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DIREITO DAS SUCESSÕES
Bens adquiridos após separação de fato não integram a partilha

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DECISÃO: STJ – Os bens adquiridos após a separação de fato não devem ser divididos. A decisão foi unânime entre os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial interposto por uma mulher que buscava incluir na partilha do divórcio bens adquiridos pelo ex-marido após a separação de fato.

 

Casados sob o regime de comunhão parcial de bens desde 1988, marido e esposa se separaram em 2000. Segundo a mulher, quatro meses despois ele adquiriu dois veículos e constituiu firma individual. Ela então moveu ação anulatória de ato jurídico, com pedido liminar de bloqueio de bens.

 

Os pedidos foram julgados procedentes em primeiro grau, mas o Tribunal de Justiça reformou a decisão. Segundo o acórdão, “o cônjuge casado, qualquer que seja o regime de comunhão – universal ou parcial –, separado de fato, pode adquirir bens, com esforço próprio, e formar novo patrimônio, o qual não se integra à comunhão, e sobre o qual o outro cônjuge não tem direito à meação”.

 

Jurisprudência

 

No recurso ao STJ, a mulher alegou que 120 dias não seriam suficientes para cortar a comunhão de bens. Para ela, somente o patrimônio adquirido após prolongada separação de fato seria incomunicável. Ela citou ainda precedente do STJ no qual esse entendimento foi aplicado.

 

O ministro Raul Araújo, relator, reconheceu o dissídio jurisprudencial, mas destacou que o entendimento consolidado no STJ é no sentido de que a separação de fato põe fim ao regime de bens.  

 

O relator esclareceu que em casos de separações recentes, ainda que não mais vigendo a presunção legal de que o patrimônio resulta do esforço comum, é possível ao interessado demonstrar que os bens foram adquiridos com valores decorrentes desse esforço comum. No entanto, o ministro afirmou que não foi esse o caso dos autos.  REsp 678790


FONTE:  STJ, 14 de julho  de 2014

Dos Crimescontra os bens imóveis e semoventes

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* Nilton de Souza Vivan Nunes

INTRODUÇÃO  

DOS CRIMES CONTRA A POSSE E DE BENS IMÓVEIS E SEMOVENTES

 

Algumas condutas que envolvam a propriedade imóvel ou semovente são classificadas e inseridas como crimes contra o patrimônio, estes previstos no ordenamento jurídico brasileiro. Normalmente associamos a palavra propriedade com a riqueza, principalmente à propriedade imóvel e de grandes rebanhos, sendo estes importantes e de fácil aquisição para aqueles que estão em melhores condições financeiras do que para a maioria das pessoas, apesar destas também desejarem adquiri-los. Porém, alguns tentam obtê-las de forma ilícita.

Importante fazermos um retrato social sobre propriedade imóvel no Brasil antes de falarmos de crimes, pois a propriedade é freqüentemente associada ao capitalismo e muitas vezes, a falta dela é vista como uma injustiça social, geralmente é resultado da exploração e ambição da minoria.

Existe crime praticado por uma ou mais pessoas, mas também vemos, diariamente, matérias jornalísticas que destacam invasões em propriedades imóveis, sejam nos centros urbanos ou nas áreas rurais, aparentemente todas essas condutas são ilícitas, e, normalmente, elas são lideradas por grupos organizados, exemplo é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em áreas rurais e nas áreas urbanas temos o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST). Esses grupos organizados que praticam os crimes contra a propriedade consideram que esta é uma preocupação social e pensam que nós deveríamos nos interessar mais pelo compartilhar e repartir, pois o principal argumento é que a propriedade deve cumprir sua função social. Hoje é comum a expressão globalização, onde obter riquezas parece ser uma necessidade contínua, por isso vivemos indagando se os indivíduos deveriam ter direito de possuir grandes porções de terra, minas, lagos, florestas, bancos, rebanhos bovinos, suínos etc. Com isso criamos um grande impasse e debate social.

Ao longo da história já tivemos inúmeras situações sobre o direito à propriedade, de um lado aqueles que defendem abolir a propriedade privada, como o comunismo defendido por Karl Marx e Friedrich Engels. Já do outro lado, temos os defensores da propriedade privada, que é maioria na atualidade. No Brasil, temos uma constante discussão sobre o assunto, seja através da reforma agrária ou de outras políticas que facilitam, principalmente, a obtenção da propriedade imóvel.

Debates a parte sobre a história e de abolir ou não a propriedade privada, o importante é estudarmos os mecanismos legais em defesa da propriedade no nosso país, seja ela pública ou privada. A nossa Carta Magna estabelece claramente o direito de propriedade:

Art. 5º (…)   XXII – é garantido o direito de propriedade;

A mesma Constituição Federal também contempla vários direitos que envolvem a função social da propriedade:

Art. 5º (…)   XXIII – a propriedade atenderá a sua função social;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: (…)   III – função social da propriedade;

Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.  (…)   § 2º – A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor.

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei….

Além das mencionadas acima, temos diversas outras normas que estabelecem regras sobre a propriedade e, no momento em que alguém é prejudicado, ou sentindo-se como tal, serão elas que darão amparo legal, exemplo é o Código Penal, utilizado para situações que caracterizam crimes, como veremos nos tópicos seguintes, mas antes vamos entender um pouco os conceitos de posse, propriedade imóvel e semovente.

Breve histórico sobre o direito de posse e propriedade imóvel e semovente. 

1.1   Da posse

O desenvolvimento da ideia de posse no direito romano constitui-se em uma das mais árduas e difíceis investigações históricas dos pesquisadores do Direito ao longo da humanidade. Várias são as teorias imaginadas para explicar a diferenciação entre posse e propriedade do direito romano. A principal corrente acerca do assunto defende que a posse desenvolveu-se em Roma, como uma consequência do Direito de Clientela. Os patrícios faziam concessões de terras aos seus clientes, conferindo-lhes a posse e reservando a propriedade. Os clientes, não podendo defender a terra como proprietário, defendiam-na como se fossem.

Muito se discute acerca do conceito mais adequado a ser dado para a posse, variando de acordo com a exigência ou dispensa de certos elementos caracterizadores. Na apresentação do conceito de posse, define-se posse como sendo o poder físico, material, de fato, sobre uma coisa corpórea, distinto e separado do poder jurídico, propriedade, sobre ela, evidenciando a vinculação da posse ao fato e da propriedade ao direito .

Duas são as principais teorias: a subjetiva e a objetiva. Na teoria subjetiva, só se tem efetivamente a posse quando reunidos o “corpus”, poder corpóreo sobre a coisa, o efetivo domínio material sobre ela e o “animus domini”, um elemento psíquico que, no direito justiniano, é o desejo de ser proprietário ou de se transformar em dono da coisa. Assim, é necessário que o possuidor tenha a vontade de ser proprietário da coisa, onde, sem a qual estaria configurada uma mera detenção. Essa teoria exige, pois, para que o estado de fato da pessoa em relação à coisa se constitua em posse, que ao elemento físico, “corpus”, venha juntar-se a vontade de proceder à coisa como procede ao proprietário, “affectio tenendi”, mais a intenção de tê-la como proprietário, “animus domini”.

