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PRESCRIÇÃO DE DÍVIDA FISCAL
Prescrição de débito fiscal só mesmo após 5 anos

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DECISÃO:  * TJ-RN – A 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte reformou a sentença original, que tirava do Município de Natal o direito de cobrar débitos fiscais de IPTU e da Taxa de Limpeza Pública dos anos de 1997, 1998 e 1999 de um então devedor.  

Para tanto, o juiz de primeiro grau teve o entendimento de que houve a chamada prescrição, que se caracteriza quando o credor não propõe, dentro do prazo de cinco anos, a respectiva ação para cobrar o crédito. O Ente Público, no entanto, moveu Apelação Cível (N° 2007.006549-2), junto ao TJRN, cujos argumentos foram acolhidos pelos desembargadores.

De acordo com a relatora do processo e vice-presidente do TJRN, desembargadora Célia Smith, a contagem do lapso temporal prescricional se inicia no momento da constituição definitiva do débito, sendo interrompido pela citação pessoal feita ao devedor, nos termos do artigo 174 (caput) do Código Tributário Nacional.

A decisão em segunda instância levou em conta que a execução fiscal relativa a créditos tributários constituídos definitivamente em 31 de dezembro de 1997, 31 de dezembro de 1998 e 31 de dezembro de 1999, foi ajuizada em 30 de dezembro de 2002, momento em que, a princípio, o Município ainda detinha o direito de ação

“A prescrição do primeiro crédito tributário constituído (31 de dezembro de 1997), somente se daria em 31 de dezembro de 2002 (um dia após do que foi realizado)”, ressalta o voto do processo.

O voto também levou em conta que é preciso verificar que, apenas em 23 de janeiro de 2004, foi proferido o despacho que determinou a citação do apelante, tendo o devedor sido finalmente citada em 20 de agosto do mesmo ano. "Diante dessas circunstâncias, impõe-se a aplicação da Súmula 106 do Superior Tribunal de Justiça, a qual dispõe que ‘proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica o acolhimento da argüição de prescrição ou decadência’”, define a desembargadora.

 


 

FONTE:  TJ-RN, 06 de março de 2009

 

FALTA DE CONVIVÊNCIA ENTRE PAI E FILHO NÃO É INDENIZÁVELAbandono afetivo não gera dano moral

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DECISÃO: * TJ-MG  –  Ninguém é obrigado a amar ou a dedicar amor. Assim concluíram os desembargadores da 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) ao confirmar decisão que nega a uma desempregada residente em Sabará (região metropolitana de Belo Horizonte) indenização por danos morais contra seu pai, pela ausência da figura paterna em sua vida.

A desempregada ajuizou a ação em novembro de 2007, quando tinha 18 anos, alegando que seu pai, apesar de ter condições, jamais procurou se aproximar dela, restringindo-se somente ao pagamento de pensão alimentícia. Ela sustenta que tal ausência causa a ela “enorme dor, angústia e sofrimento, pois lhe falta o principal, o afeto, a participação do pai na sua formação pessoal, educação e orientação”. Pediu R$ 38 mil a título de indenização por danos morais.

O pai, em sua defesa, alega que nunca conviveu com a mãe da garota e nem formaram qualquer vínculo familiar. Afirma que a filha já é maior e vive com um homem maritalmente, não existindo qualquer trauma e ainda que ela jamais o procurou para convivência.

O juiz José Washington Ferreira da Silva, da 20ª Vara Cível de Belo Horizonte, negou o pedido da desempregada. “Penso que age tal qual o pai que o abandona, o filho que pede recompensa financeira para minimizar a ausência da figura paterna”, avaliou o juiz. Para ele, não se pode recompensar amor, carinho e afeto com dinheiro, “porque estes são sentimentos que devem fluir normalmente e espontaneamente da convivência entre pai e filho”.

A desempregada recorreu ao Tribunal de Justiça, mas os desembargadores Alvimar de Ávila (relator), Saldanha da Fonseca e Domingos Coelho confirmaram a sentença.

Segundo o desembargador Alvimar de Ávila, “a paternidade requer envolvimento afetivo e se constrói com o passar do tempo, através de amor, dedicação, atenção, respeito, carinho, zelo etc, ou seja, envolve uma série de sentimentos e atitudes que não podem ser impostos a alguém e muito menos serem quantificados e aferidos como dano indenizável”.

Ainda segundo o relator, “o laço familiar que liga o pai ao filho é algo profundo, decorrente de convivência diária, da proximidade, da confiança, da vontade de fazer parte da vida do filho, sendo certo que uma decisão judicial não irá alterar um distanciamento que, por quase vinte anos, perdura entre as partes”.

“Escapa do arbítrio do Judiciário obrigar alguém a amar ou manter um relacionamento afetivo”, concluiu o relator.

Processo nº: 1.0024.07.790961-2/001

FONTE:  TJ-MG, 04 de março de 2009

 

 


 

PRESTAÇÃO DE CAUÇÃO NÃO É OBRIGATÓRIACaução é desnecessária quando ressarcimento de prejuízos é possível

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DECISÃO: * TJ-MT É desnecessária a prestação de caução para o deferimento da tutela antecipada quando possível o ressarcimento de eventuais prejuízos advindos da concessão desta medida. Com esse argumento, a Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso determinou que a Sul América Seguros de Vida e Previdência S.A. efetue a cobertura completa de tratamento médico-hospitalar de um paciente, inclusive com o exame denominado Pet Scan (PET CT), quantas vezes forem necessárias. A decisão, que manteve a antecipação de tutela concedida em Primeira Instância, foi unânime (Agravo de Instrumento nº 71.125/2008).  

Ainda de acordo com a decisão, o plano de saúde deverá proceder a todas as determinações que o médico de confiança do paciente requerer nos hospitais indicados pelo profissional, bem como de todos os outros fatores relacionados à quimioterapia (taxol, carboplatina e avastin). 
 
Nas argumentações recursais, a empresa agravante requereu a reforma da decisão, sustentando que a tutela antecipada não poderia ter sido deferida, uma vez que o agravado não prestou caução idônea e suficiente. Entretanto, para o relator do recurso, desembargador José Ferreira Leite, é desnecessária, na hipótese judicializada, o oferecimento de caução para o deferimento da tutela antecipada.  O magistrado explicou que o caso em questão envolveu questão ligada a plano de saúde e não ao patrimônio. 
 

Ainda de acordo com o magistrado, jurisprudência do próprio TJMT preleciona que a mera alegação de irreversibilidade da medida não impõe a exigência de caução. Segundo o julgador, a exigência ou não da caução para o deferimento da tutela antecipada fica a critério do Juízo. A votação também contou com a participação da juíza substituta de Segundo Grau Clarice Claudino da Silva (1º vogal) e do desembargador Juracy Persiani (2º vogal).


 

FONTE:  TJ-MT, 05 de março de 2009

 

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BENS
Agricultor precisa de bens para angariar recursos a fim de quitar dívida

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DECISÃO: * TJ-MT – Se restou demonstrado que o devedor é agricultor e necessita dos bens alienados fiduciariamente para o desempenho das suas atividades, inclusive para angariar recursos capazes de quitar a dívida do financiamento, afigura-se ponderável que a posse direta dos bens apreendidos permaneça com o devedor, que fica com o encargo de fiel depositário. Essa é a postura defendida pela Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, que acolheu recurso interposto por um agricultor de Tapurah (433 km a médio-norte de Cuiabá) e determinou que os bens apreendidos – um trator e um pulverizador – permaneçam na posse direta dele, que passa a ficar como fiel depositário (Agravo de Instrumento nº 133657/2008).  

O agricultor agravante interpôs recurso contra decisão que deferira liminar de busca e apreensão dos dois bens em uma ação que lhe move o Banco de Lade Landen Financial Services Brasil S.A. agravado. Noticiou que não buscava discutir os contratos de financiamento, mas apenas a revogação parcial da liminar, para que os equipamentos fossem mantidos em sua posse como fiel depositário, para que a atividade agrícola pudesse ser mantida. Argumentou que os equipamentos são de extrema necessidade, uma vez que sem eles a manutenção da lavoura ficaria comprometida, dificultando a colheita. Destacou que os financiamentos para o plantio da safra de soja foram efetuados e que o pagamento sempre é efetivado após a colheita, esclarecendo que caso fosse impossibilitado de realizar a colheita dos mil hectares de lavoura, o inadimplemento seria fato consumado. 

Consta dos autos que o agravante ajuizou uma Ação Ordinária de Revisão de Cláusulas Contratuais, na qual buscava esclarecer que os recursos do contrato de financiamento de maquinário agrícola, com alienação fiduciária, são tipificados como crédito rural, bem como para adequar a taxa de juros, excluir a cláusula de comissão de reserva de crédito, revisar o percentual de multa e declarar a ilegalidade e nulidade de cláusulas. Já o banco ingressou com a Ação de Busca e Apreensão nº 149/2008 contra o agravante, que se encontrava inadimplente com suas obrigações.

De acordo com o relator do recurso, desembargador José Tadeu Cury, a ação de revisão de cláusulas contratuais foi protocolada antes da ação de busca e apreensão ajuizada pelo banco, afastando a alegada ocorrência da mora. “A jurisprudência desta Corte e de outros Tribunais pátrios, especialmente o STJ, firmou entendimento segundo o qual havendo discussão judicial acerca dos valores do contrato de financiamento, afasta-se a caracterização da mora, já que essa também está sendo revisada, impedindo, por conseqüência, a concessão da liminar de busca e apreensão”, explicou.

Conforme o magistrado, os maquinários apreendidos, objeto do contrato pactuado, se apresentam indispensáveis às atividades laborais do agravante, “além de ensejar real possibilidade de honrar com o contrato de financiamento”, acrescentou. Para o relator, havendo presunção da essencialidade do bem alienado fiduciariamente na continuação das atividades laborais do agricultor, admite-se, excepcionalmente, a manutenção da posse dos bens até o julgamento da ação principal.

