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A atribuição para investigar atos infracionais análogos aos crimes de atribuição da Justiça Federal

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*Ravênia Márcia de Oliveira Leite

A Polícia Federal, conforme previsão constitucional possui atribuição para apurar os crimes cuja competência cabe à Justiça Federal, todavia, nos casos de atos infracionais análogos a tais crimes tal instituição declinada de sua atribuição, da mesma forma que a Polícia Civil, não raro, também o faz.

A Polícia Federal o faz argüindo o disposto na Constituição federal em seu art. 144, § 1º, I, o qual reza:

“I – apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;”

Ora, o texto constitucional afirma que a competência da polícia federal refere-se a “infrações penais”.

Segundo o ilustre Dr. Damásio de Jesus : “entre nós, doutrinariamente, o termo "infração" é genérico, abrangendo os "crimes ou delitos" e as "contravenções". Pode ser empregado o termo delito ou crime. O CP usa as expressões "infração", "crime" e "contravenção", aquela abrangendo estes. O CPP emprega o termo "infração", em sentido genérico, abrangendo os crimes (ou delitos) e as contravenções (exs.: arts. 4.o, 70, 72, 74, 76, 77, 92 etc.). Outras vezes, usa a xpressão "delitos" como sinônimo de "infração" (exs.: arts. 301 e 302).”

Para André Del Grossi Assumpção “define-se ato infracional a conduta que, praticada pelo adolescente ou pela criança, está descrita como crime ou contravenção penal (art. 103, ECA). Se por um lado não há diferença ontológica entre crime e contravenção, o mesmo não se dá entre estes e o ato infracional. Equivocado, assim, o entendimento daqueles para quem ‘…não existe diferença entre os conceitos de ato infracional e crime…”

Ainda continua o articulista: “como se sabe, o crime, segundo a doutrina finalista, é ação ou omissão típica, ilícita e culpável. Típica porque descrita no tipo legal. Ilícita porque contrária à ordem jurídica. Culpável porque censurável ao agente . Estas adjetivações configuram os elementos essenciais do delito e na falta de qualquer deles não há que se falar em crime ou contravenção. A inimputabilidade decorre do estágio ainda incompleto de desenvolvimento psíquico-moral e social da criança ou do adolescente e impede a formação da culpabilidade graças à reduzida prestabilidade à censura da norma penal, afastando-se sua incidência. Destarte, o ato do adolescente poderá ser típico e também ilícito mas não efetivamente culpável. Falar em crime é, pois, uma grande impropriedade.”(http://www.datavenia.net/artigos/Direito_Processual_Penal/processoaplicacaomedidasocieducativa.htm_).

Todavia, data máxima venia, analisando os conceitos material e formal de crime, verificamos, respectivamente que, “no sentido substancial, para Manzini, delito é a ação ou omissão, imputável a uma pessoa, lesiva ou perigosa a interesse penalmente protegido, constituída de determinados elementos e eventualmente integrada por certas condições, ou acompanhada de determinadas circunstâncias previstas em lei, e, o aspecto formal crime é um fato típico e antijurídico. A culpabilidade, como veremos, constitui pressuposto da pena.”

Como afirmou Bettiol "a punibilidade é antes uma nota genérica de todo o crime, ao passo que este, quando se apresenta estruturalmente perfeito em todos os seus elementos, é um fato punível que reclama necessariamente a pena”.

Verificando-se Doutrina e Jurisprudência nota-se a divergência com relação à apuração de atos infracionais relacionados a matéria federal.

Segundo Sydnei Alves Daniel, Oficial de Gabinete da Juíza Federal da 4a Vara/PB, “assim, cometido um ato infracional qualificado como crime, em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, incumbe a Justiça Federal o processo e julgamento de tal ato infracional e a Justiça Estadual o julgamento de ato infracional qualificado como contravenção, por força da incidência das regras que norteiam a competência em razão da matéria, de natureza absoluta, que não admitem derrogação, sendo nulos todos os atos porventura praticados, não somente os decisórios como também os probatórios” http://www.ufsm.br/direito/artigos/processo-penal/ato-infracional.htm).

No âmbito do Poder Judicário verifica-se, que tanto a Justiça Estadual, como a Justiça federal, declinam negativamente da competência. Senão vejamos:

"Analisando os autos, observo que este Juízo não detém competência para processar os autos deste inquérito policial, visto que há notícia neste feito de ato infracional, na medida em que Edson Silva Gomes, adolescente, foi flagrado no momento em que tentava efetuar o pagamento de contas com a utilização de uma cédula de R$50,00 (cinqüenta reais) aparentemente falsa, conforme consta na portaria de fls.02. Assim, a competência para processamento do inquérito policial é da Justiça Estadual, nos termos do artigo 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente.Por todo o exposto, suscito conflito negativo de competência, nos termos dos artigos 114, inciso I; 115, inciso III e 1l61 § lº, todos do Código de Processo Penal e artigo 105, inciso 1, alínea “d” da Constituição Federal, devendo a Secretaria promover a extração de cópia dos autos do presente inquérito policial, com posterior remessa ao Egrégio Superior Tribunal de Justiça, para as providências cabíveis. Ciência ao Ministério Público Federal." (fl. 80).

O Egrégio Tribunal de Justiça São Paulo no Agravo de Instrumento n.° 59.216/02, já decidiu:

“Jurisprudência-ato infracional-processo-competência – Ementa: MENOR – Agravo de instrumento – Prática de ato infracional que, em tese, caracteriza delito de fabricação falsa de papel-moeda em curso legal no país – Competência da Justiça Estadual da Infância e Juventude ainda que a conduta constitua crime cuja apuração seja da competência da Justiça Federal – Inteligência dos artigos 147 e 103 do ECA – Recurso não provido”.