A teoria objetiva sustenta que é necessário para a posse apenas o “corpus” e o “animus tenendi, ou seja, a vontade de possuir. Assim, para ser possuidor, prescindível é a caracterização do “animus domini”. Nessa concepção, a distinção entre “corpus” e “animus” é irrelevante, pois a noção de “animus” já se encontra na de “corpus”, sendo a maneira como o proprietário age em face da coisa que é possuídor.

A posse pode ser mantida ou restituída através de ação própria, às atuais ações possessórias.

1.2   Da propriedade

A propriedade pode ser conceituada como sendo o pleno poder sobre a coisa, “plena in res potestas”.

Tal conceito decorre de somente a propriedade poder apresentar todos os direitos sobre a coisa, ou seja, o direito de possuir, “jus possidendi”, o direito de usar, “jus utendi”, o direito de usufruir, “jus fruendi”, e o direito de modificá-la, reformá-la ou vendê-la, “jus abutendi”.

A propriedade é um direito real, absoluto, exclusivo, oponível e irrevogável, salvo nos casos lícitos de limitação, uma vez que recai sobre uma coisa. A propriedade é assim o mais amplo poder que um sujeito pode exercer sobre a coisa, a mais perfeita relação de subordinação de um bem a um particular. Tem, desta forma, ampla proteção jurídica, como o direito de reavê-la de quem injustamente a possua ou detenha. Pode exercer todos os direitos sobre a coisa, dentro de certas limitações.

O direito romano, apesar de defender o caráter absoluto do direito de propriedade já trazia algumas destas limitações, aumentadas com o tempo em função do caráter social que deve ter a propriedade e, entre as primeiras, temos a limitação de altura de edifícios, já nas públicas, podemos falar da tolerância da navegação em seus rios pelos proprietários.

Hoje, nossa carta magna consagra a função social da propriedade como um de seus preceitos básicos, o que legitima, dentre outras possibilidades, a desapropriação de áreas rurais improdutivas para fins de reforma agrária, etc.

Propriedade é uma palavra que as pessoas associam freqüentemente com riqueza, algo que é importante para aqueles que estão em melhores condições do que a maioria. Propriedade é freqüentemente associada ao capitalismo e é vista como um dos frutos amargos da exploração. Muitos perguntam se os indivíduos deveriam ter direito de possuir grandes porções de terra, minas, lagos, florestas e bancos. Muitos formadores de opinião consideram que a propriedade é uma preocupação materialista e pensam que nós deveríamos nos interessar mais pelo doar e pela compaixão.

1.3   Do semovente

Semovente é a definição dada pelo Direito ao animal, normalmente de rebanho como bovino, ovino, suíno, caprino, equino etc., que constituem patrimônio.

O termo significa: "aquele que anda ou se move por si", mas juridicamente se aplica àqueles animais que são uma propriedade (e não sendo móveis ou imóveis, justificam uma classificação exclusiva) passíveis de serem objeto das transações realizadas como o patrimônio em geral (como, por exemplo, venda ou execução judicial, na medida da possibilidade de seu arrolamento como objeto de penhora).

 

2.   Crimes previstos no Código Penal


No Capítulo III, Título II, o Código Penal volta sua atenção para a posse e a propriedade de imóveis e para a propriedade de semoventes. Busca, principalmente, proteger o patrimônio dos agricultores e pecuaristas, embora possa haver incidência típica também em relação à propriedade imobiliária urbana.

Os crimes definidos são a alteração de limites (art. 161, caput), a usurpação de águas (art. 161, I), o esbulho possessório (art. 161, II) e a supressão ou alteração de marca em animais (art. 162). Detalhemos cada um a seguir:

2.1   Alteração de limites

A definição típica está no caput do art. 161: “suprimir ou deslocar tapume, marco, ou qualquer outro sinal indicativo de linha divisória, para apropriar-se, no todo ou em parte, de coisa imóvel alheia”. A pena é detenção, de um a seis meses, e multa.

O bem jurídico protegido é a posse e a propriedade de coisa imóvel. É, portanto, o patrimônio imobiliário.

Sujeito ativo do crime é qualquer pessoa que queira apropriar-se da propriedade alheia, entendendo a doutrina que só pode ser o possuidor ou o proprietário do imóvel vizinho. O promissário comprador pode realizar uma das condutas para ampliar a área que vai adquirir.

Sujeito passivo é o possuidor ou proprietário do imóvel sobre o qual recai a conduta típica.

Duas ações podem caracterizar a conduta: suprimir ou deslocar tapume, marco ou sinal indicativo de linha divisória. Suprimir é destruir, fazer desaparecer, eliminar, podendo o agente utilizar qualquer meio, inclusive o fogo. Deslocar é alterar a posição no espaço, mudar de lugar, transferir, transportar de um lugar para outro. Por tapumes devem-se entender as sebes vivas, as árvores, as plantas que servem de marco divisório, os muros, as cercas, de arame ou de madeira, as valas ou banquetas, como menciona a lei civil (art. 1297, §§ 1º e 2º do Código Civil).

Marco é o objeto de madeira, pedra ou concreto de cimento, fixado no chão para a determinação de pontos da linha divisória entre dois imóveis.

Por sinais indicativos de linha divisória deve-se compreender toda e qualquer coisa que sirva para demarcar a linha de divisa entre duas propriedades ou posses imobiliárias, assim um rio, uma estrada, uma determinada árvore de porte, um acidente natural, um fosso, uma lagoa, uma grota, uma gruta ou um monte de pedra.

Linha divisória é a linha de separação contínua, reta, quebrada ou curva, entre um imóvel e todos os outros que lhe são contíguos, que se materializa, no espaço terrestre, através de tapumes, marcos e outros sinais materiais. Realizada a conduta em qualquer de suas modalidades a linha divisória resta alterada, diminuída a área da propriedade e posse, acrescendo-se, de conseqüência, a quantidade da área contígua.

A propriedade ou posse cuja área fica diminuída deve ser alheia, não pertencendo, nem em parte, ao agente.

Sendo a propriedade uma comunhão, em que vários condôminos têm suas posses perfeitamente individualizadas e delimitadas, pode existir o crime em relação tão somente à posse do condômino vizinho, que é alheia. A propriedade é comum, mas as posses são individualizadas.

Se a propriedade ou posse pertence ao próprio agente o crime será exercício arbitrário das próprias razões (art. 345), ressalvada a hipótese de legítima defesa da posse. O elemento subjetivo é o dolo, pois o agente deve ter consciência também de que a posse ou propriedade não lhe pertence. Quando o agente altera o limite acreditando pertencer-lhe a área a ser acrescida à sua cometerá o crime de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345,CP). Deve agir com o fim de apropriar-se da totalidade ou de parte da posse ou propriedade alheia.

Quando o agente, alterando a linha divisória entre dois imóveis na pendência de um processo judicial, pretende induzir o perito ou o juiz a erro, o crime será o de fraude processual, definido no art. 347 do Código Penal, mais severamente punido.