A decisão foi unânime. Participaram do julgamento os desembargadores Jurandir Florêncio de Castilho (1º vogal) e Orlando de Almeida Perri (2º vogal).

FONTE:  TJ-MT, 06 de março de 2009

 


CONSTATAÇÃO DE CLUSÃO ANULA ACORDOS TRABALHISTASTRT anula acordos celebrados com objetivo de lesar terceiros

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DECISÃO:  * TRT-MG  –  A 2ª SDI (Seção Especializada em Dissídios Individuais) do TRT-MG julgou procedente ação rescisória proposta pelo Ministério Público do Trabalho e rescindiu (tornou sem efeito) decisões de 1º Grau que homologaram acordos celebrados em reclamações trabalhistas ajuizadas por dois filhos contra o pai, por constatar a colusão (combinação entre partes para enganar e prejudicar terceiros). 

No caso, o pai, terceiro réu, confessou a existência de fraude e concordou com a rescisão dos acordos, dizendo-se vítima dos demais réus, seus próprios filhos. Ele argumentou que passava por situação financeira difícil e foi procurado pelos filhos e sua advogada, que, sustentando a existência de direitos trabalhistas em seu favor, pediram, como pagamento, em torno de 36,6 a 48,0 hectares da fazenda. Ao informar que as terras já haviam sido penhoradas pelo BDMG (Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais), ouviu deles o argumento de que o ajuizamento de ações trabalhistas resolveria o problema e acabou cedendo à pressão. Por seu turno, os filhos insistem na regularidade dos acordos firmados, bem como na validade dos contratos de trabalho entre as partes. 

O relator da ação rescisória, juiz convocado Paulo Maurício Ribeiro Pires, destacou que, à época da homologação dos acordos, corriam inúmeras ações contra o fazendeiro, algumas delas já em fase de execução. Além disso, as reclamações ajuizadas por seus dois filhos, que alegavam terem trabalhado como administradores da Fazenda Santa Tereza, contêm peças processuais quase idênticas, assinadas pelo mesmo advogado, com pedidos coincidentes e valores praticamente iguais. O pai não apresentou defesa naqueles processos e celebrou acordo no valor de R$60.000,00, cada um. Mas estes acabaram alcançando a cifra de R$89.158,97, em cada execução, já que incidiu sobre eles multa de 50%, pelo não pagamento no prazo ajustado. 

Citado para pagar o débito, o executado nada fez, permitindo a penhora de 92,0 hectares da Fazenda Santa Tereza, avaliados em R$92.000,00, os quais acabaram nas mãos dos filhos, pois estes ajudicaram o terreno (ou seja, ficaram eles próprios com o bem levado a leilão judicial). O relator frisou que essa inércia do fazendeiro não ocorreu em outras ações, tendo ele o hábito de utilizar todos os recursos processuais previstos em lei. 

“Diante desses elementos de convicção, o posterior ajuizamento de ação anulatória da adjudicação pelo executado, ora terceiro réu, não desnatura a fraude engendrada, aliás, conforme se extrai dos termos da defesa do referido réu e do acervo probatório, tal fato apenas demonstra que, a princípio juntos nos propósitos de fraudar a lei e lesar terceiros, os litigantes entraram posteriormente em conflito” – esclareceu o relator do recurso. 

Concluindo pela existência de fraude, lesiva aos direitos dos credores e, em especial, da Fazenda Pública, a 2ª SDI rescindiu os acordos firmados nas duas ações, com base no artigo 485, III, do CPC e na Orientação Jurisprudencial nº 94, da SBD-2, do TST, e extinguiu ambos os processos, sem resolução do mérito. Os réus foram condenados ao pagamento das custas processuais, no montante de R$5.420,33, calculadas sobre R$271.016,61, valor atribuído à causa.  (AR nº 00499-2008-000-03-00-4 ) 


 

FONTE:  TRT-MG, 06 de março de 2009

Inspeção de veículos. Desvio de finalidade

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* Kiyoshi Harada

Nos últimos anos a preocupação com a preservação do meio ambiente tomou conta dos povos do mundo inteiro.

Com a celebração do Protocolo de Kioto intensificou-se a noção de desenvolvimento empresarial sustentável, ou seja, a conciliação da atividade empresarial com a preservação ambiental passou a constituir em fonte permanente de planejamento de empreendimentos empresariais. Com base no art. 12 daquele Protocolo criou-se o crédito de carbono ou Redução Certificada de Emissões (RCE). Essas RCEs permitem o financiamento de atividades constantes do projeto certificado. Daí a grande procura deles no mercado internacional.

Dentro desse panorama surgiu o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores – PROCANVE.

Os veículos, principalmente aqueles movidos a diesel são os que mais provocam poluição. A Prefeitura de São Paulo deu início à inspeção de veículos a diesel no ano passado, conforme estabelecido na Portaria 79/08 da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente – SVMA.

Os padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente são estabelecidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA – na forma do inciso VII, do art. 8º da Lei nº 6.938/81.

Neste ano, a Prefeitura de São Paulo iniciou a inspeção de veículos movidos à gasolina por intermédio da Concessionária CONTROLAR, que compilou os valores de ruído e de capacidade em aceleração livre estabelecidos pelas Resoluções do CONAMA.

Portanto, a inspeção em curso tem amparo na legislação federal competente, podendo o Município implementar o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores – PROCONVE nos limites do art. 12 da Lei nº 8.723/93, que autoriza os governos municipais a estabelecerem “planos específicos, normas e medidas de controle de poluição do ar por veículos automotores em circulação, em consonância com as exigências do PROCONVE e suas medidas complementares”.

O que não pode é o Município estabelecer os limites de ruídos e de emissão de fumaças diferentes dos previstos nas Resoluções do CONAMA.

Embora respaldada na legislação competente, a forma de execução da inspeção veicular encetada pela CONTROLAR revela manifesto desvio de finalidade, o que acarreta a nulidade do ato normativo que prescreve a inspeção ambiental.

Ora, se a inspeção veicular visa reduzir o nível de poluição ambiental, forçando os proprietários a adequar seus veículos aos padrões de ruído e de emissão de fumaça estabelecidos pelo órgão competente, salta aos olhos que essa inspeção não deve começar pelos veículos novos, mas pelos veículos mais antigos. É simples questão de bom-senso.

É público e notório que veículos com mais de 10 anos poluem muito mais de que veículos fabricados nos últimos 5 anos. Aliás, a poluição causada pelos veículos com mais de 10 ou 15 anos nem precisa ser detectada por meio de inspeção técnica. Por onde passam eles deixam um rastro de fumaça visível a olho nu e à distância, sem contar os odores característicos de motores enferrujados em funcionamento, que os agentes do transito fingem não perceber.

Em matéria de combate à poluição não há que se distinguir ricos e pobres. O assistencialismo é matéria que foge da alçada da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente para inserir-se na Secretaria do Bem-Estar Social. O limite ao direito de poluir deve ser igual para todos.

A execução da inspeção veicular com inversão do critério lógico e racional permite concluir que essa inspeção veicular tem outra finalidade que não a despoluição da cidade, missão cabente nas atribuições regulares do Município. Ele tem, na verdade, finalidade arrecadatória na modalidade de empréstimo compulsório sui generis, sem respaldo constitucional ou legal.

O proprietário do veiculo paga a quantia de R$ 52,73 a titulo de “taxa de inspeção”, que só será restituído se o veiculo for aprovado na inspeção e mediante complicados procedimentos burocráticos estabelecidos pela Prefeitura. É o que chamamos de empréstimo compulsório condicionado, que não tem matriz constitucional.

Multiplique-se os R$ 52,73 por milhões de veículos a serem inspecionados e se terá a dimensão do valor desse empréstimo compulsório condicionado. A inspeção, pode-se dizer, funciona como forma de obtenção de receita pública por meio de uma Concessionária. Utiliza-se da competência que o Município detém para CONTROLAR o nível de poluição causado por veículos para obter resultado diverso. Isso, na teoria do direito administrativo, chama-se desvio de finalidade, a contaminar de morte o ato praticado.

E mais, a CONTROLAR vem fazendo as inspeções de maneira confusa e sem critérios. É uma luta para o cidadão conseguir agendar a data de inspeção: ora os telefones da Concessionária não estão funcionando; ora o site respectivo também está indisponível por “n” razões técnicas; ora um início de incêndio na Central de Agendamento prejudicou o serviço. Feito o agendamento uma nova surpresa: filas e mais filas acabam esgotando a paciência dos motoristas; houve casos em que veículos foram agendados no dia do rodízio causando atrasos em cascata. A incompetência da CONTROLAR é notória, bem como o seu absoluto descaso com os cidadãos-proprietários que devem pagar previamente o empréstimo compulsório condicionado para perder seu precioso tempo na fila de inspeções.

Enfim, não há eficiência e profissionalismo no pessoal encarregado da inspeção veicular.

Concluindo, essa inspeção veicular atabalhoada configura autêntico desvio de finalidade. O fim visado não é a despoluição ambiental como deveria ser, mas, a realização de receita publica na modalidade de empréstimo compulsório condicionado, sem respaldo constitucional ou legal. É a conclusão que se impõe.

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA 

KIYOSHI HARADA:  jurista, professor e especialista em Direito Financeiro e Tributário pela USP

 

As associações e o direito do consumidor

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* Welyton Dourado Gomes 

1. Conceito de Associações 

O presente artigo pretende avaliar as circunstâncias em que uma associação civil pode ou não ser parte legítima para representar os consumidores tanto no âmbito administrativo como também perante o Poder Judiciário. 

