram do julgamento os desembargadores Rosangela Telles e José Joaquim dos Santos. A votação foi unânime.

Apelação nº 0067036-50.2010.8.26.0506

 

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FONTE: TJSP, 23 de outubro de 2018.

DIREITO PENAL: Ministro determina que Justiça de SP realize nova dosimetria da pena com base na jurisprudência do STF

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O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que a Justiça paulista realize nova dosimetria da pena aplicada a um condenado por crime de tráfico de drogas. A decisão, tomada no Habeas Corpus (HC) 162305, baseou-se na jurisprudência da Corte segundo a qual condenação anterior não pode ser reconhecida como maus antecedentes se decorridos cinco anos entre o cumprimento ou a extinção da pena e a data do novo crime, período após o qual o Código Penal afasta a reincidência.

A defesa pediu a revogação da prisão preventiva decretada contra seu cliente, condenado a cinco anos de reclusão em regime inicial fechado. Narrou que havia interposto apelação ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) pedindo o reconhecimento do tráfico privilegiado (artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/2006) – situação em que o agente é primário, possui bons antecedentes, não se dedica à atividade criminosa nem integra organização criminosa – e este ainda aguarda julgamento. Após o indeferimento de liminar em habeas corpus impetrado no Superior Tribunal de Justiça (STJ), a defesa apresentou o HC 162305 no Supremo.

Decisão

O ministro Gilmar Mendes verificou que há no caso manifesta ilegalidade na individualização da pena, o que autoriza a superação da Súmula 691 do STF (que veda o trâmite de habeas corpus no Supremo contra decisão que indefere liminar em HC impetrado em tribunal superior) e a concessão da ordem de ofício. Ele explicou que, no julgamento do HC 126315, de sua relatoria, a Segunda Turma do STF assentou o entendimento de que, decorridos mais de cinco anos desde a extinção da pena da condenação anterior (artigo 64, inciso I, do Código Penal), não é possível alargar a interpretação de modo a permitir o reconhecimento dos maus antecedentes. Essa orientação também foi adotada pela Primeira Turma no julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus (RHC) 118977.

“A possibilidade de sopesarem-se negativamente antecedentes criminais, sem qualquer limitação temporal, ad aeternum, em verdade, mostra-se pena de caráter perpétuo revestida de legalidade”, frisou o relator, ressaltando que a Constituição Federal veda expressamente, na alínea “b” do inciso XLVII do artigo 5º, as penas de caráter perpétuo. “Tal dispositivo suscita questão acerca da proporcionalidade da pena e de seus efeitos para além da reprimenda corporal propriamente dita”, afirmou.

Mendes salientou a necessidade da realização de nova dosimetria da pena no caso, uma vez que condenação transitada em julgado (quando não cabe mais recurso) há mais de cinco anos não implica circunstância judicial que justifique o aumento da pena-base.

Ele determinou que o juízo da Vara Criminal da Comarca de Olímpia (SP) recalcule a dosimetria, analisando os maus antecedentes com base na jurisprudência do Supremo. Determinou também que seja analisada a possibilidade de fixação da minorante prevista no artigo 33, parágrafo 4º, da

Lei de Drogas (tráfico privilegiado), adaptando, ainda, o regime prisional, nos termos do artigo 33 do Código Penal.

 


FONTE: STF, 22 de outubro de 2018.

Dia das crianças – um tempo para pensar no futuro delas

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Rizzatto Nunes* Nesta semana, comemora-se o Dia das crianças. A essa altura, quem podia comprar já comprou os presentes para serem entregues, como manda o calendário comercial-capitalista da ocasião. Quero, então, mais uma vez, aproveitar a data para propor uma reflexão sobre o tema.

Nós, adultos, em matéria de consumo, estamos praticamente perdidos nesta sociedade capitalista que tudo produz – e qualquer coisa produz… – e que tudo vende, amparada, sustentada e auxiliada pelo marketing moderno com suas técnicas de ilusão e controle. Para o adulto, o horizonte possível de liberdade desse enredo assustador que nos obriga a consumir, consumir e consumir é o da tomada de consciência do processo histórico, que se instituiu a partir das chamadas revoluções burguesa e industrial e que vem sendo vendida como um projeto de liberdade. Falsa liberdade, na medida em que quase todo seu exercício se resume a adquirir produtos e serviços cuja escolha é limitada àquilo que é decidido unilateralmente pelos fornecedores.

Vamos, pois, alguns de nós adultos, lutando contra o poder opressivo do mercado e outros nem se dando conta desse aprisionamento. Muito bem. Pergunto: é esse o futuro que desejamos para nossas crianças? É esse tipo de sociedade que queremos manter para que elas vivam quando crescerem? Uma sociedade em que os indivíduos se medem pelo que possuem, pelo poder de compra, pelo que podem ter e não por aquilo que são?

Claro que nem toda culpa é do mercado, mas com certeza o modelo que faz com que o cidadão se aliene nas compras e acredite na publicidade, o atordoa de tal modo que ele, jogado à própria individualidade, não sabe como agir. Vendo tevê ou navegando na web, por exemplo, assiste-se ao mundo perfeito dos anúncios publicitários: o de bancos mostrando seus gerentes sempre sorrindo e oferecendo vantagens a seus clientes, enquanto na realidade os clientes são enganados a torto e a direito, assinando contratos com cláusulas abusivas, recebendo cobranças de taxas absurdas, sendo obrigados a aderir a operações casadas ilegais, etc. Há, também, a propaganda de veículos maravilhosos, que nunca quebram; de smartphones mágicos; de alimentos exuberantes etc.; enfim, um longo desfile de produtos e serviços muito diferentes do real. Há, pois, dois mundos: o da publicidade e o dos fatos.

É incumbência dos adultos conseguir fazer a leitura de tudo o que lhe é dirigido, para tentar desvendar as enganações e discernir sobre o que é válido e verdadeiro. Mas, refaço a pergunta: e nossas crianças, como estão posicionadas nesta sociedade capitalista? Como é que elas recebem o espetacular assédio do marketing e suas armas?

Com mais influência que em relação aos adultos. Mas, claro, há muitos pais absorvidos por todas as formas de consumo e, inclusive, utilizam-se do próprio mercado para controlar seus filhos, o que é uma pena. Não que seja fácil. Ainda que, por exemplo, os pais tenham o costume de limitar a exposição de seus filhos à tevê, basta um pouco de tempo para a percepção do ataque (uma verdadeira guerra de anúncios invade a sala ou o quarto em poucos minutos!). E, se o filho tem seu tempo limitado de uso da internet, são suficientes também apenas alguns minutos para a explosão de ofertas.

E, se não bastasse isso, há toda a sedução do merchandising feito em programas de tevê, filmes de cinema, vídeo e até teatro infantil nacional ou importado, o apelo dos colegas de escola, dos parentes, das lojas nos shopping-centers, pois, afinal vive-se na cidade entre as demais pessoas, o contato é inevitável e não há mesmo nada de errado em frequentar shoppings, cinemas, teatros, viajar, assistir tevê etc. Não é mesmo fácil. Mas, é lição de casa que precisa ser feita.

Cabe aos pais e somente a eles decidir o que comprar para seus filhos. É preciso explicar aos menores a desnecessidade da aquisição da maior parte das bugigangas que são oferecidas; é salutar que se explique aos filhos o que realmente importa, o que de fato tem valor permanente. Tem-se que mostrar para as crianças, com os próprios exemplos vividos por elas, a inutilidade da maior parte de seus produtos.

É comum que as crianças que recebam muitos brinquedos, logo se desinteressem da maior parte deles. Pode ser um bom precedente para mostrar a desimportância de ter muitas coisas ao mesmo tempo. E, evidentemente, cabe aos pais dizer não. A criança pode até se frustrar, mas será por algo válido, uma boa experiência que ela levará consigo, pois na vida adulta ela perceberá que a frustração é um elemento comum no jogo social.

Os pais são, pois, os primeiros responsáveis por alertar seus filhos contra o assédio feito pelo marketing infantil hoje tão sofisticado e difundido. Cabe a eles, desde logo, ensinar aos filhos como se deve decidir para comprar produtos e serviços. Qual deve ser a função do produto, seja ele um brinquedo ou uma roupa. Que se deve comprá-los sem exagero. As crianças, se pudessem, agradeceriam as lições.

Autor:

Rizzatto Nunes é desembargador aposentado do TJ/SP, escritor e professor de Direito do Consumidor.

Juízes legisladores ou legisladores judicantes? *Gisele Leite

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Resumo:

A própria evolução da jurisdição e das funções do Poder Judiciário veio ampliar a ciência do Direito e toda sua capacidade de ser controle social e uma das bases sólidas do Estado Democrático de Direito.

Palavras-chave: Ativismo Judicial. Juízes. Legisladores. Interpretação Judicial. Jurisprudência. Súmula Vinculante.

Abstract: The veryevolutionofthejurisdictionandfunctionsoftheJudiciaryhasexpandedthescienceoflawandall its capacitytobe social controlandoneofthesolidfoundationsoftheDemocraticStateof Law.

Keywords: Judicial Activism. Judges. Legislators. Judicial Interpretation. Jurisprudence. BindingSummary

Verifica-se que a forma do controle de constitucionalidade das leis no tipo concentrado, realizado pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro, seja na apreciação da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn)[1] quanto na Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC)[2] pode ser reconhecida como atividade criadora do Direito, conforme os modelos previstos por Mauro Cappelletti, em sua obra intitulada “Juízes Legisladores”.

Boa parcela da doutrina considera que os tribunais, ao realizarem sua criatividade judiciária, estão avançando no interior da área precípua do legislativo cuja função principal, segundo Montesquieu que criou a tese da separação dos poderes, seria a elaboração das leis.

Há os que enxergam nessa atividade legislativa imprópria sendo um desrespeito ao paradigma basilar da modernidade democrática. Por outro lado, há quem defenda que o exercício do Direito Judiciário posto que represente o fortalecimento de um dos poderes do Estado, permitindo o funcionamento do sistema de freios e contrapesos os famosos “checksand balances[3] dos norte-americanos.

Cappelletti veio analisar com atenção buscando diferenciar entre interpretação e a criação judiciária das leis, bem como observou a transformação de juízes em legisladores diante da separação de poderes.

Faz-se necessário, ainda, destacar os principais aspectos legislativos atinentes ao controle de constitucionalidade no direito pátrio, observando-se se causa ou não o desequilíbrio entre os poderes do Estado.

É curial comentar um quadro comparativo entre o controle concentrado abstrato em outros países e, também analisar sua recepção pelo constitucionalismo brasileiro, particularmente o contemporâneo, o que veio a resultar nas regulamentações da ADIn e da ADC pelo legislador pátrio.

Aliás, por mais de uma oportunidade, o ministro do STF Carlos Velloso ressaltou a relevância do controle concentrado de constitucionalidade, lembrando que este surgiu na Áustria sob a inspiração de Kelsen e, que floresceu particularmente após a Segunda Grande Guerra Mundial.

Carlos Velloso ainda ressaltou que o referido controle continua florescendo porque os povos europeus sentiram dolorosamente, as consequências graves dos desmandos do autoritarismo do Estado.

Perceberam afinal que seria necessário redescobrir a noção de Constituição e, prover os meios e formas aptos a defendê-la. A Constituição representa o breviário do povo livre e, os povos europeus entenderam bem isso.

A produção do direito ou criatividade jurisdicional nos faz refletir sobre a crucial questão: o juiz seria mero intérprete-aplicador do Direito ou se participa in lato sensu, da atividade legislativa, da criação do Direito.

Lembremos que a expressão “Direito Judiciário” cunhada por Bentham, em meados do século XIX, para designar a atividade do juiz que ao declarar o direito existente e vigente, estaria, em verdade, criando o Direito.

O Direito Judiciário inglês, não codificado proporcionava diversos vícios, como a incerteza, obscuridade, confusão e, mesmo a dificuldade de averiguação.

Para Cappelletti não era relevante a diferença conceitual existente entre interpretação e criação do Direito, o verdadeiro problema reside no grau de criatividade e dos modos, limites e aceitação da criação do Direito pelos tribunais.

Um defensor leal da função legislativa dos juízes foi o Chiefof Justice, o inglês Garfield Barurck para quem a melhor arte da redação das leis e, mesmo o uso da mais simples linguagem legislativa, sempre deixa de qualquer modo, as lacunas a serem preenchidas pelo juiz e, sempre admite a ambiguidade e as incertezas que, enfim, devem ser resolvidas pela via judiciária.

Cappelletti sustentava que na missão de “criar o direito”, o juiz não possui plena liberdade para interpretação, pois o sistema jurídico estabelece certos limites à liberdade jurisdicional, que tanto podem ter limites processuais quanto os substanciais. E, nisso se traduz o devido processo legal que classicamente institui aplicar o direito substancial ou material através da observância do direito processual, seguindo honestamente os procedimentos previstos e vigentes.

Não existe oposição entre as duas atividades uma vez que o processo de criação ocorre em razão da necessidade de preencher as lacunas resultantes do processo legislativo, o que é realizado através da interpretação.

busilis está justamente em mensurar o grau de criatividade, será maior quando a decisão do juiz está lastreada na equidade e, será menor quando julga e interpreta, argumentando com alguma lei ou precedente judicial.

Porém, em ambos os casos, a atividade do juiz muito se assemelha a do legislador visto que nem o legislador é totalmente livre pois tem na Constituição ou nas decisões judiciais que são as balizas a delimitar a sua liberdade.

A interpretação assim deve vincular o julgador, seja por meio da lei, de precedente ou equidade. Mas tal vinculação também não é absoluta, pois o juiz tem a necessidade de ser livre e deve fundamentar adequadamente todas suas decisões.

É inquestionável que a atividade judicial envolva sempre a interpretação conforme, já salientou Lorde Radcliffe[4], pois é óbvio que o juiz é criador de Direito, não havendo como não sê-lo.

A exposição do direito legislador é uma das principais causas de expansão na modernidade do direito judiciário ou jurisprudencial e, ipso facto, do poder criativo dos juízes.

Morton White[5] aponta que é a interpretação judiciária que representa um fenômeno do século XX e que tem como incremento a revolta contra o formalismo que se contrapunha, os EUA, na análise de casos concretos; em França, ao positivismo jurídico; e, na Alemanha, ao formalismo científico e conceitual.

Em resumo, erigiu-se como reação ao mecanicismo e à lógica que impunha ao juiz ser a “inanimada boca da lei” (Montesquieu). Com os reformadores, então passou haver a defesa de que o papel do juiz é muito mais complexo, pois ao declarar a lei e aplicá-la de forma criativa, há inexorável inclusão de valores pessoais e argumentos da história, da economia, da política, da filosofia, da ética, da sociologia e da psicologia.

Afinal, escolher nessa tábua axiológica[6] significar ter presentes os resultados práticos e as implicações morais advindas da própria escolha[7].

Levanta-se a dúvida, se a concepção de juiz legislador não comprometeria a noção fundamental de separação dos poderes, ameaçando a democracia e formando um Estado totalitário ou um Estado Judiciário.

No Estado Social ou bem-esta social cumpre o governo providenciar a execução de leis que garantam e assegurem os novos direitos, inclusive os sociais, difusos e coletivos.

Quanto mais abstrata for a lei, maior espaço haverá para que os juízes interpretem e, tal mudança comportamental dos julgadores reflete a própria mudança do Estado Moderno (de Liberal para Social) e a alteração ampliativa do papel desempenhado pelo Direito na sociedade humana.

É certo que o Estado Social majorou seus compromissos ao invés de entregar a gestão nas mãos do mercado, vindo intervir drasticamente na vida social, necessitando, para tanto, de forte produção legislativa e de uma máquina administrativa e burocrática bem ampla e capaz de realizar tal missão.

WelfareState é originariamente muito um Estado Legislativo e, que se transformou continuamente e, ainda continua em transformação para ser um Estado Administrativo que no fundo, era um Estado burocrático, não sem o perigo de se tornar um Estado policial, conforme bem advertiu Cappelletti.

O gigantismo estatal[8] dotado de legislativo, administrativo e burocracia só fizeram majorar as funções e responsabilidades dos juízes, sendo que a justiça institucional especialmente a referente ao controle judiciário da legitimidade constitucional das leis, constitui um aspecto dessa realidade e responsabilidade.

Ao judiciário apontava-se duas alternativas: a) permanecer fiel à concepção tradicional do século XVIII aos limites da função jurisdicional; b) elevar-se ao nível de outros poderes, tornar-se o terceiro gigante, capaz de controlar tanto o legislador como o administrador.

Em 1789, o modelo clássico instituído em França proclamava o ideal de separação de poderes, no qual os tribunais estavam impedidos de interferir na atividade legislativa ou administrativa.

Aos poucos, porém, fortaleceu-se o Conselho do Estado que inicialmente tinha a competência para receber os conflitos entre cidadãos e administração pública, passando depois a exercer o controle judiciário sobre os atos administrativos do Estado.

Verificou-se tal evolução não somente em França, como também em outros países europeus, notadamente a Alemanha e Itália. A referida função de controle advém da premente necessidade de examinar cuidadosamente a atividade legislativa, notadamente após a Segunda Grande Guerra Mundial.

No direito norte-americano, com maior facilidade a magistratura assumiu a função de exercer a atividade criadora do Direito, tendo inclusive a nobre tarefa desempenhada pela Suprema Corte que é um órgão do Judiciário e, não propriamente, a uma Corte constitucional especial.

A estrita e rigorosa separação de poderes teve como efeito a criação de um judiciário débil e confinado essencialmente aos conflitos privados. Cappelletti aduz que para um sistema de controle recíproco pode, sem perigo para liberdade, fazer coexistir um legislativo forte ao lado de um Executivo e Judiciário igualmente fortes.

É no equilíbrio de forças de contrapesos e controles recíprocos onde reside o inegável sucesso do sistema constitucional norte-americano. Um sistema de checkand balances onde o crescimento do Judiciário é o ingrediente necessário ao equilíbrio dos três poderes.

A principal preocupação é saber se a criação judiciária torna o juiz um legislador. Se assumindo o papel acentuadamente criativo, será mesmo que a função jurisdicional, se iguala à função legislativa, com a invasão do Judiciário em território privativo do Legislativo?