A consumação acontece quando o agente suprime ou quando desloca o tapume, marco ou sinal indicativo da linha divisória, não sendo necessário que se aproprie da propriedade alheia. Haverá tentativa se houver interrupção do processo executório, por circunstâncias alheias à sua vontade.

Se para realizar a conduta o agente emprega violência contra pessoa, responderá por dois crimes, em concurso material: a alteração de limites e a lesão corporal ou homicídio, tentado ou consumado.

Estabelece o parágrafo 1º do artigo 1.210 do Código Civil:

Art. 1.210  (…)  §1º “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.”

Tem, portanto, o possuidor de imóvel o direito de obstar, por seus próprios meios, o esbulho de sua área. Assim, se alguém invade o imóvel, nele destruindo, deslocando ou fincando marcos ou tapumes ou extremando divisas, pode o possuidor, desde que com presteza e rapidez, ele mesmo, em vez de buscar a proteção possessória jurisdicional, reagir, com suas próprias forças, à invasão, restabelecendo a integridade da área esbulhada. Crime algum cometerá, nem o exercício arbitrário das próprias razões, desde que sua conduta não ultrapasse os limites da necessidade para a autoproteção possessória.

A ação penal é de iniciativa privada no caso de propriedade privada e se não houver violência. Será pública incondicionada se o fato tiver sido praticado com violência contra a pessoa ou se for propriedade pública agredida. Em qualquer hipótese, a competência é do juizado especial criminal, estadual ou federal, se a propriedade é da União. É considerado crime de menor potencial ofensivo, pois a pena máxima não é superior a dois anos, consoante o disposto no art. 61 da Lei nº 9.099/95.

2.2   Usurpação de águas

É típica a conduta de quem “desvia ou represa, em proveito próprio ou de outrem, águas alheias” (art. 161, I, CP). A pena é detenção, de um a seis meses, e multa.

O bem jurídico protegido é o patrimônio, em relação ao direito do proprietário à utilização das águas particulares ou comuns.

Qualquer pessoa pode ser sujeito do crime. Sujeito ativo é quem desvia ou represa as águas, seja vizinho ou não do imóvel por onde elas correm. Sujeito passivo é o titular do direito de uso, gozo ou fruição das águas.

Duas são as condutas típicas: desviar ou represar. Desviar é modificar o curso natural da água, alterando, no espaço terrestre, o leito pelo qual elas correm ou fluem. Executa-se por vários meios, construindo-se canais ou valas por onde elas possam escoar ou com a utilização de tubulações e equipamentos mecânicos, como bombas, para alterar o curso natural, não sendo necessário que o desvio seja da totalidade das águas correntes. Represar é conter as águas em seu próprio leito, impedindo a continuidade de sua fluência natural, mantendo-as armazenadas em barragem, represa ou reservatório.

Águas alheias que estejam naturalmente contidas em lagoas ou lagos estanques não podem ser represadas, porque assim já se encontram, nem desviadas, porque não fluem por um curso que possa ser modificado. Podem, todavia, ser captadas, mas o tipo não emprega expressão equivalente ao verbo captar. Caso sejam apropriadas, por via de mecanismo de sucção movido por energia elétrica, eólica ou até pela força gravitacional, creio que o fato se subsumirá ao tipo de furto, porque nesse caso a conduta é a de subtrair coisa alheia móvel, desde, é óbvio, que não sejam águas de uso comum de todos.

Há elementos normativos que regulam o tema de águas alheias, um é o Código Civil, nos artigos 1.288 ao 1.296, o outro é o Código de Águas, Decreto nº 24.643/34.

As águas são públicas ou particulares. As públicas podem ser de uso comum ou dominicais, e as particulares são as nascentes e todas as águas situadas em terrenos particulares, com exceção das classificadas como de uso comum de todos, as públicas e as comuns. Assim, são alheias as águas que não sejam do agente, nem as águas comuns.

Se o agente emprega violência contra a pessoa, haverá concurso material do crime de usurpação de águas com o crime contra a pessoa, lesão corporal ou homicídio, tentado ou consumado.

O elemento subjetivo é o dolo. O agente deve ter consciência da conduta e também de serem as águas alheias e vontade livre de desviá-las ou represá-las, com o fim de obter proveito para si ou para outra pessoa. Não se exige que haja prejuízo efetivo para a vítima. Se o agente age impelido com o fim de prejudicar a vítima, sem o de obter proveito, causando efetivo prejuízo à propriedade alheia, poderá incidir o tipo do art. 163, CP (Dano – destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia).

Se o agente atua por engano, imaginando, por exemplo, ter direito ao desvio ou represamento da água, haverá erro de tipo, excludente do dolo, mas poderá responder por exercício arbitrário das próprias razões (art. 345, CP).

Consuma-se com o desvio ou o represamento das águas alheias, não sendo necessária a obtenção da vantagem pretendida pelo sujeito, para si ou para outra pessoa.

A tentativa é perfeitamente possível quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

A ação penal é de iniciativa privada, se forem águas particulares e não houver violência. Será pública incondicionada se o fato tiver sido praticado com violência contra a pessoa ou se houver desvio ou represamento de águas públicas. Em qualquer hipótese, a competência é do juizado especial criminal, estadual ou federal, se houver interesse da União. É considerado crime de menor potencial ofensivo, pois a pena máxima não é superior a dois anos, consoante o disposto no art. 61 da Lei nº 9.099/95.

2.3   Esbulho possessório

Comete esbulho possessório quem “invade, com violência a pessoa ou grave ameaça, ou mediante concurso de mais de duas pessoas, terreno ou edifício alheio, para o fim de esbulho possessório”. A pena é detenção, de um a seis meses, e multa. O bem jurídico protegido é a posse dos bens imóveis, o patrimônio imobiliário, tutelada, ainda, a integridade corporal, a saúde e a liberdade individual.

Sujeito ativo é qualquer pessoa que invade o terreno ou o edifício alheio.

Sujeito passivo é o possuidor do imóvel.

O núcleo do tipo é o verbo invadir, no sentido de entrar ostensivamente no interior do terreno ou do edifício. É nele penetrar, ingressar. Realiza-se o crime se a invasão se der com o emprego de violência ou grave ameaça contra pessoa ou mediante o concurso de, pelo menos, três pessoas. Há violência quando o agente provoca lesões corporais ou quando pratica vias de fato. A grave ameaça é a violência moral.

Havendo concurso de três ou mais pessoas, o agente e mais três, no mínimo, não é necessário o emprego de violência ou grave ameaça. Não significa dizer que os quatro devem estar presentes na invasão, podendo dois invadirem, permanecendo dois a distância ou um deles sendo apenas o autor intelectual. A norma fala em concurso e não em prática ou execução do procedimento típico. Deve o bem imóvel invadido ser alheio, não podendo pertencer, nem em parte, ao agente. Pode ser o imóvel particular ou público.