Ressalte-se, por oportuno, que a análise jurídica em comento dará ênfase à atuação das associações civis na proteção jurídica dos consumidores face ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Todavia, o presente trabalho não tem o condão de exaurir por completo as questões jurídicas que a matéria comporta, mas tão-somente fixar diretrizes para facilitar sua compreensão. 

Assim, faz-se necessário tecer algumas considerações gerais a respeito do que são, na conceituação legislativa, as associações. Por isso mesmo, não é demais lembrar que o Código Civil Brasileiro, em seu art.44, considera pessoas jurídicas de direito privado as associações, as sociedades, as fundações, as organizações religiosas e os partidos políticos. 

Noutro instante, o mesmo Codex dispõe em seu art.53 que se constituem as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos. 

Portanto, consoante previsto na legislação, as associações não têm fins lucrativos, muito embora possuam patrimônio constituído pela contribuição de seus membros, para a consecução de objetivos culturais, educacionais, esportivos, religiosos, recreativos, morais, etc. 

Caio Mário da Silva Pereira, citado por José dos Santos Carvalho Filho [01], ensina que: 

"(…) em pura doutrina, há distinção entre sociedades e associações. As sociedades seriam as pessoas jurídicas compostas de número mais reduzido de pessoas e alvejariam fim econômico. As associações, ao contrário, se constituiriam de maior número de pessoas e teriam em mira fins de caráter não econômico ou ideais, como os fins morais, literários, pios e artísticos, dentre outros da mesma natureza." 

Da mesma forma, Maria Helena Diniz [02] leciona que associação "é uma pessoa jurídica de direito privado voltada à realização de finalidades culturais, sociais, pias, religiosas, recreativas etc., cuja existência legal surge com a inscrição do estatuto social, que a disciplina, no registro competente. (…)". 

No âmbito das relações de consumo, segundo José Geraldo Brito Filomeno [03], "uma associação de proteção ao consumidor é uma entidade de direito privado, sem objetivo de lucro, devidamente inscrita no Cartório de Registro Especial da Comarca onde tem sua sede. Ela é administrada por uma diretoria, por um conselho administrativo ou deliberativo e um conselho fiscal, na forma determinada pelo estatuto social". 

Enfim, após sucinta glosa demonstrando o entendimento doutrinário e as disposições do Código Civil a respeito da matéria, não restam dúvidas acerca do conceito de associação.

2. As Associações e a Constituição Federal de 1988 

De acordo com o que preconiza a Constituição Federal, todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. 

No mesmo capítulo destinado aos direitos e deveres individuais e coletivos, a Carta Magna prevê que as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente. 

Impende ressaltar que a liberdade de associação é plena, desde que para fins lícitos, sendo vedada constitucionalmente a associação de caráter paramilitar. Dessa forma, ninguém poderá ser compelido a associar-se ou mesmo a permanecer associado. 

Por outro lado, a criação de associações, na forma da lei, independe de autorização, sendo vedada à interferência estatal em seu funcionamento. 

A existência de uma associação como pessoa jurídica, como, por exemplo, a ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor, com sede em Recife, Estado de Pernambuco, depende somente do ato voluntário de seus membros e não do reconhecimento do Estado, desde que, obviamente, sejam observados os requisitos legais para a sua criação. 

Na verdade, a interferência arbitrária do Poder Público no exercício desse direito individual pode acarretar responsabilidade tríplice: a) uma de natureza penal, constituindo, eventualmente, crime de abuso de autoridade, tipificado na Lei nº 4.898/65; b) outra de natureza político-administrativa, caracterizando-se, em tese, crime de responsabilidade, definido na Lei nº 1.079/50; e c) uma terceira de natureza civil, possibilitando aos prejudicados indenizações por danos materiais e morais [04]. 

As entidades associativas devidamente constituídas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente, possuindo legitimidade ad causam para, em substituição processual, defender em juízo interesses e direitos de seus associados, nos exatos termos do art.5º, inc. XXI, da Constituição Federal, sendo desnecessária a expressa e específica autorização de cada um de seus integrantes, conforme estabelece o art.82, inc. IV, do Código de Defesa do Consumidor, desde que a abrangência dos direitos defendidos seja suficiente para assumir a condição de interesses difusos, coletivos e os individuais homogêneos. 

Dá-se a figura da substituição processual quando alguém está legitimado para agir em juízo, em nome próprio, como autor ou réu, na defesa de direito alheio, consoante autoriza o art.6º do Código de Processo Civil. Quem litiga, como autor ou réu, é o substituto processual, o qual se pronuncia no processo judicial ou extrajudicial em nome próprio, na defesa de direito de outrem, que é o substituído. 

Segundo Kazuo Watanabe [05], "a Constituinte procurou estimular a criação de associações (incs. XVII, XVIII, XIX, XX e XXI, do art. 5º, CF), e no Capítulo da Ordem Econômica e Financeira estabeleceu a defesa do consumidor como um dos princípios em que se assenta a atividade econômica do País (art. 170, V, CF) e declarou, expressamente, que "a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo" (art. 174, § 2º, CF)". 

Por fim, a Constituição Federal, além de incentivar a criação de associações organizadas para a defesa dos interesses coletivos, veda ao Estado a possibilidade de interferir na criação, gestão ou funcionamento das associações ou entidades civis. 

3. As Associações e o Direito do Consumidor 

Inicialmente é importante deixar claro que tipo de relação jurídica pode ou não ser considerada uma relação de consumo. A relação de consumo é toda aquela relação entretida entre um consumidor, que adquire um produto ou serviço como destinatário final, e um fornecedor de produtos ou serviços, este que desenvolve a atividade comercial com habitualidade e profissionalismo com o fito de adquirir lucros, ambos transacionando produtos e serviços. 

Noutra conceituação, a relação de consumo advém de um fato jurídico em que estão presentes de um lado consumidores, como destinatários finais, entidades a ele equiparadas, a universalidade de pessoas que tenham intervindo na relação de consumo, aquele que estiver exposto às práticas empresariais, ou mesmo em decorrência de um acidente de consumo e de outro os fornecedores, que fornecem com habitualidade e profissionalismo bens e/ou serviços aos primeiros. 

Leonardo Roscoe Bessa [06] afirma que "o direito do consumidor deve ser compreendido como um conjunto de normas e princípios jurídicos que disciplinam as relações entre consumidores e fornecedores". 

Para o eminente e festejado jurista Luiz Antonio Rizzatto Nunes [07], "haverá relação jurídica de consumo sempre que se puder identificar num dos pólos da relação o consumidor, no outro, o fornecedor, ambos transacionando produtos e serviços". 

Logo, "o que qualifica a pessoa como consumidora não é o objeto da relação obrigacional, o dar, o fazer ou o não fazer, mas a destinação final que ela dá ao produto ou serviço. De plano, o comerciante não pode ser considerado consumidor, já que ele adquire o produto para a sua revenda, sendo, portanto, um intermediário, e não um destinatário final, destinatário este que vai ser justamente a pessoa a quem ele vai revender o bem". [08] 

Na verdade, é substancial mesmo que se forme uma nova mentalidade social para que tenhamos uma sociedade menos egoísta e individualista e mais solidária e participativa. Pois, só assim haverá aplicabilidade efetiva dos princípios e normas cogentes de ordem pública e interesse social previstas no Código de Defesa do Consumidor e sua adequação à nova realidade socioeconômica que estamos vivenciando. 

Para que isso efetivamente ocorra, porém, é necessário que a própria sociedade, principalmente por meio dos atores das relações de consumo, que são os consumidores e fornecedores, de um lado, e o Estado, direta e indiretamente, por meio de seus órgãos e entidades autárquicas e paraestatais, de outro, compreendam, aceitem e efetivamente ponham em prática os objetivos estabelecidos no Código. Controle de qualidade e de segurança dos produtos e serviços pelos próprios fornecedores, maior educação e informação dos fornecedores e consumidores quanto aos seus direitos e deveres, coibição e repressão mais eficazes, em nível administrativo e criminal, de todas as formas de abuso, fortalecimento dos consumidores pela criação e desenvolvimento de associações representativas, organização dos mecanismos alternativos, oficiais e privados, de solução de conflitos de consumo (art.4º e incisos) são algumas das providências objetivadas pelo legislador para que haja maior harmonia entre os atores que participam das relações de consumo. [09] 

De outra parte, é cediço que a só criação pelo legislador de mecanismos processuais eficazes, embora seja essencial para a evolução da sociedade, não é suficiente para consolidar uma política nacional de relações de consumo que realmente minimize as desigualdades existentes entre os pólos desta relação. 

É preciso mesmo que "tenhamos uma sociedade civil mais bem estruturada, mais consciente e mais participativa, enfim, uma sociedade em que os mecanismos informais e não oficiais de solução dos conflitos de interesses sejam mais atuantes e eficazes do que os meios formais e oficiais". [10] 

Partindo dessa premissa é que percebemos o quanto à atuação de uma associação séria e verdadeiramente comprometida com o bem comum pode contribuir para a consolidação da política nacional das relações de consumo em benefício de toda a sociedade brasileira. 

O trabalho desenvolvido pelas associações em geral, em especial a ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor, como também o IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor, representa o agir, a atuação concreta e contínua de uma sociedade civil mais organizada, estruturada, consciente e participativa. 

Além dos órgãos oficiais, são também instrumentos altamente importantes as associações civis de defesa do consumidor. 

Por reconhecer esse fato é que o legislador incluiu tais associações no Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, bem como determinou que a elas fossem concedidos estímulos, tanto para que fossem criadas como para que fossem mantidas e pudessem desenvolver seu trabalho, consoante dispõem os arts.5°, inc. V, c/c 105 do CDC e arts.3°, inc. IX, e 8°, do Decreto Federal n° 2.181, de 20 de março de 1997. 

