Delação premiada

*João Baptista Herkenhoff –

Com uma ressalva que registro no final, não vejo com simpatia o instituto jurídico da delação premiada.

Introduzida há poucos anos no Direito brasileiro, a delação premiada de muito tempo é utilizada em países como Estados Unidos e Itália.

A meu ver, a delação premiada associa criminosos e autoridades, num pacto macabro.

De um lado, esse expediente pode revelar tessituras reais do mundo do crime.

Numa outra vertente, a delação que emerge do mundo do crime, quando falsa, pode enredar, como vítimas, justamente aquelas pessoas que estejam incomodando ou combatendo o crime.

Na maioria das situações, creio que o uso da delação premiada tem pequena eficácia, uma vez que a prova relevante, no Direito Penal moderno, é a prova pericial, técnica, científica, e não a prova testemunhal e muito menos o testemunho pouco confiável de pessoas condenadas pela Justiça.

Ao premiar a delação, o Estado eleva ao grau de virtude a traição. Em pesquisa sócio-jurídica que realizamos, publicada em livro, constatei que, entre os presos, o companheirismo e a solidariedade granjeiam respeito, enquanto a delação é considerada uma conduta abjeta (Crime, Tratamento sem Prisão, Livraria do Advogado Editora, página 98).

Então, é de se perguntar: Pode o Estado ter menos ética do que os cidadãos que o Estado encarcera?  Pode o Estado barganhar vantagens para o preso em troca de atitudes que o degradam, que o violentam, e alcançam, de soslaio, a autoridade estatal?

A tudo isso faço apenas uma ressalva. Merece abrandamento da pena ou mesmo perdão judicial aquele que, tendo participado de um crime (seqüestro de uma pessoa, por exemplo), desiste de seu intento no iter criminis (trajeto do crime) e fornece às autoridades informações que permitam (no exemplo que estamos citando) a localização do seqüestrado e o conseqüente resgate da vida em perigo. Numa hipótese como essa, o arrependimento do criminoso tem a marca da nobreza e o Estado, premiando sua conduta, age eticamente.

 


Referência  Biográfica

João Baptista Herkenhoff  –  É Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br Home-page: www.joaobaptista.com Autor, dentre outros livros, de “Ética, Educação e Cidadania” (Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre).

Redação Prolegis
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ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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