Se o imóvel invadido for objeto de financiamento pelo Sistema Financeiro da Habitação, incidirá a norma do artigo 9º da Lei nº 5.741, de 1º de dezembro de 1971, que comina pena de detenção de seis meses a dois anos e multa, também será isento de pena se desocupar o imóvel espontaneamente, conforme estabelece:

 Art . 9º   Constitui crime de ação pública, punido com a pena de detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa de cinco a vinte salários mínimos, invadir alguém, ou ocupar, com o fim de esbulho possessório, terreno ou unidade residencial, construída ou em construção, objeto de financiamento do Sistema Financeiro da Habitação.

§ 1º   Se o agente usa de violência, incorre também nas penas a esta cominada.

§ 2º   É isento da pena de esbulho o agente que, espontaneamente, desocupa o imóvel antes de qualquer medida coativa.

Além do dolo, o agente deve agir com o fim de esbulho possessório. Esbulhar a posse é tomar a posse do imóvel. É substituir-se ao antigo possuidor, tornando-se o possuidor. O esbulho pode ser total ou parcial, conforme alcance a integridade ou apenas parte da posse da vítima.

A consumação ocorre com a invasão e não com a perda da posse pela vítima, que será tão somente o exaurimento do crime.

A tentativa é possível se o agente não consegue invadir, ingressar na posse alheia.

Havendo emprego de violência, será reconhecido o concurso material do crime de esbulho possessório e do crime contra a pessoa, lesão corporal ou homicídio, tentado ou consumado.

A ação penal é de iniciativa privada se tratar de propriedade privada e não houver violência. Será pública incondicionada se o fato tiver sido praticado com violência contra a pessoa ou se for pública a propriedade agredida. Em qualquer hipótese, a competência é do juizado especial criminal, estadual ou federal, se a propriedade é da União. É considerado crime de menor potencial ofensivo, pois a pena máxima não é superior a dois anos, consoante o disposto no art. 61 da Lei nº 9.099/95.

2.4   Supressão ou alteração de marca em animais

A descrição típica está no art. 162 do Código Penal: “suprimir ou alterar, indevidamente, em gado ou rebanho alheio, marca ou sinal indicativo de propriedade”. A pena é detenção, de seis meses a três anos, e multa.

A norma protege a propriedade de semoventes, gado ou rebanho, portanto, tutela o patrimônio.

Sujeito ativo do crime é quem realiza a conduta. Sujeito passivo o proprietário do gado ou do rebanho.

Realiza-se o crime com uma das seguintes ações comissivas: suprimir, que significa desfazer, destruir, ou alterar, no sentido de modificar, dar nova feição à marca ou sinal indicativo de propriedade.

É costume e de direito do proprietário marcar os animais, nos próprios corpos, com a utilização de desenhos, letras, geralmente as iniciais do proprietário, números, que são impressos na pelagem, a qual é queimada por ferro em brasa ou através de produtos químicos. Também se marca animal com a fixação de artefatos ou etiquetas, de metal ou outro material, indicando sua propriedade. A marcação de animais é regulada pela Lei nº 4.714/65, todavia não é indispensável que a marca no animal tenha sido feita com observância de seus dispositivos. A marca deve ser reconhecida como sinal indicativo de quem seja o proprietário do animal, podendo tal prova ser feita de toda forma em direito admitido. Qualquer sinal que indique ser o animal de propriedade de alguém pode ser alterado ou suprimido, incidindo a norma penal. O animal deve estar em meio a gado ou rebanho, expressão utilizada que significa o conjunto de animais de grande e de pequeno porte, respectivamente. Assim há gado bovino, gado eqüino, e rebanho caprino, rebanho suíno etc. Basta a supressão de uma marca ou sinal em um dos animais do gado ou do rebanho.

O elemento normativo indevidamente deve ser verificado, não havendo crime quando o agente age autorizado pelo proprietário ou porque adquiriu o animal. Deve ainda o animal estar em gado ou rebanho alheio, ou seja, que não pertença ao agente.

O crime é doloso. O dolo deve abranger não só a conduta e o resultado, mas os dois elementos normativos: a ilicitude da conduta e a condição de ser alheio o animal. Haverá erro de tipo quando o agente supõe-se autorizado a suprimir ou alterar a marca ou ainda quando imagina tratar-se de animal de sua propriedade. Diverge a doutrina acerca da necessidade da presença do fim de lesionar o patrimônio alheio. Basta, penso, o fim de, destruindo ou modificando a marca, estabelecer a dúvida sobre quem seja o verdadeiro proprietário do animal, expondo a perigo o direito de propriedade. O crime pode ser meio para a realização do delito de furto de animais, denominado “abigeato", ou ser “post factum” impunível de furto ou apropriação indébita anterior, que o absorve.

Consuma-se com a supressão ou alteração da marca, possível a tentativa quando o agente, prestes a realizar a conduta, é interrompido por ação de terceira pessoa ou pela fuga do animal.

A ação penal é de iniciativa pública incondicionada, competente o juizado especial criminal. É possível a suspensão condicional do processo penal, consoante o disposto no art. 89 da Lei nº 9.099/95. Será ação penal pública condicionada à representação do ofendido, quando a vítima for o cônjuge separado, irmão, tio ou sobrinho com quem o agente coabite (art. 182, I a III, CP).

3.   Esbulho possessório na esfera do Direito Civil

                        Já falamos sobre esbulho possessório previsto no inciso II do artigo 161 do Código Penal, agora vamos reforçar o conceito de esbulho possessório e o que prevê o Código Civil.

Esbulho é o ato pelo qual uma pessoa perde a posse de um bem que tem consigo (sendo proprietário ou possuidor) por ato de terceiro que a toma forçadamente, sem ter qualquer direito sobre a coisa que legitime o seu ato. É o caso, por exemplo, de pessoa que entra sem autorização em terreno de outrem, e o ocupa, sem que a posse do terreno lhe tenha sido transmitida por qualquer meio.

Podemos dizer que a invasão de propriedade é um esbulho possessório, mas este não se limita aos casos de invasão de propriedade. Até mesmo porque o esbulho viola a posse e não a propriedade em si. Por exemplo, um imóvel locado que é invadido: neste caso, quem sofre o esbulho é o locatário, que detém a posse do imóvel, e não o proprietário. Se o proprietário viola a posse legitimamente exercida por outrem (como o locatário, ou comodatário do imóvel, quando vigente o contrato) ele próprio pratica esbulho (art. 1197, do Código Civil). Ou seja, o direito violado com o esbulho é o direito do possuidor e não necessariamente do proprietário (porque este pode não estar exercendo a posse direta do bem). Sua previsão legal está no art. 1210, do Código Civil.

Reforcemos o que dispõe o artigo 1.210, parágrafo 1º, do Código Civil:

Art. 1.210  (…)  § O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse.

 

Ou seja, a pessoa que sofre esbulho pode, se agir de imediato, reaver a posse do bem por ato próprio, desde que não extrapole o necessário. Não pode, por exemplo, violar a integridade física do esbulhador, ou atentar contra sua vida, para reaver a posse do imóvel.