Portanto, uma associação de proteção ao consumidor é uma entidade civil de direito privado, sem fins lucrativos, devidamente constituída nos termos da legislação em vigor, que tem dentre os seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos dos consumidores previstos no Código de Defesa do Consumidor e na legislação correlata. 

Segundo José Geraldo Brito Filomeno [11], "uma associação de proteção ao consumidor tem como objetivos defender os direitos e os legítimos interesses de seus associados e dos consumidores em geral, assim como colaborar com as autoridades públicas no combate ao abuso do poder econômico e na repressão aos crimes e contravenções contra a economia popular e outros previstos em legislação especial". 

As entidades civis de defesa do consumidor integram, por lei, o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor desde a edição do Código de Defesa do Consumidor, por força do caput do art.105, a seguir transliterado: "Art. 105. Integram o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC), os órgãos federais, estaduais, do Distrito Federal e municipais e as entidades privadas de defesa do consumidor." 

Ademais, com a edição do Decreto Federal n° 2.181, de 20 de março de 1997, as associações de proteção ao consumidor passaram a ter definida sua forma de atuação no Sistema Nacional de Defesa do Consumidor. Além da participação nos colegiados e da parceria com órgãos públicos em projetos e atividades, dentre inúmeras outras atuações, tais entidades poderão: a) encaminhar denúncias aos órgãos públicos de proteção e defesa do consumidor, para as providências legais cabíveis; b) representar o consumidor em juízo, observado o disposto no inciso IV do art. 82 da Lei n. 8.078, de 1990; e, c) exercer outras atividades correlatas. (art.8º, incisos I, II e III) 

Não é demais lembrar que a Lei n° 9.790, de 23 de março de 1999, deu novo tratamento à matéria, regulamentando a qualificação de pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público. 

No capítulo atinente a defesa do consumidor em juízo, o Código de Defesa do Consumidor estabeleceu o rol de entes legitimados concorrentemente para agir em juízo na defesa coletiva dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas em potencial, são eles: a) o Ministério Público; b) a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; c) as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código; e, d) as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos por este Código, dispensada a autorização assemblear. (art.82, incisos I, II, III e IV) 

Contudo, os consumidores não poderão confiar apenas no paternalismo do Estado. É necessário que a própria sociedade civil se estruture melhor e participe ativamente da defesa dos interesses de seus membros, fazendo com que a nova mentalidade que disso resulte, pela formação de uma sociedade mais solidária (art. 3°, I, CF), seja a grande protetora de todos os consumidores. [12] 

A legitimação concorrente significa dizer que qualquer um dos legitimados "ex lege" pode propor ações judiciais de cunho coletivo, agir processualmente, independentemente da atividade simultânea de outro legitimado. 

Por conseguinte, a atuação em Juízo de qualquer dos legitimados indicados no art.82 do Código de Defesa do Consumidor pode conduzir a resultados benéficos para o consumidor, mas nunca maléficos, pois, é salutar que se diga que a propositura da ação civil pública não prejudica o direito de ação do consumidor de propor a respectiva ação judicial individual. 

Conforme preconiza o Código de Defesa do Consumidor, as associações legalmente constituídas há pelo menos um ano e que incluam entre seus fins institucionais a defesa dos interesses e direitos protegidos pelo CDC, têm legitimidade para a ação a título coletivo. 

Segundo o eminente jurista Luiz Antonio Rizzatto Nunes [13], "a lei autoriza as associações a ingressarem com ações coletivas de proteção aos direitos difusos, coletivos, e individuais homogêneos. Para tanto, há duas exigências: que tenham entre seus fins institucionais a defesa dos direitos do consumidor e que tenham sido constituídas há mais de um ano (inciso IV do art. 82)". 

Impende ressaltar, ainda, que as associações legitimadas nos termos legais previstos no Código de Defesa do Consumidor poderão agir independentemente de autorização assemblear. 

Segundo Arruda Alvim [14], "isto significa que há uma representatividade plena, a elas deferida, que é nascida da própria lei quando lhes confere legitimidade processual". 

A Lei n. 8.078/90, inteligentemente, dispôs, ao final da redação da norma do inciso IV do art. 82, "dispensada a autorização assemblear", isto é, para o ingresso da ação, não precisa a associação provar que foi feita assembléia prévia dos associados dando autorização. 

O legislador consumerista percebeu desde logo a dificuldade de atuação de uma associação que pretendesse proteger o consumidor: são sempre dezenas, centenas de problemas a serem enfrentados judicialmente e, ainda que se pudesse interpretar que o estatuto já contivesse expressamente a autorização – o que poderia ser feito –, surgiria dúvida e, pelo menos, discussão a respeito da legitimidade ativa da associação se não fosse apresentada a prévia e específica autorização para o ingresso da ação. [15] 

De outra parte, apesar do Código de Defesa do Consumidor expressamente estabelecer que as associações para terem legitimidade necessariamente devem ter entre seus fins institucionais a defesa do consumidor, nada impede que estas mesmas associações incluam entre seus fins institucionais outros objetivos, sem que isso venha a desqualificá-las para os fins desta legitimação. 

A esse respeito, exemplo melhor não há do que o da ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor, que é uma entidade civil sem fins lucrativos, de âmbito nacional, a qual tem a seguinte missão, conforme previsto no art.1º, parágrafo único, do respectivo Estatuto Social: 

Art. 1º – A ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor é uma instituição civil sem fins lucrativos, de âmbito nacional, com foro na Comarca do Recife, Estado de Pernambuco, e sede na Rua do Riachuelo, 105, salas 219 e 221, Edifício Círculo Católico, Boa Vista. 

Parágrafo primeiro – A missão da ADECON é a defesa judicial e extrajudicial do cidadão e do consumidor, como tal definido nos artigos 2°, 17 e 29, da Lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), a defesa dos direitos e interesses relativos ao meio ambiente, ao portador de deficiência física, à economia popular, à ordem econômica, à concorrência, à livre iniciativa, à saúde, ao ensino, a tributação e taxação justas, legais e constitucionais; direitos e interesses relativos aos direitos humanos, patrimônio público, histórico e paisagístico, cidadania e quaisquer outros direitos e ou Interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos (Lei 7.347, de 24.7.85 – arts.1° e 5°), podendo atuar em todo o território nacional, na forma prevista no parágrafo único do art.81, c.c. o inciso IV do art.82 do mesmo Código do Consumidor, postulando também na forma do art.5°, inciso LXX, alínea "b" da Constituição Federal e firmar convenção coletiva de consumo, que tenha por objeto estabelecer condições e características de produtos e serviços e, ainda, quando se tratar de composição de conflito de consumo. 

A ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor, por exemplo, consoante estabelecido em seu Estatuto Social, tem como objetivos os seguintes: 

a) Nos termos do art. 102 do Código de Defesa do Consumidor, poderá a associação ingressar em Juízo, objetivando compelir o Poder Público competente a proibir a produção, divulgação, distribuição ou venda, ou determinar alteração na composição, estrutura, fórmula ou acondicionamento de produto, cujo uso ou consumo se revele nocivo ou perigoso à saúde pública e à incolumidade pessoal dos consumidores e, ainda, a implementar a Política Nacional de Relações de Consumo (arts.4° e 5° CDC); 

b) Nos termos do art.83 do Código de Defesa do Consumidor poderá a Associação ingressar em Juízo com todas e quaisquer espécies de ações, capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela dos direitos e interesses elencados na cláusula primeira, devendo ainda peticionar na condição de litisconsorte ou assistente em ações propostas pelos outros legitimados de que trata o art.82 do CDC e art.5° da Lei 7.347/85, sempre que, a seu critério, afigure-se necessária tal providência, no sentido de resguardar os direitos e interesses de desvios de finalidade ou de condução procedimental inadequada, especialmente em se tratando de direitos coletivos, difusos ou individuais homogêneos. 

c)Incentivar o consumo consciente;

d)Informar ao cidadão e aos consumidores acerca dos seus direitos;

e)Estimular práticas de consumo leais por parte dos fornecedores;

f)Estimular a preservação do meio ambiente;

g)Estimular consumidores e fornecedores ao efetivo e leal cumprimento das obrigações e dos deveres encartados no CDC e demais legislação pertinente;

h)Contribuir para que seja atingido o equilíbrio ético nas relações de consumo, por meio de maior conscientização e participação do consumidor e do maior acesso à justiça;

i)Contribuir para a implementação e aprimoramento da legislação de defesa do consumidor e de matérias correlatas;

j)Contribuir para a repressão ao abuso do poder econômico nas relações de consumo e nas demais relações jurídicas correlatas;

k)Contribuir para a melhoria da qualidade de vida, especialmente no que diz respeito à melhoria de qualidade dos produtos e serviços oferecidos.

Destarte, a previsão legal de que as associações podem atuar independentemente de autorização assemblear, não foi incluída por acaso no inciso IV do art. 82 do CDC.

O motivo de ser dessa disposição legal, isto é, sua importância prática, está na confusão causada pelas empresas fornecedoras de produtos e serviços, que insistem em suscitar em Juízo preliminar de ilegitimidade ativa das associações em virtude da ausência de autorização assemblear, quando não resta dúvida da interpretação do disposto na norma contida no inc. XXI do art. 5º da Constituição Federal, a qual determina que: "as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente". 

Na verdade, a autorização para atuar na defesa dos interesses ou direitos dos consumidores está presente na própria razão de ser das associações, quando prevista nos respectivos atos constitutivos. Assim, desde a sua constituição, estão elas permanentemente autorizadas a atuar em Juízo. 

A legitimação para agir das associações, como já ressaltado, tem elevada importância na melhor organização das relações de consumo, pois constituem elas um instrumento de participação da sociedade civil no aperfeiçoamento da Política Nacional das Relações de Consumo (art. 4º, II, b), e uma forma eficiente de evitar que continue o paternalismo estatal exagerado na proteção do consumidor. [16] 

A regra geral de legitimação das associações é a de que, no ato de propositura da ação coletiva ou ação civil pública, as mesmas devem estar legalmente constituídas há pelo menos um ano. 