O ilustre Procurador Federal, Roberto Luis Luchi Demo, afirma que “estão excluídos também da competência da Justiça Federal “os crimes federais praticados por menores inimputáveis”. As aspas se justificam: a criança e o adolescente não cometem crime ou contravenção, mas ato infracional, e nem se lhe aplica pena, mas medida socioeducativa, por isso que se submetem à jurisdição do Juiz da Infância e da Juventude”

Dessa forma, verifica-se que tanto doutrina como jurisprudência não sabem ao certo, em razão até mesmo, da ínfima existência das práticas de atos infracionais análogos a crimes de competência da Justiça Federal, a quem compete a atribuição em âmbito policial para investigação dos atos infracionais análogos aos crimes de competência da Justiça Federal.

Todavia, o egrégio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que a compete a Justiça Estadual processar os fatos, razão pela qual, preliminarmente, leva-se a crer ser a Polícia Civil também detém a atribuição para apurar os fatos. Senão vejamos:

“STJ – CC 33349 / MG Relator(a) Ministro FELIX FISCHER – TERCEIRA SEÇÃO Data do Julgamento 18/02/2002 DJ 11.03.2002 p. 164 PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. FATO PRATICADO POR MENOR. CRIME DE MOEDA FALSA. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE. Compete ao Juízo da Vara da Infância e da Juventude processar e julgar o ato infracional cometido por menor inimputável, ainda que a infração tenha ocorrido em detrimento da União (Precedentes). Conflito conhecido, competente o Juízo de Direito da Vara da Infância e da Juventude da Comarca de Teófilo Otoni-MG (Juízo suscitado).”

 

REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

Ravênia Márcia de Oliveira Leite:  Delegada de Polícia Civil em Minas Gerais. Bacharel em Direito e Administração – Universidade Federal de Uberlândia. Pós graduada em Direito Público – Universidade Potiguar. Pós-graduanda em Direito Penal – Universidade Gama Filho.

E-mail: ravenia@terra.com.br  


PESQUISAS EM SERES HUMANOSReconhecida obrigação de laboratórios em manter tratamento após término de pesquisa

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DECISÃO:  * TJ-RS  – Os laboratórios realizadores de pesquisas em seres humanos são responsáveis pelo fornecimento ao paciente do medicamento desenvolvido, mesmo após o fim da pesquisa, enquanto o uso se fizer necessário. A decisão é do Juiz de Direito José Antônio Daltoé Cezar, da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Capital, que condenou laboratórios internacionais, associados em Joint-Venture, a ressarcirem ao Estado do Rio Grande do Sul valores gastos com medicação para a criança Kauã de Godoy Chaves Pereita, de Canoas, RS, nascida em agosto de 2003 e já falecida.

As empresas Genzime do Brasil Ltda., Biomarin Pharmaceutical Ltda. e Genzyme Corporation, deverão pagar ao Estado a quantia de R$ 72.900,00 devidamente corrigida e atualizada até a data do efetivo pagamento.

Em sentença de 156 páginas, o magistrado afirma que toda pesquisa envolvendo seres humanos implica riscos ao sujeito de pesquisa e graves e sérias responsabilidades àquele que a ministra. “É intuitiva a noção de que os laboratórios denunciados são responsáveis pela manutenção do tratamento daquelas pessoas – ainda mais em se tratando de criança – que serviu de sujeito de pesquisa no experimento”.

O caso

Kauã, representado por sua mãe, ajuizou ação para que o Estado do Rio Grande do Sul fosse obrigado a fornecer continuamente o medicamento Laronidase (Aldurazyme®). A criança era portadora de Mucopolissacaridose tipo I (MPS 1), doença rara, progressiva, decorrente da deficiência da enzima alfa-L-iduronidase, necessitando fazer uso contínuo e ininterrupto da medicação.

A criança submeteu-se a um tratamento experimental no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. À época, necessitava de cerca de 12 frascos mensais, a um custo de US$ 7.200,00 ao mês. O estudo, chamado “Programa Internacional de Acesso Caritativo”, foi patrocinado pelo Laboratório Biomarin/Genzyme, de março a agosto de 2005, com fornecimento do fármaco até abril de 2006. Após o período, a família ajuizou ação para que o Estado passasse a fornecer a medicação.

Intimado a se manifestar, o Estado do RS argumentou que a continuidade do tratamento deve se estender pelo tempo necessário, em atenção às regras éticas que regem a pesquisa com seres humanos. Questionou ainda se seria ético permitir que o laboratório se utilize dos pacientes para o desenvolvimento de pesquisas que visem a obter registro de suas drogas e, alcançando o seu intento, os abandone, remetendo ao poder público o custeio de medicamento de alto valor.

O laboratório alegou que o remédio tem eficácia reconhecida na Europa e Estados Unidos, e  que a pesquisa não teve caráter experimental em Porto Alegre, mas finalidade de aprimoramento quanto à dosagem a ser aplicada. Disse que a intenção dos realizadores era fornecer o medicamento gratuitamente, por tempo limitado, até que fosse possível a compra ou reembolso do mesmo aos pacientes, tendo ocorrido uma doação, ou seja, um negócio jurídico benéfico.

Analisando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o Juiz Daltoé Cezar concluiu ser a clara a disposição contratual da responsabilidade da manutenção do tratamento após o término da pesquisa: “Após estas 26 semanas, será oferecida a continuação do tratamento com Aldurazyme aos pacientes que concluírem o estudo e que não faltarem a mais de três infusões consecutivas (se estiverem recebendo infusões semanais) ou a duas infusões consecutivas (se estiverem recebendo infusões a cada duas semanas)”. Ressalta o julgador que não está prevista a hipótese de limite no tempo para o fornecimento do remédio.

Ameaça

O Juiz considerou “ameaça” o argumento do laboratório de que, caso fosse obrigado a manter o tratamento, as pesquisas no Brasil estariam seriamente ameaçadas. “Os autos de um processo não são local adequado para ameaças desse tipo. Certamente, as pesquisas médicas com seres humanos não irão parar tão-somente em razão da necessidade de observância de normas éticas básicas e elementares”, censurou. “A liberdade total, como quer o laboratório demandando, a inexistência de qualquer responsabilidade, não se coaduna com um Estado Democrático de Direito.”

