Home Blog

CRIMES DE RACISMO: STF enquadra homofobia e transfobia como crimes de racismo ao reconhecer omissão legislativa

0

O Plenário concluiu nesta quinta-feira (13) o julgamento das ações que tratam da matéria e decidiu que, até que o Congresso Nacional edite lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas se enquadram na tipificação da Lei do Racismo.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu que houve omissão inconstitucional do Congresso Nacional por não editar lei que criminalize atos de homofobia e de transfobia. O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, de relatoria do ministro Celso de Mello, e do Mandado de Injunção (MI) 4733, relatado pelo ministro Edson Fachin, foi concluído na tarde desta quinta-feira (13).

Por maioria, a Corte reconheceu a mora do Congresso Nacional para incriminar atos atentatórios a direitos fundamentais dos integrantes da comunidade LGBT. Os ministros Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes votaram pelo enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989) até que o Congresso Nacional edite lei sobre a matéria. Nesse ponto, ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por entenderem que a conduta só pode ser punida mediante lei aprovada pelo Legislativo. O ministro Marco Aurélio não reconhecia a mora.

Ministra Cármen Lúcia

Primeira a votar na sessão de hoje, a ministra Cármen Lúcia acompanhou os relatores pela procedência dos pedidos. Ela avaliou que, após tantas mortes, ódio e incitação contra homossexuais, não há como desconhecer a inércia do legislador brasileiro e afirmou que tal omissão é inconstitucional. “A reiteração de atentados decorrentes da homotransfobia revela situação de verdadeira barbárie. Quer-se eliminar o que se parece diferente física, psíquica e sexualmente”, disse.

Para a ministra, a singularidade de cada ser humano não é pretexto para a desigualdade de dignidades e direitos, e a discriminação contra uma pessoa atinge igualmente toda a sociedade. “A tutela dos direitos fundamentais há de ser plena, para que a Constituição não se torne mera folha de papel”, finalizou.

Ricardo Lewandowski

Em seguida, o ministro Ricardo Lewandowski reconheceu a mora legislativa e a necessidade de dar ciência dela ao Congresso Nacional a fim de que seja produzida lei sobre o tema. No entanto, não enquadra a homofobia e a transfobia na Lei do Racismo. Para Lewandowski, é indispensável a existência de lei para que seja viável a punição penal de determinada conduta.

“A extensão do tipo penal para abarcar situações não especificamente tipificadas pela norma incriminadora parece-me atentar contra o princípio da reserva legal, que constitui uma garantia fundamental dos cidadãos que promove a segurança jurídica de todos”, afirmou o ministro, citando jurisprudência da Corte nesse sentido. Segundo ele, a Constituição Federal somente admite a lei como fonte formal e direta de regras de direito penal.

Ministro Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes acompanhou a maioria dos votos pela procedência das ações. Além de identificar a inércia do Congresso Nacional, ele entendeu que a interpretação apresentada pelos relatores de que a Lei do Racismo também pode alcançar os integrantes da comunidade LGBT é compatível com a Constituição Federal.

Em seu voto, Mendes lembrou que a criminalização da homofobia é necessária em razão dos diversos atos discriminatórios – homicídios, agressões, ameaças – praticados contra homossexuais e que a matéria envolve a proteção constitucional dos direitos fundamentais, das minorias e de liberdades.

Ministro Aurélio Aurélio

Ao votar, o ministro Marco Aurélio não admitiu o mandado de injunção, por considerar inadequada o uso deste instrumento processual na hipótese. Por outro lado, admitiu em parte a ADO, mas não reconheceu a omissão legislativa quanto à criminalização específica da homofobia e da transfobia.

Para o ministro, a Lei do Racismo não pode ser ampliada em razão da taxatividade dos delitos expressamente nela previstos. Ele considerou que a sinalização do STF para a necessária proteção das minorias e dos grupos socialmente vulneráveis, por si só, contribui para uma cultura livre de todo e qualquer preconceito e discriminação, preservados os limites da separação dos Poderes e da reserva legal em termos penais.

Presidente

Último a votar, o ministro Dias Toffoli acompanhou o ministro Ricardo Lewandowski pela procedência parcial dos pedidos. O presidente da Corte ressaltou que, apesar da divergência na conclusão, todos os votos proferidos repudiam a discriminação, o ódio, o preconceito e a violência por razões de orientação sexual e identidade de gênero. De acordo com Toffoli, com o julgamento, a Corte dá efetividade ao artigo 3º, inciso IV, da Constituição Federal, segundo o qual é objetivo da República promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Conclusão

Por maioria, o Plenário aprovou a tese proposta pelo relator da ADO, ministro Celso de Mello, formulada em três pontos. O primeiro prevê que, até que o Congresso Nacional edite lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, se enquadram nos crimes previstos na Lei 7.716/2018 e, no caso de homicídio doloso, constitui circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe. No segundo ponto, a tese prevê que a repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe o exercício da liberdade religiosa, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio. Finalmente, a tese estabelece que o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis. Ficou vencido o ministro Marco Aurélio.

FONTE:  STF, 13 de junho de 2019

Parecer Jurídico – Julgamento REsp nº 1.340.553/RS e a prescrição intercorrente *Clovis Brasil Pereira

0

P  A  R  E  C  E  R        J  U  R  Í  D  I  C  O 

Ementa: DIREITO TRIBUTÁRIO – PRESCRIÇÃO ORDINÁRIA – PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE – REsp  nº  1.340.553/RS – ARGUIÇÃO  –  NOVAS TESES – INSTRUMENTOS PROCESSUAIS CABÍVEIS

 CONSULTA

Recebemos do CONSULENTE pedido de parecer sobre as seguintes questões, em face da aplicabilidade das teses definidas no julgamento do REsp nº 1.340.553/RS a respeito da prescrição intercorrente dos créditos tributários, com os seguintes questionamentos:

  1. Qual é o regramento contido no CTN a respeito da prescrição;
  2. A respeito da aplicação do Acórdão mencionado aos créditos já ajuizados, em que o devedor não foi ainda citado;
  3. Idem aos créditos ajuizados, em que o devedor foi citado, porém não foram localizados bens penhoráveis;
  4. Quais são os instrumentos processuais cabíveis para o reconhecimento da PRESCRIÇÃO;
  5. Outras observações pertinentes.