Esse requisito é formal e tem como função impedir que associações de "última hora" atuem, isto é, que tenham sido formadas apenas na intenção de propor específica medida judicial. É verdade que, apesar disso, ainda é possível que associações surjam com interesses não muito claros, tornando-se, por vezes, apenas formas de atração de clientela, incautos consumidores que necessitam de atenção e de proteção. 

Claro que esse um ano se conta do dia do ajuizamento da demanda para trás. [17] 

Todavia, o Código de Defesa do Consumidor prevê uma exceção à regra geral, qual seja, o requisito da pré-constituição pode ser dispensado pelo juiz, nas ações coletivas para a defesa de interesses individuais homogêneos (art.91 e seguintes), quando haja manifesto interesse social evidenciado pela dimensão ou característica do dano, ou ainda pela relevância do bem jurídico a ser protegido. 

No entanto, apesar do parágrafo único do art.82 do CDC prescindir do requisito da anualidade de sua pré-constituição, ainda persiste o requisito da sua constituição regular no ato de propositura da respectiva ação judicial, motivo pelo qual não impede que a referente associação preencha o requisito da anualidade durante o trâmite legal da ação judicial. 

Essa liberação legal tem um alvo certo: é a permissão para que associações de vítimas de graves acidentes, que tenham sido recentemente constituídas, possam estar em juízo. [18] 

A exceção se justifica porque, sem sombra de dúvida, surgirão casos em que será imprescindível constituir associações que busquem lutar por interesses específicos, como, por exemplo, as associações de vítimas e familiares de vítimas de acidentes de consumo. 

Nesta hipótese, o requisito formal acabaria tornando-se um obstáculo para o exercício legítimo dos direitos e interesses dos consumidores. Por esta razão, andou bem o legislador ao prever legalmente uma exceção à regra geral. 

Além do Código de Defesa do Consumidor, a Lei nº 7.347, de 24 de julho de 1985, que disciplina a Ação Civil Pública de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, por infração à ordem econômica e da economia popular e à ordem urbanística, também legitima as associações a atuar em Juízo a título coletivo, conforme dispõe o art.5º, inc. V, alíneas a e b. 

Portanto, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei nº 7.347/85 interagem na disciplina das ações judiciais de cunho coletivo, conforme previsto nos arts.90 e 110 a 117 do CDC. As inovações trazidas pela referida lei especial estão incorporadas ao sistema de defesa do consumidor, ai incluída a lei processual supra mencionada. Do mesmo modo, todos os avanços do CDC são também aplicáveis ao sistema legal da Lei nº 7.347/85. 

Na jurisprudência pátria não há discrepância quanto à legitimidade ativa das associações de proteção ao consumidor proporem ações coletivas, mas a título meramente exemplificativo veja-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, a seguir transcrito: 

RECURSO ESPECIAL Nº 705.469 – MS (2004/0167202-1)

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE: RODOBENS ADMINISTRAÇÃO E PROMOÇÕES LTDA E OUTRO

ADVOGADO: JOSÉ LUÍS MATTOS CUNHA

RECORRIDO: ADECON – ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DEFESA DO CONSUMIDOR DO MATO GROSSO DO SUL

ADVOGADO: ALINDOR PEREIRA DA SILVA

EMENTA: PROCESSO CIVIL. CDC. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TEMPO MÍNIMO DE CONSTITUIÇÃO DA ASSOCIAÇÃO. LEGITIMIDADE ATIVA.

– Nos termos da legislação consumerista, a associação legalmente constituída há pelo menos um ano tem legitimidade para promover a defesa coletiva dos interesses do consumidor.

– Em observância aos princípios da economia processual e efetividade da jurisdição, deve ser reconhecida a legitimidade ativa da associação que complete um ano de constituição durante o curso do processo.

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Castro Filho e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros.

Brasília (DF), 16 de junho de 2005 (data do julgamento).

MINISTRA NANCY ANDRIGHI

Relatora

RECURSO ESPECIAL Nº 645.226 – RS (2004/0038523-2)

RELATOR: MINISTRO FERNANDO GONÇALVES 

RECORRENTE: UNICONS – UNIÃO NACIONAL EM DEFESA DE CONSUMIDORES CONSORCIADOS E USUÁRIOS DO SISTEMA FINANCEIRO

 ADVOGADO: JORGE ALBERTO HARM KRIEGER E OUTRO

 RECORRENTE: CIDADANIA ASSOCIAÇÃO DE DEFESA DOS DIREITOS DO CIDADÃO

 ADVOGADO: ROBERTO OZELAME OCHOA

 RECORRENTE: ASSOCIAÇÃO DOS ACIONISTAS MINORITÁRIOS DE EMPRESAS ESTATAIS – AMEST

 ADVOGADO: LUIZ VICENTE DE VARGAS PINTO

 RECORRIDO: BRASIL TELECOM S/A

 ADVOGADO: MARCUS VINÍCIUS VITA FERREIRA E OUTROS

 EMENTA: PROCESSO CIVIL. AÇÃO COLETIVA. LEGITIMIDADE AD CAUSAM. CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO FINANCEIRA. INCIDÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.

1 – A associação que tenha entre suas finalidades institucionais a defesa do consumidor está legitimada a propor ações coletivas que visem à tutela judicial de seus propósitos.

2 – Em se tratando de contrato de participação financeira para obtenção de serviços de telefonia, com cláusula de investimento em ações, não há como afastar a incidência do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes.

3 – Recursos especiais conhecidos (letra "c") e providos.

ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Vencido o Ministro Aldir Passarinho Junior.

Os Ministros Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro Relator. Impedido o Ministro Jorge Scartezzini.

Brasília, 13 de dezembro de 2005 (data de julgamento).

MINISTRO FERNANDO GONÇALVES, Relator 

Enfim, as associações ou entidades civis, sem fins lucrativos, de proteção ao consumidor são um dos meios adequados, concretos e eficazes de participação da sociedade civil no aprimoramento da Política Nacional das Relações de Consumo, as quais atuam em benefício da sociedade com o objetivo de defender os interesses e direitos dos consumidores tutelados pelo Código de Defesa do Consumidor. 

REFERÊNCIAS 

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação Civil Pública Comentários por Artigo Lei 7.347, de 24.07.85. 2ª ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 1999.

FIUZA, Ricardo. [et al.]. Novo Código Civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002.

FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 6ª ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003.

NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004.

MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002.

GRINOVER, Ada Pellegrini. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004.

BESSA, Leonardo Roscoe. O Consumidor e seus Direitos ao Alcance de Todos. Brasília: Brasília Jurídica, 2002.

A. KHOURI, Paulo Roque. Contratos e Responsabilidade Civil no CDC. Brasília: Brasília Jurídica, 2002.

ALVIM, Arruda. [et al.]. Código do Consumidor Comentado. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.

NEGRÃO, Theotonio. GOUVÊA, José Roberto Ferreira.Código de Processo Civil e legislação processual em vigor. 39ª ed., São Paulo: Saraiva, 2007.

ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor. 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 2003.

ANDRIGUI, Ministra Nancy. Recurso Especial nº 705.469 – MS. Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça.

GONÇALVES, Ministro Fernando. Recurso Especial nº 645.226 – RS. Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça.

_____________________________

NOTAS

1. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Ação Civil Pública Comentários por Artigo Lei 7.347, de 24.07.85. 2ª ed., Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 1999, p.120.

2. DINIZ, Maria Helena. Coordenação FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil comentado. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 67.

3. FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 6ª ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003, p. 381.

4. MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Atlas, 2002, p. 261.

5. WATANABE, Kazuo. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 821.

6. BESSA, Leonardo Roscoe. O Consumidor e seus Direitos ao Alcance de Todos. Brasília: Brasília Jurídica, 2002, p. 23.

7. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 71.

8. A. KHOURI, Paulo Roque. Contratos e Responsabilidade Civil no CDC. Brasília: Brasília Jurídica, 2002, p. 42.

9. WATANABE, Kazuo. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 781.

10. WATANABE, Kazuo. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 781.

11. FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 6ª ed., São Paulo: Editora Atlas S.A., 2003, p. 381.

12. WATANABE, Kazuo. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 821.

13. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 704.

14. ALVIM, Arruda. [et al.]. Código do Consumidor Comentado. 2ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 387.

15. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, pp. 704/705.

16. WATANABE, Kazuo. [et al.]. Código Brasileiro de Defesa do Consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 8ª ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004, p. 822.

17. NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 705.

18. Idem, p. 706.

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA 

Welyton Dourado Gomes:   Advogado e Assessor Jurídico da ADECON – Associação de Defesa da Cidadania e do Consumidor.  Elaborado em 12.2008.


Estudo comparativo entre a assistência judiciária gratuita no Brasil e o apoio judiciário em Portugal

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* João Fernando Vieira da Silva 

RESUMO: O presente texto colima tecer singelas comparações entre os modelos de prestação do acesso à Justiça isento de custas, despesas processuais e honorários no Brasil e em Portugal, destacando vicissitudes e virtudes de cada ordenamento, bem como apontando a possibilidade de interações proeficientes entre as vantagens de cada modelo. 

ABSTRACT: The following text aim to gloss brief comparisons between the models of presentation of accessibility to Justice exempt from costs, procedural expenses and honorariums in Brazil and Portugal, detaching eventualities and virtues of each law ordinance, as well as pointing the possibility of proficient interactions between the advantages of each model. 