De acordo com Lorde Diplock[9], a resposta é afirmativa, pois em razão da função própria, os tribunais estão constrangidos a agir como legisladores. No entanto, Cappelletti discorda, pois, os juízes são chamados a esclarecer, integrar, plasmar e transformar a não raro criar um ex-novo Direito, mas isso, não significa, que sejam legisladores.

O doutrinador italiano enfatiza ainda que é relevante distinguir o processo jurisdicional do processo legislativo, principalmente porque o primeiro envolve o contraditório entre as partes, o que não se dá no processo legislativo.

Mas, reconhecem os tribunais que podem atuar com competência legislativa, ao invés do judiciário, quando exercem o poder de emanar diretivas gerais em temas como interpretação, a vinculação dos tribunais inferiores e emitidos enunciados obrigatórios sem a devida conexão com determinado caso concreto, quando também podem assumir eficácia erga omnes.

As críticas dirigidas à referida atividade criadora do Judiciário apontam-na como enfermidade prática, como é caso do surgimento da ambiguidade, o que torna confusa para a maioria das pessoas; outro problema se refere à eficácia retroativa, colhendo a previsibilidade e gerando o que é repudiado pelo CPC/2015 que é a decisão surpresa.

Outros, ainda, indicam alegada incompetência institucional da magistratura para agir como fonte criadora do Direito, porém, a acusação mais ferina e grave, refere-se à falta de legitimidade democrática dos juízes, que ao contrário do Legislativo e do Executivo, não são eleitos pelo voto popular. E, por essa razão, os magistrados não são obrigados a prestar contas ao povo de seus atos e nem atender aos seus anseios.

Um crítico feroz da criatividade judiciária é o LordeDevlin[10] que comentou que o filtro atuante do judiciário representaria um desvio tortuoso do processo democrático, levando-se ao Estado totalitário.

Mas, contra-argumentando Martin Shapiro[11] aduz que não necessariamente o Parlamento ou o Executivo, embora eleito pelo povo, realmente representem os interesses da maioria. Podem, certamente, representar sim, os interesses de grupos privados organizados e que conseguem fazer prevalecer sua força política junto aos dirigentes.

Com razão, aponta Shapiro que: “nesse processo de formação, troca e empréstimo de força política junto aos dirigentes. Cabe ressaltar ao lembrar que nas decisões do governo nem sempre são levados em conta conceitos como a “voz da maioria”, de tom democrático ou não-democrático”[12].

Além do argumento de que o Judiciário não é inteiramente desprovido de representatividade conforme defendeu Dahl que tomou por base a Suprema Corte norte-americana, pois seus membros por serem indicados pelo Presidente de República, refletem a posição dominante da maioria popular daquele determinado momento.

Destaca Cappelletti que tal argumento apesar de próprio da Common Law,mas também pode ser usado nos países que adotam a civil law, visto que os membros das Cortes Constitucionais são também indicados politicamente.

Recordamos que esse é o caso do Supremo Tribunal Federal que como guardião da Constituição brasileira posto que tenha seus membros indicados pelo Presidente da República.

Assim não deixa de ser, portanto, um órgão político que, ao decidir os casos concretos em tese, pode dar uma contribuição mais efetiva àquilo que Shapiro alcunhou de “representatividade geral do sistema”, ou seja, a possibilidade de que os mais diversos grupos tenham acesso ao processo judicial, de maneira mais facilitada do que teriam acesso ao processo político do Legislativo.

Temos aqui, portanto, outro argumento utilizado pelos defensores da criatividade judiciária, que proporciona, sem dúvida, uma das mais efetivas participações populares no processo democrático.

A questão tormentosa é saber se os juízes correm o risco de se transformaram em burocratas e isolados da sociedade?

Mauro Cappelletti advertiu que sim, mas nesse caso, através do sistema recíproco, a criação judiciária é considerada aceitável, podendo ser corrigida mediante de ato do Legislativo ou por meio de revisão constitucional.

A lei é um mito que deve ser completado e interpretado para traduzir-se em ação real, em certa medida a interpretação judiciária é sempre criativa do Direito.

Resta saber qual seja essa medida desta criatividade e, se esta produção de Direito pertence à vontade majoritária, conforme se expressa, em forma de maioria simples ou qualificada, conforme a legislação ordinária ou constitucional.

Porém, Cappelletti ressaltou a noção de democracia que não pode ser reduzida a uma simples ideia majoritária, não se trata da ditadura da maioria. Pois democracia[13] significa também participação, tolerância e liberdade.

Um Judiciário razoavelmente independente dos caprichos e vaidades, talvez momentâneos da maioria, pode dar uma grande contribuição à democracia, e para tanto, em muito pode colaborar para um Judiciário suficientemente ativo, dinâmico e criativo e, que tanto seja hábil e capaz de assegurar a preservação do sistema de checksandbalances, em face do crescimento dos poderes políticos, e, igualmente, os controles adequados perante os outros posicionados no centro do poder governamental.

Para responder se a tarefa que o juiz tem, é interpretar ou criar o Direito, Cappelletti ressaltou que o juiz, inevitavelmente reúne em si, uma e outra função, mesmo no caso em que seja obrigado a aplicar uma lei preexistente.

Afinal, a interpretação sempre implica em certo grau de discricionariedade[14] e escolha, concluindo-se que o grau de criatividade é particularmente elevado em alguns domínios jurídicos, conforme ocorre com a jurisdição constitucional e a proteção judiciária de direitos sociais e interesses difusos.

Os fundamentos primevos da teoria da separação dos poderes se encontram em Aristóteles, porém o filósofo não buscou a análise da composição e da competência de cada um dos poderes, fato que contribuiu para que suas ideias não se tornassem paradigmáticas da teoria.

Registra-se que a primeira tentativa de separação de poderes entre as atividades do Estado ocorreu com a publicação de Cromwell[15] depois com Locke e Montesquieu com a célebre obra intitulada “Espírito das Leis”.

Refutou Fides Angélica Ommati[16] que Montesquieu se propusera a elaboração da teoria da separação dos poderes, mas sim, elaborou a colaboração posto que os três poderes estatais são coordenados e subordinados entre si, de tal forma que seja possível um equilíbrio e interdependência. Ou seja, uma convivência harmônica e complementar.

Cromwell sugeriu e admitiu a separação entre os poderes Legislativo e Executivo quando instituiu o Protetorado no Reino Unido, no que fora seguido por Locke sob a inspiração do direito holandês que dividia o poder entre o Legislativo, o Executivo e o Federativo.

Os dois primeiros poderes concentrados nas mãos do monarca, atuando de maneira conjunta, enquanto que o Judiciário seria propriamente uma função do Legislativo, segundo os moldes do Direito inglês. Ao passo que o poder Federativo estaria voltado às relações internacionais.

O poder político, segundo John Locke, relaciona-se ao Direito de fazer a lei e visa preservar a propriedade, podendo para tanto, exercer a força, em defesa da comunidade e do bem público. O principal instrumento que possibilita a referida fruição é o Poder Legislativo.

Já em Isenmann[17], a separação de poderes, nos moldes atribuídos Montesquieu não passa de mito apenas reproduzido ao longo das gerações. O mito pressupõe o equilíbrio entre os poderes e que assim funcionaria como limite do próprio poder, assegurando-se assim, a rigorosa e ortodoxa separação de poderes, onde cada poder teria uma função própria e imune de qualquer interferência.

No fundo, não se trata de separação de poderes e, sim, de combinação, fusão, de ligação entre dois poderes reais (Legislativo e Executivo) e um função estatal que seria exercida pelo Judiciário, sendo que cada uma dessas funções seria uma forma de potência, que representa uma parcela da sociedade.

Aliás, Tocqueville[18] em análise ao Judiciário norte-americano observou que o juiz fica impedido a pronunciar-se de caso concreto onde não haja litígio. Só se ocupando de casos particulares e, para agir deve sempre esperar que exista uma demanda.

Os norte-americanos reconheceram que nos juízes, o direito de fundamentar seus veredictos na Constituição até mais que propriamente nas leis. Dessa forma, permitiriam-lhes não aplicar as leis inconstitucionais.

Num aspecto moderno do constitucionalismo e da separação de poderes, Heller[19] sustentou que a divisão de poderes não se traduz em independência, porém em condicionamento recíproco entre os órgãos, visando a defesa dos direitos fundamentais do indivíduo.

No mais atualizado constitucionalismo ocorre uma farta distribuição de poderes e funções estatais entre vários órgãos e organizações autônomas, na qual a legislação, como poder supremo compete ao povo.

Compete ao Executivo a chefia do Estado, enquanto o poder de julgar é atribuído a uma organização independe de ambos. Mas, em todos os tempos se admitiu a confusão dos três poderes concentrados nas mesmas mãos.

O objetivo de Montesquieu segundo Althusser[20] era buscar a combinação das três potências, portanto, antes mesmo de ser um ponto jurídico, era um problema político de relação de forças, de maneira que a dita separação se traduz em divisão ponderada de poder entre potências determinadas, ou seja, o rei, a nobreza e o povo (ou o governo, o parlamento e o povo) que acaba por proteger e garantir os privilégios principalmente a nobreza (ou do Parlamento ou Legislativo) e, subsequentemente, possibilitava a defesa do rei contra possíveis revoltas populares.

Touraine[21] não acreditava que seja a separação de poderes um elemento essencial para a democracia que se define pela natureza dos vínculos entre a sociedade civil e a sociedade política do Estado.

De sorte que se cada poder do Estado fosse independente, um do outro, acreditava Touraine que os poderosos utilizar-se-iam das leis para proteger seus próprios interesses.

E, tal não acontece porque a jurisprudência possibilita a constante transformação das leis adequando-as à realidade social e considerando a evolução da opinião pública e das necessidades sociais.

Não se cogita propriamente de separação de poderes, mas na comparação delimitativa entre o Estado e os direitos fundamentais. Há de se limitar o próprio poder do Estado para se conceber adequadamente a questão democrática.

Ensinou Norberto Bobbio que é a teoria de Montesquieu que trouxe a resposta ao constitucionalismo moderno a toda espécie de despotismo baseado na afirmação de que os princípes que quiseram transformar-se em tiranos começaram sempre reunindo na sua pessoa todas as funções públicas.

A separação dos poderes é estrutura capaz de promover limitações do poder estatal, parte da premissa de se criarem órgãos distintos, que, de forma autônoma e harmônica, de modo que exerçam as diferentes funções do Estado.

O Judiciário segundo os moldes do constitucionalismo liberal, estava limitado à aplicação puramente técnica das normas criadas pelo Legislativo com validade ao caso concreto. A técnica de aplicação jurisdicional da lei deveria conserva o esquema de poder vigente.

No entanto, o poder de exercer o controle de constitucionalidade das leis em tese e com a validade para todos, o Judiciário passou a desempenhar uma função política, que se insere dentre as várias atribuições do Estado moderno, ou seja, a de concretizar a justiça social.

A tese da separação de poderes rejuvenesceu por meio de obras de intérpretes e aplicadores de Direito constitucional da liberdade, pela defesa de valores que bem representam a ordem jurídica.

Para Paulo Bonavides[22] o controle de constitucionalidade tem como fim a defesa do cidadão e das liberdades e ainda a efetivação do Estado democrático do Direito. Dentro desta concepção, as instituições são colocadas a serviço dos direitos humanos.

O controle de constitucionalidade somente se realiza na forma concentrada ou difusa, segundo Clève, e se alguns pressupostos forem realizados, como a existência de uma Constituição formal e escrita, a compreensão como sendo a lei fundamental, dotada de rigidez, supremacia e hierarquia, além da previsão de órgão competente para o exercer o controle de constitucionalidade.

Destacam-se os mecanismos tais como a Ação Declaratória de Constitucionalidade, a Ação Declaratória de Inconstitucionalidade por Omissão, Omissão Parcial, Mandado de injunção e o controle no âmbito dos Estados-membros.

O sistema de controle brasileiro é considerado pelo Ministro Gilmar Ferreira Mendes, como do tipo misto[23], por ter tanto o controle concentrado e o difuso, apesar que reconheça que sua base é concentrada.

Afinal, a possibilidade de o Judiciário revisar e declarar inconstitucional a lei aprovada pela maioria (que é o princípio supremo da república), confronta com a noção de democracia. Posto que o órgão revisor não foi eleito, ao contrário do órgão que fez a lei.

Mas advertiu Samuel Freeman[24] que mesmo os juízes fossem eleitos, ainda assim a revisão seria um ato contra a maioria. O busilis real é que a revisão limita os direitos iguais de participação dos cidadãos.

O objetivo prevalente da revisão judicial é, por meio, de um órgão não-Legislativo, a impor restrições à norma que desrespeitou o itinerário Legislativo.

Tanto o Executivo, quanto Legislativo e Judiciário são poderes ordinários. Apenas a Corte Constitucional como órgão externo, detém o poder especial de promover a interpretação constitucional. Tal visão contraria a histórica tese federalista de que a Suprema Corte é o poder Judiciário ordinário, responsável pela interpretação.

De acordo com a clássica teoria da separação de poderes[25], o Tribunal determina o significado não só da Constituição Federal bem como os demais atos do Legislativo. Conclui-se que o Tribunal possui a autoridade de interpretação, em último caso, a Constituição.

Freeman argumentou que a separação de poderes[26] ocorre entre os poderes ordinários que os tribunais possuem autoridade para interpretar e aplicar leis ordinárias.

Constituição é um sistema de normas supremas que estabelece como se criam as outras normas ordinárias e não há nenhum monopólio que garanta ao Judiciário, a autoridade de revisar a forma como os três poderes interpretam a Constituição Federal.

Não cabe haver uma dogmática quanto ao caráter democrático ou não da revisão judicial. Uma revisão positivamente pode ser democrática quando modifica as leis que infringem a igualdade e de direitos básicos.

Porém, a revisão pode ser antidemocrática se alterar as leis que tenham por fim acabar ou diminuir com o poder das elites e promover as mudanças sociais.

Ressaltou ClèmersonClève[27] que a sociedade contemporânea é a técnica e de massa e, alterou o perfil dos conflitos de interesses e passaram a ser de individuais para coletivos, difusos ou individuais ou homogêneos.

Inúmeros instrumentos jurídicos processuais foram criados recentemente servem para compor essa realidade, tais como o mandado de segurança coletivo, o mandado de injunção e, mesmo a legislação como o Código de Defesa do Consumidor, a Ação Civil Pública, o Estatuo da Criança e do Adolescente e as ações que visam promover o controle de constitucionalidade.

Interessante é a crítica feita por Celso Ribeiro Bastos quanto a ação declaratória de constitucionalidade por instituir efeito vinculante, cujo objetivo maior seria o de atender aos interesses governamentais consistentes em eliminar as discussões legítimas travadas em torno de leis sabidamente mal redigidas e inconstitucionais, o que tem sido uma tônica em nossa frágil (e ainda principiante) República. Isso sem cogitar em nosso atual ensaio na democracia.

Em posição contrária ergueu-se Arnoldo Wald que defende a ADC como “instrumento de unificação jurisprudencial como finalidade básica é evitar a demora e as contradições em relação às questões constitucionais de alta relevância e, que se não foram resolvidas rapidamente, podem ensejar sim, verdadeiro caos jurídico, prejudicando a economia nacional e o próprio desenvolvimento do país”.

Há ainda o posicionamento de Evaldo Brito que questiona a legitimidade da lei que criou a ADC, sustentando que uma norma somente é legítima quando se funda em valores supremos da humanidade tipificadores também de um poder formal conformado pelas características de um Estado Democrático de Direito.

Entre esses valores supremos encontram-se a liberdade a justiça, a igualdade, o pluralismo político, dentro outros que constituem direitos fundamentais.

Com a ADC, opinou José Rogério Cruz Tucci[28], o STF equipara-se, em última análise, a um órgão certificador da constitucionalidade da lei ou do ato normativo federal. E, tal controle, segundo Tucci caberia somente ao Legislativo e não ao Judiciário. Do modo que está colocado, o STF exerce jurisdição constitucional e somente se manifesta se houver dissídio judicial.

Para Ives Gandra Martins a não observância do contraditório do contraditório e da ampla defesa constituem os principais indicadores de inconstitucionalidade da ADC permitindo que o STF decida entrar com a propositura da ação declaratória sem que nenhum elemento da sociedade, que esteja discutindo a matéria em instâncias inferiores, possa participar do processo.

A sociedade, nesse caso, não terá como se defender, pois, impedida constitucionalmente de integrar a lide. O que afronta às garantias fundamentais de contraditório e de ampla defesa, constituindo uma cláusula pétrea do artigo 60IV da CF/1988, além de violar o princípio da separação de poderes, transformando o Legislativo em um poder diminuto e inseguro.

Scartezzini afirma que não existem dúvidas da quebra da independência de poderes, pois a ADC transforma o STF em órgão sancionador da atividade legislativa, criando claro desequilíbrio entre os poderes do Estado.

Afinal, declarar a constitucionalidade, nos moldes previstos na ADC, é, em última análise, legislar, instaurando-se a dependência entre o Legislativo e Judiciário. Pois doravante, o parlamentar fará a lei após a chancela e o crivo do Judiciário.

Há quem adote posição intermediária, ou seja, não descarta a ADC por completo e nem a diz inconstitucional per si, pois a enxerga como instrumento de impugnação. Não se trata de um processo sem partes e só aparentemente objetivo, pois em substrato há as relações materiais controvertidas.

Considera José Afonso Silva[29] que a constitucionalidade vai ser verificada apenas quando do processamento da medida no STF, onde deve ser observado um mínimo de contraditório. Sem isso, a ADC é inconstitucional.

Em pesquisas que fez Mauro Cappelletti[30] revelou que em França, impera, desde a Revolução de 1789, o controle político de constitucionalidade sendo uma atividade não jurisdicional que é exercida pelo Conselho Constitucional que analisa um ato do Legislativo ou um tratado antes de ser promulgado em um processo onde não há contraditório em ampla defesa.

Também a Itália possui controle constitucional concentrado e a cargo da Corte Constitucional, e, havia ainda modelo completamente diverso na URSS pois o Soviete Supremo exercia ao mesmo tempo as funções legislativas, executivas e judiciárias (havia unidade de poder), portanto, o Soviete Supremo realizava o controle de constitucionalidade das leis.

Os EUA foram os pioneiros no controle difuso desde a Constituição de 1787 e da sentença de Marshall, desde o caso na Suprema Corte em 1803, no caso Marbury versus Madison[31]. Prevalece o princípio da supremacia da Constituição que é adotado por países como Canadá, Japão, Noruega, Dinamarca, Suécia e Suíça.