Disse ser óbvio que a decisão judicial não pode ficar alheia à realidade, seja econômica ou da realização de pesquisa, mas não pode admitir injusta e ilegal responsabilidade de lucrativos laboratórios internacionais diante de doentes dos quais se utiliza. No caso em questão, trata-se de famílias carentes, sem possibilidade de custear o tratamento.

Foi além o magistrado, advertindo que negar ao sujeito da pesquisa acesso ao medicamento após utilizar seu corpo como “laboratório vivo” é desrespeitar o paciente em sua dignidade como pessoa humana. “E este foi o tratamento lamentável dispensado pelos denunciados Biomarin/Genzyme e Genzyme do Brasil aos doentes na pesquisa realizada junto ao Hospital de Clínicas de Porto Alegre.”

E asseverou haver clara má-fé na conduta dos denunciados: “Não podem eles procurar uma pessoa, convidá-la para participar de um estudo e, depois de descoberta/aperfeiçoada a droga, exigir que o sujeito de pesquisa busque do Estado, em incerta ação judicial, o medicamento que auxiliou decisivamente a desenvolver.”

Assinalou que a relacionada entre pesquisador/pesquisado é independente da relação estatal de garantir saúde aos cidadãos. No momento em que o laboratório propõe ao doente sua participação, vincula-se ao sujeito da pesquisa, em função das gravíssimas e sérias responsabilidades que envolvem estudo em seres humanos. “Esse é o ônus da atividade empreendida pelo laboratório, que não pode ser dividido com mais ninguém.”

Por fim, rechaçou a alegação de que não há norma que obrigue o laboratório a manter o tratamento após a pesquisa, fundamentando a sentença em princípios da Bioética, Biodireito, Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito Constitucional e Direito da Criança e do Adolescente.

 

FONTE:  TJ-RS, 05 de janeiro de 2009.

 


PROTEÇÃO AO DIREITO DE IMAGEMGarçom deve ser indenizado por uso não autorizado de sua imagem em foto publicada em revista

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DECISÃO:  * TRT-MG –  Um garçom que teve sua imagem divulgada em foto promocional da churrascaria onde trabalhava – foto essa publicada em guia gastronômico de uma revista de circulação nacional – obteve na Justiça do Trabalho de Minas o reconhecimento do seu direito a receber uma indenização por uso indevido da imagem. 

A ré havia protestado contra a sentença, argumentando que os estabelecimentos não interferem na elaboração do roteiro de bares e restaurantes divulgado pela revista, de forma que não teve qualquer participação na confecção da fotografia publicada. Acrescenta que, no dia da reportagem, o próprio reclamante se ofereceu para ser fotografado mostrando um espeto de cordeiro e que, de todo modo, o acontecimento não teve o condão de causar qualquer dano à honra ou à imagem do autor.

Mas, ao apreciar o recurso, a 2ª Turma do TRT-MG manteve a indenização deferida pela sentença, com fundamento nos incisos V, X e XXVIII do artigo 5º da Constituição Federal, que asseguram a inviolabilidade do direito à imagem das pessoas, proibindo a sua reprodução sem autorização e garantindo o direito à indenização em caso de violação. A decisão se apóia ainda no artigo 20 do Código Civil, pelo qual, a publicação, exposição ou utilização da imagem de uma pessoa poderão ser proibidas, a seu requerimento, sem prejuízo da indenização que couber, quando se destinarem a fins comerciais. 

Segundo esclarece o desembargador relator, Luiz Ronan Neves Koury, o TST e o STF têm entendido que a imagem é um bem extrapatrimonial e a sua utilização não autorizada configura violação a direito personalíssimo, pouco importando se houve ou não dano à reputação: “Tratando-se a imagem de direito personalíssimo, tutelado constitucionalmente no artigo 5°, X, apenas poderá ser divulgada mediante autorização. Os nossos tribunais têm entendido que há violação ao direito de imagem com o simples fato de um veículo de comunicação retratar uma pessoa em local público, em virtude, por exemplo, de um evento de interesse público ou cultural. Caso tenha por objetivo o lucro, ou seja, a divulgação para fins comerciais, envolvendo a participação do empregado, não se tratando do próprio direito à comunicação e exercício regular do direito de informar, com maior razão torna-se devida a indenização correspondente” – frisa.

Como a empresa não comprovou que houve permissão do empregado para a utilização da sua imagem e considerando que o restaurante obteve lucro com a divulgação dos seus serviços, a Turma manteve a indenização deferida pela sentença, apenas reduzindo o seu valor para R$5.000,00. (Processo nº 00690-2007-018-03-00-3)

Retrospectiva: publicada originalmente em 11/09/2008


FONTE:  TRT-MG,  07 de janeiro de 2009

REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS COLETIVOSBanco é condenado em danos morais coletivos por não implementar programa de saúde ocupacional

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DECISÃO:  * TRT-MG – A Turma Recursal de Juiz de Fora, com base no voto do desembargador relator José Miguel de Campos, confirmou sentença que condenou uma instituição bancária a pagar uma indenização de 500 mil reais a título de reparação de danos morais coletivos, porque vinha descumprindo normas de conduta trabalhista, o que afeta direitos difusos e coletivos dos trabalhadores. É que, desde 1998, a empresa coloca em risco a saúde e a integridade física de seus empregados ao submetê-los a excessivas jornadas de trabalho, além de não implementar corretamente em seus estabelecimentos o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), instituído pela NR 7 da Portaria nº 24/94 do Ministério do Trabalho.

Para o relator do recurso, a integridade física do trabalhador é um direito da personalidade, que pode ser oposto contra o empregador: “Em geral, as condições em que se realiza o trabalho não estão adaptadas à capacidade física e mental do empregado. Além de acidente do trabalho e enfermidades profissionais, as deficiências nas condições em que ele executa as atividades geram tensão, fadiga e a insatisfação, fatores prejudiciais à saúde. Se não bastasse, elas provocam, ainda, o absenteísmo, instabilidade no emprego e queda na produtividade” – frisa.