PALAVRAS CHAVE: Brasil- Portugal- Acesso- Justiça- Gratuidade 

Key-words: BrazilPortugal – Accessibility – Justice – Gratuity

 


 

1.Introdução 

O presente trabalho se propõe a realizar um estudo comparativo entre a Assistência Judiciária Gratuita no Brasil e o Apoio Judiciário em Portugal, apontando semelhanças e divergências entre os institutos de diferentes ordenamentos jurídicos. Com isto, será possível destacar contribuições que podem ser introduzidas em nosso ordenamento, bem como sublinhar eventuais vicissitudes. 

Colima este estudo comparativo atender balizas indicadas por Mauro Cappelletti quando disserta sobre trabalhos comparativos: 

" E, antes de tudo, um estudo comparativo deve saber identificar, com precisão, o ´tertium comparationis´, que, a meu juízo, não pode ser outro que um problema humano compartilhado por duas ou mais sociedades, ao qual tais sociedades oferecem soluções que são, ou podem ser, diversas enquanto diversas são as suas necessidades, as prioridades das mesmas e os instrumentos para satisfaze-las, a suas instituições e o ´pessoal´ que as faz operar, a sua cultura e tradições. Mas nos limites em que exista um problema humano comum, ultrapassando as fronteiras de um singular sistema racional, existirão também, inevitavelmente, conexões, e, muitas vezes, razões de convergência, que emergirão à luz de uma acurada investigação comparativa". [01] 

A gratuidade no acesso ao Judiciário constitui a primeira onda renovatória preconizada por Cappelletti. Abordar o acesso à Justiça sonegando um olhar mais acurado para o estudo da gratuidade no acesso significa recair em considerações demasiadamente panfletárias, despidas de concretude e desertas de efetividade. Daí o interesse pela abordagem em tela, um passo adiante no avanço das discussões sobre o pleno acesso à Justiça.

Reforçando a importância do tema, urge novamente trazer à colação ensinamento de Cappelletti: 

" Os primeiros esforços importantes para incrementar o acesso à justiça nos países ocidentais concentram-se, muito adequadamente, em proporcionar serviços jurídicos para os pobres. Na maior parte das modernas sociedades, o auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos, necessários para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais". [02] 

No Brasil, o tema da assistência judiciária gratuita tem guarida constitucional no art. 5º, LXXIV e no art. 134, quando há menção à Defensoria Pública. Na seara da legislação infraconstitucional brasileira, o assunto é tratado na Lei 1060/50 (Assistência Judiciária Gratuita), Lei Complementar nº 80/94 (Defensoria Pública da União), Lei Complementar nº 98/99 (organiza a Defensoria Pública da União e prescreve normas gerais para sua organização nos Estados) e na Lei 10371/01 (estabelece normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados para exame de DNA em ações de investigação de paternidade). 

É importante destacar que a questão da Assistência Judiciária no Brasil ganha contornos de complexidade quando consideramos o fato de que vivemos em uma Federação repleta de Estados, com legislações nem sempre coincidentes e nuances sócio-culturais que causam grandes discrepâncias. Só para se ter ligeira idéia, basta ter em mente o singelo fato de que a Defensoria Pública [03], embora constitucionalmente prevista, não foi implementada em todos os Estados brasileiros e, mesmo nos Estados nos quais já funciona, não consegue prestar serviços sempre eficientes aos mais carentes em razão de inúmeros problemas estruturais e de pessoal. [04]

Outro item a ser frisado refere-se à necessidade de diferenciação na literatura acadêmica brasileira dos termos "Assistência Judiciária" e " Justiça Gratuita", expressões mal compreendidas pelos aplicadores do Direito e causadoras de muito transtorno na práxis jurídica. Procurando esclarecer o tema, mister expor o seguinte ensinamento: 

"A assistência judiciária gratuita não se confunde com justiça gratuita. A primeira é fornecida pelo Estado, que possibilita ao necessitado o acesso a serviços profissionais do advogado e dos demais auxiliares da justiça, inclusive os peritos, seja mediante a defensoria pública ou a designação de um profissional liberal pelo juiz. Quanto à justiça gratuita, consiste na isenção de todas as despesas inerentes à demanda, e é instituto de direito processual". [05] 

Em Portugal, a matéria recebe menção no art. 20 da Constituição Portuguesa. Na legislação infraconstitucional, destaque-se a Portaria 1085/04, o Regulamento Interno nº 01/05, a Lei 34/04 e, em plano regional, a diretiva 08/02 da Comunidade Européia. No Estado português, embora o art. 6º da Constituição Portuguesa indique tratar-se de um Estado unitário, o Apoio Judiciário é prestado regionalmente. As dificuldades são menores comparadas à realidade brasileira, tendo em vista o simples fato de Portugal ser um Estado de população e dimensões geográficas bem inferiores ao "continental" Estado brasileiro. Ainda assim, conforme será mostrado com o decorrer do estudo, Portugal não está isento de problemas. 

2.Modalidades de Assistência Judiciária Gratuita e Apoio Judiciário

A Assistência Judiciária Gratuita envolve a isenção de pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios de contratação e de sucumbência. Em Portugal, o Apoio Judiciário também torna seu beneficiário isento do pagamento de taxa de justiça (algo que no Brasil corresponderia às custas processuais,) encargos do processo (no Brasil isto corresponderia às despesas processuais) e de honorários advocatícios de contratação e sucumbência. Conforme se vê, neste ponto há muita similitude entre Portugal e Brasil. 

3.Pedido de Assistência Judiciária Gratuita e de Apoio Judiciário 

No Brasil, o pedido é formulado, em regra, pelo advogado do candidato a beneficiário, em processo judicial. Não há um processo judicial em apartado para o pedido de assistência judiciária gratuita. O pedido geralmente é lançado no bojo da petição inicial de cada ação e o juiz, além de apreciar requisitos processuais e de mérito da peça, também analisa o pedido de gratuidade.

Seja qual for o rito adotado pela ação no Brasil, no prazo legal de resposta a parte contrária pode buscar a impugnação do pedido de assistência judiciária gratuita, mas, para tanto, tem o ônus da prova de demonstrar que o requerente não necessita de tal beneplácito legal.

Não obstante algumas infelizes decisões judiciais que não acompanham os avanços doutrinários e as mais sensatas interpretações sobre a matéria, em geral a gratuidade tem sido deferida no Brasil independente da renda e patrimônio do Requerente. A carência para fins de gratuidade não é sinônimo de miserabilidade. Basta o requerente comprovar que o pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios importaria grande sacrifício de seus rendimentos e dificuldades para seu sustento. [06]

Em Portugal, o pedido de apoio judiciário pode ser apresentado em qualquer serviço de atendimento ao público da segurança social. O requerimento de apoio pode ser feito em modelo que é facultado gratuitamente por qualquer serviço de atendimento ao público de segurança social. O pedido pode ser efetivado pessoalmente, por fax, por via postal e até por e-mail (neste caso há um formulário digital para preenchimento). O pedido pode ser realizado por pessoa coletiva (expressão que corresponde à pessoa jurídica do direito brasileiro). [07] Pode o pedido ser formulado pelo próprio interessado, pelo Ministério Público, por advogado e por advogado nomeado para tal fim pela Ordem dos Advogados ou pela Câmara dos Solicitadores.

Existem vozes na doutrina portuguesa que se postam contra o pedido ser levado ao serviço de atendimento ao público da segurança social, entendendo que a questão deveria ser apreciada por juízes. Há ainda a acusação de que o encaminhamento do pedido à segurança social tem gerado até maior morosidade. Neste sentido, o juiz português Joel Timóteo Ramos Pereira assim se pronunciou: 

"Pretendeu o governo aliviar os tribunais do processamento e julgamento desse incidente e acelerar o processo de decisão. Suscitam-nos contudo várias dúvidas sobre a celeridade e justeza deste novo regime pelas razões que passamos a apontar. Em primeiro lugar cumpre considerar que não era o incidente de apoio judiciário que atrofiava um processo judicial. Bem pelo contrário. Em regra, esses incidentes eram decididos pela generalidade dos Tribunais em cerca de três a quatro semanas, estando já o processo a decorrer seus trâmites normais, dado que a sua admissão liminar permitia proceder à citação ou notificação da parte contrária, correndo todos os incidentes sem o pagamento de qualquer taxa de justiça. (…) Agora o regime é diferente. Nos termos do art. 467, nº 3 do Código de Processo Civil o autor deve juntar à petição inicial o documento comprovativo do prévio pagamento da taxa de justiça inicial ou da concessão do benefício de apoio judiciário. Significa isso que não basta apresentar a prova de ter requerido o respectivo benefício junto da entidade de segurança social: carece que esse benefício tenha sido deferido, ainda que tacitamente- o que implica, em regra, que o cidadão aguarde cerca de 45 dias até que o requerimento seja tacitamente deferido e só depois pode instaurar a respectiva ação. (…) Concluímos, pois,, que no novo regime ao invés de acelerar o processo, obriga o cidadão que pretende litigar com o benefício do apoio judiciário, a esperar cerca de um mês e meio, quando no regime anterior o processo já se encontrava em andamento". [08]

No Brasil, a Assistência Judiciária Gratuita pode ser prestada por advogado dativo nomeado pelo Estado para tanto [09], pelo Defensor Público e pelas Procuradorias Estaduais e até pelo Ministério Público nos Estados nos quais a Defensoria Pública não foi implementada em tempo hábil. Há ainda a possibilidade da prestação deste serviço pelos Escritórios Escola de Faculdades de Direito, públicas e privadas, e por organizações não governamentais. Infelizmente, no Brasil não há como o beneficiário escolher o advogado quem irá lhe prestar serviços gratuitamente em juízo, cabendo aos órgãos e entidades acima destacadas tal escolha.

Em Portugal, o Apoio Judiciário é prestado, em geral, por advogado que pode ser escolhido pelo próprio beneficiário do pedido.