RELATÓRIO

O presente PARECER JURÍDICO tem como finalidade esclarecer pontos importantes a respeito da PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE dos créditos tributários, em face do recente julgamento proferido pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.340.553/RS),  que teve como relator o Ministro  Mauro Campbell,  pelo qual foram fixadas novas teses para abordagem do tema, de grande relevância para os contribuintes em geral, que ficam à mercê da morosidade da justiça e da inércia das Fazendas Públicas (Municipal, Estadual ou Federal), que promovem as ações fiscais em massa, e não dão o atendimento necessário para a regular movimentação do processo, ficando milhares de ações dormindo nas prateleiras das Varas Fiscais do Poder Judiciário.

Por outro lado, não pode o jurisdicionado ficar refém dessa inércia, sofrendo as conseqüências da morosidade da justiça e dos efeitos colaterais provocados, tais como restrições cadastrais referendadas pela negativação  do nome do pretenso devedor tributário junto aos bancos de dados (SERASA e SPC), por exemplo que os ajuizamentos provocam.

FUNDAMENTAÇÃO

A prescrição intercorrente é a perda do direito a cobrança do tributo durante o curso do processo devido à inércia continuada e ininterrupta no curso do processo por um período superior àquele em que se verifica a prescrição. Está prevista no artigo 40º, da Lei nº 6.830/80:

Art. 40- O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

  • 1º – Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública.
  • 2º – Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.
  • 3º – Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.
  • 4oSe da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
  • 5o A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4odeste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda.

O Código Tributário Nacional, em seu artigo 174,  prevê que a prescrição nas ações de cobrança de crédito tributário ocorre após 5 (cinco) anos, contados da sua constituição definitiva.

O parágrafo único do referido artigo prevê as hipóteses de interrupção da prescrição, in verbis:

I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;

II – pelo protesto judicial;

III – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;

IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.

O recente julgamento do Recurso Repetitivo realizado pela 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.340.553/RS), firmou novos entendimentos acerca da prescrição intercorrente nas execuções fiscais, no  sentido de que:

  • I) O prazo de 1 (um) ano de suspensão previsto no artigo 40, §§ 1º 2º, da Lei nº 6.830/80 (Lei de Execução Fiscal) terá início automaticamente no momento em a Fazenda Pública toma ciência da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis.
  • II) Em execução fiscal de cobrança de dívida ativa de natureza tributária, em que o despacho de citação tenha sido proferido antes do início da vigência da Lei Complementar nº 118/2005, após a citação válida (mesmo que por edital), logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará a suspensão da execução.
  • III) Em execução fiscal de cobrança dívida ativa de natureza tributária, em que o despacho de citação tenha sido proferido antes do início da vigência da Lei Complementar nº 118/2005 e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará a suspensão da execução.
  • IV) Independente de petição da Fazenda Pública e do pronunciamento do juiz, nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) durante o qual o processo deve ser arquivado sem baixa na distribuição, na forma do artigo 40, §§ 2º, 3º e 4º, da Lei nº 6.830/80, findo o qual o juiz, após ouvir a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.
  • V) A efetiva constrição patrimonial e citação (mesmo que por edital) são aptas a causar a interrupção do curso da prescrição intercorrente. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (devendo observar a natureza do crédito) deverão ser processado, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois encontrados os bens e penhorados a qualquer tempo, mesmo depois de escoados os referidos prazos, considera-se suspensa a prescrição intercorrente retroativamente na data do protocolo da petição que requereu a providência infrutífera.
  • VI) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/1973, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar a nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da Lei nº 6.830/80, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu, exceto quando se tratar da nulidade do termo inicial, em que o prejuízo é presumido.
  • VII) E, por fim, o Magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais utilizados na contagem do prazo, inclusive ao período em que a execução ficou suspensa.

CONCLUSÃO

O julgamento recente do STJ, do Recurso Especial  (RS) nº 1.340.553, cujo Acórdão não ainda publicado (10/10/2018), tem com base a Súmula 314, do STJ que diz: “Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente.

O julgamento referido tende a pacificar o entendimento quando à PRESCRIÇÃO dos créditos tributários, uma vez que tendo sido julgado como RECURSO REPETITIVO,  como tal, será aplicado em todos os casos análogos quer tratem do tema.

A previsão é de que mais de 27.000.000 de processos em andamento, serão extintos com o reconhecimento da PRESCRIÇÃO, o que representa cerca de 20% dos processos judiciais em andamento no pais.

Por fim, a prescrição poderá ser argüida através de dois instrumentos processuais, a saber

a) A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE  é uma forma de defesa que não necessita a apresentação de garantia em Juízo, ou seja, a penhora prévia de bens. É utilizada nas hipóteses em que a nulidade do título possa ser verificada de plano, bem como questões de ordem pública, pertinentes aos pressupostos e às condições da ação, desde que desnecessária a dilação probatória, g. quando o título executivo não é mais exigível (fenômeno da prescrição) e, portanto, não preenche o requisito exigibilidade.

b) OS EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL são cabíveis quando já houve a garantia em Juízo, pressuposto essencial para sua interposição, no prazo de 30 dias, contados do depósito, da juntada da prova da fiança bancária ou do seguro garantia, ou da intimação da penhora. É importante destacar que o Executado, ora Embargante poderá alegar qualquer material útil a sua defesa.