Ele observa que as más condições de trabalho provocam riscos já conhecidos e que continuam a ser propagados. As principais causas das doenças profissionais são a duração excessiva da jornada, falta de repouso suficiente, ambiente hostil, posturas inadequadas e tensão constante. As provas do processo deixam claro que o Banco, por longo período, submeteu seus empregados a um ambiente de trabalho nocivo, em prejuízo da saúde e segurança dos seus trabalhadores.

Segundo o relator, configura obrigação do empregador promover a redução de todos os riscos que afetam a saúde do empregado no ambiente de trabalho. “De acordo com o disposto no art. 157 da CLT, cabe às empresas instruir os empregados quanto às precauções a tomar, para evitar acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, cumprindo e fazendo cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho. Reforçam a obrigação do Banco o art. 7º, XXII, da CR/88; o art. 19, § 1º, da Lei n. 8.213/91 e as disposições da Convenção n. 155 da OIT” – frisa.

A Turma também decidiu manter a condenação do Banco quanto à prática de duração excessiva da jornada de trabalho, já que as provas demonstraram reiterado desrespeito das normas trabalhistas, nesse aspecto. Foi apurado pelo Ministério Público do Trabalho que as fichas de ponto dos empregados eram entregues com os horários já preenchidos e nem todos tinham a apuração das horas extras anotadas nos cartões. Em inspeção feita pelo Ministério do Trabalho, foi também apurado que nas folhas individuais de presença não constam horas extras, sendo as anotações bem próximas da jornada contratual. Ficou claro ainda o trabalho em excesso de jornada (além das duas horas extras permitidas, que também não eram quitadas em sua totalidade), além de desrespeito ao intervalo mínimo para refeição e descanso. Para o relator, é preciso penalizar esse tipo de procedimento para que as práticas anteriores do Banco, que resultaram em inúmeras ações trabalhistas individuais nos últimos tempos, não voltem a se repetir.

A decisão está fundamentada nos artigos 1º e 21 da Lei nº 7.347/85, assim como na Lei nº 8.078/90 e nos artigos 186 e 927 do Código Civil e 5º, X, Constituição da República/88, que possibilita a reparação por dano moral a interesses coletivos e/ou difusos. “A responsabilidade civil, no âmbito trabalhista, encontra amparo na dignidade da pessoa humana do trabalhador, especificamente no preceito constitucional que tem o valor social do trabalho como um dos princípios fundamentais da República (artigo 1º, V, da Constituição da República/88)” – conclui o desembargador.

Por esses fundamentos, a Turma Recursal manteve a condenação do Banco reclamado ao pagamento de 500 mil reais a título de danos morais coletivos, bem como a obrigação a implementar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional, sob pena de pagamento de multa de 50 mil reais para cada mês em que esta obrigação for descumprida, valor esse a ser revertido ao FAT – Fundo de Amparo ao Trabalhador.  (RO nº 00325-2006-143-03-00-6)

Retrospectiva: publicada originalmente em  06/06/2008


FONTE:  TRT-MG,  05 de janeiro de 2009

As trocas de presentes

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* Arthur Rollo   

O Natal está próximo e com ele surge a expectativa de troca de presentes, que deve acontecer, preferencialmente, antes das férias. Certamente muitos só virão a trocar presentes em fevereiro, quando do fim das férias escolares.

Afinal, trocar presentes é possível ou depende da boa vontade do lojista? Existe limite de tempo para essa troca?

Primeiro, cumpre registrar que o Código de Defesa do Consumidor só obriga o fornecedor a trocar produtos com vício, chamados popularmente de defeitos, que são características que impedem ou dificultam o consumo do produto, que lhe diminuem o valor, dentre outras. O lojista estaria obrigado a trocar, por exemplo, uma camiseta furada ou desbotada, recentemente adquirida.

Trocas por esses vícios podem ocorrer dentro do prazo de garantia legal, que é de noventa dias, contados do recebimento do produto que, na grande maioria das vezes, coincide com a data da compra. No caso de produtos adquiridos através da internet, o prazo de noventa dias passa a ser contado do recebimento do produto pelo consumidor, e não da data da compra.

Não é incomum que a roupa desbote após ser lavada. Se isso acontecer, desde que o consumidor tenha seguido as instruções de lavagem, terá direito à troca.

Os cosméticos e alimentos, que são considerados produtos não duráveis, caso apresentem vícios devem ser trocados no prazo de 30 dias. Um alimento estragado, dentro do prazo de validade, pode ser considerado viciado. Alimentos com prazo de validade vencido sequer podem ser comercializados.

Não existe a obrigatoriedade legal do fornecedor trocar presentes ou produtos não correspondentes ao tamanho ou ao gosto do consumidor. Entretanto, o comércio em geral consagrou no tocante às peças de vestuário, como costume, a possibilidade de troca, desde que preservados a etiqueta do produto e o seu estado de novo. Isso se dá principalmente em datas festivas, como dia das mães, dos pais e Natal. Esse costume acaba sendo incorporado ao direito do consumidor, em razão do princípio da boa-fé.

Sem falar que a possibilidade de troca configura oferta, nos termos do art. 30 do CDC que, uma vez aceita, passa a fazer parte integrante do contrato. Traduzindo, se o lojista possibilitou a troca no momento da venda, terá que cumprir o combinado. Se não fizer voluntariamente, poderá ser compelido a fazê-lo judicialmente.

Algumas lojas limitam o prazo de troca em trinta dias. Esse prazo nos parece razoável. Todavia, se o estabelecimento possibilitar a troca, mas estabelecer prazo inferior a esse, poderá este ser interpretado como cláusula abusiva, por exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva.

O que o fornecedor não pode fazer é restringir as trocas aos dias de semana ou a horários específicos. Se o consumidor pode comprar aos finais de semana e nos horários de pico, nada mais razoável do que ele possa efetuar as eventuais trocas também nesses dias e horários. Restrições como essa são abusivas e tidas como não escritas.

Mercadorias com descontos, como as de ponta de estoque, também costumam ter restrição de troca. Essa restrição será lícita desde que o consumidor seja muito bem informado e desde que venha discriminada na nota fiscal.

Lojas de comércio popular também costumam restringir trocas. Nesse caso também será fundamental a informação.

Os estabelecimentos que só efetuam trocas em casos de vícios são menos procurados pelos consumidores, principalmente para a compra de presentes. Por isso que a impossibilidade de troca acaba sendo informada apenas quando da sua tentativa, em manifesto prejuízo do consumidor.

A regra, portanto, é que as peças de vestuário podem ser trocadas por produtos de idêntico valor ou de valor superior, complementada a diferença pelo consumidor neste caso. As exceções devem ser informadas ostensivamente ao consumidor, como através da afixação de cartaz nesse sentido no interior do estabelecimento.

Se ao vender qualquer produto, o vendedor anunciar a possibilidade da sua troca esta poderá ser exigida, nos termos do art. 30 do CDC.

Havendo a recusa na troca, pode o consumidor reclamar junto ao PROCON ou aos Juizados Especiais Cíveis, popularmente conhecidos como de pequenas causas. Naquelas demandas cujo valor não ultrapassar vinte salários mínimos, está dispensada a contratação de advogado.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA             

Arthur Rollo é mestre e doutorando em direito do consumidor pela PUC/SP.

É possível melhorar a Justiça?

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* João Baptista Herkenhoff 

Sugiro dez medidas que, a meu ver, podem aprimorar a Justiça.

1. Arejar os tribunais. – Nada de sessões secretas, exceto para questões que envolvam a privacidade das pessoas. Nada de vedar o acesso da imprensa aos julgamentos. Que todas as decisões e votos, em todos os casos, sem exceção, sejam abertos e motivados.

2. Dar rapidez aos julgamentos. – Sem sacrificar o “princípio do contraditório”, é possível fazer com que a Justiça seja mais rápida. Que se alterem as leis de modo que não se fraude a prestação jurisdicional através de recursos abusivos. Que se mudem também práticas que não estão nas leis mas estão nos hábitos e que entravam a Justiça.

3. Humanizar a Justiça. – A Justiça não lida com objetos, mas com pessoas, dramas humanos, dores. O contato das partes com o juiz é indispensável, principalmente nos casos das pessoas mais humildes que ficam aterrorizadas com a engrenagem da Justiça. O apelo de ser escutado é um atributo inerente à condição humana. Tratar as partes com autoritarismo ou descortesia é uma brutalidade.

4. Praticar a humildade. – O que faz a Justiça ser respeitada não são as pompas, as reverências, as excelências, as togas, mas a retidão dos julgamentos. Na última morada, ser enterrado de toga não faz a minima diferença. Neste momento final, a mais alta condecoração será a lágrima da viúva agradecendo, em silêncio, ao magistrado a Justiça que lhe foi feita.

5. Alterar o sistema de vitaciedade. – O magistrado não se tornaria vitalício depois de dois anos de exercício, mas através de três etapas: dois anos, cinco anos e sete anos. A cada etapa haveria a apreciação de sua conduta e aí com a participação de representantes da sociedade civil porque não seria apenas o julgamento técnico (como nos concursos de ingresso), mas o julgamento ético (exame amplo do procedimento do juiz).

6. Combater o familismo. – Nada de penca de parentes na Justiça. Concursos honestos para ingresso na magistratura e também para os cargos administrativos. Neste ponto a Constituição de 1988 regrediu em comparação à Constituição de 1946. A Constituição de 1946 proibia que parentes tivessem assento num mesmo tribunal. A Constituição de 1988 proíbe parentes apenas na mesma turma. Se o tribunal tiver cinco turmas será possível que cinco parentes façam parte de um mesmo tribunal, desde que um parente em cada turma.

7. Democratizar a eleição dos presidentes dos tribunais. – Todos os magistrados, mesmo os de primeiro grau, devem poder votar.

8. Aumentar a idade minima para ser juiz. – O cargo exige experiência de vida, não demanda apenas conhecimentos técnicos.

9. Fazer da Justiça uma instituição impoluta. – Um magistrado corrupto supera, em indignidade moral, o mais sórdido bandido.

10. O povo pressionar para que as mudanças ocorram. – Ainda que haja, como realmente há, muitos magistrados que desejam a purificação das instituições judiciárias, estes não terão força para efetuar mudanças profundas, sem o apoio e a pressão da opinião pública.


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

João Baptista Herkenhoff é Livre-Docente da Universidade Federal do Espírito Santo, professor visitante de diversas universidades e escritor. E-mail: jbherkenhoff@uol.com.br

SUSPENSÃO DE EXECUÇÃO É INDEVIDACredor não é obrigado a cumprir acordo de parcelamento de débito do qual não participou

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DECISÃO:  * TRT-MG  –  Não é possível suspender o processo de execução sem a anuência do credor, pois isso significaria forçá-lo à celebração de um acordo. Esse é o teor da decisão da 8ª Turma do TRT-MG que, acompanhando o voto do juiz convocado Paulo Maurício Ribeiro Pires, deu provimento ao recurso de uma reclamante que se viu obrigada a cumprir um acordo, do qual não participou, referente ao parcelamento do seu crédito trabalhista em execução.  

No agravo de petição interposto, a reclamante protestou contra a decisão de 1º Grau que determinou a suspensão da execução e indeferiu a realização de novas penhoras, já que havia uma proposta de pagamento parcelado apresentado pela primeira executada. Ela alegou que não há necessidade de parcelamento, pois todas as executadas possuem bens suficientes para o pagamento do débito. Afirmou ainda que não teve participação no acordo celebrado, que lhe trouxe prejuízo ao protelar o recebimento do valor total do seu crédito.  

Segundo explicações do relator, o acordo realizado perante a Vara Trabalhista não pode ser aplicado, no caso, porque sequer foi juntado ao processo, não se podendo verificar em que termos se deu a conciliação, quais as partes acordantes e a sua abrangência. Além disso, não há justificativa para a suspensão da execução, uma vez que não se trata de processo falimentar ou de recuperação judicial/extrajudicial ou de alguma das situações enumeradas no artigo 791 do Código de Processo Civil. O relator salienta que, neste caso específico, a execução está embasada em título judicial transitado em julgado, cuja exigibilidade é imediata, não podendo haver a vinculação da reclamante a uma condição prevista em acordo do qual não participou e, conseqüentemente, não se obrigou a cumprir.  

“Outrossim, cabe destacar que ao empregador, que não quitou os créditos trabalhistas na época própria, durante o contrato de trabalho, agora, na fase de execução trabalhista, após ter tido a oportunidade de discutir todo o pleito do trabalhador, não é dado procrastinar no pagamento” – finalizou o relator, determinando o prosseguimento da execução, com a conseqüente citação das executadas para o pagamento do montante da condenação.

(AP nº 00272-2007-134-03-00-3 )


FONTE:  TRT-MG,  18 de dezembro de 2008.

RESTRIÇÃO À OPÇÃO PELO SIMPLES É ILEGALDevedora de imposto municipal pode ser inscrita no “Simples Nacional”

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DECISÃO:  * TJ-RS  – Negar o enquadramento de microempresa no regime especial de arrecadação de tributos “Simples Nacional”, sob a alegação de que a firma deve impostos ao Município, não passa de legítima coação. O entendimento unânime foi firmado pela 2ª Câmara Cível do TJRS em julgamento realizado em 17/12.

A ação foi interposta pela Ultralentes Indústria Ótica Ltda. – ME contra sentença que julgou o improcedente pedido apresentado em Mandado de Segurança impetrado contra o Agente Fiscal da Receita Municipal de Porto Alegre. A petição de enquadramento como ¨Simples Nacional¨ foi indeferida, ao argumento de a microempresa ser devedora de impostos ao Fisco Municipal.

Apelação

A Ótica apelou sustentando que foi constituída em 20/07/1987, enquadrando-se, em 18/12/1998, como microempresa. Salientou que solicitou seu enquadramento como ¨SIMPLES¨, nos termos da Lei Complementar Federal nº 123/06, destacando que o indeferimento ocorreu em 07/2007. O débito, no valor original de R$ 47,65, terminou sendo pago em 09/2007.

Benefícios e restrições

Para o Relator da Apelação, Desembargador Roque Joaquim Volkweiss, a Microempresa tem razão em apelar. O magistrado destacou que, ao garantir o apoio a ser dado pelas leis ordinárias ou comuns às microempresas, aos microprodutores rurais e às empresas de pequeno porte, mediante redução da carga tributária, em momento algum a Constituição Federal condicionou a concessão ou a manutenção do estímulo à inexistência de débitos tributários. Frisou que a única condição imposta é que a empresa beneficiária possua reduzido faturamento periódico. Salientou ainda que a Constituição Federal, como também nenhuma Lei Complementar, não impôs restrições ao direito das pequenas empresas.

O magistrado questionou ainda: o que tem a ver a eventual inadimplência de uma empresa de pequeno porte com o seu baixo faturamento, para a concessão do estímulo de pagar menos tributos?

“Nada, absolutamente nada, ou seja, não é o corte do estímulo que o Município lhe impõe que vai propiciar o necessário aumento do seu faturamento para poder crescer! É uma pura e simples questão de lógica que o Município, no afã de aumentar a sua arrecadação, simplesmente deixa em segundo plano quando se trata de alguém que lhe deve tributos! Em outras palavras, parte do princípio de que, se a empresa está mal, não pagando os seus impostos, que feche então as suas portas e desapareça do mercado de trabalho, em escancarada contrariedade à filosofia adotada pela Carta Magna, no sentido de que a pequena empresa efetivamente cresça!”

Também participaram do julgamento os Desembargadores Arno Werlang e Sandra Brisolara Medeiros.

Proc.70025002486

FONTE:  TJ-RS, 19 de dezembro de 2008.

CONTRATO DE SEGURO SAÚDETJ confirma indenização securitária a segurado devedor

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DECISÃO:  * TJ-SC  –  A 3ª Câmara de Direito Civil do TJ, em matéria sob relatoria do desembargador Marcus Tulio Sartorato, manteve sentença da Comarca de Balneário Camboriú que condenou a Bradesco Vida e Previdência ao pagamento R$ 10 mil a Luiza Salla, referente à indenização securitária pelo óbito de sua mãe, Elza Helena Kurth.

A condenação inclui, ainda, 68 diárias de R$ 100, decorrentes da internação. Segundo os autos, Elza celebrou com a instituição um contrato de seguro de vida que lhe garantia a cobertura diária de R$ 100 em caso de internação hospitalar e R$ 10 mil, em caso de morte.

Com o falecimento, sua filha e beneficiária requereu os valores securitários, negados pela seguradora ante a inadimplência do prêmio à época dos fatos.

Ao examinar os autos, o relator do processo considerou injustificável a recusa ao pagamento, pois a segurada quitou 25 prestações, com certo tempo de atraso, estando em aberto três parcelas.

Ressaltou que em nenhum momento a seguradora buscou em juízo a resolução do contrato por falta de pagamento ou comunicou extrajudicialmente a segurada.

O magistrado esclareceu, ainda, que o caso ocorrido em 2001 estava sob vigência do Código Civil de 1916, que garantia ao segurado o direito de receber a indenização, desde que realizado o pagamento integral do débito até então vencido. Dessa forma, a empresa poderá compensar no pagamento das indenização, as mensalidades referentes aos três meses em aberto. A decisão foi unânime. (Apelação Cível n. 2007.029183)


FONTE:  TJ-SC,  18 de dezembro de 2008.

O “Dossiê da Desesperança”, uma atualização necessária

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* Clovis Brasil Pereira

 três anos, fizemos uma reflexão sobre os problemas que se abatiam sobre o país e o mundo, e o dilema vivido pela  sociedade em geral, frente aos problemas do cotidiano, que traziam uma grande descrença e mesmo desesperança para o enfrentamento de tantas  dificuldades que se apresentavam. 

Chegamos ao final de 2008, e percebemos que a perplexidade da sociedade só tem crescido, pois a cada dia que passa, novos fatos brotam do cotidiano, e ironicamente,  acabam dando a exata sensação de que o mundo caminha para o descaminho.

A esperança vai perdendo a corrida para o medo e angústia.  Cresce a desesperança.

Se de um lado, evoluímos positivamente no campo da tecnologia, na melhoria do padrão de vida de alguns segmentos sociais, notadamente no Brasil, com o crescimento do número de empregos, na pequena melhoria na distribuição de renda,  de outro lado, num chocante contraste, nos apequenamos como seres humanos, descuidamos do enriquecimento das relações humanas.

Estamos deixando de olhar  nos olhos das pessoas, de dar um breve sorriso, um aceno de cumplicidade, de transmitir uma breve palavra confortadora.

Pertencemos a uma geração, em que o contato entre as pessoas, muitas  vezes num mesmo espaço territorial, é feito por rádio ou  celular. Quando estamos à procura de um endereço, não perguntamos mais ao vizinho, ao amigo como encontrá-lo, mas preferimos nos socorrer do frio e impessoal GPS.

Estamos dando preferência aos presentes caros, da moda, ao invés de um aperto de mão, um sorriso, um consolo, um gracejo, um gesto de amor e solidariedade.

Enfim, estamos sendo vencidos pelo sistema consumista, gerado pelo capitalismo, que estimula  o acúmulo de riquezas, nos passa a falsa idéia de que o dinheiro trás poder, reconhecimento e respeito no meio social.

São falsas idéias, que acabam ruindo, dia após dia, no embalo de   uma  crise econômica mundial de proporções desastrosas,  onde o berço do imperialismo econômico (EUA) entraram em pânico, e como conseqüência, seus  conglomerados financeiros, infiltrados por todos os recantos  do mundo, acabaram sendo afetados, acabaram  ruindo, virando  pó.

Quando nos aproximamos de mais uma virada de ano, tempo em que as pessoas, embaladas pelo clima Natalino, que inspira mais solidariedade e  mais  calor humano, achamos por bem, atualizar o  chamado “Dossiê da Desesperança”, na esperança que possamos renovar a reflexão  e realimentar a conscientização, de que temos um compromisso maior com a sociedade em que vivemos, com suas relações sociais, no convívio com as pessoas, com o meio ambiente, com a paz, com o bem estar da infância, dos idosos, dos doentes, dos inválidos, dos desempregados.

São estarrecedores  os índices de violência urbana, que cresceram assustadoramente nos últimos três anos.  As estatísticas recentes, revelam que no ano de 2008,  somente na cidade do Rio de Janeiro, morreram mais de 1.200 pessoas. 

Em pleno século XXI, não conseguimos vencer a guerra contra certas doenças endêmicas, provocadas por pequenos mosquitos,  tais como febre amarela e a dengue.

A corrupção se  dissiminou  por todas as esferas de Poder, não escapando nem mesmo o sempre respeitado Poder Judiciário.

A violência no âmbito da família extrapolou todos os limites imagináveis.  Pais e padrastros  matando seus filhos.  Filhos, maltratando e matando os próprios pais.

Enfim, aumenta dia a dia, o medo, a insegurança, o desamor.  Lamentavelmente, cresce  a desesperança.

Eis o texto que produzimos em 2005, que  trazem

os mais uma vez à reflexão, que mostra um pouco a dramaticidade que envolve o mundo em que vivemos.

Ao longo da história da humanidade, desde seus primórdios, os homens sempre disseram buscar uma sociedade fraterna, harmônica, sem desigualdades sociais e econômicas, sem preconceitos de raça, língua, religião, etc.

Paradoxalmente, o tempo foi passando, e contrapondo-se aos altos índices de desenvolvimento tecnológico em todas as áreas da atividade humana, vemos estarrecidos, acontecimentos do cotidiano, que mostram uma sociedade doente, fragmentada, dominada pelo medo, afrontada pela pobreza, acuada pela violência.

Esse é o quadro que lamentavelmente, se apresenta no Brasil e no mundo, de forma generalizada.

Entre nós, a cada momento, o que denominamos “dossiê da desesperança” vai se avolumando, colocando em risco a estabilidade da sociedade, atormentando e envergonhando todos os cidadãos que aspiram o mínimo de equilíbrio e justiça social.

Os exemplos se multiplicam dia a dia, e os encontramos em todos os segmentos e matizes sociais.

Afinal, que país é esse?

Aonde no Poder Judiciário, a quem cabe a solução dos conflitos e assegurar a paz social, temos juizes presos por desvios de verbas públicas, por venda de sentenças judiciais à grupos criminosos, ou por assassinato de próprio colega, como revide pela investigação de atividade criminosa que praticava, dentre outros desvios deploráveis.

Aonde no Ministério Público, a quem cabe fiscalizar o cumprimento da lei e zelar pelos interesses da sociedade, encontramos integrantes condenados pelo assassinato a sangue frio da própria mulher e seu filho, pequenino ser, que ainda se recolhia no ventre materno, ou ainda, outro que matou um jovem, pela desinteligência em cenas de ciúme, dentre outros casos deploráveis.

Aonde, entre os advogados, incumbidos da nobre missão de pugnar pelo respeito à liberdade e à vida das pessoas, na sua amplitude maior, encontramos vários exemplos de profissionais que se bandearam para o lado dos criminosos, envolvendo-se com o narcotráfico, com o roubo, contrabando, corrupção, dentre outros delitos repugnáveis.

Aonde, no seio das instituições policiais, seja militar, civil ou federal, cujos membros têm por missão manter a ordem pública e garantir a segurança dos cidadãos, vemos grande número de integrantes envolvidos com quadrilhas especializadas no tráfico de drogas, no roubo de cargas, no contrabando, com grupos de extermínio, seqüestros, enfim, todo o gênero de atividade à margem da lei. Aliás, recentemente a temida Policia Federal apreendeu 2 milhões de dólares, em mais uma operação cinematográfica, onde desbaratou uma quadrilha que comercializava “boi recheado de cocaína”, e foi literalmente “roubada”, sem que a sociedade tenha recebido uma satisfação convincente do que realmente aconteceu.