A escolha do advogado pelo beneficiário da gratuidade deveria ser a regra em Portugal, mas a intenção do legislador tem sido por vezes restrita por estranhos comportamentos da Ordem dos Advogados de Portugal. A Ordem dos Advogados, em descompasso com os ditames legais, tem, em algumas regiões, avocado para si a tarefa de escolher o advogado que prestará o Apoio Judiciário, medida nada producente, uma vez que quebra o elo de confiança e lealdade entre o advogado escolhido e o beneficiado, bem como pode suscitar favoritismos indevidos na escolha dos patronos por parte da Ordem.

Invocando novamente o juiz português Joel Timóteo Ramos Pereira aponte-se o seguinte: 

" Já no caso de pagamento de honorários a patrono escolhido, não existe qualquer nomeação da Ordem dos Advogados, nem a lei prevê qualquer notificação a ser efetuada pela mesma. Sabemos que a generalidade das Delegações da Ordem dos Advogados tem procedido de forma equivalente nas duas situações, a saber, nomeando o patrono escolhido, contudo parece-nos que esse não é o procedimento correcto". [10] 

No Brasil, usualmente, dispensa-se do candidato à Assistência Judiciária Gratuita maiores cuidados quanto à prova de que é merecedor deste benefício. Basta a declaração, em petição, de necessitar de tal amparo. Alguns juízes são um pouco mais rigorosos ao exigirem a juntada de procuração do advogado com poderes expressos para postular gratuidade ao seu cliente ou de declaração na qual o postulante expressamente afirme necessitar da gratuidade por ser pobre nos termos da lei. [11] 

Em Portugal, a concessão é mais criteriosa e há uma vasta listagem de documentos a serem apresentados para que ela seja efetivada. Goza, contudo, de presunção de insuficiência econômica: quem estiver recebendo alimentos por necessidade econômica; quem reunir as condições exigidas para a atribuição de quaisquer subsídios em razão de sua carência de rendimentos; quem tiver rendimentos mensais, provenientes do trabalho, iguais ou inferiores a uma vez e meia o salário mínimo nacional; filho menor, para efeitos de investigar ou impugnar sua maternidade ou paternidade e requerente de alimentos e os titulares de direito à indenização por acidentes de viação. 

Há estudiosos portugueses que criticam o excesso de rigor para aferição de deferimento do benefício. Entendem que a exigência de muitos documentos e a complexidade dos ritos fixados pelos serviços de segurança social tende até a desestimular pessoas pobres e leigas a buscarem o Judiciário, ao passo que muitos dos que não precisam da gratuidade, mais pacientes e "articulados" no lançamento do pedido, saberão driblar as exigências administrativo-legais e obterão benefício sem ter necessidade.

Uma virulenta exposição crítica do assunto extrai-se dos escritos de Manuel Carvalho da Silva: 

" O novo regime consagra o entendimento de que o direito à protecção jurídica é um direito que o Estado apenas está obrigado a assegurar aos cidadãos mais carenciados, com base em critérios de carência ou insuficiência de meios econômicos que são utilizados para efeitos de atribuição de prestações sociais no domínio dos sistemas de solidariedade, tomando como base os rendimentos de todo o agregado familiar. Entretanto, o acesso ao direito e aos tribunais, claramente consagrado no art. 20º da Constituição da República Portuguesa, não se situa no domínio da segurança social, mas trata sim de garantir um direito fundamental em matéria de defesa e exercício dos direitos dos cidadãos, assegurando a todos a igualdade de oportunidades no acesso ao direito e aos tribunais. (…) A acrescer a todas estas considerações, há de denunciar um complexo de junção de prova documental, só por si desmotivador do acesso a um direito que a nova lei desvirtuou, apostando, na generalidade dos casos, no pagamento a prestações das despesas judiciais, talvez para que as pessoas não reajam tanto à injustiça desta lei. Hoje para se obter apoio judiciário (gratuito) não é apenas necessário viver na miséria, é ainda obrigatório expô-la em toda sua extensão; a do requerente e a do agregado familiar no seu conjunto. Os ricos podem esconder a sua riqueza para não pagarem impostos, os pobres são obrigados a expor a pobreza para receberem uma esmola" [12]. 

4.Concessão da Assistência Judiciária no Brasil e do Apoio Judiciário em Portugal

No Brasil, a concessão depende basicamente de decisão judicial, a ser proferida pelo magistrado que analisa os autos nos quais existiu petição constando tal pedido. 

Em Portugal, a concessão compete ao dirigente máximo dos serviços de segurança social da área de residência do Requerente. 

Conclusão 

O sistema adotado na Assistência Judiciária Gratuita pátria poderia ser muito aprimorado se adotasse, com os devidos temperamentos que nossa cultura jurídica exige e sem algumas das vicissitudes alienígenas, algumas exigências e padrões típicos do Apoio Judiciário em Portugal. 

No Brasil, como vimos, em geral já na petição inicial o juiz é compelido a analisar o pedido de Assistência Judiciária Gratuita. Apreciar pedido desta natureza no bojo de questões de ordem processual, bem como análise de documentos acostados à inicial e até de eventual decisão sobre postulações liminares, faz com que o magistrado avalie com menos rigor e técnica a questão inerente ao pedido de gratuidade. Consectário lamentável disso é a possibilidade de decisões distorcidas, que deneguem tal pleito quando o correto era a concessão e, por outro giro, que também ocorra a hipótese de deferimentos do benefício sem o postulante merecer. A apreciação do pedido por instâncias extrajudiciais exclusivamente instituídas para tal fim, parecido com o que ocorre em Portugal, mas sem a morosidade que lamentavelmente lá se registra, seria a medida mais profícua a ser tomada, até porque fixaria critérios mais uniformes e precisos para a apresentação e concessão de tal pedido. Cabe, entretanto, ponderar que a instauração de tal mecânica no ordenamento brasileiro exige profundas reformas na lei processual pátria, mudanças que devem vir acompanhadas de instrumentos que diminuam o risco de que uma boa idéia trazida de outro ordenamento não logre êxito em razão de contextos burocráticos inaptos. É preciso lembrar que as pessoas que procuram a Assistência Judiciária Gratuita são, na sua maioria, paupérrimos e pouco instruídos. Tais cidadãos devem sempre ser bem orientados quanto aos documentos e procedimentos para obtenção de um benefício que não pode, de maneira alguma, ser sonegado a quem realmente dele carece. 

Também seria salutar pensar na possibilidade do beneficiado pela gratuidade no Brasil ter o poder de efetivamente escolher seu patrono. Tal possibilidade é clara no ordenamento português e, embora a experiência venha mostrando que em Portugal indevidas ingerências da Ordem dos Advogados deturpam os fins legais, ainda é possível lutar pela implementação da liberdade de escolha de advogado ao beneficiado pela gratuidade no Brasil. A relação entre um advogado e seu cliente deve ser permeada por confiança extrema. O serviço prestado por um estranho, não obstante a boa-fé e a observância de preceitos éticos pelo prestador, pode gerar terrível distanciamento entre o jurisdicionado e sua pretensão jurídica [13].

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPPELLETTTI, Mauro. Juízes irresponsáveis. Tradução Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1989.

_____ Acesso à justiça. Tradução e revisão Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988

COSTA, Eduardo Ferreira. Assistência judiciária à pessoa jurídica. Júris Síntese nº 28: São Paulo, março/abril de 2001

LIPPMAN, Ernesto. Assistência judiciária- obrigação do Estado na sua prestação- o acesso dos carentes à justiça visto pelos tribunais. RJ nº 228. Rio de Janeiro: Outubro de 1996

MOREIRA, José Carlos Barbosa. Por um processo socialmente efetivo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil nº 11: São Paulo, maio/junho de 2001

PEREIRA, Joel Timóteo Ramos. Apoio Judiciário: Será mesmo mais célere e justo?. Revista "O Advogado". nº 07: Lisboa, fevereiro de 2001

_____ Apoio Judiciário: pagamento de honorários a patrono escolhido- deve o patrono escolhido juntar procuração ao processo?. Revista "O Advogado". nº 34: Lisboa, julho de 2003.

SILVA, Manuel Carvalho. Custas judiciais e apoio judiciário- é preciso corrigir injustiças. Disponível no site www.cgtp.pt. Acesso em 22 de julho de 2005

ZANIOLO, Pedro Augusto. A assistência judiciária e a justiça gratuita no processo de conhecimento. Jus navigandi, Teresina, a.9, n.747, 21 jul. 2005. Disponível em : http:www1.jus.com.br/doutrina/text.asp id=7046. acesso em 22 de julho de 2005

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Notas

1. CAPPELLETTTI, Mauro. Juízes irresponsáveis. Tradução Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1989.p. 16

2. CAPPELLETTI, Mauro. Acesso à justiça. Tradução e revisão Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1988.pp. 31/32

3. Não é intenção deste artigo tecer críticas diretas à Defensoria Pública enquanto instituição ou aos defensores públicos. Muito pelo contrário… Louve-se os heróicos esforços dos defensores para mitigar as deficiências estruturais da Instituição. Comentando o assunto, Barbosa Moreira assim expõe: "São disposições que se articulam no sentido de assegurar ao litigante pobre, na medida do possível, que seus interesses sejam defendidos de modo condigno em juízo. Na prática, por motivos diversos, esse objetivo está longe de ser atingido em todos os casos. As Defensorias Públicas, notadamente, nem sempre conseguem imprimir a seu trabalho a eficiência desejável, apesar da competência e da dedicação de tantos defensores. Equipá-las bem é tópico que precisaria assumir posição de maior relevo nas escalas de prioridade da Administração Pública; mas o que se vê, no particular, é a freqüente incoerência entre a declarada preocupação social de muitos governos e o descaso na prática voltada ao assunto". In MOREIRA, José Carlos Barbosa. Por um processo socialmente efetivo. Revista Síntese de Direito Civil e Processual Civil nº 11: São Paulo, maio/junho de 2001.p.5

4. Corroborando isto, basta advertir que, à época do início dos estudos para confecção do presente artigo, apurou-se que no Rio de Janeiro a Defensoria Pública estava em greve há mais de um mês. Em Minas Gerais, um Estado com mais de 700 Municípios, a Defensoria não chega a contar com 400 defensores. Em São Paulo, sequer há a implementação de Defensoria Pública, sendo certo que os atendimentos que deveriam ser prestados pela Defensoria são realizados, de forma irregular, por Procuradores Estaduais e pelo Ministério Público.