É o parecer sobre o tema tão palpitante, que submetemos ao CONSULENTE,  s. m. j.

Guarulhos (SP), 10  de outubro de 2018.

CLOVIS BRASIL PEREIRA                                      LUCAS DA LUZ PEREIRA

       ADVOGADO                                                               ESTAGIÁRIO

    OAB/SP nº 61.654                                                  OAB/SP  Nº 219.597-E

 

 

CURSO ESPECIAL – Ações Práticas no Direito de Familia

0

Inscições abertas. Vagas Limitadas.  Curso Presencial – Local:  Auditório Baeta, FIG/UNIMESP –  PROGRAMA:  Acesse www.prolegis.com.br

Mantida multa de R$ 11,28 mi contra banco por práticas abusivas

0

A 4ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo negou pedido de instituição bancária que pretendia anular de auto de infração e cancelamento da multa de R$ 11 milhões imposta pela Fundação de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon/SP). De acordo com os autos, o banco acionou a Justiça após ser multado pela prática de seis infrações ao Código de Defesa do Consumidor, entre elas a imposição de compra de seguro residencial para análise de solicitação de empréstimo.

O relator do recurso, desembargador Paulo Barcellos Gatti, ressaltou em seu voto que a prática de comercializar seguro juntamente com empréstimo consignado viola o disposto no CDC. O magistrado também apontou que “em mais de uma oportunidade, as informações fornecidas pelo banco aos consumidores foram insuficientes”.

Sobre a multa, o magistrado escreveu que o  Procon, como órgão de fiscalização, tem competência administrativa para aplicar sanções àquele que violar normas vigentes, sendo que o seu poder de polícia decorre de normas federal e estadual. Sobre o valor aplicado, destacou que a instituição bancária teve oportunidade de exercício das garantias constitucionais à ampla defesa e ao contraditório no curso do processo administrativo instaurado pela fundação. “Com base nos critérios previamente estabelecidos que, consoante mencionado, tão somente pormenorizou aqueles já descritos no artigo 57, caput, do CDC, o órgão administrativo aplicou, fundamentadamente, a correspondente sanção administrativa, conforme se verifica do ‘demonstrativo de cálculo da multa’, inexistindo qualquer desproporcionalidade ou irrazoabilidade no procedimento”, afirmou.

Completaram a turma julgadora os desembargadores Ana Liarte e Maurício Fiorito. A decisão foi unânime.  Apelação nº 1036048-10.2022.8.26.0053

 FONTE:  TJSP, 20 de setembro de 2023.

Revertida condenação com base em reconhecimento fotográfico

0

Em julgamento de revisão criminal, o 7º Grupo de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo absolveu, por unanimidade, homem que havia sido condenado por latrocínio com base em reconhecimento fotográfico.

De acordo com os autos, três homens foram denunciados e um dos acusados, em confissão extrajudicial, detalhou o envolvimento de um quarto homem, conhecido por “Magrão” ou “Mimizão”, que teria efetuado os disparos. Com base nessa confissão, a polícia apresentou fotografias do autor a duas testemunhas, em depoimento extrajudicial, que teriam reconhecido o homem. Já em audiência, uma delas se retratou e a outra não foi ouvida.

“O reconhecimento fotográfico presente nestes autos não seguiu os parâmetros mínimos de confiabilidade necessários, haja vista que a autoridade policial tão somente mostrou a fotografia do peticionário às testemunhas presenciais do crime. E, para além da precariedade do reconhecimento, o procedimento não foi confirmado em juízo”, afirmou o relator do recurso, desembargador Marcelo Semer. Para o magistrado, as provas elencadas pouco esclarecem sobre a participação do apelante, “de forma que a condenação está contrária à evidência dos autos, razão pela qual é o caso de deferimento da revisão criminal”.

O julgamento contou com a participação dos desembargadores Xisto Albarelli Rangel Neto, Augusto de Siqueira, Hermann Herschander, Walter da Silva, Marco de Lorenzi, Moreira da Silva, Miguel Marques e Silva e Marcelo Gordo.  Revisão criminal nº 0021180-43.2021.8.26.0000

FONTE:  TJSP, 21 de setembro de 2023.

TJPI autoriza processos extrajudiciais de divórcio, dissolução de união estável e inventários envolvendo filhos menores ou incapazes

0

Regra foi adotada após pedido do IBDFAM-PI em conjunto com a OAB-PI

O Tribunal de Justiça do Piauí – TJPI autorizou a realização extrajudicial de procedimentos de divórcio, dissolução de união estável e inventários, mesmo quando há filhos menores de idade ou incapazes envolvidos.

A norma está contemplada no novo Código de Normas de Serviços Notariais e Registrais e é fruto do pedido do Instituto Brasileiro de Direito de Família, seção Piauí – IBDFAM-PI, e da Comissão de Direito das Famílias e Subseções da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Piauí – OAB-PI.

As advogadas Ana Letícia Arraes, Isabella Paranaguá e Cláudia Paranaguá, membros da diretoria do IBDFAM-PI, explicam que para a realização desses procedimentos é fundamental apresentar ao tabelião a comprovação prévia da resolução das questões relacionadas à guarda, pensão alimentícia e convivência.

“Para os inventários extrajudiciais com filhos menores ou incapazes, é necessário que haja a adjudicação de único herdeiro ou que cada bem seja partilhado aos herdeiros e ao cônjuge de acordo com o quinhão ideal. Caso a partilha não obedeça a este critério, requer-se prévia autorização judicial, conforme o artigo 725, VII, do Código de Processo Civil. Nesse caso, o juízo competente, após a oitiva do Ministério Público, avaliará se não há prejuízo ao incapaz e permitirá a partilha de forma extrajudicial”, afirmam.