Tanto a Áustria como a Alemanha adotam o sistema típico concentrado também chamado de “sistema austríaco”, formulado por Hans Kelsen[32] e a Escola de Viena, durante a Constituição de 1920, sendo o dito controle da competência da Corte Constitucional, mas tal fora reformado, admitindo-se, também a ação incidental.

O controle de constitucionalidade presente no constitucionalismo pátrio remonta à Carta Constitucional de 1824 que atribuía ao Parlamento a tarefa exclusiva de legislar bem como a de proceder a interpretação, suspensão e revogação e, ainda, velar e proteger a guarda da Constituição.

Influenciada pela doutrina francesa, a Carta Imperial brasileira privilegiava o Parlamento como depositário de todas as atribuições. Não havia nada que se assemelhasse ao controle judicial de constitucionalidade nem mesmo o poder Moderador do Imperador, conforme ressalta Ministro Gilmar Mendes citando Pimenta Bueno[33] que virava manter a harmonia e o equilíbrio entre os demais poderes.

Com a República, o Brasil adotou o modelo constitucional norte-americano tendo em Rui Barbosa[34] o seu principal expoente. A Constituição brasileira de 1891 consagrou o modelo difuso de controle judicial, instituindo o controle por via de exceção onde o Judiciário só se manifesta quando devidamente provocado pelo interessado.

A primeira Carta republicana brasileira atribuiu ao Supremo Tribunal Federal, sendo órgão revisor das decisões judicias de segundo grau, tornando-se de fato o foro privilegiado para dirimir as controvérsias envolvendo a discussão sobre a validade do tratado, convenção, lei federal ou decisões judiciais em face da Constituição Federal brasileira vigente.

A Lei 221/1924 e a reforma constitucional de 1926 consideraram o sistema de controle difuso de constitucionalidade do direito brasileiro. O referido Judicial Review conforme salientou Rui Barbosa, não se fazia em abstrato e menos que um não se fazia em abstrato e menos que um poder de legislação era um exercício de hermenêutica.

Algumas alterações trazidas pela Constituição de 1934 que obrigou o STF a decidir pelo voto da maioria da totalidade de seus membros, como forma de garantir a segurança jurídica.

Inovação para a atribuição de competência ao Senado para suspender a eficácia de lei declarada inconstitucional pelo STF, conferindo-lhe efeito erga omnes.

Da mesma forma significativa foi a criação de representação interventiva, onde o STF acabaria por declarar a inconstitucionalidade da lei autorizativa da intervenção federal em Estados e municípios, ou de maneira inversa, determinando que a lei interventiva, de iniciativa do Senado, só poderia prosperar caso fosse declarada constitucional pela Suprema Corte.

A criação de uma Corte Constitucional, segundo o modelo austríaco, embora tenha sido proposta, não foi acatada pela Constituição brasileira de 1934.

Com o estabelecimento do Estado Novo a Constituição brasileira de 1937[35]deu-se a concentração de poderes no Executivo. Permitiu-se que o Presidente da República submetesse à apreciação do Parlamento a matéria declarada inconstitucional pelo STF e, caso fosse aprovada por dois terços de votos em cada uma das casas legislativas, invalidava a declaração judicial de inconstitucionalidade[36].

Constituição brasileira de 1946 restaurou a tradição do controle judicial no Direito brasileiro. O Procurador Geral da República passou a ter a titularidade da representação interventiva, na qual o STF tinha a função final de decidir sobre a constitucionalidade do ato interventivo originário do Senado Federal.

Foi somente em 1965 que a Emenda Constitucional 16 instituiu o controle abstrato de normas estaduais e federais brasileiras. Nas Constituições brasileiras de 1967 (e a Emenda Constitucional nº 1 de 1969) trouxeram o monopólio da ação continuou com o Procurador-Geral da República, enquanto que ao Presidente da República fora definida a competência de suspender ato estadual impugnado.

A Emenda Constitucional nº 7, de 1977 introduziu a representação para fins de interpretação da lei, autorizando ao Procurador-Geral da República a legitimidade para provocar o pronunciamento do STF.

Constituição federal brasileira de 1988 inovou substancialmente principalmente ao ampliar o número de legitimados para a propositura da Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Ao lado do Procurador-Geral, o artigo 103 atribuiu tal competência ao Presidência da República, às Mesas do Senado, da Câmara das Assembleias Legislativas, ao Governador de Estado, ao Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, aos partidos políticos com representante no Congresso nacional e à confederação ou entidade sindical nacional.

A principal consequência introduzida pela ampliação de legitimados segundo o Ministro Gilmar Mendes[37], fora o fortalecimento do controle concentrado de constitucionalidade e o enfraquecimento do controle incidental difuso, visto que praticamente todas as controvérsias passaram a ser resolvidas no âmbito do Supremo Tribunal Federal, mediante controle abstrato de normas, inclusive com a concessão de medida cautelar.

Igualmente aprimorado foi o federalismo, na medida em que os governadores passaram a dispor de um instrumento mais eficaz de aferição da constitucionalidade das leis estaduais.

Constituição de 1988 revigorou também o sistema representativo, contemplando as minorias partidárias com a possibilidade de arguir a inconstitucionalidade das leis, assim como protegeu os direitos subjetivos através da Ação de Inconstitucionalidade saneadora de omissão normativa constitucional.

A regulamentação de ações de constitucionalidade no ordenamento jurídico brasileiro, o processo e julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade e da Ação Declaratória de Constitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal, está regulamentado pela Lei 9.869, sancionada em 10 de novembro de 1999. Esta estabelece o rito processual para os institutos previstos nos artigos 102 e 103 da Constituição Federal de 1988, fruto da Emenda Constitucional 3/93.

A ADC foi proposta, pioneiramente, por Ives Gandra Martins e Gilmar Ferreira Mendes, como alternativa à iniciativa do ex-presidente Fernando Collor de reintroduzir a Avocatória[38], que criada pela Emenda Constitucional nº 7, de 1977, não fora recepcionada pela Constituição de 1988.

A Ação Geral defende a constitucionalidade de uma norma quando instado constitucionalidade, sustenta Mendes, tem sua fundamentação teoria no direito alemão[39] e não constitui nenhuma novidade no direito pátrio.

Antes disso, porém, a Emenda Constitucional 16/65, ao criar a ação de representação direta de inconstitucionalidade. Por isso, Mendes considera a ADC uma ADIn com sinal trocado. Esse é o mesmo entendimento de Hugo de Brito Machado, para quem ambas constituem forma de provocação da Corte Maior para manifestar-se sobre atos normativos em tese.

Diante da Lei 9.868/1999 que foi uma primeira constatação que fica evidente é a diferença de finalidades que as ações buscam alcançar. Determina o inciso I do artigo 3º que a petição propositora da ADIn indicará o dispositivo da lei ou do ato normativo impugnado.

Já o inciso I do artigo 14 ressalta que a petição inicial da ADC indicará o dispositivo da lei ou do ato normativo questionado. Ou seja, enquanto uma ação pretende um posicionamento do STF sobre um ato que se pretende impugnar, por inconstitucional, retirando-o do ordenamento, a outra busca tão-somente obter da Corte superior uma declaração de que determinado ato, que está sendo questionado, tem validade constitucional.

Esta diferença de finalidade a alcançar também se reflete na formulação da petição inicial. Desta forma, é que, conforme o artigo 3º, I na ADIn, a petição[40] indicará o dispositivo da lei ou do ato normativo e os fundamentos jurídicos do pedido em relação a cada uma das impugnações.

Já o artigo 14, III estabelece que na ADC é obrigatória a apresentação de documento que comprove a existência de controvérsia judicial relevante sobre a aplicação da disposição objeto da ação declaratória.

O que se pretende impugnar ou questionar nestas ações é a adequação de dispositivo da lei ou do ato normativo à Constituição, conforme prevê o acima citado no inciso I do artigo 13, quando for o caso de ADC.

A Lei 9.868/99 regulamentou um aspecto importante do processo qual seja, dos prazos. Na ADIn, o relator pode informações nos órgãos ou a autoridades das mais emanou a lei ou ato administrativo impugnado. O parágrafo único do artigo 6º prevê que tais informações deverão ser prestadas em trinta dias contados do recebimento do pedido.

Decorrido este prazo, serão ouvidos, sucessivamente, o Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, que deverão manifestar-se cada qual, em quinze dias (art. 8º). Somente vencida esta etapa é que será lançado o relatório, com cópia a todos os Ministros e pedido de dia para julgamento (art. 9º)[41].

A questão de prazos[42] na ADC está redigida de maneira confusa, fruto talvez de má técnica legislativa. O artigo 19 informa que decorrido o prazo do artigo anterior, será aberta vista ao Procurador-Geral da República, que deverá pronunciar-se no prazo de quinze dias.

O problema é que não há artigo anterior no caso da ADC (do 13ºa 18º) que mencione qualquer prazo, como ocorre na ADIn, conforme prevê o referido do artigo 8º. Ali era possível fazer referência a vencidos estes prazos pois o artigo 6º estabelecia quais eram estes prazos os trinta dias para que o relator ou visse os órgãos ou autoridades.

Já no caso da ADC não existe prazo do artigo anterior. Assim, permanece a dúvida, o Procurador-Geral será ouvido depois de quanto tempo? Na falta de um dado mais objetivo e preciso, é possível delimitar-se este prazo como aquele contido no § 3º do artigo 20, que estabelece que as informações, perícias e audiências serão realizadas no prazo de trinta dias, contados da solicitação do relator.

A Lei 9.868 não inovou em relação aos legitimados para a propositura da ADIn, mantendo a mesma relação prevista pelo art. 102 da CF/1988. O artigo 13, por seu turno, limita os legitimados à proposição da Ação Declaratória de Constitucionalidade de lei ou ato normativo federal ao Presidente da República, às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal ao Procurador-Geral da República.

Outra diferença prevista pela lei, entre os dois institutos, é em relação às fontes que deverão ser consultadas pelo Ministro-relator na formação de seu juízo de seu juízo de valor sobre a constitucionalidade do ato ou lei que se pretende ver declarada.

Na ADIn, o relator pede informações a:

  1. a) ao órgão do qual emanou a lei ou ato normativo impugnado;
  2. b) às autoridades das quais emanou a lei ou o ato normativo impugnado;
  3. c) a outros órgãos ou entidades, considerando a relevância da matéria e a representatividade dos postulantes;
  4. d) ao Advogado-Geral da União;
  5. e) ao Procurador-Geral da República.

Na ADC são consultados, conforme estabelecem os artigos 19 e 20: a) o Procurador-Geral da República; b) o Perito ou comissão de peritos; c) pessoas com experiência e autoridade na matéria; d) Tribunais superiores; e) Tribunais federais; f) Tribunais estaduais.

O Procurador-Geral tem garantido um prazo de quinze dias para oferecer seu parecer. Os demais agentes serão ouvidos, se for o caso, para prestar informações adicionais, a critério do Ministro-relator, em caso de necessidade de esclarecimento de matéria ou circunstância de fato ou de notória insuficiência das informações existentes nos autos, conforme frisa o primeiro parágrafo do artigo 20.

No que concerne à medida cautelar[43], o STF está autorizado a concedê-la, observadas as condições impostas pela lei. No caso da ADIn, o artigo 10 determina que a liminar só será concedida após a audiência dos órgãos ou autoridades dos quais emanou a lei ou ato normativo impugnado[44].

Tais agentes públicos deverão se pronunciar em cinco dias. O Advogado-Geral da União e o Procurador-Geral da República, por sua vez, serão ouvidos no prazo de três dias.

Somente em caso de excepcional urgência, terceiro parágrafo, o Tribunal Superior poderá deferir a medida cautelar sem audiência destes órgãos ou autoridades. A liminar concedida terá eficácia erga omnes e efeito ex nunc, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe a eficácia retroativa.

Da mesma forma, a concessão da medida cautelar[45] torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário.

Em relação à ação principal, reza o artigo 12 que havendo pedido de medida cautelar, o relator, em face da relevância da matéria e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica, poderá, após a prestação de informações, no prazo de dez dias, e a manifestação do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República, sucessiva, no prazo de cinco dias, submeter o processo diretamente ao Tribunal, que terá a faculdade de julgar definitivamente a ação.

O procedimento para concessão de cautelar, na ADC é mais simples, como prevê no artigo 21. Neste caso, o STF determinará que os juízes e os Tribunais suspendam o julgamento dos processos que envolvam a aplicação da lei ou do ato normativo objeto da ação até seu julgamento definitivo.

O Tribunal deverá proceder ao julgamento da ação no prazo de cento e oitenta dias, sob pena de perda de sua eficácia. Segundo o artigo 24, proclamada a constitucionalidade, torna-se Improcedente a ADIn e Procedente a ADC.

Quanto à possibilidade de recurso, determina o artigo 26 que a decisão é irrecorrível, ressalvada a interposição de embargos declaratórios, não podendo, igualmente, ser objeto de ação rescisória.

No procedimento desta forma, o STF verdadeiramente não vai declarar a lei inconstitucional, invalidando-a. Antes disso, essa permissão mais se assemelha a uma declaração de incompatibilidade, nos moldes da doutrina alemã.

A lei não determina qual será o outro momento que será fixado, mas o certo é que durante este período a lei atacada continuará em plena vigência.

parágrafo único do artigo 28 determina que as declarações de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a Interpretação conforme a Constituição e a Declaração Parcial de Inconstitucionalidade sem redução de texto, terão eficácia era omnes e efeito vinculante em relação aos órgãos do poder Judiciário e à Administração Pública Federal, estadual e municipal.

Devido a importância que desempenham na questão do controle de constitucionalidade é necessário explicitar cada um desses pontos, como faz Ministro Gilmar Mendes.

A interpretação conforme a Constituição[46]. O Tribunal parte do princípio de que o legislador busca positivar uma norma constitucional conforme é o princípio da constitucionalidade da lei.

Isto significa que a lei positivada não contraria o disposto na Constituição, antes, pelo contrário, está de acordo com seus parâmetros.

Se sua constitucionalidade for questionada, o Tribunal não deve negar sua legitimidade, visto que o legislador interpretou corretamente a Constituiçãono momento de elaboração. A interpretação resulta, por parte do órgão Judiciário, numa declaração de constitucionalidade da lei.

Este tipo de interpretação só é possível quando o legislador, manifestamente, não comete nenhuma violência contra expressão literal do texto, ou seja, quando não altera o significado do texto constitucional, ou na expressão de Sepúlveda Pertence, não age desconforme a Constituição.

A Declaração parcial de Inconstitucionalidade sem redução do texto é instrumento que o Tribunal dispõe quando pretende realçar que determinada aplicação da norma é contrária à Constituição.

Assim a Lei NumberOne é inconstitucional se aplicável a uma hipótese X. O Tribunal deixa explícito que aquela hipótese de aplicação é inconstitucional, sendo nula somente esta parte. O restante do texto continua válido.

O efeito vinculante e eficácia erga omnes. Não só em relação aos órgãos do Poder Judiciário como também da Administração Pública federal, estadual, municipal, as decisões do STF terão efeito vinculante, obrigando todos a seguirem a orientação fixada pela Corte Suprema.

Esta eficácia erga omnes obsta, segundo Ministro Gilmar Mendes, que a questão seja novamente submetida à apreciação do STF, sob forma d ADIn. Entretanto, mudando as circunstâncias fáticas, não há como evitar que, sob outro contexto, a matéria seja apreciada.

É o caso da decisão do STF, que concede prazo em dobro para a Defensoria Pública enquanto o órgão não estiver estruturado. Se, num momento seguinte tal Defensoria estiver em pleno funcionamento, poderá o STF mudar sua posição desconsiderando a possibilidade de conceder-lhe o prazo dilatado, Bryde[47] entende que os conhecimentos sobre o processo de mutação constitucional exigem que se admita nova aferição da constitucionalidade da lei no caso de mudança da concepção constitucional.

O Poder Legislativo não é alcançado pelo efeito vinculante, pois, com a declaração de constitucionalidade nada ocorre no mundo jurídico a não ser a certeza do Direito, posto que os pressupostos de admissibilidade são a dúvida, a controvérsia e a incerteza.

Mas a lei vige do mesmo modo pelo qual vigia antes da sentença e o Poder Legislativo não fica impedido de alterar ou revogar a norma, mesmo após declarada sua constitucionalidade pelo STF. Outro entendimento de ClèmersonCleve, para quem o efeito vinculante deveria, do mesmo modo, atingir também os atos do Poder Legislativo, pois não há razão que justifique a discriminação.

Idêntica é a posição de Cruz Tucci, ao argumentar que se o pedido deduzido na ADC for reputado improcedente, a respectiva decisão, transitada em julgado, gozará igualmente de eficácia erga omnes não mais podendo ser arguida inconstitucionalidade da lei antes de examinada perante qualquer tribunal, inclusive a Excelsa Corte.

No entanto, não é a opinião do Ministro Gilmar Mendes, pois, a expressão demais órgãos do Poder Judiciário indica que STF não é alcançado pelo efeito vinculante. A autovinculação, na sua opinião, é inadmissível, pois se por um lado congela e cristaliza o Direito Constitucional, por outro obriga o tribunal sustentar a tese errada ou mesmo já superada.

Já a não observância do efeito vinculante pelos demais órgãos do Poder Judiciário caracteriza grave violação de dever funcional, típica de dolo ou fraude, previstos no inciso I do artigo 133 CPC.

Apesar de existir a concordância de que o juiz, ao declarar a lei, de alguma forma a está interpretando, há que se reconhecer que o Direito Judiciário assume um papel muito mais relevante do que mera prática hermenêutica.

Os Juízes, no moderno constitucionalismo, assumem cada vez mais as funções de legisladores, mesmo porque necessitam reafirmar seu poder diante do crescimento da presença do Executivo nas ações do Estado.

Durante muito tempo o judiciário se manteve afastado dos debates relevantes para a sociedade e os juízes limitavam-se a declarar a lei, numa posição pretensamente neutra e imparcial.

Contemporaneamente essa postura não mais se justifica, seja pelo agravamento da crise social e política, que exige uma intervenção direta do Judiciário, seja pela necessidade de defesa de princípios democráticos e constitucionais, muitas vezes subjugados diante da pressão de grupos econômicos mais fortes, que possuem mecanismos de interferência nas atividades dos poderes legislativo e executivo.