Aonde, entre os políticos, a quem cabe a árdua função de gerir os destinos dos poderes institucionais, democraticamente constituídos, cujos mandatos foram outorgados pelo povo, encontramos vários maus exemplos, ora de roubarem literalmente os cofres públicos, fraudarem licitações, receberem favorecimentos, ora de patrocinarem o “mensalão”, ora o “mensalinho”.

Aonde o Banco Central do Brasil, com todo seu poderio, e a quem cabe a organização e fiscalização do sistema financeiro, não consegue guardar em seus cofres R$ 150 milhões de reais, e foi saqueado em pleno centro de Fortaleza.

Afinal, que país é esse?

Aonde a sociedade assiste atônita a desagregação da base familiar.

Aonde os casais se separam muitas vezes, por banalidades.

Aonde pais abandonam seus filhos, e onde filhos às vezes matam os próprios pais.

Aonde, ao lado de escolas que não ensinam, convivem professores que não educam.

Aonde médicos, baluartes da vida humana, são acusados e presos por pedofilia, abusos sexuais, abortos, erros médicos que cotidianamente se multiplicam.

Afinal, que país é esse?

Aonde a infância continua sem assistência, sem moradia, sem educação, com fome, submetida ao trabalho escravo em algumas regiões, e jogada à prostituição e à deriva do vício, em tantas outras.

Aonde religiosos encarregados de transmitir a paz espiritual às pessoas, se vêm envolvidos em crimes sexuais, abuso de menores, crimes passionais, ou ainda, explorando e enganando seres humanos, na maioria das vezes fragilizados, e que acabam sendo ludibriadas em sua boa-fé.

Aonde temos uma imprensa, que muitas vezes, denuncia sem certeza, faz um sumário de culpa sem provas, julga à revelia os pretensos culpados, e enlameia o nome de pessoas inocentes.

Ande os criminosos, dentro dos presídios, organizam rebeliões, dão ordens às autoridades constituídas, organizam e comandam seqüestros.

Aonde os criminosos, fora dos presídios, se multiplicam pelas “Máfias” que todo o dia pipocam pelos mais longínquos recantos do Brasil. Os exemplos são a máfia “do sangue”, máfia da “merenda escolar”, máfia “do INSS”; a máfia “dos tributos”, máfia “dos seguros”, máfia “dos concursos”; a máfia “dos combustíveis”, máfia “do mogno”, máfia “do orçamento”; a máfia “do narcotráfico”, máfia “do lixo”, máfia “do crime organizado”; a máfia “da venda de órgãos”, máfia “do dendê”, máfia “da prostituição infantil”; máfia “dos fiscais”, máfia “da adoção de crianças”, máfia “da prostituição internacional”. Desculpem os mafiosos se esqueci algum “segmento mafioso”, mas se ocorreu, foi involuntário. Agora, mais recentemente, ainda surge a “máfia do apito”, para desassossegar uma das poucas modalidades de lazer, quase uma unanimidade entre os brasileiros, que é o futebol.

Afinal, que país é esse?

É triste constatar que seres humanos, tão inteligentes, tendo ao seu alcance, todos os meios para promover o bem da sociedade, sejam protagonistas de um dossiê tão degradante, que denominados “o Dossiê da Desesperança”.

Afinal, o que falta à sociedade para encontrar o melhor caminho?

Leis, como afirmam alguns, certamente não é.

Aonde temos uma Constituição Federal que tem como fundamento, a dignidade da pessoa humana (§ 3º, art. 1º).

Aonde os direitos individuais são elencados à exaustão, no artigo 5º, em seus incisos I a LXXVII.

Aonde os direitos sociais, consistentes na educação, saúde, trabalho, moradia, lazer, segurança, previdência social, proteção à maternidade e à infância, assistência aos desamparados, são assegurados no artigo 6º, certamente não precisa de mais leis, mas simplesmente, de cumprir aquilo que está prescrito como fundamento na Lei Maior.

É preciso sim, que o homem, mergulhe no passado, e relembre a lição de Aristóteles, o grande filósofo grego, para quem o homem é um animal político, e por isso mesmo nasceu para viver em sociedade.

Urge que a sociedade desperte, e através de seus agentes mais influentes e significativos, se reorganize, e sem falsas lições de retórica, se paute pelo caminho da ética, do amor ao próximo, da fraternidade, do respeito mútuo, Caso contrario, esse animal político lembrado pelo filósofo grego, não fará jus ao direito de viver em sociedade, e continuará, isto sim, a engrossar cada vez mais, o “Dossiê da Desesperança”.

 


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

CLOVIS BRASIL PEREIRA:  Advogado, com escritório na cidade de Guarulhos (SP); Especialista em Processo Civil; Licenciado em Estudos Sociais, História e Geografia. É Mestre em Direito (área de concentração: direitos difusos e coletivos). Professor convidado do Curso de Pós Graduação em Direito Civil e Processual Civil do Curso Êxito, de S. J. dos Campos (SP): Professor convidado da Pós Graduação em Processo Civil na Universidade Guarulhos;   Professor Universitário, lecionando atualmente as disciplinas Direito Processual Civil e Prática Jurídica Civil nas Faculdades Integradas de Itapetininga (SP) e Unicastelo, São Paulo (SP), onde é  Coordenador do Núcleo de Prática Jurídica ;  ministra cursos na ESA- Escola Superior da Advocacia, no Estado de São Paulo,  Cursos Práticos de Atualização Profissional e  Palestras sobre temas atuais; é membro da Comissão do Advogado-Professor da OAB-SP; membro da Comissão de Ensino Jurídico da OAB-Guarulhos; é colaborador com artigos publicados nos vários sites e revistas jurídicas. É coordenador e editor do site jurídico www.prolegis.com.br

Contato:   prof.clovis@54.70.182.189