Não reavida a posse dessa forma, poderá o esbulhado obter a restituição da posse, através da ação de reintegração de posse, regulada pelos artigos 920 a 931 do Código de Processo Civil. Deverá estar assistido por advogado, que proporá a ação perante o juízo competente, podendo obter liminar para a reintegração.


CONCLUSÃO

Os crimes contra o patrimônio, em especial contra a propriedade imóvel e semovente, tem tipificação penal, porém, para a propriedade imóvel será preciso conhecer em detalhes as circunstâncias do fato para o perfeito enquadramento. Isto porque somente se configura um crime quando todos os elementos do tipo penal (ou seja, todos os elementos previstos em lei que compõem um determinado crime) estiverem presentes. E, mesmo preenchendo todos os requisitos, muitos prejudicados não se socorrem do Direito Penal, mas sim do Direito Civil, já que muitos casos têm origem privada e necessita da provocação do prejudicado mediante queixa para o procedimento penal, conforme disposto no parágrafo 3º do artigo 161 do Código Penal:

Art. 161 (…) § 3º – Se a propriedade é particular, e não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa.

Outras questões impedem o procedimento penal, previstos nos artigos 181 e 182, do Código Penal, o primeiro isenta cônjuge, ascendente e descendente de pena, e no segundo, quando envolve certos parentes, há imposição para proceder mediante representação. Ambos os casos direcionam os prejudicados ao amparo do ordenamento civil, reforçando e demonstrando maior eficiência que a proteção penal. Lembrando que o Direito Penal é a "ultima ratio", o último recurso legal que se deve utilizar. O amparo no Direito Civil está disposto nos termos dos artigos 1210 a 1224 do Código Civil, assim como artigos 920 a 931 do Código de Processo Civil. As ações possessórias instruídas pelo Código de Processo Civil, são instrumentos mais ágeis e de resultado mais efetivo do que o acionamento da perseguição penal.

Diante da complexidade das questões possessórias, não seria errado comentar que a autoridade policial não está formada e legitimada para decidir sobre a solução a ser dada com a sua intervenção, podendo, por exemplo, retirar o real possuidor, deixando no local o real esbulhador, pois os próprios juízes têm uma difícil missão de julgar, mesmo com produção de provas com documentos, testemunhas e laudos periciais. Podemos dizer que nem mesmo a simples apresentação do título de propriedade é o suficiente para provar o domínio e posse, já que um contrato de locação pode dar o direito ao locatário e não ao locador, e este pode ser o esbulhador.


Importante registrar que o conceito penal de esbulho possessório é diverso e mais restrito do que o civil, pois, para que haja esbulho possessório, no campo penal, é necessário que a invasão tenha por fim o esbulho, e seja praticada, em terreno ou imóvel alheio, com violência à pessoa ou grave ameaça, ou, ainda, em concurso de pessoas, entretanto, para a sua configuração, exige-se o elemento subjetivo do injusto, ou o chamado dolo específico, no caso, consistente na vontade de apropriar-se de coisa imóvel alheia. Considerando que, atualmente, a maioria das imputações de esbulho possessório resultam de ocupações coletivas de imóveis rurais, normalmente improdutivos, importante se faz ressaltar a legitimidade constitucional da atuação dos movimentos agrários, visando a implantar a reforma agrária e que não caracteriza crime contra o patrimônio. Tal ensinamento foi registrado no voto do então Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, proferido no julgamento do "habeas corpus" nº 5.574/SP:

 

“a constituição da república dedica o capítulo iii do título vii à política agrícola e fundiária e à reforma agrária. configura, portanto, obrigação do estado. correspondentemente, direito público, subjetivo de exigência de sua concretização. na ampla arca dos direitos de cidadania, situa-se o direito de reivindicar a realização dos princípios e normas constitucionais. a carta política não é mero conjunto de intenções. de um lado, expressa o perfil político da sociedade, de outro, gera direitos. é, pois, direito reclamar a implantação da reforma agrária. legítima a pressão aos órgãos competentes para que aconteça, manifeste-se historicamente. reivindicar, por reivindicar, insista-se, é direito. o estado não pode impedi-lo. o modus faciendi, sem dúvida, também é relevante. urge, contudo, não olvidar o princípio da proporcionalidade – tão ao gosto dos doutrinadores alemães. a postulação da reforma agrária, manifestei em habeas corpus anterior, não pode ser confundida com o esbulho possessório, ou a alteração de limites. não se volta para usurpar a propriedade alheia. a finalidade é outra. ajusta-se ao direito. sabido, dispensa prova, por notório, o estado, há anos, vem remetendo a implantação da reforma agrária. os conflitos resultantes, evidente, precisam ser dimensionados na devida expressão. insistase. não se está diante de crimes contra o patrimônio. indispensável a sensibilidade do magistrado para não colocar, no mesmo diapasão, situações jurídicas distintas (…).” (HC Nº 5.574/SP (97.0010236-0). RELATOR: O EXMO. SR. MINISTRO WILLIAM PETTERSON. RELATOR DESIG: O EXMº SR. MINISTRO LUIZ VICENTE CERNICCHIARO. 6ª Turma: 08/04/97) 

 

 

Importante será sempre analisar o contexto de cada caso concreto para sabermos se este é enquadrado no Direito Penal. Mas, em regra, quando não há violência, podemos concluir que o melhor caminho é pelo Direito Civil, sendo a escolha mais prudente em defesa da propriedade.

 


REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

  •  CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal – parte especial – v.1. 6.ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
  •  DELMANTO, Celso. Código penal anotado. 5.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1988
  • MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal – parte especial – Arts. 121 a  234 do CP. São Paulo: Atlas, 2000.

  •  NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral / parte especial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005.


 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

NILTON DE SOUZA VIVAN NUNES, Advogado, professor universitário nas cadeiras de Direito Penal e Prática Jurídica Penal na UNIFIG Guarulhos, graduado em Ciências Jurídicas e Sociais pela UNIFIG Guarulhos, Pós graduado em Direito Processual Civil na mesma instituição; Mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada, Espanha; Doutorando em Direito Penal Internacional pela Universidade Nacional de Lomas de Zamora, Argentina.

Email:  tonnunesadvogado@hotmail.com


INCIDÊNCIA DA PRESCRIÇÃO TRABALHISTAPrescrição trabalhista é aplicável em ação ajuizada pelo empregador contra empregado

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DECISÃO: *TRT-MG – A 7ª Turma do TRT-MG manteve a decisão de 1º Grau que acolheu a prescrição total das pretensões de um grupo econômico que cobrava de um ex-empregado o pagamento de indenização por danos morais e materiais. No caso, a relação de emprego entre as partes foi reconhecida judicialmente no período compreendido entre 02/05/06 e 02/01/09. Assim, o entendimento dos julgadores foi o de que a ação ajuizada contra o trabalhador em 01/06/2011 está prescrita. 

O desembargador relator, Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto, não teve dúvidas quanto à aplicação da prescrição trabalhista, de dois anos, rejeitando a pretensão do grupo no sentido de que fosse reconhecido o período de três anos previsto no Código Civil. Conforme ponderou o julgador, esse prazo é maior que o concedido ao próprio trabalhador para ajuizar ação, o que não se pode admitir. Nesse contexto, o recurso foi julgado improcedente. 

