Mandado de Busca e Apreensão: a séria questão da legitimidade junto ao Judiciário na seara estadual

* Ravênia Márcia de Oliveira Leite

A análise do tema em epígrafe no processo penal, pressupõe a observância dos direitos individuais previstos na Constituição Federal, especialmente aqueles previstos no artigo 5.º, XI, X e LVI que se referem, respectivamente, à inviolabilidade de domicílio, intimidade e vida privada, incolumidade física e moral e inadimissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos.

Em primeiro plano, deve-se observar que a Constituição Federal estabeleceu, claramente, as atribuições às Policiais Civis e Militares. Senão Vejamos:

“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I – polícia federal;

II – polícia rodoviária federal;

III – polícia ferroviária federal;

IV – polícias civis;

V – polícias militares e corpos de bombeiros militares.

(…)

§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.

§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.”

Dessa forma, legitima a investigação realizada pelo Polícia Militar na seara castrense, com vistas a instruir o Inquérito Policial Militar, restando, autorizada, portanto, a representação pelo Mandado de Busca e Apreensão com tal finalidade.

Todavia, exceto casos excepcionais onde a Polícia Civil reste impedida ou impossibilitada, a concessão de Mandado de Busca e Apreensão à Polícia Militar, pode contaminar o processo criminal, constatada a cristalina ilegitimidade da última para as investigações criminais, veemente a ilicitude da prova produzida dessa forma.

O art. 241 do Código de Processo Penal, no compasso do texto constitucional estabelece que: “quando a própria autoridade policial ou judiciária não a realizar pessoalmente, a busca domiciliar deverá ser precedida da expedição de mandado”.

Noticiado fato criminoso o mesmo deve ser noticiado ao Delegado de Polícia que deverá adotar as medidas exigidas pela lei e pela Carta Magna e instaurar o devido Inquérito Policial, representando pelas medidas cautelares cabíveis, dentre elas o Mandado de Busca e Apreensão.

Obviamente, não se defende aqui, a impunidade, mas, justamente o contrário, em matéria legal e constitucional todos os envolvidos com a Segurança Pública e a Justiça devem nortear seus atos pelos seus ditames.

Ao permitir-se a concessão e cumprimento de Mandado de Busca e Apreensão pela Polícia Militar, exceto nas hipóteses mencionadas, afrontando a Constituição Federal e o Código de Processo Penal, não se estabelecerá Segurança Pública, mas, ao contrário, viabilizar-se-á a contaminação das provas obtidas de forma ilícita ou ilegítima, permitindo-se a arguição da nova redação do art. 157 do Código de Processo Penal (Lei n.º 11.690/08):

“Art. 157.  São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais. 

§ 1o  São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras. 

§ 2o  Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova.”

A integração entre a Polícia Civil e a Polícia Militar, operacionalizada em vários Estados da federação, demonstra a redução dos índices de criminalidade, e nesse ponto, devemos aplaudir tais medidas, entretando, tais opções em Segurança Pública, de caráter administrativo e jurídico, não podem sobreporem-se ao prescrito na lei e na Constituição Federal.

Dessa forma, em um país norteado pelas regras de um Estado Democrático de Direito, os operadores do Direito devem prezar por aquilo que lhes deve ser mais caro: o cumprimento aos ditames legais e constitucionais.

Permitir o contrário, sob qualquer argumento, acarretará um retrocesso democrático e, sobretudo, à investigação policial e ao processo criminal, como um todo.

 

REFERÊNCIA  BIOGRÁFICA

Ravênia Márcia de Oliveira Leite:  Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar. Pós-graduanda em Direito Penal – Universidade Gama Filho.

E-mail: ravenia@terra.com.br  


Redação Prolegis
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ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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