As advogadas ressaltam que a presença de filhos menores e incapazes nos procedimentos de inventário, divórcio e dissolução de união estável reflete em uma preocupação com a preservação e defesa dos direitos das crianças e dos incapazes.

“É necessário comprovar que esses indivíduos não serão prejudicados com essa nova possibilidade de procedimento extrajudicial”, elas observam.

Ainda assim, as advogadas analisam que a nova regra representa um avanço em relação à desjudicialização das demandas familiares, além de impactar na celeridade judicial.

“Isso estimula a conciliação entre as partes, visto que os processos extrajudiciais são mais rápidos e contribuem para que as Varas de Família e Sucessões possam oferecer à sociedade um serviço judicial mais eficaz e ágil, posto que a extrajudicialização resulta na redução do acervo dessas jurisdições”, avaliam.

Pedido de providências

Em março passado, o IBDFAM enviou ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ pedido de providências para autorizar a realização extrajudicial da dissolução conjugal e de inventários, mesmo quando houver filhos menores e incapazes, desde que consensual, e ainda que haja testamento.

O Instituto já havia protocolado pedido para quando houvesse testamento. Na época, porém, o CNJ não admitiu a possibilidade. O novo pedido tem como base recente entendimento do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que garantiu a possibilidade.

No documento, o IBDFAM sugere a adequação da hipertrofia da extrajudicialização em uma nova intelecção do artigo 610 do Código de Processo Civil – CPC para que seja autorizada de forma expressa uma normativa federal pelo CNJ do inventário extrajudicial com filhos menores ou incapazes, desde que a partilha seja ideal, ou seja, que todos recebam, inclusive, os incapazes, o que está previsto em lei, sem nenhum tipo de prejuízo.

O Instituto também sugere que seja autorizado o divórcio consensual de forma extrajudicial, ainda que com filhos menores e incapazes, ressalvadas as questões relativas à convivência familiar e alimentos entre filhos menores, que, obrigatoriamente, devem seguir para via judicial. Outra sugestão é para que seja autorizado o inventário extrajudicial ainda que exista testamento.

Atualmente, seis Estados brasileiros admitem a possibilidade: Rio de Janeiro, Santa Catarina, Mato Grosso, Acre, Maranhão e, agora, Piauí.

FONTE:  IBDFAM, 21 de setembro de 2023.

MP pode propor ação civil pública para defender interesses individuais de vítima de violência doméstica

0

Para a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Ministério Público (MP) tem legitimidade para propor ação civil pública em defesa de interesses individuais de vítima de violência doméstica. De acordo com o relator, desembargador convocado Jesuíno Rissato, a ação civil pública pode ser utilizada não apenas para tutelar conflitos de massa, que envolvem direitos transindividuais, mas também para defender direitos e interesses indisponíveis ou que detenham “suficiente repercussão social”, servindo a toda a coletividade.

Após ter sido agredida pelo irmão, uma mulher procurou o Ministério Público de São Paulo, que requereu medidas protetivas de urgência, as quais foram deferidas pelo juízo de primeiro grau. Quatro meses depois, o MP ajuizou a ação civil pública com pedidos para que o réu se afastasse da casa onde morava com a irmã e fosse proibido de se aproximar ou ter contato com ela.

Por considerar que o MP não possuía legitimidade ativa para propor tal tipo de ação, o juízo indeferiu a petição inicial. Na mesma linha, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou provimento à apelação, sob o entendimento de que a ação ajuizada com o nome de ação civil pública tinha, na verdade, natureza de ação civil privada, que não compete ao MP propor.

Legitimidade da atuação do MP se vincula à indisponibilidade dos direitos individuais

Em seu voto, o relator do recurso no STJ destacou que, conforme o artigo 25 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), o MP tem legitimidade para atuar nas causas cíveis e criminais decorrentes de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Jesuíno Rissato lembrou que, no julgamento do Tema 766 dos recursos repetitivos, a Primeira Seção do STJ definiu que o limite para a legitimidade da atuação judicial do Ministério Público se vincula à disponibilidade, ou não, dos direitos individuais a serem defendidos.

“Tratando-se de direitos individuais disponíveis, e não havendo uma lei específica autorizando, de forma excepcional, a atuação dessa instituição permanente – como no caso da Lei 8.560/1992, que trata da investigação de paternidade –, não se pode falar em legitimidade de sua atuação. Contudo, se se tratar de direitos ou interesses indisponíveis, a legitimidade ministerial decorre do artigo 1º da Lei 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público)”, explicou.

Medida protetiva de urgência requerida tem natureza indisponível

O magistrado ponderou que a medida protetiva de urgência requerida para resguardar interesse individual de uma vítima de violência doméstica e familiar tem natureza indisponível, visto que a Lei Maria da Penha surgiu para assegurar o cumprimento de tratados internacionais de direitos humanos nos quais o Brasil assumiu o compromisso de resguardar a dignidade da mulher (a exemplo da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres).

“O objeto da ação civil pública proposta no presente caso é, sim, direito individual indisponível que, nos termos do artigo 1º da Lei 8.625/1993, deve ser defendido pelo Ministério Público, que, no âmbito do combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, deve atuar tanto na esfera jurídica penal quanto na cível, conforme o artigo 25 da Lei 11.340/2006”, concluiu Rissato ao dar provimento ao recurso especial e reconhecer a legitimidade ativa do MP para representar a vítima na ação civil pública.  REsp 1.828.546.

FONTE:  STJ, 21 de setembro de 2023.