5. LIPPMAN, Ernesto. Assistência judiciária- obrigação do Estado na sua prestação- o acesso dos carentes à justiça visto pelos tribunais. RJ nº 228. Rio de Janeiro: Outubro de 1996, p.35

6. No mesmo diapasão, assim escreve Pedro Augusto Zaniolo:" Não importa se o requerente possui patrimônio, rendimentos, se constituiu advogado particular ou está na absoluta miséria, para que seja beneficiário da justiça gratuita. Mister se faz que, no momento, não possua condições de arcar com as custas e os honorários, sem prejuízo próprio ou de sua família" in ZANIOLO, Pedro Augusto. A assistência judiciária e a justiça gratuita no processo de conhecimento. Jus navigandi, Teresina, a.9, n.747, 21 jul. 2005. Disponível em : http:www1.jus.com.br/doutrina/text.asp id=7046. acesso em 22 de julho de 2005

7. É importante assinalar que no Brasil há uma certa rejeição e desconfiança à concessão da Assistência Judiciária Gratuita às pessoas jurídicas, havendo na maioria da jurisprudência previsão apenas quanto ao deferimento de tal pedido no que concerne às entidades sem fins lucrativos. Cumpre destacar que, apesar de tal tendência, não há em qualquer lei uma proibição expressa à extensão de tal benefício à todas as pessoas jurídicas. Criticando decisões judiciais que denegam o benefício às pessoas jurídicas com fins lucrativos, Eduardo Ferreira Costa, com simplicidade, expõe: "Ora, o simples intuito de lucro visado pela pessoa jurídica em sua atividade não é argumento suficiente para obstar de antemão o benefício já que uma coisa é perseguir o lucro e outra, bem diferente, é consegui-lo efetivamente. (…) o que não se pode conceber é o prévio indeferimento do benefício sem que aja uma análise concreta da idoneidade econômica da pessoa jurídica requerente em cotejo com os encargos financeiros do processo, de modo a demonstrar realmente a impossibilidade de concessão da benesse legal" in COSTA, Eduardo Ferreira. Assistência judiciária à pessoa jurídica. Júris Síntese nº 28: São Paulo, março/abril de 2001. p.03

8. PEREIRA, Joel Timóteo Ramos. Apoio Judiciário: Será mesmo mais célere e justo?. Revista "O Advogado". nº 07: Lisboa, fevereiro de 2001

9. Sobre o tema, assim comenta Ernesto Lippmann: " Sendo a prestação da assistência judiciária um dever do Estado, cabe à Fazenda remunerar aqueles que tenham sido indicados como defensores dativos pelo juiz. Tal direito foi reconhecido pelo novo Estatuto da OAB em seu art. 22, após vários julgados que determinaram a responsabilidade do Estado".in LIPPMAN. op.cit.p. 37

10. PEREIRA, Joel Timóteo Ramos. Apoio Judiciário: pagamento de honorários a patrono escolhido- deve o patrono escolhido juntar procuração ao processo?. Revista "O Advogado". nº 34: Lisboa, julho de 2003.

11. Vale lembrar que a matéria não recebe tratamento uniforme no ordenamento jurídico pátrio. Em alguns Estados há orientação para que a Defensoria Pública só aceite como "clientes" pessoas com renda familiar de até 02 salários mínimos. Há registros também de Estados nos quais os juízes têm sido mais draconianos na análise de tal pedido, chegando ao ponto de exigir daquele que pretende a concessão de gratuidade a juntada de declaração de Imposto de Renda para aferir se é possível o deferimento.

12. SILVA, Manuel Carvalho. Custas judiciais e apoio judiciário- é preciso corrigir injustiças. Disponível no site www.cgtp.pt. Acesso em 22 de julho de 2005.p.01

13. Sobre esta tema há interesse manifestação de Barbosa Moreira: " Pode suceder que o necessitado conheça determinado profissional e o prefira a qualquer outro no patrocínio de sua causa. De modo nenhum se lhe impõe utilizar os serviços da Defensoria Pública: a circunstância de não dispor de recursos para pagar honorários não deve priva-lo de uma escolha pessoal, inspirada na confiança".in MOREIRA, José Carlos Barbosa.op.cit.p. 5

 


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

João Fernando Vieira da Silva:   advogado, professor de Teoria Geral do Processo, Processo Civil, Direito Civil e Prática Jurídica das Faculdades Doctum – Campus Leopoldina, especialista em Direito Civil pela UNIPAC – Ubá (MG), mestrando em Teoria Geral do Estado e Direito Constitucional pela PUC/RJ, pesquisador de grupo sobre Acesso à Justiça da PUC/RJ e do Viva Rio

Elaborado em 01.2009.

BANCO CONDENADO POR LIBERAÇÃO INDEVIDA DE CRÉDITOBanco é condenado a indenizar consumidor por liberar crédito sem autorização

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DECISÃO:  * TJ-DFT  –  O Banco Finasa S/A terá que pagar R$ 5 mil de indenização, por liberar empréstimo indevidamente em nome de um consumidor. O autor da ação teve o nome incluído no Serviço de Proteção ao Consumidor e o crédito negado no comércio. A decisão é do juiz da Primeira Vara Cível de Brasília.

A instituição financeira, sem a solicitação da vítima, realizou empréstimo no valor de R$ 37.724,01 a outra pessoa que se passou pelo consumidor. Alega o autor que sofreu constrangimento pela negativa de crédito em estabelecimento comercial e só teve conhecimento do erro da financeira quando soube que não poderia receber o cartão de crédito que havia solicitado ao Banco de Brasília.

O autor destacou na ação, a falta de cuidado do réu na confirmação dos documentos apresentados, durante a abertura da conta-corrente e liberação do empréstimo, além de concluir que não possui cadastro ou renda que lhe permitisse a contratação do valor concedido.

O Banco Finasa se defendeu ao argumentar que segue as normas estabelecidas pelo Banco Central para a abertura, manutenção e movimentação de contas. A Finasa disse ainda que a vítima não registrou nenhuma ocorrência aos cadastros restritivos consultados pela instituição financeira para impedir a realização de fraudes.

Na sentença, o juiz ressaltou que o Banco é empresa de grande porte e depende de contratações rápidas e simples para obter melhores resultados. Assim, assume o risco de eventuais danos causados a terceiros.

De acordo com a fundamentação do magistrado, é necessário que o requerido tome todas as precauções na abertura de créditos e consiga detectar o uso de informações fraudulentas para evitar danos indevidos aos consumidores. O juiz determinou ao réu o pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000 e a retirada do nome do autor do registro do SPC. Nº do processo: 151820-2

FONTE:  TJ-DFT,  27 de fevereiro de 2009.

 

 

 


 

SERVIÇOS ESSENCIAIS SÃO OBRIGAÇÃO DO ESTADOCopasa religa água de devedora idosa

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DECISÃO:  * TJ-MG  –  Os desembargadores da 3ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmaram a decisão de 1ª Instância, que deferiu uma liminar determinando o imediato religamento de água a um usuário inadimplente. Segundo os dados do processo, na residência onde a água foi cortada pela Copasa, localizada na comarca de Varginha, mora uma pessoa idosa e um menor que se submeteu a procedimento cirúrgico.

A Copasa recorreu contra a decisão, alegando que a tarifa de água é uma contraprestação ao serviço executado e afirmou que a inadimplência autoriza o corte de abastecimento, após notificado o devedor. Alegou ainda que o Ministério Público não poderia atuar no caso, que se trata de direito individual de um grupo reduzido de pessoas.

Para a relatora do processo, desembargadora Albergaria Costa, é fato que o Ministério Público não pode atuar na defesa dos direitos individuais. No entanto, nesse caso específico, a legitimação para defender o usuário inadimplente foi conferida pelo Estatuto do Idoso, que estabelece que compete ao Ministério Público “instaurar o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos direitos e interesses difusos ou coletivos, individuais indisponíveis e individuais homogêneos do idoso”. “E, conforme demonstram os autos, no imóvel que se pretende o abastecimento de água reside uma idosa, além de menor que se submeteu a procedimento cirúrgico”, lembrou a relatora.

Albergaria Costa destacou em seu voto que a água é um bem indispensável à população e que seu fornecimento constitui um serviço público essencial. A desembargadora ressaltou também a importância de analisar a suspensão do serviço quando o usuário deixa de pagar por ele. A magistrada lembrou que o texto da Lei nº 8.987/95 prevê expressamente a interrupção do serviço após prévio aviso, quando ocorre a falta de pagamento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

“No caso específico dos autos, em que os usuários encontram-se doentes – há idosa que sofreu derrame cerebral e menor recém-submetido a cirurgia – concordo com o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, decidiu. Em vários julgamentos, o STJ considerou que não é admissível a interrupção de serviços essenciais “como forma de exercício arbitrário das próprias razões”, sobretudo quando se trata de débito antigo. No caso em questão, o débito remonta a período superior a seis meses.

Votaram de acordo com a relatora os desembargadores Kildare Carvalho e Silas Vieira.   Processo nº: 1.0707.08.159028-3/002   TJ-MG,  27 de fevereiro de 2009.


FONTE: