A prescrição trabalhista, o marco constitucional inicial para a sua contagem

    * Luiz Salvador –            

               E a questão da ilegimitidade da Procuradoria do Trabalho para argüi-la

             Apesar do caráter tutelar e alimentar assegurado aos créditos trabalhistas, até 4 de outubro/88, o trabalhador só podia demandar seu empregador para pagamento de seus créditos trabalhistas impagos, observados os dois últimos anos de trabalho a teor do normatizado pelo art. 11 da CLT. A partir de 05/10/88, o inciso XXIX do art. 7º da CF alargou o instituto da prescrição de dois anos para cinco, desde que o empregado ajuíze a reclamação trabalhista dentro de dois anos do respectivo desligamento (extinção do contrato), incluído o prazo do aviso prévio por força da nº 83 da E. SDI do C. TST, que cristalizou o entendimento de que o prazo prescricional só começa a fluir no final do término do aviso prévio (Art. 487, § 1º da CLT). Durante muitos anos a Justiça do Trabalho se recusava a acatar aplicação subsidiária do disposto pelo art. 172 do C.Civil, até que o C. TST pacificou a divergência editando o Enunciado 268, que assim, dispõe: "A demanda trabalhista, ainda que arquivada, interrompe a prescrição". Pacificado este entendimento, a jurisprudência cuidou de delinear os demais contornos que envolvem a questão.

            "Como se vê, a posição de certa corrente jurisprudencial no sentido de que quanto aos pedidos não formulados no primeiro ajuizamento, o prazo prescricional tem fluência normal, contraria o sentido de que o simples ajuizamento da reclamação trabalhista adquire no processo do trabalho. Além do mais, desconsidera os princípios interpretativos inerentes ao direito e o processo do trabalho, que devem se guiar pela características próprias do tipo de relação jurídica que regulamentam. Neste sentido são várias as normas que procuram atenuar o formalismo do processo civil, como, por exemplo, a já anteriormente mencionada que permite que o simples ajuizamento da ação interrompa a prescrição, independente de se consumar a notificação da parte contrária. Por outro lado, é sabido que o hipossuficiente nem sempre tem conhecimento de todos os seus direitos, ou pelo menos daqueles que foram violados no curso da relação de emprego. Por esta razão também, de ordem teleológica, é mais do que justificável que se tenha uma interpretação mais benéfica quanto aos efeitos da interrupção da prescrição, em face da natureza da controvérsia existente para deslinde na Justiça do Trabalho, presumindo-se ter sido este o objetivo do TST, ao editar o En. 268/TST". (TRT 3ª Região, RO5.888/97, AC. 15.11.97, Rel. Juiz Luiz Ronan Neves koury, in LTR62-05/697/97).

             Examinando esta mesma questão, o TRT-PR, assim já decidiu:

            "PRESCRIÇÃO. INTERRUPÇÃO. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. EXTINÇÃO DO FEITO ANTERIOR SEM JULGAMENTO DO MÉRITO. Ainda que sindicato atuante como substituto processual venha a ser considerado parte ilegítima -ad causam- em reclamação anteriormente ajuizada com o mesmo objeto, referida ação deve ser tida como válida para efeitos de interrupção da prescrição relativamente a substituído, já que induvidosa a inocorrência de inércia deste quanto ao direito de ação, devendo ser relevado, ainda, que em caso tal, a entidade sindical, apesar de se valer, de meio inadequado, ingressa em Juízo, como pretensa credora. Aplicação subsidiária das disposições dos arts. 172, inciso I, 173 e 174, inciso III, do Código Civil e art. 219, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil e Lei 8.036-90, art. 3º ". (TRT-PR-RO 12.083-98 – Ac.4ª T 13.453-99 – Rel. Juíza Rosemarie Diedrichs Pimpão – decisão publicada no DJ-PR de 25-06-1999). A contagem do prazo prescricional se inicia com o da extinção do contrato, como se extrai do exame do art. 7º, inciso XXIX (A) da CF: "cinco anos para o trabalhador urbano, até o limite de dois anos APÓS A EXTINÇÃO DO CONTRATO".

            Apesar da clareza redacional do texto, que fixa o início do marco prescricional de modo a não pairar dúvida, teima a jurisprudência em delinear um outro contorno diferente do pretendido, insistindo numa construção de sentido diverso pretendendo seja o marco inicial contado não da extinção do contrato, mas do ajuizamento da ação, restringindo assim a eficácia de uma norma de claro e nítido caráter tutelar. A jurisprudência respeitadora da vontade da Carta Política vigente no País, divergindo do posicionamento conservador apontado, orienta-se, corretamente, na vontade expressa do legislador constitucional, como se extrai das lúcidas conclusões seguintes:

            "O prazo de dois anos após a extinção do contrato de trabalho, previsto no art. 7°, item XXIX, letra a, da CF/88 é o limite dado pelo legislador constitucional ao trabalhador urbano para propor ação em que reivindicará direitos trabalhistas até os últimos cinco anos. Portanto, não se pode incluí-lo neste lapso temporal, pois ele seria diminuído para três, contrariando, desta forma, a vontade expressa do legislador constitucional, que foi a de conferir ao trabalhador o prazo prescricional de 5 anos para fazer valer direitos oriundos da relação de emprego. Ao intérprete não cabe limitar a eficácia da normas constitucionais de tutela do empregado através da exegese restritiva, principalmente quando se trata de prescrição de créditos provenientes de relação de trabalho, de natureza alimentar e considerado por ela própria como valor fundamental da República Federativa (art. 1°, item IV),base da ordem econômica (art. 170) e primado da ordem social (art, 193), TRT 3ªReg. RO 1848/92 – Ac. 3ªT., 21.01.93, Rel. Antonio Alvares da silva" ( Revista LTr -ano 57 – n° 06 – junho de1993 – São Paulo – págs. 755/756). "A Constituição Federal, em seu artigo 7º, inciso XXIX, prevê, a prescrição dos direitos anteriores a cinco anos da extinção do contrato de trabalho. Interpretação teleológica esta que atende aos princípios basilares do Direito Material, qual seja, na dúvida sobre o alcance da norma, deve a mesma ser aplicada no sentido mais favorável ao obreiro, "in dubio pro operario" (TRT-PR RO 00011/95, Ac. 3ª T- 00404/96, Rel. Juiz Mario Antonio Ferrari, in DJP 19-01-96, PAG. 56). "A prescrição na Justiça do Trabalho é contada a partir da rescisão contratual. Note-se inclusive, que a Carta Magna, em seu arg. 7º, inciso XXIX, não fez a menor referência à data do ajuizamento da ação para a contagem do prazo prescricional, fazendo referência tão somente à data da extinção contratual. Assim, resta indene de dúvida que o marco prescricional é a data da rescisão contratual"(TRT-PR RO 4.791/95, AC. 1ª T. 12.997/96 – Rel. Juiz Wilson Pereira, in DJPR 05.07.96). " Segundo o art. 7º, XXIX letra a, da Constituição Federal de 1.988 o início do prazo prescricional ocorre na data da extinção do contrato de trabalho, e não na data em que foram pagas as verbas rescisórias" (TRT-PR RO 9799/91, AC. 1ª T 3180/93, Unân, Rel. Juiz Tobias de Macedo Filho, in DJPR 02.04.93, PÁG. 151).

            De todos sabido que o instituto da prescrição é de direito patrimonial e não de direito público (Cód. Civil, arts. 161/179), sendo que o momento aprazado para sua invocação é o do oferecimento da defesa, sob pena de preclusão, para que produza os efeitos então pretendidos – o atingimento direto do direito e por via reflexa extinção da ação, fazendo fenecer o direito do obreiro mesmo diante do seu caráter tutelar e alimentar. Tal conclusão se extrai do exame do disposto no art. 269, inciso IV do vigente Código de Processo Civil que elevou a prescrição como matéria de mérito. Assim, até em obediência ao princípio do contraditório e da ampla defesa, a matéria de mérito não pode ser invocada fora do primeiro grau (em grau de recurso, em memorial, sustentação oral, sob pena de permitir-se a supressão de instância. Tratando-se então, como visto, de direito patrimonial, não detém o Ministério Público do Trabalho legitimidade para argüir a prescrição mesmo em favor de entes públicos, já que não é parte no processo e sua atuação se dá na qualidade de defensor da lei (Custos Legis), impedidos do papel de representação judicial e consultoria jurídica de entidades públicas, inciso IX do art. 129 da CF/88:

            "A prescrição de direitos patrimoniais somente pode ser suscitada pelas partes que compõem a lide, sendo vedado até mesmo sua decretação ex officio, a teor do disposto no art. 219, § 5º, do CPC, c/c o art. 166, do CC. Seguindo esta diretriz, o MPT somente tem legitimidade para argüir prescrição de direitos patrimoniais quando figurar como parte na ação, o que não in casu, sob pena de estar exercendo verdadeira representação judicial do ente público demandado, o que lhe é constitucionalmente vedado – art. 129, IX, CF/88 – TRT da Décima-Nona Região, por unanimidade, RO Nº 97612141.70 – Procedência: JCJ de Arapiraca/AL – Presidente em exercício: Juíza HELENA E MELLO – Relator: Juiz PEDRO INÁCIO DA SILVA, Maceió, 28 de julho de 1998. (DOE 04.09.98).

            Neste mesmo sentido, também, por último a Orientação Jurisprudencial n.º 130, do C.TST:

            "Prescrição. Ministério Público. Custos legis. Ilegitimidade. O Ministério Público não tem legitimidade para argüir a prescrição a favor da entidade de direito público, em matéria de direito patrimonial, quando atua na qualidade de custos legis (arts. 166, do CC, e, 219, § 5º, do CPC). Parecer exarado em Remessa de Ofício"

 

Conclusão.

            Tratando-se a prescrição de direito patrimonial deve ser argüida no primeiro grau com a defesa, pena de preclusão, sendo que o MPT não detém legitimidade para sua argüição por não ser parte e estar impedido de exercer o papel de representação judicial e consultoria jurídica de entidades públicas, a teor do inciso IX do art. 129 da CF/88. O arquivamento de ação anterior ajuizada interrompe a prescrição, assegurando-se íntegros todos os direitos incumpridos, mesmo os não constantes da ação anterior arquivada, observando-se, ao propor a ação, apenas, o prazo prescricional de dois anos contados da extinção do contrato de trabalho (art. 7°, item XXIX, letra a, da CF/88), atendendo-se assim à vontade do Legislador Constituinte.

 


Referência Biográfica

 LUIZ SALVADOR   –   Advogado trabalhista no Paraná, diretor para assuntos legislativos da ABRAT, integrante do corpo técnico do DIAP (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar).

E-mail: defesatrab@uol.com.br

Redação Prolegis
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ISSN 1982-386X – Editor Responsável: Prof. Ms. Clovis Brasil Pereira.

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