Princípio da insignificância pode ser aplicado a contrabando de até mil maços de cigarro, define Terceira Seção

0

Em julgamento de recursos repetitivos (Tema 1.143), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu a tese de que o princípio da insignificância é aplicável ao crime de contrabando de cigarros quando a quantidade apreendida não ultrapassar mil maços, seja pela baixa reprovabilidade da conduta, seja pela necessidade de se dar efetividade à repressão do contrabando de grande vulto.

No entanto, segundo o colegiado, o princípio da insignificância poderá ser afastado nas apreensões abaixo de mil maços se houver reiteração da conduta criminosa, pois tal circunstância indica maior reprovação e periculosidade social.

Ao fixar o precedente qualificado por maioria de votos, o colegiado modulou os efeitos da decisão para definir que a tese deve ser aplicada apenas aos processos ainda em trâmite na data do julgamento (13 de setembro) – sendo inaplicável, portanto, às ações penais já transitadas em julgado. Não havia determinação de suspensão de processos em razão da afetação do tema.

Aplicação pontual do princípio da insignificância já é adotada pelo MP

No voto que prevaleceu na seção, o ministro Sebastião Reis Junior explicou que a conduta de introduzir cladestinamente cigarro pela fronteira brasileira constitui crime de contrabando, tanto no caso de cigarro produzido no Brasil para exportação quanto nas hipóteses em que a importação do produto é expressamente proibida (artigo 18 do Decreto-Lei 1.593/1977).

O ministro ainda lembrou que o Brasil é signatário da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, cujo artigo 15 determina a repressão do comércio ilícito de produtos de tabaco, inclusive o contrabando.

Sob essa perspectiva, e como forma de proteção à saúde pública, Sebastião Reis Junior afirmou que, em regra, deve prevalecer o entendimento de que o contrabando de cigarros não comporta a aplicação do princípio da insignificância.

“Por outro lado, entendo que a posição adotada pela 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, no sentido da aplicação do princípio da insignificância para a hipótese de contrabando de cigarros em quantidade que não ultrapassa mil maços, não só é razoável do ponto de vista jurídico como ostenta uma base estatística sólida para sua adoção”, afirmou.

Apreensões de até mil maços são poucas em relação ao volume total

Para embasar esse posicionamento, o ministro apontou que as apreensões de até mil maços, embora correspondam à maioria das autuações, representam muito pouco em relação ao volume total de cigarros apreendidos. De acordo com as informações estatísticas do ano passado, a maior quantidade se verifica em autuações superiores a dez mil maços, com a concentração mais expressiva (73,41%) nas apreensões entre cem mil e um milhão de maços.

Dessa forma, para o ministro, impedir a aplicação do princípio da insignificância nas apreensões de até mil maços de cigarro seria ineficaz para a proteção da saúde pública, além de sobrecarregar indevidamente os entes estatais encarregados da persecução penal, “sobretudo na região de fronteira, com inúmeros inquéritos policiais e outros feitos criminais derivados de apreensões inexpressivas, drenando o tempo e os recursos indispensáveis para reprimir e punir o crime de vulto”.  REsp 1.971.993.

FONTE:  STJ,  20 de setembro de 2023.

Penhora contra empresa do mesmo grupo da executada exige prévia desconsideração da personalidade jurídica

0

A busca judicial por patrimônio de empresa que não integrou a ação na fase de conhecimento e não figura na execução, ainda que ela integre o mesmo grupo econômico da sociedade executada, depende da instauração prévia do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, não sendo suficiente o simples redirecionamento do cumprimento de sentença.

O entendimento foi estabelecido pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso especial e julgar procedentes os embargos de terceiros opostos por uma empresa que teve mais de R$ 500 mil penhorados em razão de dívida de outra empresa do mesmo grupo, decorrente de ação ajuizada por consumidor. A penhora não foi precedida de incidente de desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada.

Ao manter a penhora determinada em primeiro grau, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) considerou que o artigo 28, parágrafo 2º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) prevê a responsabilidade subsidiária das pessoas jurídicas integrantes do mesmo grupo societário da devedora principal, o que tornaria possível penhorar ativos de outras empresas do grupo caso não se encontrassem bens da sociedade devedora.

Incidente de desconsideração é norma processual de observância obrigatória

Relator do recurso especial, o ministro Antonio Carlos Ferreira explicou que a responsabilidade civil subsidiária, prevista expressamente no CDC, não exclui a necessidade de observância das normas processuais destinadas a garantir o contraditório e a ampla defesa – entre elas, a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Segundo o ministro, a interpretação do CDC deve levar em conta que a previsão de responsabilidade subsidiária das sociedades integrantes de um grupo econômico está inserida na mesma seção que disciplina o instituto da desconsideração. Ainda de acordo com Antonio Carlos Ferreira, a norma processual de instauração do incidente é de observância obrigatória e busca garantir o devido processo legal.

“Portanto, o tribunal de origem, ao entender ser suficiente o mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não participou da fase de conhecimento, penhorando o crédito da recorrente sem prévia instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, violou o disposto nos artigos 28, parágrafo 2º, do CDC e 133 a 137 do Código de Processo Civil“, concluiu o ministro. REsp 1864620

FONTE:   STJ, 19 de setembro de 2023.

Proibição de bebida no regime aberto deve considerar crime e situação pessoal do condenado

0

​Para a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a proibição genérica do consumo de álcool, imposta pelo juízo da execução penal como condição especial para o cumprimento da pena em regime aberto, deve levar em consideração as circunstâncias específicas do crime e a situação individual do reeducando, não sendo suficiente o argumento de que a medida busca preservar sua saúde ou prevenir futuros delitos.

O entendimento foi estabelecido pelo colegiado ao dar parcial provimento a uma reclamação e, nos termos de decisão anterior proferida pelo STJ em habeas corpus (HC 751.948), ordenar que o juízo da execução revise a determinação – fundamentando-a ou eliminando-a – de proibir a ingestão de bebida alcoólica, estabelecida a um condenado por roubo como condição para o cumprimento da pena em regime aberto.

Em decisão aplicável a todas as pessoas que cumprissem pena em regime aberto na comarca de Guaxupé (MG), o juízo da execução, entre outras medidas, havia proibido o consumo de qualquer tipo de bebida alcóolica.

Após a decisão do STJ no HC 751.948, determinando ao juízo que fundamentasse de forma individualizada eventuais condições especiais de cumprimento da pena, a vara de execuções penais manteve a proibição de ingestão de álcool, citando razões como o comportamento do reeducando no curso da execução penal e problemas de saúde enfrentados por ele.

Não há impedimento para consumo moderado de álcool na folga ou em casa

O relator da reclamação, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, ponderou que, de fato, o apenado não deve ingerir álcool durante o horário de trabalho ou antes de dirigir – conduta que, inclusive, é tipificada como crime pelo artigo 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

“No entanto, não parece, a princípio, irrazoável que o executado, estando dentro de sua residência, no período noturno ou em dias de folga, venha a ingerir algum tipo de bebida alcóolica (uma cerveja, por exemplo), cujo consumo não é vedado no ordenamento jurídico brasileiro, aconselhando-se, por óbvio, a moderação, tendo em conta os conhecidos efeitos deletérios do excesso de consumo de álcool para a saúde”, concluiu o ministro ao determinar que o juízo revise a condição especial de cumprimento da pena, devendo observar a situação individual do apenado.

Leia o acórdão na Rcl 45.054.

FONTE  19 de setembro de 2023.

OLX não tem responsabilidade por anúncio de carro clonado que foi vendido fora da plataforma

0

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) eximiu o site OLX do dever de pagar indenização pela venda fraudulenta de um carro anunciado em sua plataforma. O colegiado entendeu que o serviço foi utilizado pelo vendedor apenas como espaço de anúncios classificados, pois nenhuma etapa da negociação ocorreu no ambiente virtual da OLX.

Os compradores encontraram no site o anúncio de venda de um carro no valor de R$ 210 mil e entraram em contato com o vendedor por meio do telefone indicado. As partes concluíram a negociação por telefone e presencialmente, sendo feito o pagamento por meio de transferência bancária e pela entrega de outro veículo. Contudo, ao tentarem transferir a propriedade do carro no Departamento de Trânsito, os compradores descobriram que ele havia sido clonado.

Ao analisar a ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada contra o site, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) concluiu pela responsabilidade da OLX, por ter hospedado um anúncio falso.

Responsabilidade depende de como a plataforma foi usada no negócio

A relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou que são diversas as modalidades de sites de comércio eletrônico, que podem ser qualificados como lojas virtuais, de compras coletivas, comparadores de preços, classificados e intermediadores.

Segundo a relatora, os classificados obtêm receita com os anúncios e não cobram comissão pelos negócios que são fechados. Ela mencionou precedente do tribunal segundo o qual, nesses casos, o site não tem a responsabilidade de fiscalizar previamente a origem dos produtos – por não se tratar de atividade intrínseca ao serviço prestado –, mas se exige que mantenha condições de identificar cada um de seus anunciantes.

Nessa situação, disse Nancy Andrighi, a página de classificados responderá apenas se deixar de fornecer elementos para a identificação do autor do anúncio, mas não terá responsabilidade por vícios ou defeitos do produto ou serviço.

Em relação à OLX, a ministra verificou que o site pode atuar como um simples portal de classificados ou como uma verdadeira intermediária – o que altera o regime de responsabilidade.

Nexo causal é interrompido diante de fato de terceiro

A ministra ressaltou que o dever de indenizar surge apenas quando há nexo causal entre a conduta do agente e o resultado danoso. O nexo poderá ser interrompido, esclareceu, caso ocorra fato exclusivo da vítima ou de terceiro (artigo 14, parágrafo 3°, II, do Código de Defesa do Consumidor); ou evento de força maior ou fortuito externo (artigo 393 do Código Civil).

No caso em análise, a relatora constatou que a operação de compra e venda do veículo foi concretizada integralmente fora da plataforma, não tendo o fraudador utilizado nenhuma ferramenta colocada à disposição pela OLX para essa finalidade.

“Tal circunstância evidencia que, na hipótese, a OLX funcionou não como intermediadora, mas como mero site de classificados. A fraude perpetrada caracteriza-se como fato de terceiro que rompeu o nexo causal entre o dano e o fornecedor”, afirmou.  REsp 2.067.181.

FONTE:  STJ, 18 de setembro de 2023.

 

Interpretações do STJ sobre o instituto da interdição

0

A confirmação de que uma pessoa adulta não tem mais a capacidade de gerenciar os atos de sua vida civil é um momento familiar doloroso, que também envolve muitas complicações jurídicas. O tema é de avaliação obrigatória pelo Judiciário, responsável por decidir sobre a interdição ou não de uma pessoa. Em razão de sua complexidade, muitos processos sobre o assunto acabam chegando ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).

A análise judicial – que ganhou novos contornos após a publicação do Estatuto da Pessoa com Deficiência, em 2015 – tem dois momentos principais: a interdição, em que se avalia a real incapacidade para a gestão da vida civil, e a curatela, instrumento pelo qual uma pessoa (ou mais de uma) se torna responsável por acompanhar o interditado e gerir suas rendas e seu patrimônio.

Na primeira parte desta reportagem especial, são apresentados entendimentos do STJ sobre o processo de interdição; no próximo domingo (24), as decisões do tribunal em diversas controvérsias a respeito do instituto da curatela.

O papel do MP como defensor do curatelando

Uma questão que ainda gera posições divergentes no tribunal diz respeito à atuação do Ministério Público (MP) em defesa dos interesses do curatelando.

Em dezembro de 2019, a Terceira Turma, por maioria, julgando processo que tramitou em segredo, decidiu que a atuação do MP como fiscal da ordem jurídica, em ação de interdição da qual não é autor, impede que ele atue, simultaneamente, como defensor do curatelando.

No processo, uma mulher pediu a interdição de sua irmã. Não havia Defensoria Pública na comarca, e as instâncias ordinárias indeferiram o pedido do MP para que fosse nomeado curador especial, ao fundamento de que tal papel poderia ser desempenhado pelo próprio órgão ministerial, uma vez que a Constituição Federal permite que ele exerça outras funções que não sejam incompatíveis com a sua finalidade.

A relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, apontou a existência de uma antinomia entre a função de fiscal da lei e os interesses particulares envolvidos. Segundo ela, a cumulação de funções pelo MP pode levar à prevalência de uma em detrimento da outra, o que seria contrário aos valores que o legislador visava resguardar ao estabelecer regras especiais para o processo de interdição.

No caso de não haver Defensoria Pública estadual em determinada comarca para exercer a curadoria especial, a ministra afirmou que essa ausência deve ser suprida conforme as normas locais de organização e funcionamento do órgão e, “na impossibilidade de tal suprimento, há de ser designado advogado dativo”.

No mesmo mês, dezembro de 2019, a Quarta Turma, invocando precedentes, reafirmou que, “nos procedimentos de interdição não ajuizados pelo Ministério Público, cabe ao órgão ministerial defender os interesses do interditando”. Para o colegiado, “a designação de curador especial pressupõe a presença de conflito de interesses entre o incapaz e o representante legal” – situação não verificada no caso em julgamento, que também tramitou em segredo judicial.

O recurso do MP era contra acórdão do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), o qual considerou indispensável a intimação do órgão para representar o interditando e desnecessária a nomeação de curador especial para exercer a mesma função. De acordo com o MP, sua atuação como representante judicial do suposto incapaz seria inviável desde a promulgação da Constituição de 1988, e o exercício da curadoria especial caberia à Defensoria Pública.

Por considerar que o acórdão do TJBA estava em consonância com entendimentos do STJ, a Quarta Turma confirmou a decisão monocrática do relator, ministro Marco Buzzi, que havia mantido a inadmissão do recurso especial do MP.

Sentença de interdição não afeta atos anteriores do interditado

Ao julgar o AgInt nos EDcl no REsp 1.834.877, de relatoria do ministro Raul Araújo, a Quarta Turma reafirmou o entendimento de que a sentença de interdição possui natureza constitutiva, pois, além de declarar uma incapacidade preexistente, ela constitui uma nova situação jurídica, de sujeição do interditado à curatela, com efeitos ex nunc.

No caso julgado, um idoso firmou contrato de cessão de crédito em favor de três pessoas. Após a morte do cedente, o espólio afirmou que ele não tinha capacidade mental suficiente para celebrar o negócio, devido à idade avançada e a graves problemas de saúde – o que, inclusive, ensejou sua interdição.

O espólio alegou ainda que houve dolo por parte dos cessionários, que teriam se aproveitado da situação do idoso para comprar, por apenas R$ 200 mil, um precatório avaliado em quase R$ 1 milhão. O TJSP negou provimento ao recurso do espólio.

No STJ, o ministro Raul Araújo apontou que, conforme consta nos autos, o cedente não aparentava distúrbio mental e estava lúcido à época da negociação, não havendo demonstração inequívoca de que já fosse incapaz naquele momento.

Para o relator, o entendimento do TJSP, de que a superveniência de incapacidade não afeta a validade dos contratos firmados anteriormente, estava em consonância com a jurisprudência do STJ, a qual prevê que a sentença de interdição, salvo pronunciamento judicial expresso em sentido contrário, tem efeitos ex nunc.

Nulidade de ação que envolve incapaz por falta de intimação do MP não é automática

“A ausência da intimação do Ministério Público, quando necessária sua intervenção, por si só, não enseja a decretação de nulidade do julgado, sendo necessária a demonstração do efetivo prejuízo para as partes ou para a apuração da verdade substancial da controvérsia jurídica”, declarou o ministro Luis Felipe Salomão no julgamento do REsp 1.694.984.

Uma empresa ajuizou ação de rescisão contratual e reintegração de posse contra uma mulher e obteve vitória parcial em primeira instância. Na apelação, o curador da ré afirmou que ela foi interditada durante o curso do processo, por ter sido considerada absolutamente incapaz para os atos da vida civil, e requereu a declaração de nulidade da citação feita em seu nome.

O MP estadual também pediu a anulação do processo, por vício na citação e ainda porque não houve a intimação do órgão para atuar no feito, o qual envolvia interesse de pessoa que foi declarada incapaz na ação paralela de interdição.

Ao analisar o caso, a Quarta Turma reafirmou o entendimento de que os atos do interditado anteriores à interdição até podem ser reconhecidos como nulos, mas esse não é um efeito automático da sentença de interdição, devendo ser proposta ação específica de anulação do ato jurídico, na qual precisará ser demonstrado que já havia incapacidade na época de sua realização.

Quanto à falta de intimação do MP, o ministro Salomão, relator, afirmou que a intervenção do órgão nos processos que envolvem interesse de incapaz “se justifica na possibilidade de desequilíbrio da relação jurídica e no eventual comprometimento do contraditório em função da existência da parte vulnerável”.