Portanto, assumindo o papel de juízes legisladores, os magistrados nada mais fazer do que fortalecer a democracia e o equilíbrio entre os poderes.

A fundamentação da separação dos poderes[48] está na base da defesa da própria democracia. Os poderes devem estar de tal modo separados que não seja possível, a um deles, assumir o controle total do Estado, exercendo todas as suas funções, sejam elas executivas, legislativas ou judiciais.

Lembremos que a ditatura do Executivo, seja na forma civil ou militar, ou a ditadura parlamentar, ou ainda, o Governo dos Juízes, são fantasmas que amedrontam os democratas e os defensores das liberdades públicas.

Nesse sentido é a separação de poderes assume real importância, pois se cada um realizar a sua função e, ao mesmo tempo, for controlado, pelos demais, num verdadeiro sistema de controle recíproco, na forma do sistema de checksand balances, haverá com certeza condições objetivas e concretas para a existência de um Estado Democrático de Direito.

Referências:

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CAPPELLETTI, Mauro. O controle judicial de constitucionalidade das leis no direito comparado. Porto Alegre: Fabris, 1984.

_____________________ Juízes legisladores? Tradução de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Fabris, 1993.

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FREEMAN, Samuel. Democracia e controle jurídico de constitucionalidade. Tradução de Álvaro Vita. In: Lua Nova, n.32. São Paulo: CEDEC, 1994.

HELLER, Hermann. Teoria do Estado. São Paulo: Mestre Jou, 1998.

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OMMANTI, Fides. Dos Freios e contrapesos entre os poderes do Estado. Revista de Informação Legislativa. Brasília: n.55, julho/setembro de 1997.

SCARTEZZINI, Ana Maria. A Ação de declaração de constitucionalidade da lei e os princípios constitucionais. Ação declaratória de constitucionalidade. São Paulo: Saraiva, 1995.

TOCQUEVILLE, Alexis. A democracia na América. Coleção Os Pensadores. 2ª edição. Tradução de J.G. Albuquerque. São Paulo: Abril Cultural, 1979.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16ª edição. São Paulo: Malheiros, 1999.

[1] A Ação Direta de Inconstitucionalidade, mais especificamente Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica (ADI ou ADIn) é um instrumento utilizado no chamado controle direto da constitucionalidade das leis e atos normativos, exercido perante o Supremo Tribunal Federal brasileiro. É instrumento do controle concentrado de constitucionalidade das leis.

Lembrando que o controle concentrado de constitucionalidade, como seu próprio nome diz, é aquele que se concentra em apenas um órgão. No sistema brasileiro de controle, este órgão é o Supremo Tribunal Federal, titular exclusivo da competência para julgar, em tese, a constitucionalidade de uma lei ou ato normativo.

Esse controle, pelo critério formal de classificação, também é chamado de abstrato ou direto, já que se dá pela via principal, isto é, a análise da constitucionalidade é o objeto principal, autônomo e exclusivo da causa.

O STF entende que a constitucionalidade das MPs pode ser questionada tendo como parâmetro os requisitos constitucionais de “relevância e urgência” do art. 62, mas de forma excepcional. Já quanto aos requisitos de “imprevisibilidade e urgência” para MPs que abrem crédito extraordinário (art. 167, § 3º), a Corte admite o controle mais amplo, já que a Constituiçãodeu densidade normativa a esses requisitos ao exemplificar com os casos de guerra, comoção interna e calamidade pública. Essas realidades fáticas não permitem ampla margem de discricionariedade, como no caso da relevância e urgência.

[2] A ação declaratória de constitucionalidade (ADC) é uma ação judicial proposta com o objetivo de tomar certo judicialmente que uma dada norma é compatível com a Constituição É uma das formas de exercício do controle de constitucionalidade concentrado.

Foi introduzido pela Emenda Constitucional 3/1993 com a alteração da redação do artigo 102, inciso I, alínea a, e acréscimo do segundo parágrafo ao referido artigo, bem como o § 4º ao artigo 103, todos da Constituição Federal, tendo a sua disciplina processual sido regulamentada pela Lei 9.868/1999.

[3] Os famosos checkand balance system é a essência do mecanismo da separação de poderes proposta por Montesquieu no período da Revolução Francesa. Através desse sistema, o Poder do Estado (seja Executivo, Legislativo e Judiciário) está apto a contes os abusos do outro, de forma que se equilibrem harmonicamente.

Tal sistema foi consagrado pelo pensador francês, na sua obra intitulada “O Espírito das Leis”. Sua expressão em nosso direito constitucional está positivada no artigo  da CF/1988 o que impõe não só a dita separação dos Poderes do Estado, como também os torna independentes e harmônicos entre si.

[4] Cyrill John Radcliffe, (1899-1977) foi advogado britânico, como Lorde foi mais conhecido por seu papel na partição da Índia britânica. Onde serviu como primeiro chanceler da Universidade de Warwick desde a sua fundação em 1965 a 1977.

Em 1949, Radcliffe foi nomeado Senhor do Apelo em Ordinário, jurado do Conselho Privado. Usualmente, ele não tinha sido juiz. Nas décadas de 1940 e 1950, ele presidiu uma série de consultas públicas, além de seus deveres legais e continuou a realizar inúmeras funções de conselheiro, governança e presidências até sua morte. Ele presidiu o Comitê de Inquérito ao Futuro do British FilmInstitute (1948), cujas recomendações levaram à modernização do BFI no período pós-guerra. A partir de 1957, foi presidente do Comitê Radcliffe, chamado a investigar o funcionamento do sistema monetário e de crédito. O comitê publicou um relatório conhecido como o relatório Radcliffe, que sugeriu reformas sobre como a política monetária é executada.

Ele também era um orador público frequente e escreveu numerosos livros: ele deu a BBC ReithLecture em 1951 – uma série de sete transmissões intituladas “Power e theState” que examinaram as características da sociedade democrática e consideraram as noções problemáticas de poder e autoridade. Ele também apresentou a Oxford UniversityRomanesLecture em 1963 em MountstuartElphinstone. Em 1962 ele foi feito um par hereditário como o Visconde Radcliffe, de Hampton Lucy no condado de Warwick.

[5] Morton White (1917-2016) era um filósofo e historiador americano. Era proponente de uma doutrina que ele chama de pragmatismo holístico e também notável erudito da história intelectual americana. Foi professor do Departamento de Filosofia de Harvard de 1953 a 1970.

Foi professor emérito na Escola de Estudos Avançados de Princeton, NJ, onde foi professor na Escola de Estudos Históricos de 1970 até 1987, quando se aposentou.

[6] A tábua axiológica nos remete diretamente a tábua principiológica de sustentação de direitos e deveres. Axiologia é o estudo de valores, uma teoria do valor geral, compreendido no sentido moral.

E, conforme descreveu na Alemanha com Max Scheler ou John Rickert e a França por Ruyer ou R. Polin, a axiologia estabelecer uma hierarquia de valores.

[7] Contrariando o que a maioria pensa, não escolhemos de forma racional. Em nossas escolhas jazem processos emocionais, baseados em nossas crenças e em nossos valores.

Primeiramente, as nossas emoções escolhem e depois o nosso intelecto procura uma razão para “encaixar” e assim justificar essa escolha. Em todo o momento precisamos fazer escolhas e toda vez que escolhemos algo automaticamente abrimos mão de alguma coisa. Se estiver sentado você não pode ficar em pé, se estiver nesse momento no escritório não tem como estar à beira-mar tomando sol.

Recordando a poesia de Cecília Meireles, Ou Isto ou Aquilo. In litteris:

“Ou se tem chuva e não se tem sol,

ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,

ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,

quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa

estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,

ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…

e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,

se saio correndo ou fico tranquilo.

Mas não consegui entender ainda

qual é melhor: se é isto ou aquilo.”.

[8] O que atualmente está em jogo no Brasil é a reconstrução literal e completa do Estado brasileiro e sua verdadeira inserção no século XXI. Ou continuamos com o gigantismo estatal sufocante na economia e com bolivarianismo retrógrado na política, representados por essa visão atrasada de luta de classes, ou partimos para um Estado moderno, leve, fiscalizador, vigoroso e pouco intervencionista, antídoto do populismo, do clientelismo, do paternalismo das bolsas e políticas públicas esmolantes, antônimos de criatividade, do empreendedorismo e da verdadeira independência econômica. (In: A perestroika brasileira. Disponível em:https://oglobo.globo.com/opiniao/a-perestroika-brasileira-17657040Acesso em 16.02.2018).

[9] William John Kenneth Diplock, Barão Diplock (1907-1985) foi um juiz britânico e Lorde. Foi filho de um advogado irlandês, frequentou a WhitgiftSchool e Universidade College, em Oxford, onde lecionou Química.

Foi o juiz mais antigo da Câmara dos Lordes, exerceu o mais alto cargo no tribunal de apelação do Reino Unido. Renunciou a esse cargo em 1984, mas continuou como julgador ordinário Lorde of Appeal. Em 1972, liderou a investigação sobre as formas de aprimorar os procedimentos processuais para lidar com a violência existente na Irlanda do Norte. Suas recomendações levaram à criação do que seriam os tribunais temporários em que um juiz governaria, sem júri, para evitar a intimação relatada pelas testemunhas.

O juiz superior Warren E. Burger, líder do lado americano e velho amigo de Diplock disse quando de seu falecimento: “Suas contribuições tanto para o direito comum substantivo quanto para a administração judicial moderna deixam uma marca significativa na administração da justiça. Advogados e juízes de ambos os lados do Atlântico vão sentir falta dele”.

[10] Patrick Arthur Devlin, Barão Devlin (1905-1992) foi juiz britânico e que atuou como Lorde da Lei. Em 1959 dirigiu uma Comissão de Inquérito, a Comissão Devlin, que informou sobre o Estado de Emergência declarado pelo governador colonial de Nyasaland.

Em 1985, ele se tornou o primeiro juiz britânico a escrever um livro sobre um caso que ele mesmo presidiu, o julgamento em 1957 do suspeito de ser assassino em série, chamado John Bodkin Adams. Devlin.

Foi também é conhecido por sua parte no debate sobre a homossexualidade na lei britânica, em resposta ao relatório Wolfenden, onde argumento contrariamente HLA Hart, que uma moral pública comum deveria ser mantida.

Argumentou em favor de James Fitzjames Stephen que a moralidade popular deveria ser autorizada a influenciar o processo legislativo e que mesmo os atos privados devem ser sujeitos a sanção legal, se eles fossem considerados moralmente inaceitáveis, pelo homem razoável, para preservar o tecido moral da sociedade.

A ideia de homem razoável é derivada de John Stuart Mill de que a lei não tinha negócios que interferissem com atos privados que não prejudicavam ninguém. O argumento de Devlin foi expandido em seu livro intitulado “The EnforcementofMorals”, de 1965, onde ocorreu debate sobre o papel do direito penal na aplicação de normas morais. Aliás, Hart também escreveu a obra intitulada Direito, Liberdade e Moralidade (1963) e A Moralidade da Lei Criminal (1965).

Devlin argumentou que a existência de uma sociedade depende da manutenção de valores políticos e morais compartilhados. Assim, a violação da moral compartilhada afrouxa um dos laços que mantêm coesa uma sociedade e, portanto, ameaça com sua desintegração.

Desta forma, propôs Devlin uma moral pública, em determinadas situações, anulava questões de julgamento pessoal ou privado.

[11] Martin Shapiro é professor emérito de Direito, da Universidade de Berkeley, Harvard, Stanford, de Irvine e San Diego. É autor da obra intitulada “Direito e da Política no Supremo Tribunal; Liberdade de expressão: o Supremo Tribunal e Revisão Judicial; Supremo Tribunal e Agências Administrativas; Tribunais: uma análise comparativa e política e Quem Guarda os Guardiões: Controle Judicial da Administração.

[12] Assim, a manutenção da separação de poderes no Brasil requer mecanismos recíprocos de controle que sejam efetivos, pois em um país onde o chefe do Poder Executivo detém os recursos financeiros e pode indicar membros de tribunais, obviamente que os tribunais ficarão à mercê do Poder Executivo e acabarão não exercendo o devido controle almejado pela teoria da separação de poderes, tornando inviável e ultrapassada a separação de poderes posta na Constituição Federal brasileira, pois o legislador constituinte originário prestigiou a separação de poderes mas acabou criando amarras para que ela não funcionasse como se esperava, criando um monstro chamado Poder Executivo. (In: CAVAZZANI, Ricardo Duarte. Crise Da Democracia Representativa e os Reflexos sobre a Separação dos Poderes: O Enfraquecimento do Estado. Disponível em: http://www.abdconst.com.br/revista12/criseRicardo.pdf Acesso em 16.02.2018).

[13] Na teoria contemporânea da democracia confluem três grandes tradições do pensamento político: a) a teoria clássica, divulgada como teoria aristotélica, das três formas de Governo, segundo a qual a democracia, como Governo do povo, de todos os cidadãos, ou seja, de todos aqueles que gozam dos direitos de cidadania, distingue-se da monarquia, como Governo de um só, e da aristocracia, como Governo de poucos; b) a teoria medieval, de origem romana, apoiada na soberania popular, na base da qual há a contraposição de uma concepção ascendente a uma concepção descendente de soberania conforme o poder supremo derive do povo e se torne representativo ou derive do príncipe e se transmite por delegação do superior para o inferior; c) a teoria moderna, conhecida como teoria de Maquiavel, nascida com o Estado moderno na forma das grandes monarquias, segundo a qual as formas históricas de Governo são essencialmente duas: a monarquia e a república, e a antiga democracia nada mais é que uma forma de república (a outra é a aristocracia), na qual se origina o intercâmbio característico do período pré-revolucionário entre ideais democráticos e ideais republicanos e o Governo genuinamente popular é chamado, em vez de democracia, de república.

O problema da democracia, das suas características, de sua importância ou desimportância é, como se conclui, antigo. Tão antigo quanto a reflexão sobre os conceitos da política, tendo sido reproposto e reformulado em todas as épocas. De toda sorte, isso é verdade que um exame do debate contemporâneo em torno do conceito e do valor da democracia não pode prescindir de uma referência, ainda que rápida, à tradição.

[14] Na evolução histórica, o escravo da lei passou a ser o dono da lei. E, tal passagem pode ser entendida como aquela do positivismo exegético ao que pode ser chamado de positivismo não-exegéticodiscricionarista, como em Kelsen e Hart, entendidos aqui num sentido abrangente como as correntes doutrinárias do juspositivismo que compreendam a insuficiência ôntica da norma (a zona sombria de Hart e a moldura de Kelsen), mas que apostem na discricionariedade coo sua solução. Como bem ensina a doutrina, não se confundem discricionariedade com arbitrariedade.

Ao agir arbitrariamente o agente estará agredindo a ordem jurídica, pois terá se comportado fora do que a lei permite. Seu ato, em consequência é ilícito e por isso mesmo corrigível judicialmente. Ao agir discricionariamente, o agente estará quando a lei lhe outorga tal faculdade (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELO, 2004. P.396).

[15] Após os horrores da guerra civil, da consumação de regicídio e da instauração da ditadura de Cromwell, que Thomas Hobbes, refugiado em França, veio a publicar em 1651, sua obra” O Leviatã “, livro que fazia apologia ao Estado Todo-poderoso que, monopolizando a fora concentrada na comunidade, torna-se pleno fiador da vida, da paz e da segurança de todos seus súditos.

O protetorado de Cromwell que foi apoiado no exército e na burguesia puritana, transformou o Reino Unido em grande potência naval e comercial. Mas, em 1660 com o óbito do Lorde protetor, novamente o país vivenciou uma crise política cuja solução, para se evitar nova guerra civil, fora a restauração da monarquia e retorno dos Stuart ao trono britânico.

[16] Fides Angélica da Costa Veloso Mendes Ommati é uma jurista de amplos conhecimentos. Foi Procuradora do Estado do Piauí, professora catedrática da Universidade Federal do Piauí, Presidenta e Conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil no Piauí.

[17] EberhardIsenmann é um historiador alemão. Suas áreas de especialização em ensino e pesquisa incluem história urbana, história econômica, constitucional e legal. Isenmann publicou várias vezes. Seu trabalho escrito de 1988 sobre a história da cidade alemã no final da Idade Média tornou-se o trabalho padrão.

Uma versão completamente revisada e significativamente expandida do trabalho foi publicada em 2012. EberhardIsenmann estudou de 1964 a 1969 na Universidade de Tübingen assuntos de inglês, alemão, história e ciência política, filosofia e educação. Em 1969, ele passou o exame científico para o ensino em escolas de gramática nos assuntos alemão e história.

[18] Alexis-Charles-Henri Clérel, visconde de Tocqueville, conhecido também como Alexis de Tocqueville (1805-1859) foi pensador político, historiador e escritor francês. Tornou-se célebre por suas análises da Revolução Francesa, cuja pertinência fora enfatizada por François Furet, da democracia americana e da evolução das democracias ocidentais em geral.

Após estudar Direito em Paris, em 1827 ingressou na magistratura em busca de uma carreira provisória enquanto não se cumpria a exigência de idade mínima de quarenta anos para a candidatura à câmara dos deputados.

Constituição Francesa de 1830 reduziu essa exigência para trinta anos, o que permitiu que Tocqueville lançasse, em 1836, sua primeira candidatura, na qual foi derrotado. Em 1839, conseguiria a primeira de uma série de vitórias que o manteriam na câmara até o golpe de estado de 1851.

Entre junho e outubro de 1849, assumiu a pasta dos negócios exteriores do ministério Odilon Barrot sob o governo de Luís Bonaparte na Segunda República. Segundo Tocqueville, nas eras democráticas o vínculo das afeições humanas se estende e se relaxa fazendo com que os cidadãos se fechem em si próprios e deixem de olhar para o mundo que os rodeia, pois rapidamente se esquecem da tradição que o precedeu, apagando-se os vestígios das gerações muito rapidamente.

Como cada classe se aproxima das outras e se mistura com elas, seus membros se tornam indiferentes e como que estranhos uns aos outros, pois, na democracia eles “não devem nada a ninguém, não esperam, por assim dizer, nada de ninguém; acostumam-se a se considerar sempre isoladamente, imaginam de bom grado que seu destino inteiro está em suas mãos.

Assim, não apenas a democracia faz cada homem esquecer de seus ancestrais, mas lhe oculta seus descendentes e o separa de seus contemporâneos; ela o volta sem cessar para si mesmo e ameaça encerrá-lo, enfim, por inteiro, na solidão de seu próprio coração”.

[19]Hermann Heller foi jurista e teórico político alemão, ativo na ala não-marxista do Partido Socialdemocrata Alemão durante a República de Weimar. Tentou formular as bases teóricas para as relações da socialdemocracia com o Estado e o nacionalismo.

Vem de Hermann Heller, a noção de que se prescinde”da normalidade social positivamente valorada, a Constituição, como mera formação normativa de sentido, diz sempre muito pouco”. (In: HELLER, Hermann. Teoria do Estado. São Paulo: Mestre Jou, 1968, p.304). Apud BESTER, Gisela Maria. A concepção de constituição de Hermann Heller – Integração Normativa e Sociológica e sua possível contribuição à teoria da interpretação constitucional. Disponível:https://www.direito.ufmg.br/revista/index.php/revista/article/viewFile/1131/1064Acesso em 14.02.2018).

[20] Louis Althusser (1918-1990) foi filósofo francês nascido na Argélia. Seu nome é devido a uma homenagem ao seu tio paterno que havia morrido na Primeira Grande Guerra Mundial. Segundo o filósofo, sua mãe pretendia casar-se com esse tipo, mas, após a morte deste e apenas em razão

disso, casou-se com o pai de Althusser. Marxista, filiou-se ao Partido Comunista Francês em 1948. No mesmo ano, tornou-se professor da ENS. Em 1946 Althusser conheceu HélèneRytmann, uma revolucionária de origem judaico-lituana, oito anos mais velha. Ela foi sua companheira até 16 de novembro de 1980, quando foi estrangulada pelo próprio Althusser, num surto psicótico. As exatas circunstâncias do ocorrido não são conhecidas – uns afirmam ter se tratado de um acidente; outros dizem que foi um ato deliberado.

Althusser afirma não se lembrar claramente do fato, alegando que, enquanto massageava o pescoço da mulher, descobriu que a tinha matado. A justiça considerou-o inimputável no momento dos acontecimentos e, em conformidade com a legislação francesa, foi declarado incapaz e inocentado em 1981.

A ideologia, para Althusser, é a relação imaginária, transformada em práticas, reproduzindo as relações de produção vigentes. Na realização ideológica, a interpelação, o reconhecimento, a sujeição e os Aparelhos Ideológicos de Estado (AIE), são quatro categorias básicas. Em seu discurso sobre a Ideologia é patente sua preocupação em encontrar o lugar da submissão espontânea, o seu funcionamento e suas consequências para o movimento social. Para ele, a dominação burguesa só se estabiliza pela autonomia dos aparelhos (de produção e reprodução) isolados.

O mito do Estado, como entidade incorporada pelos cidadãos e como instituição acima da sociedade, aparece, também no estruturalismo marxista de Althusser sob a forma de” a instituição além das classes e soberana “.

Assim os Aparelhos Ideológicos do Estado são a espinha dorsal de sua teoria. A teoria dos Aparelhos Ideológicos de Estado constrói uma visão monolítica e acabada de organização social, onde tudo é rigidamente organizado, planejado e definido pelo Estado, de tal sorte que não sobra mais nada para os cidadãos. Não há mais nenhuma alternativa a não ser a resignação ante o Estado onipresente e absolutamente dominante.

[21] Alain Touraine é um sociólogo francês conhecido por sua obra dedicada à sociologia do trabalho e dos movimentos sociais. Conhecido como o pai da” sociedade pós-industrial “. Seu trabalho é baseado na sociologia de ação e seu principal ponto de interesse tem sido o estudo de movimentos sociais. Acredita que a sociedade molda o seu futuro através de mecanismos estruturais e das suas próprias lutas sociais.

Com os primórdios do desenvolvimento industrial, a empresa capitalista e o proletariado eram de fato os elementos centrais na transformação social e política. Porém na sociedade pós-industrial, segundo o autor, esta centralidade da indústria – e, portanto, do fator econômico produtivo – se perde. Nesta nova sociedade, o conhecimento e a informação passam a constituir elementos chaves na produção.

Os conflitos sociais, da mesma maneira, não se concentram mais no elemento econômico. Apesar dos conflitos de classe não desaparecerem (a indústria não desaparece), a relação trabalhador-patronato não detém mais a proeminência de outrora.

Isto, principalmente, pelo fato destes conflitos de classes terem, de uma forma geral, se institucionalizado, abrindo espaço para outras reivindicações sociais, agora não mais econômicas, mas destacadamente culturais: surgem os movimentos feministas, de homossexuais, estudantil, etc.

[22] Paulo Bonavides é destacado jurista brasileiro, professor emérito da Universidade Federal do Ceará. Sobre a obra de Paulo Bonavides, existem várias fontes a serem consultadas, destacando-se a sua biografia,” Paulo Bonavides “, escrita por Antonio Carlos Klein (Fortaleza, Edições Demócrito Rocha, 2003); e a tese do professor Dimas Macedo: ‘” El Pensamiento Político de Paulo Bonavides “‘ (México: Universidade de Puebla, 2010), publicada no Brasil pela Editora Malheiros, de São Paulo, com o titulo:”Estado de Direito e Constituição – O Pensamento de Paulo Bonavides”. Sua influência no pensamento jurídico nacional e internacional o levou a inúmeras condecorações, sendo Doutor honoris causa pela Universidade de Lisboa, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Universidad Nacional de Córdoba, Universidad Inca Garcilaso de la Vega e Universidade de Fortaleza.

Também é comendador das maiores honras jurídicas do cenário nacional, a Medalha Rui Barbosa da Ordem dos Advogados do Brasil e a Medalha Teixeira de Freitas do Instituto dos Advogados Brasileiros, além de várias outras, como o Grande-Colar do Mérito do Tribunal de Contas da União, a Medalha da Abolição do Governo do Estado do Ceará, a Medalha Clóvis Beviláqua do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

[23] A configuração do Estado Democrático de Direito idealizado na Constituição brasileiro de 1988 cuja confluência entre os sistemas político e jurídico procurou resguardar uma série de direitos fundamentais, passou a exigir dos poderes instituídos postura diferente da adotada até então.

Não se trata de afirmar, que diante desse rol de direitos, que o poder constituinte tenha conferido maior responsabilidade a uma das funções do Estado, como fez o Ministro Gilmar Mendes assegurando que o país tinha formatado uma Constituição, cuja marca é a opção eminente judicialista, justificando, pois, o predomínio do Poder Judiciário, detentor da última, e, porque não afirmar, da melhor palavra.

[24] Samuel Freeman é professor universitário atuante na filosofia social, política, ética e filosofia do direito. Escreveu livros sobre a Justiça e Contrato Social (Oxford, 2006) e sobre a filosofia política de John Rawls. Freeman ensinou na Universidade da Pensilvânia desde 1985, ano em que recebeu seu Ph.D. da Universidade de Harvard. John Rawls era seu supervisor de dissertação. Antes do estudo de pós-graduação, Freeman era advogada por dois anos, trabalhando na Corte de Apelação dos EUA, 4º Circuito e na Suprema Corte de Carolina do Norte.

Ele recebeu seu AB e JD da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill. Freeman é casada com a socióloga Annette Lareau.

Eles têm uma filha, Rachel, genro, Miguel, três netas, Cristina, Sara e Noelia, e um neto, Sammy, que todos moram em Sevilha, Espanha. Eles também têm um filho, Dillon, que é autista e vive perto deles na Pensilvânia.

[25] É muito pertinente observação do professor lusitano José Joaquim Gomes Canotilho, de que mesmo na modernidade, não se mostra adequado falar de apenas um constitucionalismo, consideradas as experiências inglesa, americana e francesa, pelo que aquele doutrinador prefere a expressão “movimentos constitucionais”, o tema é tratado aqui sob a consideração de que o constitucionalismo moderno é todo aquele ligado ao liberalismo político e econômico, próprios do contexto histórico vivenciado após a Revolução Francesa.

E foi sob os renovados ares daquela revolução iluminista burguesa, que soube muito bem fazer-se a forma de pensar mais adequada a todos os povos, através do conhecimento gramático de seus filósofos e historiadores, juristas, etc., todos prontos para relevar “a luz, a verdade e a vida”, que a Constituiçãofrancesa de 1793, em seu preâmbulo, reafirmou os princípios gerais ditados na “Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão” de 1789.

[26] Canotilho analisa a importância constitucional da separação de poderes através de três princípios: o jurídico-organizatório (criação de estrutura constitucional com funções, competências e legitimação de órgãos para um comando recíproco do poder – checkandbalances); o normativo autônomo (possibilidade de “compartimentação” de funções para justificar a justeza de uma decisão), e o princípio fundamentador de incompatibilidades (necessário à chamada “separação pessoal de poderes ou funções” para que se evite o entrelaçamento pessoal de funções executivas e legislativas). (In: CANOTILHO, J.J. Gomes. Direito Constitucional e teoria da constituição. 7ª edição. Coimbra: Almedina, 2004).

[27] Clèmerson Merlin Clève (1958) é jurista e advogado brasileiro. Professor titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná e do Centro Universitário Autônomo do Brasil (UniBrasil).

É conhecido por diversas obras jurídicas de direito público, tendo sido finalista do Prêmio Jabuti em 2015. Em 2014, foi indicado pelo ministro da Justiça José Eduardo Cardozo para compor a Comissão de Especialistas que redigiu o Anteprojeto da Nova Lei de Migração, texto que compôs a redação final do PL n. 2.516/2015 que deu origem à Lei n. 13.445/2017, a Lei de Migração. Em 2017, foi indicado para ser membro da Comissão Nacional de Estudos Constitucionais (CNECO) do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Participam dessa comissão de juristas eminentes como José Afonso da Silva, Dalmo de Abreu Dallari, Arnoldo Wald, Carlos Mario da Silva Velloso, Paulo Bonavides, José Paulo Sepúlveda Pertence, Juarez Freitas, entre outros.

Nos meses de fevereiro, março, abril e junho de 2015, e em janeiro de 2017, seu nome foi cotado pela imprensa para ocupar o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, nas vagas dos ministros Joaquim Barbosa e Teori Zavascki.

Em 2017, foi lembrado por diversos veículos de imprensa como o orientador dos juízes Sérgio Moro e João Pedro Gebran Neto, julgadores dos casos da Operação Lava Jato, no Programa de Mestrado em Direito Constitucional da UFPR.

[28] Professor-titular do Departamento de Direito Processual José Rogério Cruz e Tucci atual diretor da melhor faculdade de Direito do pais, a FDUSP – Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. É mestre pela própria Faculdade do Largo São Francisco e doutor pela Universitàdi Roma, turma de 1982.

É membro também da banca Tucci Advogados Associados e do Instituto Brasileiro de Direito Processual e da InternationalAssociationof Procedural Law.

[29] José Afonso da Silva (1925) jurista brasileiro, mineiro, especialista em Direito Constitucional. É Procurador do Estado de São Paulo aposentado, além de ter sido livre docente de direito financeiro, de processo civil e de direito constitucional da Faculdade de Direito da UFMG.

É membro de diversos institutos, dentre os quais o Instituto dos Advogados do Brasil e a Associação Brasileira de Constitucionalistas Democráticos, da qual foi presidente e fundador. Foi secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo de 1995 a 1999. É pai do atual professor titular de direito constitucional da Faculdade de Direito da USP, Luís Virgílio Afonso da Silva.

[30] Mauro Cappelletti (1927-2004) era jurista italiano e fez seu doutorado em Direito na Universidad de Florença, Itália e, foi Professor de Direito na mesma instituição, bem como na Faculdade de Direito da Universidade de Stanford. Além disso, foi presidente da Faculdade de Direito do Instituto Universitário Europeu de Florença.

A sua visão sociológica de procedimentos, herdade de Piero Calamandrei, a experiência compartilhada do direito civil e do direito comum o tornaram um observador privilegiado de grandes conflitos de valores do século XX e, acima de tudo, um importante estudo de direito processual.

[31] O ano é 1797. Os Estados Unidos eram governados pelo Presidente John Adams. Advogado, graduado em Direito na então pouco prestigiada Universidade de Harvard, Adams, que era vice-presidente de George Washington, acabara de tomar posse como Presidente dos Estados Unidos. Durante todo o período em que esteve à frente da Casa Branca, Adams, membro do partido Federalista, sofreu severas críticas dos Republicanos, sobretudo no que diz respeito ao posicionamento americano acerca do conflito existente entre França e Inglaterra.

Os Republicanos acreditavam que os EUA possuíam uma dívida história com a França, já que a nação europeia foi de grande valia na guerra de independência americana, por óbvio, contra a mesma Inglaterra. Adams e a maioria esmagadora dos Federalistas discordavam de tal pensamento, o que custou, e muito, para a imagem do então presidente e até mesmo do partido ao qual integrava.

Naquele momento, as eleições para parte das cadeiras no Congresso Americano já aconteciam antes dos pleitos presidenciais. Neste diapasão, servia a primeira como verdadeiro termômetro político para a segunda. O fato é que os federalistas sofreram uma grande derrota nas eleições de 1800, tendo perdido preciosos 22 assentos na Câmara dos Representantes para o partido Republicano.

Nas eleições presidenciais que ocorreriam no mesmo ano, o resultado não seria diferente: Thomas Jefferson, então vice-presidente dos EUA, membro do partido Republicano, vence John Adams, candidato à reeleição pelo partido Federalista.

Diante de sua derrota, e vislumbrando que o partido Federalista perdera espaço no Legislativo e no Executivo, John Adams decide então manter o controle sobre o único poder que lhe restava, o Judiciário.

Para tanto, Adams decide alterar o JudiciaryAct de 1789, dobrando o número de juízes federais, e criando outros cargos na magistratura americana, no que ficou conhecido como “MidnightJudges” (parte dos estudiosos apontam que o nome foi dado pelo fato da nomeação ter se dado “no apagar das luzes” do governo Adams, outros entendem que o fato recebeu este título por ter se dado às escuras, escondido).

Por fim, o derrotado presidente americano decide nomear John Marshall, seu secretário de Estado, para o relevante cargo de Chief Justice (em apertada síntese, o equivalente ao presidente do STF no Brasil). Fundamental para que se entenda a história é destacar que, dentre os magistrados nomeados por Adams, está William Marbury, que assumiria o posto de Juiz de Paz no estado da Colúmbia. Em 04/03/1801, Thomas Jefferson assume a presidência dos Estados Unidos.

Dentre as suas primeiras medidas no cargo, Jefferson nomeia James Madison, que viria a ser o próximo presidente dos EUA, para o ofício de Secretário de Estado. No exercício do cargo, Madison passa a analisar a situação das nomeações dos novos magistrados.

Ao fazê-lo, Madison observa que um número considerável de possíveis magistrados ainda não havia recebido a carta de nomeação, razão pela qual o ato presidencial não estava completo, sendo, portanto, passível de cancelamento.

O Secretário de Estado não hesitou: cancelou todas as nomeações pendentes, dentre elas, a de William Marbury. Indignado com a situação, Marbury ajuíza, com fulcro na seção 13 do JudiciaryAct, a chamada “writ ofmandamus”, uma espécie de mandado de segurança adotado pelo ordenamento jurídico americano, em face do Secretário Madison, na Suprema Corte Americana, assim, o caso passou a ser conhecido como Marbury vs. Madison. (In: BOAVENTURA, Thiago Henrique. Conheça o Caso Marbury vs. Madison. Disponível em: https://thiagobo.jusbrasil.com.br/artigos/451428453/conhecaocaso-marbury-vs-madison Acesso em 14.02.2018).

[32] O controle de constitucionalidade é um sistema resultante de uma conjuntura positivista, respaldada pelas ideias do austríaco Hans Kelsen, no século XX e, é ligado principalmente à ideia da supremacia da Constituiçãosobre as demais normas.

Argumenta o jurista que o direito regula sua própria criação, de forma que uma norma jurídica regula o procedimento pelo qual outra norma jurídica é produzida.

O controle concentrado de constitucionalidade teve seu surgimento da Áustria, quando sua Constituição de 1920 criou o Tribunal Constitucional, órgão exclusivo de controle de constitucionalidade. Hans Kelsen, idealizador, afirmava que a Constituição, por sua supremacia, não poderia ser interpretada por qualquer pessoa ao ponto de permitir que normas fossem anuladas, sendo estas passíveis de anulação unicamente após o Tribunal Constitucional determinar desta forma, indo na direção oposta à opinião anteriormente proferida pela Suprema Corte americana.

[33] Francisco Antônio Pimenta Bueno (1836-1888) foi engenheiro e militar. Foi considerado o” jurista do Império “. Destacou a influência francesa sobre o constitucionalismo brasileiro que incorporou a noção de soberania do Parlamento cuja consequência teria sido atribuir-se ao Legislativo a prerrogativa de fazer e de interpreta as leis conforme bem quisesse, e assim velar a guarda da Constituição. Anotou sobre o papel do Poder Moderador que retirava qualquer chance de desenvolvimento do modelo de controle judicial.

[34] A respeito da grafia correta do nome de Rui Barbosa que deve respeitar o Formulário Ortográfico da língua portuguesa em vigor isto não impede que descendente de uma personalidade usem a grafia antiga, pois essa é uma decisão pessoal.

Mas, em respeito às instruções para a Organização do Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa (12 de agosto de 1943) e a Lei 5.765, de 18.12.1971, que aprova alterações na ortografia da língua portuguesa, a Fundação Casa de Rui Barbosa não apenas a grafia com i o nome de seu patrono, como orienta a todos os que consultam a fazer o mesmo.

[35] A Constituição brasileira de 1937 foi também conhecida como Polaca fora outorgada pelo Presidente Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937, nesse mesmo dia implantou a ditadura do Estado Novo. Foi a nossa quarta Constituição e a terceira da república de conteúdo pretensamente democrático. Mas, foi

uma carta política profundamente mantenedora das condições de poder do então presidente Getúlio Vargas. Sua alcunha de polaca foi devida ter sido inspirada no modelo semifascista polonês, sendo extremamente autoritária e concedia ao governo poderes praticamente ilimitadas.

Fora redigida pelo prestigiado jurista Francisco Campo, então ministro da Justiça e, obteve a aprovação prévia de Vargas e do ministro da Guerra, o general Eurico Gaspar Dutra.