A alegação das rés era a de que o reclamante, ex-Diretor Administrativo e Financeiro, havia assediado sexualmente uma das empregadas do grupo e praticado má gestão em sua atuação como diretor, causando prejuízos às empresas. Por essas razões, elas pediam o pagamento de indenizações por danos morais e materiais. Mas os pedidos nem chegaram a ser apreciados. É que, na visão do relator, o grupo demorou demais para ajuizar a ação, o que atraiu a incidência da prescrição.

Conforme explicou o desembargador, o artigo 114, item VI, da Constituição Federal, inserido pela Emenda Constitucional nº 45/2004, dispôs que a Justiça do Trabalho passou a ser competente para processar e julgar ações de indenização por danos morais e/ou materiais decorrentes da relação de trabalho. Nesses casos, aplica-se a prescrição prevista no artigo 7º, item XXIX, da Constituição. E isto, ainda que as pretensões sejam deduzidas pela empresa em face do trabalhador.

"Não se aplica ao caso a prescrição trienal prevista no Código Civil (art. 206, §3º, V), porquanto a pretensão reparatória das empresas decorre de supostos atos ilícitos praticados pelo trabalhador na relação de trabalho havida entre as partes, o que atrai a aplicação da prescrição trabalhista, tanto mais se reconhecida a relação de emprego", registrou o relator. Ele ratificou o entendimento de 1º Grau no sentido de que entendimento diverso ofenderia o princípio da igualdade e privilegiaria o empregador. É que, neste caso, o patrão teria três anos, para ajuizar ação contra o empregado, enquanto este tem assegurado o prazo de dois anos subsequentes à ruptura contratual para exercer o direito.

O magistrado destacou que, tanto a jurisprudência do TRT mineiro como a do TST, têm entendido da mesma forma. Ementas citadas no voto destacaram que o prazo prescricional para as partes do contrato de trabalho postularem indenização por danos morais ou materiais decorrentes da relação de trabalho é o de dois anos previsto no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal. Ademais, o fato de a ação de indenização ser ajuizada pelo empregador em face de empregado é irrelevante. Uma decisão lembrou que a Justiça do Trabalho tem normas próprias acerca da prescrição, que devem ser observadas ainda que a matéria tenha natureza civil. Segundo o entendimento, não seria justo que o empregado tivesse um prazo prescricional menor do que o concedido ao empregador.

Diante disso, a Turma de julgadores decidiu confirmar a decisão que acolheu a prescrição total e extinguiu o processo com resolução de mérito nessa parte, nos termos do artigo 269, inciso IV, do CPC.  (0001406-30.2010.5.03.0153 AIRR)


FONTE:   STJ, 16 de fevereiro de 2014.

NÃO CARACTERIZAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIATurma mantém penhora de vaga de garagem com registro próprio

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DECISÃO: *TST – A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho reafirmou a possibilidade de se penhorar vaga de garagem de apartamento considerado bem de família, desde que os imóveis tenham matrículas próprias. O entendimento reflete a jurisprudência do TST e do Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

Entenda o caso 

A ação trabalhista foi ajuizada por um auxiliar de importação que pretendia o reconhecimento de vínculo empregatício com a Brasilconnects Cultura, empresa que atua na área de eventos culturais. O trabalhador, contratado como autônomo, tinha como função inicial atuar no desembaraço alfandegário do acervo de obras de arte trazido para a exposição "Brasil 500 Anos", realizada em abril de 2000 nas comemorações dos 500 anos do Descobrimento. Posteriormente, permaneceu na empresa como auxiliar de serviços gerais, e trabalhou em outra mostra, comemorativa dos 50 da TV.

Após o reconhecimento do vínculo de emprego, o processo entrou na fase de execução, quando houve a desconsideração da personalidade jurídica da empresa e, consequente, a responsabilização de seu administrador, cujo patrimônio ficou foi penhorado para a quitação da dívida. Nesse aspecto, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) destacou que o fato de o vice-presidente da sociedade civil, sem fins lucrativos, prestar serviços de forma voluntária não impede sua responsabilização por atos de gestão que motivaram a reclamação trabalhista.

Em relação à penhora da vaga de garagem de apartamento, o TRT considerou-a legítima em razão do imóvel possuir matrícula individual no Cartório de Registro de Imóveis. Para o Regional, tal característica retira a condição de imóvel de família, não cabendo a aplicação da garantia de impenhorabilidade prevista no artigo 1° da Lei 8.009/90. Lembraram ainda que o STJ consolidou entendimento no mesmo sentido na Súmula 449.

Inconformado, o executivo recorreu ao TST por meio de recurso de revista pretendendo reformar a decisão do Regional, proferida em agravo de petição. Nessa situação, para que o TST possa modificar o decidido é necessário que a parte demonstre que houve ofensa literal de artigo da Constituição Federal, como exige o artigo 896, parágrafo 2º, da CLT, tendo em vista que o processo já está em fase de execução.

Todavia, a despeito das alegações do administrador de que não podia ser responsabilizado pelas dívidas contraídas pela sociedade civil, a Turma rejeitou a tese exposta. Isto porque não foi demonstrada a ofensa direta à Constituição Federal, uma vez que o conflito envolve apenas o exame da legislação infraconstitucional que regula a matéria, como a Lei 6.830/80, que autoriza o direcionamento da execução contra os responsáveis das pessoas jurídicas, tal como ocorre com o administrador em relação à sociedade civil (artigo 4º, inciso V, parágrafo 3º).

O relator do processo, ministro Renato de Lacerda Paiva, lembrou, ainda, que não houve ofensa ao artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição, como afirmado pelo executivo, porque lhe foram garantidos o devido processo legal, os meios de ampla defesa e o contraditório.

Em relação à penhora da garagem que tem matrícula independente do imóvel residencial, o ministro afirmou que a decisão do TRT-SP está de acordo com a jurisprudência do TST, no sentido de que a impenhorabilidade de apartamento não se estende à vaga de garagem. Uma vez mais, o ministro Renato Paiva destacou que a análise da questão passa por legislação específica.

A decisão de negar provimento ao agravo foi unânime.  (Processo: AIRR-161600-21.2003.5.02.0074)


FONTE:   TST, 17 de fevereiro de 2014. 

 

PLANO DE SAÚDE DEVE ARCAR COM TRATAMENTO MÉDICOPlano deverá arcar com tratamento fora da área de cobertura

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  DECISÃO: *TJMG – Decisão se baseou no fato de o paciente ter esgotado a chance de tratamento eficaz em Minas

“As empresas administradoras de planos de saúde deverão arcar com todo o custeio do tratamento de seus associados, independentemente de previsto em cláusula contratual ou não, ou até mesmo de carência do plano ou não.” Assim se manifestou o desembargador Wanderley Paiva, da 11ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em decisão que condenou a Fundação Forluminas de Seguridade Social (Forluz) a arcar com os custos do tratamento de um usuário do plano de saúde, a ser realizado fora da área geográfica de abrangência do contrato entre as partes.

