Exceção de pré-executividade. Efeito suspensivo do processo de execução fiscal

* Kiyoshi Harada

Hoje,  é pacífica a Jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça quanto ao cabimento de exceção de pré-executividade nos casos em que há prova inequívoca da inexistência de título líquido e certo, quer em função de sua nulidade, quer em razão da decadência ou da prescrição, quer em função da ilegitimidade passiva ad causam, quer, ainda, porque o crédito reclamado já havia sido pago.

Enfim, a exceção de pré-executividade, fruto de criação doutrinária e jurisprudencial permite que o executado demonstre a improcedência da execução sem sujeitar-se à constrição de seus bens. Ela sempre será possível nos casos em que o juízo poderia conhecer de ofício a matéria, a exemplo do que acontece a cerca da higidez do título executivo. Não vislumbrado título executivo apto a fundamentar a expropriação de bens do devedor razão nenhuma há para permitir o prosseguimento do processo de execução. Objetiva, em nome dos princípios da celeridade e da economia processual pôr termo à execução infundada, independentemente de apresentação de embargos.

Sendo assim, está ínsita na exceção de pré-executividade a sua natureza suspensiva, ou seja, a suspensão do processo de execução para evitar a penhora, quando, então, aquela exceção restará prejudicada, pois com o apenhamento de bens do devedor abre-se o prazo para apresentação de embargos. Por isso, independentemente do pedido expresso de concessão liminar da suspensão do feito, o juiz há de determinar o recolhimento do mandado de penhora ao despachar a petição de exceção de pré-executividade, a menos que entenda que o seu conteúdo extravasou dos limites autorizados pela jurisprudência. Entretanto, nessa hipótese, deve o juiz indeferir de plano a exceção. Caberá ao excipiente interpor recurso de agravo com pedido de efeito ativo. Não sendo concedido efeito ativo ou desprovido o agravo, a execução prosseguirá.

O que não é compreensível é o fato de o juiz, por não ser medida positivada em nosso Direito, ignorar os termos da exceção, determinar bloqueio on-line das contas do devedor excipiente para, ao depois, ordenar que a Fazenda se manifesta em relação à exceção apresentada como aconteceu em um caso concreto conforme despachos judiciais abaixo transcritos: 

‘Considerando que a simples interposição de exceção de pré-executividade não tem o condão de suspender o curso da execução fiscal, citado(a) o(a) Executado(a), determino o bloqueio pelo sistema do BACENJUD, nas contas do(a) Executado(a),….., CPF/CNPJ nº ………….., no valor de R$………… ( ……………), devendo ficar depositados à disposição deste Juízo, para liberação posterior mediante alvará.
Aguarde-se a confirmação do bloqueio, no prazo de 05 dias.
Manifeste-se a exeqüente acerca da exceção de pré-executividade em 15 dias.
Após ao MP’.
 

Antes mesmo da publicação do despacho retro, um novo foi proferido nestes termos: 

Considerando a efetivação do bloqueio eletrônico de valores através do convênio BACENJUD, determino o seguinte:
I – Lavre-se termo de penhora do numerário bloqueado e intime-se o executado para assiná-lo, no prazo de 10 (dez) dias, cientificando-o de que a data da assinatura será o termo inicial para a contagem do prazo para oposição de embargos à execução;
II – Após, intime-se o exeqüente para, no prazo de 10 (dez) dias, manifestar-se em relação à penhora.
III – E ainda, face a insuficiência de saldo nas contas do executado constante nos demonstrativos do bloqueio via Bacenjud, intime-se o exeqüente para indicar, no prazo de 10(dez) dias, bens passíveis de penhora do executado.’
Aracaju, 27 de junho de 2007.
Dra. Taiane Danusa Gusmão Barroso

Juíza de Direito. 

Evidente a inversão tumultuária da ordem processual, que decorre desses despachos, ao ordenar que a Exeqüente se manifeste sobre a exceção de pré-executividade, que restou prejudicada com a prematura ordem de penhora e seu cumprimento respectivo.

Como indica o próprio nome, a exceção de pré-executividade, também, conhecida como objeção de pré-executoriedade, é instrumento processual que antecede à execução. A execução pressupõe, necessariamente, a constrição de bens do devedor e a exceção de pré-executividade visa exatamente evitar essa agressão patrimonial, em razão de nulidade da execução. Efetivada a penhora, o procedimento judicial cabível são os embargos e não mais a exceção de pré-executividade.

Ainda que se argumente que a exceção de pré-executividade não está positivada em nosso ordenamento jurídico, o certo é que o disposto no art. 265 do CPC deve ser aplicado analogicamente ao seu processamento, uma vez que, a finalidade desse dispositivo é justamente suspender o curso do processo principal enquanto não decidida questão prejudicial alegada por via excepcional.

Dispõe o art. 265, III e IV do CPC: 

“Art. 265. Suspende-se o processo:
…………………………………………………….
III – quando for oposta exceção de incompetência do juízo, da câmara ou do tribunal, bem como no caso de suspeição ou impedimento do juiz.
IV – quando a sentença de mérito:
a)depender do julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente;
b)não puder ser proferida senão depois de verificado determinado fato, ou de produzida certa prova, requisitada a outro juízo;
c)tiver por pressuposto o julgamento de questão de estado, requerido como declaração incidente.”
 