Além da enorme concentração de poderes não mão do chefe do Executivo, o seu conteúdo nitidamente centralizado deixou a cargo do Presidente da República a nomeação de autoridades estaduais, os interventores. E, a esses, por sua vez, cabia nomear as autoridades municipais. A expressão” Estado Novo “foi termo copiado da ditadura de Antônio Salazar em Portugal.

E, com essa constituição, Getúlio Vargas instaurou regime autoritário de inspiração fascista até o final da Segunda Guerra Mundial. E, assim, consolidou o seu governo, que começara, apenas, provisoriamente, em 1930.

O fim do Estado Novo ocorrido em outubro de 1945, quando se realizou as eleições para a Assembleia Nacional Constituinte, paralelamente à eleição presidencial.

Foi eleita a Constituinte, seus membros se reuniram para elaborar uma nova constituição, que entrou em vigor a partir de setembro de 1946, substituindo então a Carta Magna de 1937 (que deu origem a diversos acontecimentos na História política ao Brasil) que têm consequências até hoje.

E, principalmente porque formou o grupo de oposição a Getúlio Vargas e que culminou no golpe militar de 1964. Este, por sua vez, deu origem à Constituição de 1967, a outra constituição republicana autoritária.

[36] A carta autoritária constitucional de 1937 foi elaborada e redigida em sua maior parte por Francisco Campos (que mais tarde elaboraria também atos institucionais da ditadura militar), com a ajuda de líderes integralistas, um ano antes do golpe.

Logo após a outorga da Constituição, Campos foi nomeado ministro da Justiça — cargo em que deve ter tido muito pouco trabalho, pois sua própria carta subordinava a justiça aos desmandos do executivo. Sua inspiração veio, em maior parte, da legislação fascista do ditador polonês JózefPilsudski, e uma parte das leis do regime de Mussolini na Itália. Mas, acima de tudo, era uma Constituição que tinha tudo aquilo que os positivistas de 1889 queriam: uma república com executivo forte, militarista, conservadora e autoritária.

Ou seja, finalmente a corrente positivista, autoritária e caudilhista de Júlio de Castilhos e Flores da Cunha (e outros sob a influência do castilhismo e do Colégio Militar de Porto Alegre, onde estudaram todos os presidentes do regime militar pós-64) chegava ao poder.

Nesse sentido, o Estado Novo não teve elementos típicos do totalitarismo fascista europeu: nem partido único, nem mobilização das massas e nem projetos expansionistas — o Estado Novo foi mais um regime paternalista autoritário.

[37] Gilmar Ferreira mendes (1955) é jurista, magistrado e professor brasileiro. É ministro do Supremo Tribunal Federal desde de 20 de junho de 2002, tendo presidido a referida corte entre o ano de 2008 até 20101. Foi indicado pelo então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em cujo governo exercera o cargo de Advogado-Geral da União desde janeiro de 2000. Como Chefe do Poder Judiciário, a Gilmar Mendes coube também assumir, simultaneamente, a Presidência do Conselho Nacional de Justiça – CNJ, período em que comandou processo de efetiva e irreversível modernização da Justiça brasileira, a começar pela implantação do inédito Planejamento Estratégico Nacional, cujo destaque foi a fixação das metas de nivelamento, a exemplo da conhecida Meta 2, que resultou no julgamento de 2,72 milhões de processos antigos (protocolados antes de janeiro de 2006). A criação do Processo Judicial Eletrônico, do Cadastro Nacional de Condenados por Atos de Improbidade, do Cadastro Nacional de Adoção e do Cadastro Nacional de Adolescentes em Conflito com a Lei, das Varas Criminais e de Execução Penal Virtuais, está entre as muitas medidas destinadas a dar tornar mais ágil e eficiente a prestação jurisdicional no país. No tocante à promoção dos direitos humanos e da cidadania, são também destaques dessa bem-sucedida gestão: Programa” Mutirões Carcerários “(mais de 114 mil processos examinados, quase 35 mil benefícios concedidos, entre os quais aproximadamente 21 mil alvarás de soltura de presos indevidamente encarcerados),” Começar de Novo “(mais de 1.700 vagas de emprego oferecidas a egressos do sistema penitenciário por entidades públicas e privadas),” Advocacia Voluntária “(assistência jurídica gratuita à população carcerária economicamente necessitada) ,” Casas de Justiça e Cidadania “(uso de espaços públicos do Judiciário para ações de cidadania),” Nossas Crianças “(ações voltadas ao efetivo cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente), além da criação do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas.

[38] Avocatória é instrumento jurídico utilizado pela Justiça brasileira no Supremo Tribunal Federal. É também chamado de incidente de inconstitucionalidade pelo qual o STF, avoca para si a responsabilidade de questões que tramitam nas justiças estaduais ou em outras instâncias judiciárias. Após ser devidamente solicitado pelo Tribunal Regional de Justiça, o STF toma a decisão em relação à questão constitucional e, esta decisão deve ser obedecida por todos.

[39] No direito alemão, o Bundesverfassungsgericht tem-se utilizado da competência para expedir providências cautelares (einstweiligeAnordnung) (§ 32 da Lei de Organização do Tribunal), suspendendo, provisoriamente, a execução da lei questionada. Sempre afirmou-se, porém, que a decisão proferida na medida cautelar não contemplava as razões eventuais que permitiam ao requerente sustentar a nulidade da lei, até porque, nesse processo, não se poderia proceder a um juízo de validade10.

Pareceria correto, portanto, supor que a suspensão liminar se refere aqui, tão somente, à execução ou à aplicação da lei, restando incólume a lei propriamente no plano da validade11. Não havia dúvida, outrossim, de que o efeito vinculante (Bindungswirkung — § 31, (1), da Lei de Organização do Tribunal) das decisões do Bundesverfassungsgericht era suficiente para assegurar a não aplicação de uma norma pelos órgãos constitucionais, autoridades administrativas e tribunais, suspendendo, assim, a sua vigência fática ou a sua eficácia. (In: MENDES, Gilmar F. Questões Atuais sobre as Medidas Cautelares no Controle Abstrato de Constitucionalidade. Disponível em: www.osconstitucionalistas.com.br/wp-content/uploads/661-2148-1-PB.pdf Acesso em 16.02.2018).

[40] A petição inicial deve conter cópia da lei ou do ato normativo que está sendo questionado. Ela deve ser fundamentada, caso contrário pode ser impugnada de imediato pelo relator. O relator deve pedir informações às autoridades de quem emanou a lei, tais como Presidente da República, Congresso Nacional, para estabelecer o contraditório. Considerando a relevância da matéria e a representatividade dos requerentes, o relator poderá ouvir outros órgãos ou entidades.

Caso haja necessidade de esclarecimento da matéria, podem ser designados peritos para emitir pareceres sobre a questão ou chamadas pessoas com experiência e autoridade no assunto para opinar. O Advogado-geral da União e o Procurador-Geral da República devem se manifestar nos autos.

Quando houver pedido de medida cautelar, só poderá haver concessão pela maioria absoluta dos ministros que compõem o Tribunal, ou seja, por 6 votos. Somente em casos de excepcional urgência, a cautelar poderá ser deferida sem que sejam ouvidas as autoridades de quem emanou a lei. Uma vez proposta a ação, não se admite desistência.

[41] A teoria da inconstitucionalidade por arrastamento, também conhecida como inconstitucionalidade por atração ou inconstitucionalidade consequente de preceitos não impugnados, deriva de uma construção jurisprudencial do STF. Portanto, não se encontra positivada em qualquer norma constitucional ou legal de nosso sistema jurídico.

Por esta teoria, o STF poderá declarar como inconstitucional, em futuro processo, norma dependente de outra já julgada inconstitucional em processo do controle concentrado de constitucionalidade. ADIs, ADCs e ADPFs têm efeitos extunc (anula a lei desde a sua criação), erga omnes (vale para todos) e vinculante para todo o Poder Judiciário e para todos os órgãos da Administração Pública, direta e indireta, não abrangendo, apenas, o Poder Legislativo.

A dependência ou a interdependência normativa entre os dispositivos de uma lei pode justificar a extensão da declaração de inconstitucionalidade a dispositivos constitucionais mesmo nos casos em que estes não estejam incluídos no pedido inicial da ação. […].

[42] O art. 12, dessa forma, reduz os prazos (10 dias para informações e 5 dias de vista dos autos, sucessivamente, ao AGU e ao PGR) do rito ordinário (art. 6º e 8º, que fixam trinta dias para informações e 15 dias para AGU e PGR) e torna possível que, com celeridade semelhante a um julgamento de medida cautelar, o Tribunal passe logo ao julgamento definitivo do mérito da ação, quando a matéria nela discutida for patentemente relevante e tiver especial significado para a ordem social e a segurança jurídica. (In: MENDES, Gilmar F. Questões Atuais sobre as Medidas Cautelares no Controle Abstrato de Constitucionalidade. Observatório da Jurisdição Constitucional, Ano 5, 2011/2012. Disponível em: http://www.osconstitucionalistas.com.br/wp-content/uploads/661-2148-1-PB.pdf Acesso em 15.02.2018).

[43] A concessão de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade – ADIn está disciplinada nos artigos 10 a 12 da Lei nº 9.868/99. A respeito da eficácia da medida concedida, destacamos: (1) a medida cautelar, dotada de eficácia contra todos, será concedida com efeito ex nunc, salvo se o Tribunal entender que deva conceder-lhe eficácia retroativa (Lei nº 9.868/99, art. 11, §

1º). Nesse processo, a medida cautelar assegura, em caráter temporário, até o julgamento final da ação, a suspensão dos efeitos da norma impugnada.

A medida reveste-se, ordinariamente, de eficácia ex nunc, operando, portanto, somente a partir do momento em que o Supremo Tribunal a defere. Excepcionalmente, no entanto, a medida cautelar poderá projetar-se com eficácia ex tunc, repercutindo sobre situações pretéritas, desde que o Supremo Tribunal Federal expressamente lhe outorgue esse alcance.

Em suma: a excepcionalidade da eficácia extunc impõe que o Supremo Tribunal expressamente a determine no acórdão concessivo da medida cautelar; a ausência de determinação expressa importa em outorga de eficácia ex nunc à suspensão cautelar de aplicabilidade da norma impugnada;

2) a concessão da medida cautelar torna aplicável a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação em sentido contrário (Lei 9.868/99, art. 11§ 2º).

A cautelar implica, assim, a restauração provisória da vigência de eventual norma revogada pela lei impugnada. Esse um ponto que merece acurada análise: a concessão de medida cautelar, suspendendo a eficácia da norma impugnada, torna aplicável (provisoriamente) a legislação anterior acaso existente, salvo expressa manifestação do Supremo Tribunal Federal. Significa dizer que:

(A) se a norma impugnada, que teve sua eficácia suspensa pela medida cautelar, havia revogado outra norma, esta volta a viger, a partir da data em que a cautelar for concedida; (B) no final do processo, decidindo-se que a norma impugnada é constitucional, a medida cautelar, antes concedida, é cassada, considerando-se definitivamente revogada a norma que tinha voltado a viger; (C) no final do processo, se julgada inconstitucional a norma impugnada, permanece inalterada a vigência da norma anterior.

[44] É o que bem observa o Ministro Carlos Veloso no seu voto proferido na ADI nº 2.895-2/AL: […] Também o Supremo Tribunal Federal, no controle concentrado, fica condicionado ao “princípio do pedido”. Todavia, quando a declaração de inconstitucionalidade de uma norma afeta um sistema normativo dela dependente, ou, em virtude da declaração de inconstitucionalidade, normas subsequentes são afetadas pela declaração, a declaração de inconstitucionalidade pode ser estendida a estas, porque ocorre o fenômeno da inconstitucionalidade “por arrastamento” ou “por atração”.

[45] Duas considerações em relação à medida cautelar em ADC: (A) a medida cautelar em ADC possui efeito vinculante, uma vez que obriga os demais órgãos do Poder Judiciário (a orientação do STF é tranquila nesse sentido); (B) ao contrário da medida cautelar concedida em ADIn, a cautelar concedida em ADC possui um prazo limite de cento e oitenta dias para a sua eficácia.

[46] A técnica de interpretação conforme a Constituição que somente se aplica em face de normas polissêmicas ou plurissignificativas (normas que ensejam diferentes possibilidades de interpretação), o órgão de controle elimina a inconstitucionalidade excluindo determinadas hipóteses de interpretação (exclui um ou mais sentidos inconstitucionais) da norma, para lhe emprestar aquela interpretação (sentido) que a compatibilize com o texto constitucional. Tal técnica foi usada, por exemplo, no julgamento da ADI 4.277, na qual o STF reconheceu as uniões homoafetivas como entidades familiares, quando atribuiu ao art. 1.723 do Código Civil, interpretação conforme a Constituiçãopara deste excluir qualquer significado que impeça o reconhecimento da união contínua, pública e duradoura entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar.

Já a técnica da declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto tem sido usada para afastar determinadas hipóteses de aplicação ou incidência da norma, que aparentemente seriam factíveis, mas que a levaria a uma inconstitucionalidade, porém sem proceder a qualquer alteração do seu texto normativo. Não se está afastando os meros sentidos interpretativos da norma, mas subtraindo da norma determinada situação, à qual ela em tese se aplicaria. Tal técnica foi aplicada no julgamento da ADI 1.946, na qual o STF declarou a inconstitucionalidade parcial sem redução do texto do artigo 14 da EC 20/1998 (que instituiu o teto para os benefícios previdenciários do RGPS), para excluir sua aplicação ao benefício do salário-maternidade (licença gestante), que deve ser pago sem sujeição a teto e sem prejuízo do emprego e do salário, conforme o artigo XVIII, da CF/1988. (In: DA CUNHA JÚNIOR, Dirley. Distinções entre as Técnicas da Interpretação Conforme a Constituição e da Declaração Parcial de Inconstitucionalidade sem redução de texto. Disponível em: https://dirleydacunhajunior.jusbrasil.com.br/artigos/152105770/distincoes-entre-as-tecnicas-da-interpretacao-conformeaconstituicaoeda-declaracao-parcial-de-inconstitucionalidade-sem-reducao-de-texto Acesso em 15.02.2018).

[47] Brun-Otto Bryde (1943) é estudioso e jurista alemão, ex-juiz do Tribunal Federal Constitucional da Alemanha. Ele também foi professor visitante duas vezes na Faculdade de Direito da universidade de Wisconsin em 1989 e 1994. Bryde também foi membro da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial. De 2001 a 2011 foi juiz no Tribunal Federal Constitucional da Alemanha (1º Senado). Ele foi o primeiro juiz do Tribunal Constitucional Federal a ser eleito sob proposta do Partido Verde. Foi seguido pela juíza Susanne Baer.

[48] A crise vivenciada pela democracia representativa contemporânea influencia negativamente a divisão de poderes, na medida em que não proporciona nem a independência e nem a harmonia entre os poderes. Portanto, a falta de harmonia e independência entre os poderes cria um cenário de disputa entre estes. Acarretando o enfraquecimento político e social, pois os objetivos a serem galgados pelo Estado passam para o segundo plano quando o povo se encontra mal representado e suas instituições se encontram em conflito, o que impede o desenvolvimento.

Autora: 

Gisele Leite:    Professora universitária, Mestre em Direito, Doutora em Direito, Professora universitária da área jurídica e da área da Educação, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito. Pesquisadora. Articulista de vários sites jurídicas e revistas jurídica.

Entre perdas e ganhos da principiologia constitucional brasileira *Gisele Leite

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O presente texto pretende analisar a evolução das Constituições brasileiras, com especial atenção o processo legislativo e político e a final estruturação da principiologia constitucional.

E nessa análise crítica poderemos identificar as perdas e ganhos alcançados, bem como os contextos políticos e sociais que ensejaram retrocessos de legitimações sociais e individuais.

Introdução

Tratar da principiologia constitucional brasileira significa defrontar-se com uma vastidão temática desafiadora principalmente porque representa a diretriz do ordenamento jurídico, trazendo o arcabouço político-administrativo e formador da ideologia política dominante do Estado, enfocando particularmente a evolução histórica de princípios constitucionais fundamentais e os direitos e garantias[1] individuais contidos nas Constituições pátrias.

A história constitucional brasileira aponta para um Direito Constitucional inserido num contexto influenciado por fatores históricos, sociológicos, culturais e principalmente políticos

Lembremos que a Constituição de um país é o sustentáculo de todo ordenamento jurídico, configura a fonte de legalidade e legitimidade de todas as demais produções normativas, ou seja, as leis, decretos, medidas provisórias entre outros.

Se em 1967 tínhamos um Estado de excepção que tolhia as garantias fundamentais em prol de preservar a ordem pública, daí ter sido alcunhada de a “Carta dos Generais”, já em 1988, tinha-se outro objetivo que era o de curar as feridas do autoritarismo e do totalitarismo.

E, no lugar da opressão veio a liberdade. Mas, a materialização de toda essa evolução e mudança foi lenta, sofrida e gradual.

A evolução constitucional brasileira, foi marcada pela concretização dos direitos defendidos pelas Constituições de 1824, 1891, 1934, 1946, 1967/69 finalizando-se com a Constituição Cidadã, a de 1988, quando se começou a construção da base principiológica presente na atualidade.

Afinal, ainda buscamos compreender a dinâmica do processo das liberdades democráticas, bem como discutir os avanços e retrocessos, os ganhos e as perdas, advindos da experiência constitucional brasileira, que se apresentam inseridos na forma de princípios constitucionais.

Desde da Independência do Brasil o anseio por liberdade foi um catalisador presente em todas manifestações populares contra o governo. E, as ideias difundidas mundialmente pela Revolução Francesa de 1789, bem como os valores apregoados pela Declaração de Independência das Colônias dos Estados Unidos da América em 1776, bem anteriores à Constituição do Império brasileiro, que já trazia a noção de que o Estado fosse hábil e capaz de garantir e preservar coletivamente um bem-estar ao povo e ao indivíduo, portanto, reafirmando a função social do direito, o combate a opressão fundamentado principalmente na dignidade da pessoa humana.

A norma magna da monarquia brasileira foi alheia à vontade da nação, apesar de ter dedicado um extenso artigo para assegurar os direitos civis e políticos dos cidadãos brasileiros. Porém, não residia na monarquia a origem dos problemas surgidos da adequação da Constituição Imperial à vida social do século XIX, tanto assim é que o movimento responsável a instaurar um novo regime político, a República, muito pouco contribuição para a solução desse busilis.