 

O menor M.R.S., por meio de seus pais, entrou na Justiça contra a Forluz para que a instituição cobrisse tratamentos médicos a que precisava se submeter na clínica Cepisp, no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. Os pais afirmaram que, após o menor ser submetido a vários tratamentos em Divinópolis e em Belo Horizonte, sem sucesso, eles foram informados de que apenas a Cepisp possuía tratamento para a doença que o acometia: crises convulsivas de difícil controle, conhecidas como epilepsia infantil com espasmos.

 

Os pais alegaram que o caso era de extrema urgência e emergência, pois as crises convulsivas podiam provocar sequelas irreversíveis no bebê, então com sete meses de idade. A Forluz se recusava a pagar pelo procedimento, pelo fato de o Sírio Libanês se encontrar fora da área geográfica de cobertura do plano, conforme cláusula contratual.

Em Primeira Instância, o juiz Fernando Fulgêncio Felicíssimo, da 2ª Vara Cível da comarca de Divinópolis, confirmou pedido de antecipação de tutela e condenou a instituição a custear todas as despesas necessárias ao tratamento da criança, inclusive fora da área geográfica de abrangência do contrato.

 

A Forluz recorreu, argumentando, entre outros pontos, que o Código de Defesa do Consumidor era inaplicável ao caso, pois a instituição não possui fins lucrativos e era voltada para a autogestão. Afirmou ainda que a cláusula que trata da abrangência geográfica tem respaldo em legislação da Agência Nacional de Saúde (ANS), sendo, portanto, de sua responsabilidade a cobertura contratual apenas em Minas Gerais. Sustentou também que, ao contrário do estipulado na sentença, há, na rede credenciada da Forluz, o tratamento de epilepsia infantil necessário a M.

 

A instituição afirmou também que M. poderia ter efetuado o procedimento médico por meio do sistema de livre escolha, no hospital por ele requisitado, tendo direito ao reembolso das despesas realizadas fora da rede credenciada, nos limites dos valores acordados. Sustentou ainda que a sentença violava princípios constitucionais e indicava quebra do equilíbrio econômico financeiro dos ajustes celebrados entre as partes.

 

Relações contratuais

 

Na avaliação do desembargador relator, Wanderley Paiva, ainda que a Forluz seja uma associação sem fins lucrativos, ela firmou contrato de prestação de serviços, mediante pagamento, por isso o caso deveria ser visto à luz do CDC.

 

Em relação à cláusula que limitava a cobertura geográfica, o desembargador verificou que M. tentou tratamento em Minas Gerais, sem obter sucesso, tendo os próprios médicos do hospital de Belo Horizonte credenciado à Forluz sugerido o Sírio Libanês. O hospital de São Paulo, em ofício, afirmou ser a única instituição do país com equipamento com 64 canais para o tratamento necessário a M. Considerando a cláusula contratual de limitação geográfica abusiva e incompatível com a boa-fé que deve reger as relações contratuais, o relator julgou-a nula.

 

“Diante do exposto e da comprovação de que o autor/apelado tenha esgotado a chance de tratamento eficaz no estado de Minas Gerais (área de abrangência), e diante da indicação do hospital Sírio Libanês, em São Paulo, o qual dispõe de equipamento específico para o tratamento, sendo o único nosocômio do país, patente é a manutenção da sentença hostilizada”, declarou o relator.

 

Os desembargadores Alexandre Santiago e Mariza de Melo Porto votaram de acordo com o relator.  (Processo 1.0223.10.022624-8/002)

 

FONTE:   TJMG, 14 de fevereiro de 2014.

 

 


 

DIREITO À VIDA E À SAÚDEPrefeitura de Caxias do Sul (RS) terá de pagar tratamento a portador de doença incurável

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DECISÃO: *STF – O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, manteve decisão da Justiça do Rio Grande do Sul que determinou o fornecimento, pelo Município de Caxias do Sul (RS), de medicação e internação domiciliar a portador de esclerose lateral amiotrófica, doença irreversível e incurável. O município tentou cassar a determinação do Tribunal de Justiça do Estado (TJ-RS) por meio um pedido de Suspensão de Liminar (SL 618) que foi negado pelo presidente do Supremo.

O município alegou que a obrigação de arcar com os custos da medicação e da internação domiciliar representa grave lesão a interesses públicos, em especial à saúde, à ordem e à economia da cidade. Acrescentou que o regime de internação pretendido talvez não seja viável por conta das condições sanitárias da residência do portador da doença e que a regulamentação aplicável ao caso concreto – Portaria 2.029/2011 do Ministério da Saúde – não autoriza tratamento domiciliar para a condição clínica do autor do pedido. Por fim, o município argumentou que o cumprimento da decisão judicial implicaria a imposição de pagamentos imediatos a particulares, sem que esteja presente hipótese de dispensa de licitação.

 

Ao decidir, o ministro Joaquim Barbosa constatou que a liminar concedida pelo TJ-RS “reconheceu a necessidade de preservar a saúde física e intelectual [do portador de esclerose], revelando a convicção judicial de que a doença que o acomete é irreversível e incurável”. Segundo o ministro, “nesse contexto, não pode prevalecer a pretensão manifestada pela municipalidade, sob pena de, convertendo o presente [pedido de SL] em recurso, privilegiar a forma – observância de eventual regulamentação infralegal – em detrimento da necessidade inadiável, sem que exista a demonstração evidente da violação à ordem pública”.


FONTE:   STF, 14 de fevereiro de 2014.

 

OBRIGATORIEDADE DO DEPÓSITO RECURSALEmpresa perde recurso por achar que gratuidade judiciária incluía depósito recursal

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DECISÃO: *TST – Apesar de ter recebido o benefício da gratuidade judiciária, a empresa Visual Presence Marketing Integrado perdeu o direito a recorrer de uma condenação em um processo trabalhista por não ter feito o depósito recursal exigido pela Lei. A decisão foi tomada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região (DF/TO) e confirmada pela Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, sob o aparato da Súmula 128. 

O artigo 5º, inciso LXXIV, da Constituição da República assegura a assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. A partir do momento em que a parte tem reconhecida sua condição de hipossuficiência, o Estado garante a isenção do pagamento de todas as despesas processuais. Contudo, o depósito recursal não constitui despesa processual. "Ainda que se reconheça ao empregador o benefício da gratuidade judiciária, daí não segue a sua liberação da obrigação de efetuar o depósito recursal", julgou o ministro Lelio Bentes Corrêa, relator do processo no TST. (Processo: AIRR-1317-94.2012.5.10.0103).


FONTE:   TST, 16 de fevereiro de 2014.

HUMILHAÇÃO GERA DEVER DE INDENIZARRestaurante terá de indenizar atendente humilhada por gerente

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DECISÃO: *TST – Em julgamento realizado pela Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, a empresa carioca Fafato Restaurante, Bar e Pizzaria Ltda. foi condenada a indenizar uma atendente por danos morais por ter sido chamada de burra e incompetente na frente de colegas e clientes pela gerente do estabelecimento. 