No entanto, o magistrado observou que, “no instante do ajuizamento da ação de rescisão contratual, não havia sido decretada a interdição, não havendo se falar, naquele momento, em interesse de incapaz e obrigatoriedade de intervenção do Ministério Público”. Além disso, apesar da falta de intimação do MP nesse processo, Salomão considerou que o órgão compareceu aos autos, após denúncia de terceiro sobre possíveis irregularidades, e pôde cumprir seu papel por meio de “inúmeras manifestações”.

Ausência de interrogatório do interditando pode levar à anulação do processo

Em outro caso que tramitou em segredo, no qual também decidiu que o MP não poderia atuar como curador especial, a Terceira Turma entendeu que a ausência de interrogatório do interditando dá ensejo à nulidade do processo de interdição.

Uma mulher ajuizou ação de interdição com pedido de tutela antecipada para obter a curatela provisória de sua mãe, diagnosticada com mal de Alzheimer. O MP se manifestou pela necessidade de interrogatório da idosa, mas o juízo de primeiro grau dispensou a providência, com base na qualidade da perícia médica, e decretou a interdição, nomeando a filha como curadora. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) negou provimento ao recurso do MP.

A relatora no STJ, ministra Nancy Andrighi, afirmou ser importante que o juiz proceda ao exame pessoal por meio de entrevista, ainda que não tenha conhecimentos para fazer diagnósticos. Segundo ela, o exame pessoal não é apenas para avaliação do estado biológico do interditando, mas serve para verificar seus laços afetivos, suas condições materiais e cognitivas, a forma como se relaciona e se comporta em sociedade e, especialmente, sua opinião sobre a interdição e sua relação com quem pretende ser o curador.

“O exame a ser feito mediante interrogatório em audiência, pessoalmente pelo juiz, não é, portanto, mera formalidade. Ao contrário, é medida que garante a participação e a própria defesa do interditando no processo. Aliás, é também medida de humanização do trabalho judicial, que poderá, com habilidade e dedicação, conhecer fatos que o processo oculta ou omite”, declarou.

Ordem dos legitimados para ajuizamento da ação de interdição não é preferencial

Para a Terceira Turma, a ordem dos legitimados para o ajuizamento da ação de interdição não é preferencial, e qualquer pessoa que se enquadre no conceito de parente do Código Civil (CC) é parte legítima para propor esse tipo de ação.

O processo – que tramitou em segredo judicial – começou quando um homem requereu a interdição de sua sobrinha, afirmando que ela foi diagnosticada com esquizofrenia e seria incapaz para os atos da vida civil. Na contestação, a interditanda sustentou que seu tio não tinha legitimidade para ajuizar a ação, uma vez que a ordem prescrita nos artigos 1.768 do CC e 1.177 do Código de Processo Civil (CPC) não foi observada. A sobrinha alegou, ainda, que somente na falta ou na impossibilidade dos pais é que a lei confere a outro parente a legitimidade para a propositura da ação de interdição.

O relator do recurso no STJ, ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, esclareceu que a enumeração dos legitimados prevista no artigo 1.177 do CPC é taxativa, mas não preferencial, podendo qualquer dos indicados propor a ação.

De acordo com o magistrado, o caso é de legitimação concorrente, não sendo a propositura da ação prerrogativa de uma única pessoa, pois mais de um legitimado pode requerer a curatela, formando-se um litisconsórcio ativo facultativo. “Ambos os pais, ou mesmo mais de um parente pode propor a ação, cabendo ao juiz escolher, em momento oportuno, quem vai exercer o encargo”, explicou.

O ministro também destacou que a interdição pode ser requerida por quem a lei reconhece como parente: ascendentes e descendentes de qualquer grau (artigo 1.591 do CC) e parentes em linha colateral até o quarto grau (artigo 1.592 do CC).

Laudo médico pode ser dispensado na propositura da ação de interdição

Em outro julgamento relevante da Terceira Turma, foi definido que o laudo médico previsto no artigo 750 do CPC como necessário à propositura da ação de interdição pode ser dispensado se o interditando não quiser se submeter ao exame. O caso tramitou sob sigilo.

Ao ajuizarem o pedido de interdição de sua mãe, duas mulheres não conseguiram juntar à petição inicial o laudo médico sobre a condição da interditanda, pois ela se recusava a fazer qualquer tipo de tratamento com especialista. O juízo de primeira instância extinguiu o processo sem resolução do mérito por ausência de interesse processual (artigo 485, inciso VI, do CPC), ao fundamento de que não foi apresentado documento indispensável. O Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) negou provimento à apelação das autoras.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, observou que, embora o artigo 750 do CPC mencione o laudo médico como necessário à propositura da ação de interdição, esse mesmo dispositivo legal ressalva, expressamente, a possibilidade de tal documento ser dispensado na hipótese em que for impossível juntá-lo à petição inicial.

A relatora também ressaltou que o laudo precisa apenas fornecer elementos indiciários, que tornem juridicamente plausível a tese de que estariam presentes os requisitos para a interdição, de modo a viabilizar o prosseguimento da ação. Ela ponderou que o laudo não substitui a prova pericial a ser produzida em juízo, de forma que o julgador não deve ser demasiadamente rigoroso diante da alegação de impossibilidade de apresentá-lo.

“Se se tratasse de um documento indispensável à decisão de mérito, deveria o julgador ser mais rigoroso, mas, por se tratar de documento necessário à propositura da ação e ao perfunctório exame de plausibilidade da petição inicial, deve ele ser mais flexível, justamente para não inviabilizar o acesso à Justiça”, afirmou.  REsp 1834877REsp 1694984

FONTE:  STJ, 17 de setembro de 2023.