Convém traçar os elementos que ensejaram a marcar a transição entre o regime monárquico para o republicano. E, as principais questões da monarquia foram, a saber: a abolição da escravatura, com a consequente mudança do sistema de trabalho, a constante manifestação de intelectuais em prol da república, a pressão dos grupos republicanos em face dos escândalos da corrupção.

E, que já permite concluir que em face do ambiente de descontentamento geral, aliás, resultante também do fato da norma magna ter sido outorgada e imposta por ato unilateral de vontade do Príncipe- Regente, o detentor do poder, a pessoa do Imperador Dom Pedro I.

A propósito, essa foi a razão da Constituição imperial revestir-se, ab initio, de um viés antipático de Carta outorgada e imposta. Nascendo, portanto, sem legitimidade popular e com selo da conveniência de sua outorga.

Afora isso, a deliberação de todas aquelas questões nunca contivera a participação popular. E, não chega ser exagero mencionar que Constituiçãoque sucedeu a do Império, apesar de ter sido proclamada sob o manto da República, também não atendeu a outro desígnio que era de legitimar este golpe aplicado habilmente pela elite da época. O que nos faz concluir que não faziam direito, apenas a pura e simples política.

Só para melhor ilustrar convém ler o artigo 92 da Carta do Império onde se percebe que o povo sempre fora afastado das questões relacionadas ao governo.

Constituição de 1891 que sacramentou a República se abeberou na Revolução Francesa, ademais, fora elaborada na oportunidade de queda do Império brasileiro com a notável contribuição de Rui Barbosa e trouxe ainda para nosso país a noção de uma federação, inspirada diretamente dentro dos moldes dos EUA.

Para compreender o modelo democrático de processo ou simplesmente chamado de processo democrático, é importante antes de tudo, analisar o próprio Estado Democrático de Direito, cuja paradigma se desenvolve a partir de um referencial histórico que foi o fim da Segunda Grande Guerra Mundial, quando especialmente o campo do direito constitucional veio a superar os paradigmas anteriores, a saber, o Estado Liberal e o Estado Social.

Nesse modelo se incorporaram muitos avanços, porém, superando-o por meio de um prestígio mais efetivo da pessoa humana, do cidadão e da sociedade nas decisões políticas do Estado.

Lembremos que o Estado Liberal, em suma, pode ser descrito como aquele que foi estruturado sob as premissas do liberalismo econômico que emerge a partir das Revoluções burguesas[2] do século XVIII, quando se pautou os princípios da liberdade e igualdade perante a lei (igualdade formal).

Assim, trata-se de um Estado de Direito que significa um Estado que encontra limites políticos, legalmente instituídos, ao exercício de seus poderes.

Além de que é juridicamente marcado pelo reconhecimento de direitos e garantias individuais aos cidadãos, sobretudo direitos civis e políticos, como a liberdade, inviolabilidade do domicílio, a legalidade, a propriedade privada, habeas corpus, o devido processo legal, o direito de voto e, etc. Naturalmente, percebe-se que há uma excessiva abstenção do Estado, que é mais propriamente regido pelas leis do mercado.

Por outro lado, o Estado Social é aquele que se identifica mais na primeira metade do século XX, notadamente após as revoluções sociais e revoltas trabalhistas, e tem como premissa que o mero reconhecimento de direitos pelo Estado é insuficiente, sendo indispensável e necessária a intervenção do Estado no efetivo implemento desses direitos[3].

In casu, trata-se de um Estado de Direito, doravante estruturado sob o princípio da igualdade material, impondo-lhe deveres prestacionais para com seus cidadãos.

Nas práxis política pode o Estado Social ser dividido em duas correntes, a saber: o Estado de Bem-Estar social ou WelfareState e o Estado socialista. Afora isto, é marcado particularmente no âmbito jurídico pelo reconhecimento de direitos sociais, tais como sociais, econômicos e culturais, como direito à saúde, à educação, cultura, previdência e assistência social, transporte, moradia, alimentação, salário mínimo, férias remuneradas e, etc. E, nesse caso, há uma excessiva intervenção do Estado.

O Estado Democrático de Direito[4], trata-se de mais novo paradigma sustentado sob as bases do Estado Constitucional de Direito e da democracia, que se unem para amalgamar um conceito novo, reunindo o que há de bom nos dois paradigmas anteriores (o Estado liberal e o Estado Social).

O surgimento do Estado de Direito ou Rechtstaat está historicamente vinculado ao surgimento do Estado Liberal, cujas premissas exigiam que o governo e os governantes se submetessem às leis que eles mesmos criaram. É, portanto, um Estado legal e legalista, estruturado com fulcro no Império da lei, que se impõe a todos, inclusive aos governantes e o próprio Estado, às leis do país, numa evidente negação do Estado Absolutista (onde aliás, o monarca estava acima da lei).

Aliás, é expressiva e consagradora de uma pretensa impessoalidade do Estado, que privilegia eminentemente a igualdade formal (perante a lei) entre as pessoas, bem como direitos de liberdade.

Devemos ainda recordar que conforme é consagrado pela tradição norte-americana, a ruleoflaw, apesar de muitas semelhanças com o inicial Estado de Direito, ainda se baseia em outros postulados, tais como, a existência de uma dimensão processual, onde há a imposição de procedimentos legais preestabelecidos; dá-se a submissão do Poder Executivo ao Parlamento; a prevalência de um movimento constitucionalista de defesa dos direitos e liberdades fundamentais, dever de publicidade das razões públicas das decisões institucionais do Estado, etc.

Na tradição francesa, o État legal[5] baseia-se em ideias de vontade geral e na soberania popular, estruturando-se na representatividade legislativa, ficando sua legalidade por esta condicionada e nesta fundamentada.

Numa ideia generalista, a democracia[6] seria o governo de todos. Portanto, não é o governo de maiorias e nem de minorias, mas sim, um governo de todos.

E, conforme já aludido por Abraham Lincoln, a democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo. De sorte que não se pode excluir da participação política e nem as minorias e nem maiorias, em razão de fatores que os diferenciam e os tornam um grupo.

Assim, a democracia veda a exclusão, o que impede que as minorias sejam suprimidas pela vontade das maiorias e exige ainda que os direitos de todos sejam respeitados inclusive os direitos das minorias.

A verdadeira democracia reconhece os mesmos direitos a todas as pessoas indistintamente, independentemente de qualquer fator discriminador, seja raça sexo, cor, sexualidade, origem, religião, convicção religiosa, filosófica ou econômica. A democracia significa que deve haver acesso facilitado para as pessoas aos direitos reconhecidos, em face de limitações fáticas que a vida lhes impõe.

De sorte que o Estado deve criar mecanismos que facilitem isso na tentativa de igualar suas condições às das demais pessoas (igualdade material)[7], obrigando que os ônibus possuam elevadores ou rampas que possibilitem esse acesso, por exemplo, aos deficientes físicos.

A regra procedimental de decisão política nas democracias se baseia na prevalência da vontade política da maioria, pois afinal, faz-se necessário uma regra que possa decidir as questões políticas do Estado, sob pena de jamais se chegar a qualquer decisão.

Nesse diapasão, pode-se afirmar que a democracia comporta um duplo sentido, podendo ser entendida no sentido formal, e em sentido material, ou substancial.

A democracia formal seria a identificada pela vontade da maioria, enquanto que a democracia substancial corresponde àquela que exige o respeito aos direitos e garantias fundamentais de todos, inclusive das minorias.

Percebe-se que a vontade da maioria não pode e nem deve violar e ferir os direitos fundamentais, principalmente os constitucionalmente consagrados, das minorias, e nem mesmo criar privilégios ou discriminações negativas contra as minorias. O governo é de todos e não apenas de um grupo, seja este majoritário ou minoritário.

Inclusive, cabe ressaltar que as ditaduras são antíteses da democracia, e podem ser tanto de maiorias ou de minorias. O que notabiliza as ditaduras é justamente a supressão de direitos de certo grupo em face da prevalência de outro grupo. Assim, as ditaduras podem ser tanto de uma minoria como de uma maioria.

A democracia medieval fundou-se na representatividade, sendo predominante o fato de o povo eleger seus representantes para que estes legislem em seu nome. E, não as democracias diretas, nas quais o povo legisla diretamente, ou seja, participa de forma direta e imediata na formação das leis, às quais também irá se submeter.

Existe ainda as democracias semidiretas, nas quais o povo elege seus representantes para que estes legislem em seu nome, mas em alguns casos o próprio povo legisla diretamente.

No constitucionalismo[8] contemporâneo, a participação do povo ocorre com a devida demonstração dos argumentos apresentados pelas pessoas, o que tem ganhado maior destaque, seja no campo teórico, como no prático, o que motivou a releitura da democracia que pode ser entendida para além da mera representatividade. Assim, hoje é corrente cogitar-se na chamada democracia deliberativa.

A democracia deliberativa surgiu nas últimas duas décadas do século XX, se apresentando como alternativa às teses da democracia então predominantes, as quais reduziam a um processo de agregação de interesses particulares, cuja finalidade seria a escolha de elites governantes.

Em oposição à essas teses agregativas e elitistas[9], a democracia deliberativa fulcra-se na noção de que o processo democrático não pode se limitar à prerrogativa popular de eleger seus representantes.

A experiência histórica aponta que assim concebida, pode ser malbaratada e manipulada. Pois a democracia forçosamente deve envolver, além da escolha de seus representantes, também a possibilidade de se deliberar publicamente sobre as questões a serem decididas.

Afinal, a troca de argumentos e contra-argumentos racionaliza, otimiza e legitima a gestão da coisa pública.

De sorte que a deliberação deve existir dentro de um contexto aberto, livre e igualitário. E, todos devem, realmente, terem iguais possibilidades para influenciar e persuadir. E, tais pressupostos de uma deliberação justa, racional e eficiente são institucionalizados dentro do Estado de Direito.

Portanto o Estado de Direito é um pressuposto da democracia. Não existe uma autêntica democracia sem que haja o respeito aos direitos fundamentais[10].

Com relação ao Estado de Direito e à democracia, em resumo, pode-se dizer que o paradigma do Estado democrático de Direito consagra–se como um Estado constitucional e constitucionalizado, estruturado legalmente pela democracia e submetido às leis que edita.

Desta forma, trata-se de um Estado que tem seu poder limitado e legitimado pelo poder do povo e pelo reconhecimento e garantia dos direitos fundamentais de todos. É um Estado que existe para proteger e promover as pessoas que o compõem, todas estas, sem discriminações de qualquer natureza, enfim, que garanta e proteja o direito de todas as pessoas.

Confirma-se dessa forma, que o Estado que é meio e não um fim em si mesmo, e existe para a consecução de fins humanos que é o mecanismo para a promoção e proteção da pessoa humana.

Afora isso, é um Estado que possui suas origens e suas decisões fundamentais tomadas com base em discurso racional público, no qual se assegura o igual direito de participação a todos os cidadãos que o compõe, para que participem do processo de formação das leis às quais estarão se submetendo.

O modelo processual democrático visa a separação dos modelos anteriores, o liberalismo processual e socialismo processual e, ainda, o neoliberalismo processual. Afastando-se assim das distorções, desequilíbrios e paradoxos produzidos por eles, posto que tais modelos não são hábeis de atender às necessidades de uma sociedade plural, democrática e participativa, pautada na cidadania e estruturada sob à égide de Estado Democrático de Direito, conforme tem sido consagrado pelas constituições contemporâneas ocidentais.

Nesse modelo é rechaçado todo e qualquer protagonismo[11], seja dos litigantes, seja do juiz, propondo uma estrutura dialética de procedimento[12], de caráter policêntrico, pautada na coparticipação dos sujeitos processuais, em nível de igualdade.

E à luz do Estado Democrático de Direito, o processo deve servir como instrumento através do qual os sujeitos processuais de forma isonômica, e equilibrada, evitando-se os protagonismos, divide a responsabilidade da resolução dos litígios, da demanda judicial, entre todos eles (corresponsabilidade).

Frise-se ainda que existe entre os sujeitos processuais nítida interdependência, pois para haver uma decisão escorreita faz-se necessária a participação responsável de todos, sendo que a colaboração[13] de um auxilia e tem poder de influência no resultado final, assim, sem a participação, perde-se a democracia, perde-se a justiça e, nos aproximamos da mera igualdade formal.

Por fim, o modelo democrático de processo visa a supressão da noção de que o processo corresponde a mero instrumento de jurisdição, sendo assim, um instrumento técnico, em verdade, deve-se afirmá-lo como mecanismo garantístico[14] de direitos fundamentais de pessoas envolvidas na demanda judicial, bem como comprometidas com a preservação da ordem jurídica constitucionalmente estabelecida, afastando-se os desvios e abusos do poder estatal, bem como do poder econômico privado.

O processo é uma garantia contra o arbítrio e o abuso dos poderes públicos e privados em todos os setores, devendo controlar os provimentos dos agentes políticos afim de garantir[15] a legitimidade discursiva e democrática das decisões.

Enfim, o processo incorpora concretamente um instituto legitimante e estruturador da participação da cidadania e perfaz assim a essência da própria democracia.

Quando vigente o CPC de 1973 o modelo democrático de processo podia ser legalmente identificado, e reforça-se ainda mais atualmente, com o CPC de 2015 cujas bases normativas fundamentais estão enraizadas na Constituição Federal brasileira de 1988, de caráter muito democrático e humanista.

E, tal fato vem logo identificado em seu primeiro artigo pois coloca que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da Republica Federativa do brasil, observando-se as disposições deste Código.

Em diversos trechos, o CPC de 2015 reafirma positivamente que é um código processual democrático, neoprocessualista, principalmente quando se reconhece os princípios processuais bem como sua influência em diversos procedimentos adotados.

Entre as normas fundamentais do processo civil, consagra a comparticipação, a corresponsabilidade e a isonomia entre os sujeitos processuais em seus artigos 6º e 7º, cujas redações afirmam a cooperação dos sujeitos do processo, a duração razoável do processo[16], a prevalência do julgamento do mérito de forma que a decisão seja justa e efetiva.

Além disso, é assegurada às partes a paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz[17] zelar pelo efetivo contraditório[18].

CPC de 2015 ainda prevê certos deveres cooperativos tão peculiares ao processo democrático, a saber: dever de esclarecimento; dever de prevenção; dever de assistência ou auxílio.

Observou o pai do Direito processual civil brasileiro, José Carlos Barbosa Moreira, que o dever de esclarecimento integra o dever de cooperação do juiz com os litigantes, com o fito de contribuir com a mitigação das desigualdades substanciais entre as partes, conferindo-se ao juiz a faculdade, de prestar-lhes informações sobre os ônus que lhe cabem, convidando-as, para esclarecer as declarações sobre os fatos, e a necessidade de comprovar suas respectivas alegações.

O dever de esclarecimento foi o que moveu o artigo 485 do CPC/2015[19] a exigir que esclareça mais especificamente a decisão, extirpando dúvidas e prestigiando sempre que possível o julgamento do mérito das causas.

Por sua vez, o dever de prevenção impõe ao juiz um dever geral que, em suma, pode ser descrito como o dever de apontar os eventuais defeitos processuais das postulações das partes, para que possam ser corrigidos.

Por conta desse dever, deve-se prover o saneamento de pedidos obscuros, a possibilidade de se encontrar a exposições lacunares de fatos relevantes; a indispensabilidade de adequação dos pedidos formulados à situação de fato e de direito descrita; sugestão de determinadas atuações pelas partes.

A guisa de exemplificação, cabe apontar o artigo 321 do CPC/2015 que assevera que o juiz ao verificar que a petição inicial não preencha os requisitos dos artigos 319 e 320 ou que apresente defeitos ou irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor, dentro do prazo de quinze dias úteis, a emende ou a complete, a indicando com precisão o que deve ser corrigido ou complementado.

Já o dever de assistência ou auxílio opera-se no sentido de propiciar a superação de eventuais dificuldades[20] que impeçam o pleno exercício de direitos ou faculdades ou ainda, o cumprimento de ônus ou deveres processuais. Cabendo ao magistrado providenciar, sempre que possível, a pronta e eficaz remoção de obstáculo[21].

Conclui-se, portanto, que o CPC/2015 é muito mais democrático que seu antecessor, mas o problema não se limita à ordem positiva e legal e, sim, particularmente na índole interpretativa. Na alma hermenêutica no sentido de dar a interpretação à luz do texto constitucional vigente, priorizando-se o policentrismo, a comparticipação e a isonomia entre os sujeitos processuais ao longo do processo.

Referências:

NUNES, Dierle. José Coelho. Processo Jurisdicional Democrático: uma análise crítica das reformas processuais. Curitiba: Juruá, 2008.

DOS SANTOS. Eduardo R. Princípios Processuais Constitucionais. Salvador: JusPODIVM, 2016

LEAL, Rosemiro Pereira. O garantismo processual e direitos fundamentais líquidos e certos. Disponível em: http://www.arcos.org.br/periodicos/revista-eletronica-de-direito-processual/volume-iv/o-garantismo-processualedireitos-fundamentais-liquidosecertos Acesso em 25.03.2018.

GRECO, Leonardo. Garantias Fundamentais do processo: O processo justo. Disponível em: https://processoemdebate.files.wordpress.com/2010/09/processo-justo_leonardo-greco.pdf Acesso em 23.3.2018.

[1] O grande mestre Leonardo Greco in litteris leciona: “As garantias fundamentais abrangem em princípio tanto o Processo Civil, quanto o Penal, o Trabalhista, o Eleitoral etc. Meu interesse principal é pelo Processo Civil, o que me leva a estar mais atento às consequências que a implementação das garantias terá sobre ele. Todavia, parece-me impossível abstrair por completo dos seus reflexos sobre os demais ramos do Direito Processual”.

[2] As revoluções burguesas são movimentos sociopolíticos ocorridos entre 1640 e 1850 nos quais a sociedade aristocrática, caracterizada pela monarquia absoluta e/ou pelos títulos de nobreza, foi transformada em uma sociedade capitalista dominada pela produção mercantil liberal. Os exemplos clássicos de revoluções burguesas são a Revolução Inglesa (1640/88) e a Revolução Francesa (1789), nas quais “os mecanismos políticos, jurídicos e ideológicos de ambas garantiam, à burguesia, o desenvolvimento das relações capitalistas de produção e o exercício da dominação social e da hegemonia política sobre os demais segmentos da sociedade contemporânea”

Seu principal exemplo foi a Revolução Francesa (1789), a qual se seguiram outras revoluções, na Europa (Revolução de 1820, Revolução de 1830, Revolução de 1848) e nas colônias americanas (Independência da América Espanhola). O Antigo Regime termina de vez na Rússia por meio da Revolução de Fevereiro de 1917 e da Revolução de Outubro, classificadas como revolução socialista e proletária.

Alguns dos méritos da Revolução Francesa foram: abolir as corporações de ofício e o tabelamento de preços; remover restrições à indústria, finanças e bancos; encerrar os direitos e deveres feudais dos camponeses; e confiscar as terras da Igreja Católica para, depois, vendê-las para a iniciativa privada.

[3] É a liquidez dos direitos fundamentais, constitucionalmente reconhecidos, que acarreta o non liquet, de modo que se pode exigir sempre uma decisão declaratória, constitutiva acessória, porque a lei demarcou os princípios de isonomia, contraditório, ampla defesa e se habilita ainda a criação de fundamentos como a autoprivação de liberdades diferenciadas, pelos quais, substituímos por liberdades simétricas processualmente exercidas de forma dialética.

[4] A rigor, a expressão “Estado Democrático” não pode significar instituição não esclarecida, e agente fantasma de direitos legislados ou adotados numa ordem jurídica qualquer, sequer pode ainda tal Estado se jactar como recinto axiológico de uma decidibilidade governativa, administrativa e judiciária, comprometida com pauta de valores não juridificados e não processualmente dada à fiscalização irrestrita.

Assim, no direito democrático, o que primeiro se preocupa é com a despersonalização do Estado para tornar visíveis as individualidades componentes da Administração Governativa em todos os segmentos da comunidade jurídica cuja proposta constitucional é a possibilidade cognitiva de todos no espaço processual, seja no sentido de produção, recriação, afirmação ou destruição da lei.

[5] A expressão “Estado Legal ou Estado legislativo “se refere a um sistema político em que o Estado está sujeito ao princípio da legalidade. A lei é então considerada como a única expressão da vontade geral desejada pelo povo soberano, através de seus representantes no Parlamento. De sorte que estabelece nítidas condições e limites de atuação da Administração. Não há nada acima da lei que tenha autoridade suprema na lei e na ordem lega. Ocorre o legicentrismo.

[6] Qualquer que seja o ângulo a enfocar da teoria da democracia, há relevante traço definidor dos regimes que se apresenta assim, pois enfatizam a visibilidade do poder. Assim, na teoria de Dahl, o direito de acesso à informação está persente na descrição das condições e características da poliarquia.

[7] Novamente, com rigor, leciona Leonardo Greco: “A igualdade concreta também se aplica quando uma das partes é o Estado, sob pena de privar o particular da garantia da tutela jurisdicional efetiva54. Os chamados privilégios processuais da Fazenda Pública somente são legítimos na medida em que se fazem necessários para que o Estado possa exercer com plenitude a sua defesa em juízo, em igualdade de condições com qualquer outro litigante. De nenhum modo são toleráveis para dar ao Estado posição de vantagem ou para dificultar ou retardar o acesso à Justiça do cidadão ou para eximir o Estado do cumprimento dos seus deveres.

O reexame necessário, critérios diferenciados para o arbitramento de honorários da sucumbência, intimação pessoal dos advogados da União, dispensa de depósito de 5% do valor da causa na ação rescisória, parcelamento de precatórios, proibições de liminares, dispensa do depósito da multa por interposição de agravo manifestamente incabível ou infundado, proibição de execução de sentenças cautelares antes do trânsito em julgado, possibilidade de intervenção das pessoas jurídicas de direito público nas causas cuja decisão possa ter reflexos, ainda que indiretos, de natureza econômica, independentemente de interesse jurídico (Lei 9469/97, art. 5) são privilégios que violam a garantia da igualdade concreta.

Quanto aos prazos em dobro ou em quádruplo, a questão é polêmica. O que foi modificado sensivelmente com CPC de 2015.

[8] A constitucionalidade democrática corporificada numa lei ou constituiçãoequivale assim, na lição de Rosemiro Leal, a um título executivo, trazendo em seu bojo a liquidez e certeza, devendo-se obter a imediata satisfação, com devido a priori pela Administração Governativa.

Por essa razão, o mandado de segurança que tutela a liquidez e certeza dos direitos, é um instituto de características democráticas, quando, particularmente, se põe como ação e procedimento constitucional para a execução dos direitos fundamentais de vida, liberdade e dignidade diante a ilegalidade da inadimplência de agentes da Administração e não de proteção aos direitos individuais, em face de outrem, sem origens nas bases das já implementados direitos fundamentais.

[9] A riqueza do termo “elite” remonta a Pareto, que alguns anos depois, por influência de Mosca, enunciou a tese segundo a qual em toda sociedade há uma classe “superior” e que detém geralmente o poder político e o poder econômico à qual se deu nome de aristocracia ou elite.

[10] Saliente-se que todos os sujeitos do processo possuem o direito de exigir do Estado o respeito aos seus direitos fundamentais. E, o juiz não pode impor a quem quer que seja, um tratamento humilhante, que seja ofensivo à sua honra, à sua liberdade, à sua intimidade, à sua propriedade, a não ser nas hipóteses e dentro dos limites estabelecidos pela própria lei.

E, com esse fundamento, o processo repudia as provas ilícitas, a não ser na medida em que seu uso seja necessário para preservar o direito cujo sacrifício não seja lícito exigir em ponderação com o direito violado pela ilicitude da prova.

[11] O direito processual brasileiro legislado e aplicado segue à realização de uma espécie de dirigismo, ou ativismo judicial protagonizando pela pessoa física exercente do poder jurisdicional. Denuncia-se uma posição bem similar em países vizinhos da América latina, também em outros da Europa Continental.

[12] A ritualística procedimental deverá ser regida pela lei, de forma a assegurar a necessária paridade de tratamento de todos perante os órgãos jurisdicionais e regular de modo equilibrado o encadeamento lógico de todos os atos processuais, a fim de garantir o respeito às regras mínimas do processo justo.

Mas, tal procedimento legal não pode ser rigidamente inflexível, devendo facultar ao juiz uma certa margem de variação para estabelecer a necessária paridade concreta de armas, bem como propiciar o cumprimento de todas as atividades tecnicamente mais idôneas para permitir que cada uma das partes faça valer o seu direito ou demonstre a sua procedência.

Acima de tudo, é que o procedimento seja realmente previsível, para que cada uma das partes, possa esquadrinhar uma estratégia de atuação, e tenha condições de prever o desenvolvimento futuro do processo para que o seu desempenho seja o mais eficaz possível e, para que as bruscas alterações do rumo não venham cercear indevidamente o seu direito de defesa.

[13] Sublinhe-se que no bojo do contraditório participativo ou dinâmico tão peculiar ao Estado Democrático contemporâneo, se assegura ao acusado, o direito de intervir em todos os atos probatórios para influir na produção de provas e assim também influenciar eficazmente na decisão que irá apreciá-las. mesmo o indiciado ou suspeito, durante a investigação preliminar, tem todo o direito de participar e influir na colheita de todas as provas que possam ser repetidas no processo judicial.

[14] A repetida retórica de lesão ou ameaça aos direitos fundamentais, ainda não implantados, a ser apreciado pelo Judiciário brasileiro tem gerado um paradoxo indissolúvel, porque são considerados como lesados e ameaçados os direitos inexistentes, aumentando assim a carga das normas constitucionais referentes aos direitos constitucionalmente líquidos e certos, principalmente quando interpretados segundo o princípio da reserva do possível, em descarte explícito ao significado do Estado Democrático de Direito.

[15] Garantismo é uma forma de pensar o Processo em suas dimensões analítico-legal, semântico-conceitual e pragmático-jurisprudencial como efetiva GARANTIA do indivíduo e da sociedade perante o poder estatal de exercer a Jurisdição.

Se processo é garantia, jurisdição é poder, e este só será legitimamente exercido quando concatenar as regras de garantia estabelecidas no plano constitucional, como o devido processo, o contraditório (direito das partes, não do juiz), a ampla defesa, a imparcialidade, a impartialidade, a acusatoriedade, a liberdade, a dispositividade, a igualdade, a segurança jurídica, a separação dos poderes, a presunção de inocência etecetera.

[16] O direito à prestação jurisdicional tempestiva, ou seja, em prazo razoável, trata-se de exigência da tutela jurisdicional efetiva. E, a demora ou tardança no julgamento gera uma instabilidade na situação jurídica dos litigantes, sendo incompatível com a noção de segurança jurídica que é exigível em toda sociedade realmente democrática.

A jurisdição, afinal, deve assegura a quem tem razão o pleno gozo de seu direito durante o máximo de tempo possível. E, o ideal seria que tal gozo fosse assegurado durante todo o tempo de duração do próprio direito, desde seu nascimento até o seu desaparecimento na esfera jurídica.

[17] O direito de acesso à Justiça é o direito a um julgamento por um juiz imparcial, ou seja, um juiz equidistante das partes e dos interesses a ele submetidos, que vai examinar a postulação que lhe foi dirigida no intuito exclusivo de proteger o interesse de quem tiver razão, de acordo com a lei e as demais normas que disciplinem essa relação jurídica. Mas, a imparcialidade não se confunde com a neutralidade. Pois ninguém, nem mesmo o magistrado é neutro.

[18] O contraditório e o direito à ampla defesa abrange tanto o direito à autodefesa quanto à defesa técnica por um advogado habilitado, e também o direito a não ser prejudicado no seu exercício por obstáculos alheios à sua vontade ou pela dificuldade de acesso às provas de suas alegações

[19] A motivação das decisões judiciais atende a dupla exigência. De um lado, as partes e o público têm o direito de conhecer as razões que sustentam a decisão e de verificar se essa fundamentação é logicamente consistente e se é capaz de convencê-los de que o juiz se empenhou para que a decisão fosse a mais acertada e a mais justa possível.

De outro lado, o juiz tem o dever de demonstrar que examinou todos os argumentos relevantes de fato e de direito apresentados pelas partes, porque somente assim terão estas a certeza de que o contraditório participativo foi respeitado, ou seja, de que o juiz efetivamente considerou toda a atividade desenvolvida pelas partes para influir na sua decisão.

[20] A gratuidade visa a garantir ao juridicamente pobre paridade de tratamento e igualdade de chances no acesso à tutela jurisdicional, mas não a colocá-lo em posição mais vantajosa do que a do seu adversário, sob pena de transformar-se num instrumento de privilégio.

Enquanto que o usuário da justiça paga tem um freio natural que o inibe de abusar do direito de demandar: a ameaça de ter de arcar com os encargos da sucumbência, como custas, honorários advocatícios e honorários periciais. O juridicamente pobre não tem esse mesmo freio, o que pode levá-lo a tornar-se um desenfreado litigante de má-fé.

Para evitar esse abuso e tentar assegurar igualmente a boa-fé do litigante pobre, alguns países exigem que este produza, ainda que sumariamente, alguma prova do direito alegado, antes da concessão da gratuidade, sob pena de indeferimento desta. É o que acontece, por exemplo, no Direito Alemão, através do § 118 do Código de Processo Civil. E, nesse sentido, se orientou a recente Reforma Trabalhista no direito brasileiro.

[21] A Convenção Americana de Direitos Humanos ou Pacto de São José da Costa Rica de 1969 é um instrumento normativo internacional de proteção aos direitos humanos no continente americano.

Nos termos do seu artº 7, § 5º: Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo.

Autora: Gisele Leite:  Professora universitária, Mestre em Direito, Doutora em Direito, Professora universitária da área jurídica e da área da Educação, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito. Pesquisadora. Articulista de vários sites jurídicas e revistas jurídica.

Ex-vereadores de São Martinho são condenados a prisão por uso de dinheiro público para viagem de turismo

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A 4ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul condenou sete ex-vereadores do município de São Martinho e um empresário a 4 anos e 6 meses de prisão em regime semiaberto pelo crime de peculato. Eles foram acusados de usarem o dinheiro público para fazer viagem de turismo, com a justificativa de que estariam em um curso de aperfeiçoamento.

Cada um dos então parlamentares recebeu R$ 1.478,40, equivalente a quatro diárias para participarem do curso Aspectos da Lei de Responsabilidade Fiscal e Transição de Mandato, que ocorreu entre 24 e 27 de janeiro de 2006, em Foz do Iguaçu.

Todos foram absolvidos em 1ª instância da denúncia, contudo  Ministério Público recorreu da decisão ao Tribunal de Justiça sustentando a existência de provas suficientes para a condenação. O MP alegou ter havido o fornecimento indevido de certificados do curso, sem o efetivo controle de frequência dos inscritos, além do desvio de finalidade e conduta dolosa em relação à redução da carga horária, que deveria ser de seis horas diárias e acabou sendo reduzida para quatro horas diárias.

Decisão

Em seu voto, o relator do acórdão, o juiz Mauro Borba, alertou: “O trato da coisa pública exige um redimensionamento ético.” Ele disse que é preciso “gestar a coisa pública, através da observância de regras e princípios, guiada pela melhoria de vida da coletividade, que respeite os interesses da comunidade”.

Para o magistrado, uma simples análise do folder de divulgação do curso, que anunciava uma única palestra por dia, com um único palestrante por dia, já denunciava a falta de seriedade do curso e a probabilidade de desvio de sua função. “A destinação de um dia inteiro só para inscrições (que não passaram de 40) não se justificava.” Ele lembrou ainda que o valor das diárias equivalia a mais que o dobro do salário mensal de um vereador na época.

O magistrado condenou os vereadores e o empresário a 4 anos e 6 meses de reclusão em regime inicial semiaberto. Os desembargadores Rogério Gesta Leal e Sérgio Miguel Achutti Blattes acompanharam o voto do relator.

 

FONTE: TJ – RS

Atraso sistemático de salários gera direito a indenização por danos morais

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Um município foi condenado a indenizar um ex-empregado em R$5 mil por danos morais em razão de sucessivos atrasos salariais. A decisão é da 11ª Turma do TRT de Minas, com base no voto da juíza convocada Adriana Campos de Souza Freire Pimenta. Para a relatora, a conduta do réu violou a honra subjetiva do trabalhador, em afronta aos princípios da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e da função social da empresa/propriedade (artigos 1º, III e IV, 5º, XXII e XXIII e 170, caput, II, III e VIII, CR/88).

Após a condenação imposta em 1º grau, o município recorreu, com a alegação de não ter culpa pelos atrasos salariais. Nesse sentido, argumentou que dependia do repasse do Fundo de Participação dos Municípios para garantir o correto cumprimento de suas obrigações. O réu acusou gestões anteriores de terem causado grave desequilíbrio para gerir a nova administração, o que impactou diretamente na folha de pagamento dos servidores municipais. No entanto, a juíza convocada entendeu que o ato ilícito abusivo ficou caracterizado no caso.

Em seu voto, esclareceu que a mora no pagamento das parcelas salariais, em regra, não enseja indenização por danos morais. Isso porque o ordenamento jurídico estabelece consequências próprias para a quitação das verbas trabalhistas fora do prazo. O problema é que, no caso, o atraso no pagamento dos salários dos funcionários foi sistemático, como confessado pelo próprio município. Para a julgadora, é inegável o desgaste psíquico causado ao empregado, em virtude do transtorno financeiro experimentado. “O trabalhador depende de sua remuneração para viver dignamente, não havendo dúvidas de que atravessou desequilíbrio no seu orçamento, porquanto as verbas trabalhistas têm a finalidade precípua de satisfazer suas necessidades básicas”, destacou.

A Turma de julgadores, ao acompanhar o posicionamento da juíza convocada, negou provimento ao recurso e manteve o entendimento adotado em 1º grau, inclusive quanto ao valor de R$5 mil, considerado razoável em face do contexto apurado no processo.

  •  PJe: 0011879-40.2017.5.03.0053

FONTE: TRT – MG

Gari receberá indenização por danos materiais cumulativamente com auxílio-doença

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A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) condenou a Resende Castro e Castro Ltda.,  de Cassilândia (MS), ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 200 mil a um gari afastado por auxílio-doença após ter sofrido acidente de trabalho. Segundo a Turma, o benefício previdenciário e a pensão podem ser recebidos cumulativamente.

Despreparo

O gari, contratado para prestar serviços ao município, sofreu acidente em 2013. Com apenas três meses na função, ele teve a perna direita presa na prensa do caminhão de lixo. Na reclamação trabalhista, afirmou que a empresa não ofereceu equipamentos de proteção individual nem treinamento ou curso.

O empregado sustentou ainda que os ferimentos foram agravados pelo despreparo dos demais garis e do motorista do caminhão, que não sabiam como retirá-lo da prensa e optaram pelo uso de um maçarico, causando queimaduras e danos irreversíveis à perna.

Lesão definitiva

A perícia constatou que a lesão era definitiva, gerando incapacidade total e permanente para o trabalho. Segundo o laudo, a empresa não prestou nenhum tipo de auxílio-médico.

O juiz da Vara de Cassilândia concordou que a atividade exercida pelo grupo que prestava serviços à prefeitura era de risco e, por isso, condenou a empresa a pagar indenização por dano material no valor de R$ 200 mil, na forma de pensão mensal, e ainda R$ 50 mil por dano moral e R$ 20 mil por dano estético.

Negligência

Ao Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS), a empresa de coleta de lixo alegou que o empregado havia sido o único culpado pelo acidente por ter apoiado o joelho enquanto a prensa foi baixada, “agindo de forma negligente”. E argumentou que ele já estava recebendo auxílio-doença do INSS e, por isso, não teria direito à indenização por danos materiais.

Com o fundamento de que não era possível a acumulação, “exceto para complementação de valores”, o TRT afastou a condenação por danos materiais e manteve apenas as indenizações por dano moral e estético.

Acumulação

Segundo o relator do recurso de revista do gari, ministro Douglas Alencar Rodrigues, assinalou que não há qualquer impedimento para a percepção concomitante de benefício previdenciário e de pensão relativa à indenização por danos materiais arbitrada em razão de ato ilícito do empregador. “Conforme estabelece o artigo 121 da Lei 8.213/91, o pagamento pela Previdência Social das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem”, afirmou. “As duas indenizações têm naturezas distintas e, portanto, não se confundem, tampouco se excluem”.

Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso para restabelecer a sentença.

Processo: RR-25305-92.2014.5.24.0101

FONTE: TST