Como se vê, todas as situações consagradas no art. 265, III e IV do CPC refletem a existência de questão prejudicial que, caso não seja resolvida previamente, poderá acarretar prejuízo ao julgamento de mérito da demanda.

Assim, fora de dúvida de que a questão prejudicial alegada na exceção de pré-executividade impede, o regular prosseguimento da execução fiscal.

Nesse sentido é a jurisprudência de nossos tribunais: 

“EMENTA.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO EXTRAJUDICIAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. MEIO APROPRIADO PARA A SUSPENSÃO DO PROCESSO EXECUTÓRIO PARA RESGUARDAR AS PARTES LITIGANTES DE UM PREJUÍZO EM FACE DA ALTERAÇÃO DO TÍTULO EXECUTIVO, ATRAVÉS DO JULGAMENTO DA AÇÃO REVISIONAL QUE CORRE PARALELAMENTE. A AÇÃO REVISIONAL FOI JULGADA PROCEDENTE ANULANDO CLÁUSULAS DO CONTRATO. TÍTULO EXECUTIVO. AUSÊNCIA DE LIQUIDEZ. ALTERAÇÃO DO "QUANTUM DEBEATUR". NECESSIDADE DE LIQUIDAÇÃO DO REAL VALOR DEVIDO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE PROCEDENTE. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. AGRAVO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO UNÂNIME.’
(Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe, AI nº 2004.206099, Rel. Desa. Josefa Paixão de Santana, j. 06/12/2005).

‘EMENTA.
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. SUSPENSÃO DO PROCESSO.
O ajuizamento de exceção de pré-executividade é meio hábil para, enquanto não apreciada, suspender a execução fiscal.’
…………………………………………………..
VOTO

Entendo que a execução deva permanecer suspensa, uma vez que não teria eficácia a oposição de exceção de pré-executividade se não suspendesse o andamento do feito executivo, evitando-se a realização da constrição do patrimônio do devedor. Se assim não fosse, o executado aguardaria a efetivação da penhora para a oposição de embargos, meio processual de cognição mais ampla.
Nesse sentido já decidiu a Segunda Turma desta Corte, no julgamento do agravo de instrumento nº 2002.04.01.040131-0, publicado no DJU de 08.01.2003, em que fui Relator, assim ementado:

“EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO. POSSIBILIDADE.

O ajuizamento de exceção de pré-executividade é meio hábil para, enquanto não apreciada, suspender a execução fiscal.”

“EXECUÇÃO FISCAL. SUSPENSÃO DO PROCESSO INDEPENDENTE DE PENHORA OU GARANTIA. POSSIBILIDADE, NAS HIPÓTESES EM QUE A MATÉRIA SEJA COGNOSCÍVEL MEDIANTE EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE.
A liminar constitui meio idôneo para impedir a propositura de execução fiscal pela fazenda conforme se deflui da exegese do ART – 151 do CTN-66, sem malferimento ao ART-38 da LEF, que deve ser interpretado em sintonia com aquele. Mas, uma vez proposta a execução, a sua suspensão depende de estar seguro o juízo, mediante penhora ou caução idônea, sob pena de total desvirtuamento dos postulados básico que informam o processo de execução, Isso porque as disposições que regem processo de conhecimento somente se aplicam ao processo de execução em caráter subsidiário (ART-598 do CPC-73). E em matéria de execução há norma específica determinando que a sua suspensão se dê mediante a interposição de embargos de devedor, que por sua vez têm como pressuposto processual objetivo e extrínseco a penhora de vens. 2. Entretanto, se a liminar ou antecipação de tutela obtida após o ajuizamento da execução estiver fundada e, razões que podem ser conhecidas mediante exceção de pré-executividade, que vem sendo admitida pela doutrina e jurisprudência como forma de defesa de mérito a ser manejada nos próprios autos do processo executivo, independente de penhora, não há óbice a suspensão da execução até julgamento da ação conexa” (AG nº 96.0438417/PR – Rel. Juíza Tânia Terezinha Cardoso Escobar – DJ de 10/03/1999, p. 868).

Frente ao exposto, dou provimento ao agravo de instrumento para suspender a execução fiscal até o julgamento da exceção de pré-executividade pelo Juízo de origem.

Desembargador Federal DIRCEU DE ALMEIDA SOARES
Relator.’ (TRF 4ª Região, AI nº 2005.04.01.022520-0/RS, Rel. Des. Fed. Dirceu de Almeida Soares, DJU de 14/09/2005).
 

Apesar de implícito o efeito suspensivo da exceção de pré-executividade convém que a petição de exceção requeira, expressamente, a concessão de liminar para suspender o processo de execução. Do seu indeferimento caberá agravo em sua modalidade ‘por instrumento’ porque, como já salientado, uma vez efetivada a penhora, a exceção restará prejudicada de forma irreversível. 

 


REFERÊNCIA BIOGRÁFICA

KIYOSHI HARADA: Especialista em Direito Tributário e em Direito Financeiro pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Membro do Conselho Superior de Estudos Jurídicos da Fiesp. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.
Email:  kiyoshi@haradaadvogados.com.br     site: www.haradaadvogados.com.br

 

Redação Prolegis
Redação Prolegishttp://prolegis.com.br
ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

Fale Conosco!

spot_img

Artigos Relacionados

Posts Recentes