Em novembro de 2006, ela entrou com reclamação trabalhista na 31ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro pedindo a indenização. Comprovadas as ofensas por meio de prova testemunhal, a empresa foi condenada ao pagamento de indenização no valor de cinco vezes a maior remuneração da atendente, que na época era de R$ 520. A defesa contestou os depoimentos e o valor fixado e disse que, pela sentença, ficou configurado o enriquecimento sem causa da trabalhadora. 

Rescisão do contrato 

Ainda, segundo o restaurante, a atendente se recusou a formalizar, por escrito, seu pedido de dispensa. "Não podíamos obrigá-la a fazer", argumentou. Os advogados da empresa disseram que ela manifestou espontaneamente sua vontade de deixar o emprego, o que deveria prevalecer sobre qualquer documento que porventura houvesse formalizado.

O argumento foi rejeitado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (RJ) em recurso apresentado pela Fafato. Segundo a decisão, o restaurante é quem deveria apresentar prova da rescisão contratual motivada pelo empregado, mediante pedido de demissão (artigo 477, parágrafo 1º, da CLT). De acordo com o dispositivo, o pedido deve ser escrito e acompanhado pelo órgão sindical a que o trabalhador está filiado.

A empresa não conseguiu o destrancamento do recurso com o agravo de instrumento apresentado no TST. Segundo o relator do processo, ministro Fernando Eizo Ono, as razões recursais foram insuficientes para alterar a decisão que negou processamento ao recurso de revista. Eizo Ono lembrou que as violações legais apontadas pela empresa não foram discutidas pelo Regional. Seu voto foi acompanhado por unanimidade pela Quarta Turma.  (Processo: AIRR-155800-66.2006.5.01.0031)


FONTE:   TST, 17 de fevereiro de 2014.

DANOS MORAIS DEVIDOS POR OFENSA À VIDA ÍNTIMAEmpregadas ofendidas e discriminadas por manterem relacionamento homossexual serão indenizadas

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DECISÃO: *TRT-MG – A orientação sexual do trabalhador diz respeito à vida íntima de cada um, não devendo sofrer qualquer tipo de ingerência e nem mesmo indagação por parte do empregador, salvo necessidades específicas e excepcionais de um ou outro cargo. Assim se expressou a magistrada Aline Paula Bonna, em sua atuação na 30ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, ao apreciar um caso em que duas empregadas, em razão da legítima orientação sexual por elas adotadas, sem qualquer relevância para o desempenho das funções, foram expostas a situações constrangedoras e preconceituosas, incompatíveis com o ambiente de trabalho, que deve ser saudável e dignificante, como ressaltou a juíza.

A situação relatada pelas trabalhadoras foi comprovada pela prova testemunhal que revelou o caráter depreciativo dos vários comentários feitos pelos empregados da empresa ré. A esse respeito, o próprio gerente disse que teria que dispensar uma ou ambas as empregadas por serem um casal de lésbicas, já que a homossexualidade delas estava gerando muitos comentários no ambiente de trabalho. Inclusive, demonstrou que um dos motoristas da empresa teria dito a uma das empregadas que "alguns minutinhos com ele as faria deixar de gostar de mulher". Contudo, conforme demonstrado pelos depoimentos colhidos, embora as empregadas tenham levado ao conhecimento da empresa as situações constrangedoras pelas quais vinham passando, a empregadora não tomou nenhuma atitude para protegê-las ou para cessar essa situação.

"Em consonância com os valores supremos da liberdade, do bem-estar e da igualdade, no âmbito de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social, consagrados no preâmbulo da Constituição da República, o inciso X de seu art. 5º consagrou a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação", destacou a juíza, frisando que, em casos como esse, o dano psicoemocional é presumido em relação ao homem médio que vivencia situação semelhante. Conforme explicou, o dano está implícito no caráter depreciativo dos comentários feitos pelos empregados da reclamada. E a empresa responde pelos atos dos seus empregados em serviço, independente de culpa (artigos 932, III e 933 do CC).

Assim, considerando as circunstâncias específicas do caso (gravidade e a duração dos fatos, a extensão dos danos e as condições financeiras das partes), e atenta á função pedagógica da reparação civil, a juíza arbitrou a indenização em R$7.000,00 para cada empregada. A empresa recorreu, mas a decisão, considerada irretocável pelo TRT de Minas, foi mantida.


FONTE:  TRT-MG, 06 de fevereiro de 2014.

TENTATIVA DE EXTORSÃOFuncionário que tentou extorquir patrão com vídeo de insetos é condenado.

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DECISÃO: *TJ-DFT – O funcionário de uma renomada rede de fast food foi condenado a 4 anos de reclusão, pelo crime de extorsão. A decisão é da 2ª Turma Criminal do TJDFT.

Consta dos autos que entre os dias 29 de novembro e 4 de dezembro de 2012, um atendente de quiosque instalado no shopping Pátio Brasil constrangeu, mediante grave ameaça, o proprietário do mesmo, com o intuito de obter para si vantagem econômica indevida. Ainda de acordo com os autos, no período e local descritos, o acusado encaminhou diversos emails para a vítima, exigindo o depósito de R$ 50.000,00 em sua conta bancária para que não fossem divulgados três vídeos gravados pelo réu, em que registrou baratas em contato direto com alimentos servidos naquele estabelecimento.

Em sua defesa, o réu alega que sua intenção era unicamente aplicar um susto na vítima para tentar resolver os problemas de higiene no local, no que tange à recorrente presença de baratas na máquina de sorvetes.

Inicialmente, a juíza da 5ª Vara Criminal registra que a materialidade e a autoria do fato são incontestes, já que o réu foi preso em flagrante e confessou o ocorrido. Ao analisar o feito, ela refuta a tese do réu – de uma simples brincadeira – , uma vez que, da leitura dos emails enviados à vítima, "vê-se que o tom das ameaças em nada se pareciam com uma brincadeira. Pelo contrário, tinham conteúdo forte, passível, com tranquilidade, de constranger alguém a ceder aos intentos do remetente". A magistrada acrescenta, ainda, que o próprio réu se contradiz quando, escreve no email "’Eu acho que você pensa que eu estou blefando, posso te provar que não estou…" deixando, assim, bem claro que sua intenção estava longe de ser uma brincadeira.

Diante dos fatos, a juíza concluiu estar devidamente caracterizado o crime de extorsão imputado ao réu, destacando ainda que se trata de "rapaz novo com astúcia já perigosa, o que requer medida suficiente de repressão à sua conduta para que não repita situações como a presente". Assim, condenou-o a 5 anos de reclusão, em regime inicial semi-aberto, e 50 dias-multa.

Em sede recursal, o Colegiado manteve a valoração negativa das circunstâncias judiciais da culpabilidade e das circunstâncias do crime, contudo reduziu a pena fixada para 4 anos de reclusão em regime aberto e 10 dias-multa, por entender que a pena inicial se mostrava desproporcional com a mínima estabelecida para o delito. (Processo: 20120111899369)


FONTE:  TJ-DFT, 07 de fevereiro de 2014.