Da necessidade de declararem-se inconstitucionalidade na 1ª instância

* Luiz Guilherme Marques

A Constituição de 1988 tem vários defeitos – dentre os quais a prolixidade – mas é a mais avançada de todas que já se editou no nosso país.

Enunciando princípios de reconhecimento da dignidade da pessoa humana, estabeleceu parâmetros para a edição de leis progressistas.

Todavia, absurdamente muitos dispositivos de leis antigas (e antiquadas) são considerados como vigentes, como do Código Penal e do Código de Processo Penal, apesar de estarem em desacordo com a nova Constituição.

Posteriormente, editaram-se novas leis que representam um retrocesso na evolução do Direito brasileiro, dentre as quais a famigerada Lei dos Crimes Hediondos, quando proíbe a liberdade provisória e a progressão de regime de cumprimento da pena.

Uma vez que o legislador federal não resolve o problema, editando novas leis em lugar dessas, e, ao contrário, vez por outra editando outras, também eivadas de inconstitucionalidade, cabe ao Judiciário reconhecer as inconstitucionalidades existentes, inclusive no julgamento cotidiano de casos concretos.

Não é muito usual – principalmente na 1ª instância – os juízes declararem a inconstitucionalidade de dispositivos legais.

Ainda perduram em geral o tabu da sacralidade das leis e uma certa descrença da força da Constituição, como se as primeiras fossem sempre perfeitas e a segunda não passasse de mera declaração de boas intenções do nosso ordenamento jurídico.

As leis ordinárias muitas vezes são ordinárias no sentido pior da palavra, havendo muitas que priorizam interesses das classes dominantes, como o decreto-lei 911/65, que privilegia as multinacionais montadoras de veículos automotores, e a lei que instituiu o FGTS, a qual extinguiu, na prática, a estabilidade no emprego, que representava uma das mais importantes conquistas dos trabalhadores celetistas.

É preciso que se discuta mais o teor da legislação, revogando-se direta ou indiretamente as normas incompatíveis com a Lei Maior.

Não pode haver no Direito nenhuma norma contrária aos grandes princípios, como o da dignidade da pessoa humana e outros.

Mesmo nos países mais adiantados se abrem exceções a esses princípios editando-se regras draconianas normalmente justificando-se na segurança do Estado, mas essa política não passa de um erro.

Sempre que se autoriza a degradação de seres humanos e o desrespeito ao meio ambiente os resultados são ruins para o futuro.

Os seres humanos são mais importantes que a estrutura estatal, esta última que facilita a vida humana, mas não é a única forma de se viver, conforme se pode ver pela organização social dos índios, que vivem sem um Estado organizado.

A quantidade excessiva de leis prejudica seu conhecimento pela população e pelos operadores do Direito. Aliás, os próprios legisladores ficam muitas vezes perdidos no oceano de leis e regulamentos.

Na época de NAPOLEÃO BONAPARTE, os juízes franceses eram obrigados a ser meros “bouches de la loi”, mas agora não.

Juiz tem de fazer Justiça e não trabalhar como mero cumpridor de regulamentos. 


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

LUIZ GUILHERME MARQUES: Juiz de Direito da 2ª Vara Cível de Juiz de Fora (MG).

Redação Prolegis
Redação Prolegishttp://prolegis.com.br
ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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